diff options
| -rw-r--r-- | .gitattributes | 3 | ||||
| -rw-r--r-- | 20149-8.txt | 1987 | ||||
| -rw-r--r-- | 20149-8.zip | bin | 0 -> 25428 bytes | |||
| -rw-r--r-- | LICENSE.txt | 11 | ||||
| -rw-r--r-- | README.md | 2 |
5 files changed, 2003 insertions, 0 deletions
diff --git a/.gitattributes b/.gitattributes new file mode 100644 index 0000000..6833f05 --- /dev/null +++ b/.gitattributes @@ -0,0 +1,3 @@ +* text=auto +*.txt text +*.md text diff --git a/20149-8.txt b/20149-8.txt new file mode 100644 index 0000000..cc63050 --- /dev/null +++ b/20149-8.txt @@ -0,0 +1,1987 @@ +The Project Gutenberg EBook of Paródia ao primeiro canto dos Lusíadas de +Camões por quatro estudantes de Évora em 1589, by Anonymous + +This eBook is for the use of anyone anywhere at no cost and with +almost no restrictions whatsoever. You may copy it, give it away or +re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included +with this eBook or online at www.gutenberg.org + + +Title: Paródia ao primeiro canto dos Lusíadas de Camões por quatro estudantes de Évora em 1589 + +Author: Anonymous + +Release Date: December 20, 2006 [EBook #20149] + +Language: Portuguese + +Character set encoding: ISO-8859-1 + +*** START OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK PARÓDIA AO PRIMEIRO CANTO *** + + + + +Produced by Rita Farinha and the Online Distributed +Proofreading Team. The images for this file were generously +made available by Biblioteca Nacional Digital +(http://bnd.bn.pt). + + + + + + +PARODIA AO PRIMEIRO CANTO DOS LUSIADAS DE CAMÕES POR QUATRO ESTUDANTES +DE EVORA EM 1589. + + +LISBOA. +NA TYPOGRAPHIA DE G. M. MARTINS. +Rua do Ferregial de Baixo, 22. +1880. + + + + +As honras da parodia só ás obras do genio costumam conceder-se. A divina +Iliada foi parodiada em um poema heroi-comico tão antigo, que geralmente +se attribue ao proprio Homero; ainda que Suidas lhe dá por auctor a +Pigres, irmão da Rainha Artemisa. N'esse poema, intitulado a +_Batrachomyomachia_, a terrivel lucta dos Gregos e Troianos é +reproduzida no maravilhoso combate dos ratos e das rãs. Esta corôa +burlesca ainda faltava ao rival de Homero, quando o poeta Scarron +_primeiro_ marido da famigerada Marqueza de Maintenon, se lembrou de +cantar: + + ...... cet homme pieux, +Qui vint chargé de tous se Dieux +Et de Monsieur son père Anchise, +Beau vieillard à la barbe grise, etc. + +A grande obra do unico homem de genio que talvez tenha produzido a nossa +terra, não podia isentar-se d'este fado inherente ás grandes +celebridades. Eram apenas passados dezoito annos depois da publicação +dos _Lusiadas_--ainda a reputação de Camões não estava consagrada pelos +seculos, quando alguns homens engenhosos comprehenderam que aquella obra +immortal era uma d'aquellas a que a parodia era devida. O resultado de +seus trabalhos não é de certo para comparar com nenhuma das espirituosas +producções que ficam mencionadas; mas ainda assim não é esta +inteiramente destituida de merecimento. Francisco Soares Toscano, bem +conhecido dos litteratos pelo seu _Parallelo de Principes_, escreveu uma +interessante noticia sobre esta obra, em que nos conta o curioso modo +por que ella foi composta. Quatro estudantes da Universidade d'Evora +costumavam sair a passear, ás tardes, aos arrabaldes da cidade, levando +comsígo os Lusiadas. Chegados a um verde ferrageal, sentavam-se a uma +fresca sombra, e se abria a sessão parodiadora. Assim como a engelhada e +disforme mascara de uma velha megéra cobre o rosto radiante de formosura +de uma elegante _Coquette_, para mais fazer realçar seus encantos, +quando deixe cair aquelle hediondo disfarce; assim o immortal poema +devia ser desfigurado por aquelles travessos estudantes. Os Gamas, +Castros e Albuquerques tinham de ceder seu logar aos Catigelas, Lunas e +Barbanças, barões sem duvida tão assignalados nos combates de Baccho +como ess'outros nos de Marte. + +Dois mezes durava aquella sessão extraordinaria; e já tão continuados +passeios davam que fallar aos estudantes e tambem dariam que entender á +Santa Inquisição d'Evora, se aquella sociedade secreta não fosse +composta, como de facto o era, de quatro theologos, e tão orthodoxos, +que um d'elles veio a ser Inquisidor Geral. Mas por fim appareceu a +mysteriosa obra dos quatro patuscos, como hoje lhe chamaria um +academico, e não sei se já então lhe chamavam. A este modo de composição +de sociedade e ás muitas emendas que depois soffreu dos curiosos, como +adverte Toscano, se deve talvez a confusão do enredo d'este poema. +Parece que seus collaboradores tinham principalmente em vista inverter +ao _de-vinho_ cada verso que entrava em discussão, sem attender á +coherencia do todo. É provavel que se propozessem a celebrar os mais +famosos bebedores Evorenses, aos quaes alludissem, e talvez nomeassem +por seus proprios nomes ou apellidos. Toscano, que os devia conhecer, +assim o indica quando diz que tinha feito varias cotas a esta parodia +para melhor se entender. Com effeito na est. XXX se faz menção de um +_Pero Vaz_, que provavelmente é o mesmo christão-novo, bebado perdido, +auctor do epigramma latino de que falla a noticia. Infelizmente para a +historia da _Borracheologia Lusitana_, cotas e epigramma tudo se perdeu. + +Os collaboradores d'esta innocente profanação litteraria não são +inteiramente desconhecidos. _Manoel do Valle de Moura_, natural de +Arrayolos no Alemtejo, doutorou-se em Theologia na Universidade d'Evora, +e chegou a ser Arcebispo d'esta diocese e Inquisidor geral. Contava +vinte e cinco annos quando concorria para esta composição, e chegou a +uma avançada idade. Além da obra _De Encantationibus et Ensalmis_, de +que falla Toscano, e outras de não menor utilidade, Barboza o faz auctor +de uma _Illustração á primeira Ode de Camões_. De certo não fez pouco +Sua Rev.^{ma} se conseguiu lançar alguma luz sobre aquelle confuso ou +estropeado poema. Nem _Bartholomeu Varella_, nem o Licenciado _Manoel +Luiz_, tiveram a honra de encher as columnas da Bibliotheca Lusitana; +mas João Baptista de Castro de ambos faz menção no seu Mappa de +Portugal. Não é comtudo a Varella, como elle pensa, que cabem os +louvores que lhe dá por esta composição burlesca. Manoel Luiz +Freire--que assim lhe chama um Padre Francisco da Cruz, citado por +Castro,--se deve ter como o principal e mais chistoso collaborador desta +obra. As unicas noticias biographicas que d'elle sabemos, são as +apontadas por Toscano em sua noticia. O quarto dos theologos, e ao que +parece o mais theologo de todos, foi o pobre _Luiz Mendes de +Vasconcellos_, cujo ronceiro estro só lhe pôde inspirar um unico verso. +Não se confunda este obscuro individuo com o auctor do _Sitio de Lisboa_ +e da _Arte militar_, supposto fossem contemporaneos. Um dedicou-se á +Egreja, o outro ás armas. + +Esta parodia chegou a alcançar certa celebridade, ainda que até agora +nunca fosse impressa. Eis-aqui o que d'ella diz Faria e Souza, fallando +de outra de um soneto de Garcilasso, attribuida a Camões: «Lo que mi +poeta hizo conquel soneto de Garcilasso, pasándose de tanta gravedad a +tanta picardia, hizo otro ingenio Portuguez con el canto 1.^o de su +Lusiada, intitulándole _Borrachera_; porque celebra en él á algunos +aficionados del vino; y las mas de las otavas son bueltas á este +proposito con gran felicidad.» E depois de dar como amostra os quatros +primeiros versos da 1.^a oitava, prosegue: «El canto 2.^o continuó (y no +con menos felicidad) _Antonio de Magallanes y Menezes_, señor de la +Ponte da Barca, que este ano de 1645, aqui en Madrid, me referió algunas +estancias. Yo, quando en mi mocedad atendia á esto, bolvi tambien +algunas, de que se me acuerdan los primeros quatro versos de la 90 del +canto 5.^o, que son: + +Da boca de facundo capitão, &c. + +y mi rebuelta dice deste modo: + +Da boca do fecundo borrachão +Pendendo estavam todos bem bebidos, +Quando deu fim a grande inundação +Dos altos copos grandes e subidos!» + +(_Comment. ás Rim. Tom. 1.^o pag. 354_). + + + + +FESTAS BACCHANAES: + +CONVERSÃO DO PRIMEIRO CANTO DOS LUSIADAS DO GRANDE LUIZ DE CAMÕES +VERTIDOS DO HUMANO EM O DE-VINHO POR UNS CAPRICHOSOS AUCTORES: S. + +O DR. MANOEL DO VALLE, BARTHOLOMEU VARELLA, LUIZ MENDES DE VASCONCELLOS, +E O LICENCIADO MANOEL LUIZ, NO ANNO DE 1589. + + * * * * * + +NOTICIA. + + +Esta obra da conversão do primeiro canto do poema de Luiz de Camões se +fez no anno de 1589, para a qual concorreram quatro pessoas, a saber: o +_Dr. Manoel do Valle_, deputado da Santa Inquisição, que compôz o livro +dos Ensalmos em latim, que agora imprimiu: outro foi _Bartholomeu +Varella_, natural de Vianna, junto a Evora, o qual falleceu, que era +irmão de Diogo Pereira, que foi este anno ás Côrtes, que El-rei D. +Filippe II fez em Lisboa, por Procurador d'esta cidade de Evora. Foi +Bartholomeu Varella clerigo e grandissimo poeta. O terceiro foi _Luiz +Mendes de Vasconcellos_, criado do Arcebispo D. Theotonio; o qual posto +que não era poeta, se achou ao fazer da obra; e só fez um verso, que é o +ultimo da oitava 17; porque estando elles suspensos no cuidado de +completarem a dita oitava e parados no verso que diz: + +_Porque este é o que aguenta a velha idade_, acudiu o dito Luiz Mendes, +concluindo: + +_Desterrando a agua-pé d'esta cidade._ + +O quarto e principal auctor foi o Licenciado _Manoel Luiz_, Bacharel; e +este anno de 1619 vive com o Priorado de Terena. Este foi o promovedor +d'esta obra, e a fez quasi toda, ou o melhor d'ella. + +Quando a fizeram eram então todos theologos; e ás tardes, acabado o +estudo, sahiam pela porta de Machede, e assentados em um ferrageal, iam +traduzindo para a bebedice as taes oitavas de Camões, fingindo uma +embarcação de Lisboa para Evora, como Camões a de Portugal para a India +Oriental; e compozeram a tal obra dentro em dois mezes, no cabo dos +quaes sahiram com ella: sendo que já os estudantes suspeitavam de alguma +applicação (posto que não soubessem de certo o que era) pelos verem ir +todas as tardes para fóra dos muros, e communicarem seus papeis, sem +darem conta d'isso a ninguem. + +Finalmente, sahida a obra, foi muito festejada e estimada de todos; e +lendo-a o Padre Ferrer, castelhano (varão doutissimo da Companhia, do +qual o Dr. Manoel do Valle traz uma carta no seu livro) e fallando-se +n'ella, costumava dizer, que era a melhor obra que nunca sahira nem elle +vira, se não fosse tão suja. + +Depois, como se divulgou, cada um a quiz emendar como entendia, d'onde +vem andarem hoje as copias com tanta diversidade de leituras. Porém eu, +esta que aqui vae, a trasladei do proprio original e letra de +Bartholomeu Varella, que está em poder do Chantre da Sé d'esta cidade, +Manoel Severim de Faria, que a houve do dito Varella, e lhe fiz algumas +cotas para intelligencia da obra. + +Isto me parece basta para se saber o como esta obra se fez. E eu +_Francisco Soares Toscano_ o fiz aos 10 de Janeiro de 1619. + + + + +FESTAS BACCHANAES. + + +ARGUMENTO. + + +_Fazem concilio os bebados de porte, +Oppõe-se aos Bagulhentos Pedro ingente; +Favorece-os o Catigela forte, +No Lamarosa tem seu lava-dente. +De inveja Lyeo lhes busca a morte, +Descendo a Monte-mór contra esta gente, +Que vê em rio Mourinho a acção traidora, +E a Peramanca chega vencedora_. + + +I. + + +Borrachas, borrachões assignalados, +Que de Alcochete junto a Villa Franca, +Por mares nunca d'antes navegados +Passaram inda além de Peramanca: +Em pagodes, e ceias esforçados, +Mais do que se permitte a gente branca, +Em Evora cidade se alojaram, +Onde pipas e quartos despejaram: + + +II. + + +Tambem as bebedices mui famosas +D'aquelles que andaram esgotando +O imperio de Baccho, e as saborosas +Agoas do bom Louredo devastando; +E os que por bebedices valerosas +Se vão das leis do reino libertando; +Cantando espalharei por toda a parte, +Se a tanto me ajudar Baccho, e não Marte. + + +III. + + +Cessem do Novellão, do gran Barbança +As grandes bebedices que fizeram; +Cale-se do Rangel e do Carrança +A multidão dos vinhos que beberam, +Que eu canto d'outra gente e d'outra lança, +A quem frascos de vinho obedeceram: +Cesse tudo o que a musa antiga canta, +Que outro beber mais alto se alevanta. + + +IV. + + +E vós, bacchanaes nymphas, pois creado +Em mim tendes a sêde tão ardente, +Se sempre em largo copo espraiado +Festejei vosso vinho alegremente, +Dae-me agora um bom papo despejado +Para beber á perda co'esta gente, +Porque de vossas agoas Baccho ordene +Um rio para bebados perenne. + + +V. + + +Dae-me uma vasilha mui cheirosa, +Seja de bom licor, não saiba a arruda, +De Peramanca seja que é gostosa, +O peito esforça, a côr ao gesto muda; +Dae-me igual nome ás tassas da famosa +Gente vossa que Baccho tanto ajuda; +Que se espalhe, e se cante no universo, +Se tanta bebedice cabe em verso. + + +VI. + + +E vós, Fernan Gonçalves, segurança +Das festas de Lyeo em esta idade, +Podeis atravessar com confiança +Quantas adegas ha n'esta cidade: +Vós, mano, nosso amor, nossa esperança, +A quem só promettemos lealdade, +Pois Baccho a nós vos deu por cousa grande, +Seja a medida assim de quem a mande. + + +VII. + + +Vós só tendes o ramo florescente +Da arvore de Cybele mais amada, +Que nenhuma nascida em Benavente +Ou pelo rio abaixo até Almada. +Vêde-o nas toalhas, que presente +Vos mostra a bebedice já passada, +Nas quaes vivas lembranças vos deixou +O que de vinho mais se carregou. + + +VIII. + + +Vós, alto taverneiro, cujo imperio +O bebado em se erguendo vê primeiro, +Ou beba n'este nosso hemisferio, +Ou beba lá n'esse outro derradeiro: +E nem por isso sente vituperio +O fidalgo, o estudante, o cavalleiro, +Antes o Turco, o Mouro, e o Gentio +Lhes pêza não beber do vosso rio: + + +IX. + + +Inclinae por um pouco a magestade, +Que no azamboado rosto vos contemplo, +Quando fordes c'os mais d'esta cidade +Offertar-vos a Baccho no seu templo: +Os olhos da real bebecidade +Ponde no borrachão, vereis exemplo +De amor de vossos vinhos saborosos +Por bebados louvados espantosos. + + +X. + + +Então vereis se sois bem conhecido +De todos os amigos de Falerno; +Que não é pouco ser obedecido +No estio, primavera, outono, inverno: +Ouvi, vereis o nome engrandecido +D'aquelles de quem sois senhor superno; +E julgareis qual é mais excellente +Se ser do mundo rei, se de tal gente. + + +XI. + + +Ouvi, que não vereis com vãs façanhas +Fantasticas, fingidas, mentirosas, +Louvar os vossos, como nas estranhas +Musas, de engrandecer-se desejosas: +Bebedices dos vossos são tamanhas, +Que excedem as sonhadas fabulosas, +Que excedem ao primeiro vinhateiro, +E a Baccho inda que fôra verdadeiro. + + +XII. + + +Por estes vos darei um Claudio fero, +Que fez a Peramanca tal serviço, +Um fulano Coutinho, que de mero +A borracha para elle só cubiço. +Pois pelos doze Pares dar-vos quero +Uns doze que sobre um pobre chouriço +Entornaram tão rijo que de cama +Um monte lhes serviu d'esterco e lama. + + +XIII. + + +E se a troco de Nun'alvres e Barbança +Ou do Luna quereis igual memoria, +Vêde primeiro a Pedro, cuja lança +No beber escurece qualquer gloria; +E aquelle que do enxame a segurança +No copo só quiz ter, por ter victoria; +Aquelle Diogo, invicto cavalleiro, +Que em quatro não é quarto, mas primeiro. + + +XIV. + + +Nem deixarão meus versos esquecidos +Aquelles que na sêde gastadora +Se fizeram no copo tão subidos, +De Lyeo a bandeira vencedora: +Um Daniel fortissimo e os temidos +Lacaios, por quem sei que sempre chora +Da Chamusca e Louredo o vinho forte, +E outros a quem Thetis causa a morte. + + +XV. + + +Em quanto a estes canto, e a vós não posso, +Bom Fernando, que não me atrevo a tanto, +Essa mão alargae ao vinho vosso, +Dareis materia a nunca ouvido canto. +Começarão a fugir d'agoa do poço +Os que em vêl-a sómente tem espanto, +Que em pagodes, merendas e jantares +Empinar querem só de Baccho os mares. + + +XVI. + + +Em vós os olhos tem o Mouro frio, +Frio, que usar de vós lhe não é dado; +Pelo contrario o barbaro gentio +Com desejo de ver-vos 'stá squentado; +Peramanca o vermelho senhorio +Vos tem s'enviuvaes apparelhado; +Que pois em dar seus bens sois brando e tenro, +Deseja de comprar-vos para genro. + + +XVII. + + +De Castella se veem n'essa morada +Agoas de duas côres deleitosas, +Quando a nossa cidade está esgotada, +Inda que o gesso as faz menos gostosas; +C'o licor novo espera ser tirada +A reima das entranhas sequiosas, +Porque esse é o que aquenta a velha idade +Desterrando a agoa-pé d'esta cidade. + + +XVIII. + + +Mas em quanto com novo não me alento, +Reparti com os pobres que o desejam; +Ide largando d'elle, com intento +Que seus poucos reales vossos sejam. +Assi recolhereis o nosso argento, +E de todos aquelles que festejam +Por tal ordem a Baccho celebrado, +Que costumam beber cada bocado. + + +XIX. + + +Já de lá d'Alcochete caminhavam, +As fermosas borrachas apertando, +E depois de vasias as largavam, +Outras d'outro licor melhor tomando, +De branca escuma os copos se mostravam +Cubertos ao beber não lhe assoprando; +Mas as agoas nem doces, nem salgadas +D'ellas vistas não foram nem provadas. + + +XX. + + +Quando Francisco, bebado espantoso, +Que em copo, frasco, taça é eminente, +Se ajuntou em conselho, desejoso +De dar favor a toda aquella gente. +Pisando esse caminho tão famoso +Da rua das adegas prestemente, +Convocados da parte do entornante +Por um já n'outro tempo bom tocante. + + +XXI. + + +Deixam dos sótãos frios o aposento +Que para beber n'elles lhe foi dado, +Obedecendo logo ao mandamento +De um bebado tão nobre e tão honrado. +Alli se acharam juntos n'um momento +No bairro de Reimonde celebrado, +Os da Porta d'Avis e outros onde +As suas casas grandes tem o Conde. + + +XXII. + + +'Stava Francisco alli sublime e dino, +Vermelho como os raios de Vulcano; +Por sceptro tinha um copo crystalino +De cheiroso licor, mas não d'este anno; +Da boca lhe sahia um ar tão fino, +Que em vinho convertêra um tigre hyrcano; +Dos ramos tinha c'rôa rutilante +Em que tornou a Daphne seu amante. + + +XXIII. + + +Em lagariças, dornas assentados, +Cubertos de mosquitos que voavam, +Os mais bebados são agasalhados, +Sem ordem nem razão se assentavam. +Precedem os menores aos honrados; +E assi uns pelos outros se trocavam: +Quando Francisco alto assi dizendo, +Com tom de voz começa grave e horrendo: + + +XXIV. + + +Moradores de donde antigamente +Teve Sertorio casa e certo assento, +Se do grande beber da forte gente +De Baccho não perdeis o pensamento, +Deveis de ter sabido claramente +Como é dos fados grandes certo intento +Que por elles s'esqueçam Castelhanos, +Flamengos, Allemães, Italianos. + + +XXV. + + +Já lhe foi, bem o vistes, concedido +A um bebado d'estes mais pequeno +Sogigar Caparica e ter bebido +Toda a terra que rega o Tejo ameno. +Camarate lhe tem obedecido, +Póvos se lhe mostrou brando e sereno; +Para que é mais cansar? cousa é notoria +D'Ourem e Figueiró levaram gloria. + + +XXVI. + + +Deixo, bebados, toda a fama antiga +Que lá dentro em Lisboa uns alcançaram, +Quando com dez Tudescos n'uma briga +No nosso officio tanto se afanaram. +Tambem deixo a memoria que os obriga +A grande nome quando se tomaram +C'um soldado Hollandez, c'um Biscainho, +Quando a carga do frasco era só vinho. + + +XXVII. + + +Agora vêdes bem que vem bebendo, +E cada qual já traz seu couro leve, +Pelas charnecas sêccas, não temendo +Sequidão dos Pegões, a mais se atreve; +Que havendo tantos já que as partes vendo +Onde o copo comprido tem por breve, +Inclinam seu proposito e porfia +A ver os vinhos que Evora teria. + + +XXVIII. + + +Promettido lhe tem Baccho o governo +Da rua das adegas celebrada, +Onde vinhos lhe tem que os de Falerno, +Os do Rhim, ou de Alcache tem em nada. +Bem sabeis que se vem chegando o inverno, +Esta gente vem sêcca e esgotada, +Já parece bem feito que lhe seja +Mostrada Peramanca que deseja. + + +XXIX. + + +E porque, como ouvistes, tem passados +Na viagem tão asperos perigos, +Tantos vinhos vinagres esgotados, +Nas Vendas novas, nos Pegões antigos; +Que sejam determino agasalhados +Entre as quintas aqui de seus amigos, +E enchendo cada qual a sua bota +Comecem a seguir sua derrota. + + +XXX. + + +Taes palavras Francisco assi dizia, +Quando todos sem ordem respondendo, +Na sentença um do outro differia, +Razões diversas dando e recebendo. +Mas Pero Vaz alli não consentia +No que Francisco disse, conhecendo +Que esqueceria um bebado eminente +Se cá viesse beber aquella gente. + + +XXXI. + + +A bebados ouvira que viria +Uma gente de copo tão estranha, +Pela charneca, a qual esgotaria +Tudo quanto Louredo e Lagem banha; +E com beberes novos venceria +A todos os famosos d'Allemanha. +Altamente lhe dóe perder a gloria +Na taça em que de todos tem victoria. + + +XXXII. + + +Vê que de Evora teve sogigado +Os bebados e o vinho, e nunca caso +Lhe tirou por insigne ser louvado +Té dos imigos d'agoa do Parnaso. +Teme agora que seja sepultado +Seu tão celebre nome em negro vaso +D'agoa do esquecimento, se lhe chegam +Os bebados insignes que navegam. + + +XXXIII. + + +Sustentava contra elle o Catigela, +Affeiçoado á gente bebedana, +Por quantas bebedices vira n'ella, +Jantando em Alcochete uma semana. +Affeiçoado vem da gente bella, +Que por brazões os copos tem ufana, +De quem a lingua é tal, se o copo empina, +Que ora parece grega, ora latina. + + +XXXIV. + + +Estas cousas se movem em uma cêa +Onde apenas um ao outro s'entende, +Um d'elles tem a vinda em boa estrêa, +Outro ás picheladas a defende; +Assi que um pela infamia que recêa, +E outro pelo gasto que pretende, +Porfiam, arrebessam, permanecem, +A quasquer seus amigos favorecem. + + +XXXV. + + +Qual o fervente mosto em talha escura, +Quando a tinta lhe lançam espremida, +Por aqui, por alli sair procura +Com impeto e braveza desmedida; +A adega brame toda co'a fervura, +Bota o bagulho fóra a escuma erguida, +Tal andava o tumulto levantado +Entre um bebado e outro apaixonado. + + +XXXVI. + + +Mas um que a esta gente sustentava, +E d'entre todos elles mais bebia, +Ou porque o amor do vinho o obrigava; +Ou porque o seu beber o merecia, +Tremelicando alli se levantava, +Olhando a quem primeiro brindaria; +Um borrachão famoso pendurado, +Trazia ao tiracolo ao esquerdo lado. + + +XXXVII. + + +Do pichel a viseira rutilante +Levantada, de vinho branco e puro, +Por dar-lhe de beber a pôz diante +De Francisco com taes armas seguro, +E dando uma pancada penetrante +C'o grande borrachão no sólo duro, +O chão tremeu, e um d'elles de torvado, +Uma gran vez tomou sobre um bocado. + + +XXXVIII. + + +E diz: Ó bebado alto, a cujo imperio +Os vinhos obedecem que encerraste, +Se aquelles que em ti buscam refrigerio, +Cujo beber soberbo tanto amaste, +Não queres que padeçam vituperio, +Pois que esta adega hoje lhe mostraste, +Não ouças mais, pois bebado és direito, +A quem em bebedices é suspeito. + + +XXXIX. + + +Porque se o copo aqui se não mostrasse +Vencido d'esta gente e infamado, +Bem fôra que aqui Baccho o sustentasse, +Que o territorio seu deixa esgotado, +Mas esta tenção sua agora passe, +Porque em fim vem de estomago danado; +E nunca beba mais vinho de Beja +Quem do beber alheo tem inveja. + + +XL. + + +E tu pois que padre és da borracheza, +Não consintas que bebam por canada; +E porque mostres mais tua grandeza, +Com pipas, quartos seja agasalhada: +Tragam-lhe alguns leitões lá da deveza +De conserva azeitona e retalhada, +Sardinha de Liceira que é conforme +Que a sêde se repare e se reforme. + + +XLI. + + +Como isto disse o bebado famoso +O grão Francisco ledo consentiu, +E uma taça de vinho mui cheiroso +Logo sobre elles todos esparsiu. +Cada um pelo caminho desgostoso +Da rua das adegas se partiu, +Providos de beber seus instrumentos +Tornaram para os frios aposentos. + + +XLII. + + +Em quanto este conselho na famosa +Adega se passou, aquella gente +Pisando a charneca sequiosa +Beber deseja d'Evora a agoa-ardente. +E chegando á Amieira lamarosa, +Onde o caminho vem de Benavente, +Se algum licor trazia de Lyeo, +Sem gota lhe ficar alli o bebeo. + + +XLIII. + + +Tão rijamente os odres despejavam +Como em terra que tem de vinho abrigo; +Mas se tanto bebiam confiavam +No Thomé dos Pegões que era amigo. +Á desejada venda já chegavam +Onde os abraça o seu compadre antigo; +E em signal que da vinda se alegrava, +Novos vinhos que tinha lhe mostrava. + + +XLIV. + + +Vasco Bagulho que era o capitão +Que ás Bacchanaes venturas se offerece, +De soberbo e altivo borrachão, +A quem fortuna em copo favorece, +Para se aqui deter não vê razão, +Que a terra não dá vinho ao que parece. +Por diante passar determinava +Mas impediu-lh'o o vinho que chegava. + + +XLV. + + +Eis que apparece logo em companhia +Uma recova d'asnos de Castella, +Que gran copia de vinho lhe trazia, +Que foi fermosa vista, cousa bella. +Alvoroçam-se todos de alegria, +Desejam já provar a causa d'ella: +Que tal será o vinho alli diziam, +De que logares estes o trariam? + + +XLVI. + + +Os seus borrachões eram de maneira +Que pipas pareciam mui compridas, +Agasalha-os com festa a taverneira +Por suas taças ver melhor providas, +O vinho bota em vasos de madeira. +Enchendo do restante as mais medidas. +Senta-se á meza logo em continente, +Para beber tambem com esta gente. + + +XLVII. + + +E do que os Castelhanos vem providos +Começam a comer todos sentados, +Que uns d'azeitonas vem apercebidos, +Outros de uns pexinhos bem salgados. +E os que de manjares vem despidos, +Começam a mandar vir alhos assados, +E sobre isto aos outros vão brindando, +Os castelhanos vinhos festejando. + + +XLVIII. + + +Estando assi comendo, eis que chegavam +Outros que lhes pediam que esperassem, +Porque para beber desafiavam +Os mais famosos tres que alli se achavam. +Vinho trazem tambem, o qual gavavam, +Pedindo aos assentados que provassem: +Para provar do vinho um fóra salta, +Que no beber aos outros mais se exalta. + + +XLIX. + + +Não tem descarregado a agoa-ardente, +Quando o que saltou fóra já bebia; +Começa de gaval-o á sua gente, +Dizendo que parece malvasia. +O tarverneiro então em continente +Tal gente recebeu com alegria. +Enchem vasos de vinho e do que deitam +Os que vem e os que estão nem gota engeitam. + + +L. + + +Comendo alegremente perguntavam, +Com lingua onde as palavras se detinham, +D'onde era o licor branco que gostavam +E se vermelho entre elle tambem tinham. +De Castella os marranos lhe tornavam +Que si, e suas mercês de donde vinham? +Disse um d'elles: De junto a Benavente, +Vimos a Evora a beber sómente. + + +LI. + + +De Riba-tejo temos já provado +Os vinhos, e as adegas temos visto, +Caparica deixamos esgotado +_Molto sudando nel glorioso acquisto_. +E de um bebado somos tão amado, +Tão querido de todos e bem quisto, +Que não no largo mar com leda fronte, +Mas de vinho entraremos n'uma fonte. + + +LII. + + +E por mandado seu buscando vamos +A terra que Louredo em torno rega, +Depois que os quartos todos esgotamos +Da Telha, Lavradio, Aldea-gallega. +Mas já razão parece que saibamos, +Se entre vós a verdade se não nega, +Quem sois, que vinho é este que buscaes, +E se tendes do d'Evora alguns signaes. + + +LIII. + + +Somos, um dos do vinho lhe tornou, +Estrangeiros na terra e na nação, +Que os proprios são aquelles que criou +A terra que sovado come o pão. +A lei cega tivemos que ensinou +Aquelle descendente de Abrahão, +Que vinho não bebeu quente nem frio; +_Intendami chi può, che m'intend'io_. + + +LIV. + + +Esta pequena venda aonde estamos +É de nossa passagem certa escala, +Onde ás vezes taes vinhos nós gostamos, +Que acontece ficar homem sem falla. +E por ser terra esteril procuramos, +Cada vez que passamos, visital-a. +Comem aqui e bebem tanto a pique, +Que prometto que o Fuentes cedo enrique. + + +LV. + + +E pois que tantos odres despejaes +Se d'Evora buscaes o vinho ardente, +Guiando-vos irei, té que sejaes +Postos em Monte-mór seguramente, +Onde será bem feito que vejaes +O tridentino André que é o bebente +Que essa terra governa, e que vos veja, +Para que d'alguns vinhos vos proveja. + + +LVI. + + +Dizendo isto o Mourisco carregou +Os seus odres, deixando a companhia, +D'ella e do vendeiro se apartou; +Bebe cada um sua vez por cortezia; +Os novos companheiros acceitou +Com mostras de prazer e d'alegria, +Dizendo a cada um que caminhasse, +E quem beber quizesse que o tomasse. + + +LVII. + + +A noite se passou na leda frota +Com estranha alegria não cuidada, +Por acharem em terra tão remota +A venda nova d'elles desejada. +Disse o Mourisco alli: Venga la bota! +Na castelhana lingua d'elle usada. +Elles que no beber tanto se esmeram, +A seu mandado logo obedeceram. + + +LVIII. + + +Do vinho alegres côres rutilavam +Pelas taças de vidro crystallino; +As velhas azeitonas que lhes davam +Festejam mais que flôres e boninas, +Da venda os taverneiros s'espantavam +Do cheiro e do sabor das agoas finas, +Porém a demais gente não provava +O bom licor que entre esta se brindava. + + +LIX. + + +Mas assi como a Aurora marchetada +As fermosas borrachas lhe mostrou +Áquella gente meia atordoada, +Cada qual d'elles sua vez tomou. +Começa a embebedar-se a camarada, +Que de fermosos frascos se adornou, +Para beber com festa e alegria +C'o bebedor da terra que partia. + + +LX. + + +Partia alegremente, desejando +De beber já com gentes tão ufanas, +Que por charnecas sêccas caminhando, +Vem a beber em terras Transtaganas. +A borracha que traz vem empinando +Do licor que se vende não com canas. +Já chega, mas sem gota o Tridentino; +E quem sem gota está é bem mofino. + + +LXI. + + +Recebem-no alli alegremente, +O Mourisco com sua companhia, +E dá-lhe d'azeitonas um presente, +Que para tal effeito já trazia. +Dá-lhe sardinha frita; salta o ardente +Licor, com que elle tem tanta alegria. +Tudo o Marques contente bem recebe, +Mas triste está com ver que ninguem bebe. + + +LXII. + + +Estava o Granadino mui confuso +Com ver que não tem já de vinho nada, +Com que brinde ao bebente, como é uso, +Que para o receber fez tal jornada. +Reprende o companheiro seu abuso, +Pois sequer não deixára uma canada +Para enxaugoar a boca ao que trazia +Do fresco Monte-mór a alegre via. + + +LXIII. + + +Porque em chegando diz que ver deseja +Do vinho os instrumentos; que não crê +Que tão honrada gente alli esteja, +Sem terem pelo menos agoa-pé. +Mas os outros a quem nada sobeja +Do licor da boa planta de Noé, +Aos vendeiros pedem que alli 'stavam, +Das fundagens que para si guardavam. + + +LXIV. + + +E disse um d'elles: pois que em tal sazão +Viemos que entre nós nem gota havia, +Quero-vos dar alguma informação +De nós, em quanto o vinho lá se avia. +Posto que granadino é de nação +Este homem que nos serve aqui de guia, +Perto está de Lisboa a patria nossa, +Buscamos Peramanca amada vossa. + + +LXV. + + +Deixamos esgotado todo o imperio +Que Baccho em nossas terras tem visivel; +Vimos correndo agora este hemispherio, +Porque beber por lá não é soffrivel: +E posto que sofframos vituperio, +Por um largo beber tudo é soffrivel: +Que melhor é vergonha em quem bebeu, +Que a dôr por não soffrer q'outrem soffreu. + + +LXVI. + + +Porque bastava só vinho infinito, +Que não ha nem gota já na companhia, +Que é tal, e no beber tem tal esp'rito, +Que inda um Tejo de vinho esgotaria. +Se as vasilhas quer ver como tem dito, +Cumprido esse desejo te seria: +Vasias as verás, que eu me obrigo +Que sempre assi 'starão, s'imos comtigo. + + +LXVII. + + +Isto dizendo mostram diligentes +Os vasos com que apagam as seccuras; +Mostram fermosos frascos e as pendentes +Borrachas que em caminhos são seguras: +Os odres nas medidas differentes, +Cobertos d'encouradas vestiduras: +Outras borrachas trazem por aljavas, +De còrno copos grandes, taças bravas. + + +LXVIII. + + +Chega n'isto o vendeiro diligente +Com as suas fundagens saborosas; +Bebe d'ellas André alegremente, +Desafiando as gentes tão famosas. +Mas d'entre elles um bebado valente +Responde-lhe que as gentes valerosas +Não sahiam a um; e com razão, +Que é fraqueza entre ovelhas ser leão. + + +LXIX. + + +Mas d'isto que André Marques bem notou +E de tudo o que ouviu no copo attento, +Um odio certo n'alma lhe ficou +Uma vontade má de pensamento. +Nas obras e no gesto o não mostrou, +Mas com risonho e ledo fingimento +Tratal-os brandamente determina, +Até que mostrar possa o que imagina. + + +LXX. + + +Piloto lhe pedia o capitão +Por quem podesse a Evora ser levado, +Polo qual lhe daria um borrachão +De vinho de Valbom que é extremado. +André lh'o prometteu, mas com tenção +De peito venenoso e tão danado, +Que a morte, se podesse, n'este dia +Em logar de piloto lhe daria. + + +LXXI. + + +Tal odio lhe ficou e má vontade +Da resposta que aquelle lhe tornou, +Que agoa lhe ordena dar com falsidade +Em logar do licor que Noé deixou. +Oh que caso cruel! oh que maldade! +Que de uma só palavra que soltou +D'este que elle buscava como amigo +O faz ficar seu perfido inimigo! + + +LXXII. + + +Partiu-se n'isto André, sem companhia +Dos bebados que tinha despedido, +Com engano seu e grande cortezia, +O gesto ledo a todos e fingido. +Já sobre seu asninho se subia +Com vinho de que ia apercebido, +E quando se desceu no aposento +Não levava a borracha mais que vento. + + +LXXIII. + + +Da rua das adegas o Thebano, +Que da parternal coxa foi nascido, +Olhando o ajuntamento tão ufano, +Ser do seu bom André aborrecido, +No pensamento cuida um falso engano +Com que seja de todo destruido. +E em quanto isto n'alma imaginava +Um borrachão tomando assi fallava. + + +LXXIV. + + +Está do Fado já determinado +Que em tantas bebedices tão famosas +Se tenham d'estes bebados achado, +As suas taças sempre victoriosas; +E eu Baccho tão sublime e tão honrado +Bebado, e mais de partes tão honrosas, +Hei de soffrer que o Fado favoreça +Outrem por quem meu copo se escureça? + + +LXXV. + + +Já quizeram os Fados que tivesse +Esta genta victoria n'esta parte, +Cujos campos o Tejo reverdece; +E que com tanto vinho não se farte! +Pois não se ha de soffrer que o Fado desse +A tão poucos tamanho esforço e arte, +Que venham beber vinho transtagano, +Abatendo o gran nome do Thebano. + + +LXXVI. + + +Não será assi: porque antes que chegado +Seja Vasco Bagulho, astutamente +Lhe será tanto engano fabricado, +Que nunca beba d'Ev'ra o vinho ardente. +A Monte-mór irei, e o indignado +Peito rovolverei do bom bebente: +Porque sempre per via irá direita +Aquelle que no vinho agoa não deita. + + +LXXVII. + + +Isto dizendo irado e quasi insano +N'esse Monte-mór fresco se desceu, +Onde tomando a fórma e gesto humano, +Para onde estava o Marques se moveu: +E por melhor tecer o astuto engano, +No gesto natural se converteu +De Talha-manco muito seu valido, +Um Taverneiro velho conhecido. + + +LXXVIII. + + +Estando assi bebendo co'elle a horas +Á sua falsidade accommodadas, +Lhe diz como eram gentes roubadoras. +Estas que ora de novo são chegadas, +Que das gentes nas vendas moradoras +Correndo a Fama veio que roubadas +Foram por estes homens que passavam, +Que sob capa de paz sempre ancoravam. + + +LXXIX. + + +E sabe mais, lhe diz, como entendido +D'estes bebados tenho bagulhentos, +Que deixam Riba-tejo destruido +Em beber com incendios violentos: +E trazem já de longe o engano urdido +Contra nós; que todos seus intentos +São para os nossos vinhos esgotarem, +E pipas, toneis, quartos, despejarem. + + +LXXX. + + +E tambem sei que tem determinado +Da virem buscar vinho aqui mui cedo, +Mas ter-lhe-hemos um tal ardil traçado +Que não cheguem a ver o de Louredo. +Á justiça darás logo recado +Que estes galantes prenda, que sem medo +Pelo caminho roubam, pela estrada, +E só com furtos bebem na jornada. + + +LXXXI. + + +E se assi não tivermos d'este feito +Impedido o caminho totalmente, +Eu tenho imaginado no conceito +Outra manha e ardil que te contente. +Manda-lhe aqui dar guia que de geito +Seja astuto no engano e tão prudente, +Que os leve adonde sejam submergidos, +Onde a agoa dê fim a seus sentidos. + + +LXXXII. + + +Tanto que estas palavras acabou, +O Tridentino André, bebado velho, +Os braços ao pescoço lhe lançou, +Agradecendo muito o tal conselho. +Em se apartando d'elle concertou +Para os poder prender todo o apparelho, +Com que em puro desgosto lhe tornassem +D'Evora o vinho puro que buscassem. + + +LXXXIII. + + +E busca mais para o cuidado engano +Um homem que d'alli com elle mande, +Sagaz, astuto, sabio em todo o dano, +De quem fiar se possa um quarto grande. +Diz-lhe que acompanhando o Alcochetano +Por ribeiras, por charcos com elle ande, +Que se d'aqui passar, que lá adiante +Vá cahir onde nunca se levante. + + +LXXXIV. + + +Já o carro d'Apollo caminhava +Pelo nosso horizonte, quando erguido +O bom Vasco c'os seus determinava +De vir por vinho á terra apercebido. +Os borrachões a gente desatava, +Corre-se cada qual não ter bebido; +E do que á venda veio novamente +Beberam todos logo em continente. + + +LXXXV. + + +Assi se vem chegando junto á terra +Para tomar o vinho necessario; +Mas o Marques o vinho todo encerra +Só pelo não beber o seu contrario. +Porém Vasco Bagulho que não erra +Em não se fiar d'este adversario, +Apercebido vem como podia +E entra em Monte-mór com alegria. + + +LXXXVI. + + +O grão Marques que o vê logo desmaia, +Diz á Justiça que ande apparelhada +De pistolete, chuça e azagaia, +De rodela, de casco e boa espada; +E que em dando recado logo saia, +Porque tome esta gente atordoada. +E para que melhor isto se faça +Vae-se beber com elles per negaça. + + +LXXXVII. + + +Bebendo André co'a gente sequiosa, +Andam os beleguins fóra espreitando, +E co'a chuça e azagaia perigosa +Ao Marques se entraram acenando. +Mas a gula que estava desejosa +De beber, sem recado vão entrando. +Qualquer se lança ao copo tão ligeiro, +Que nenhum dizer póde que é primeiro. + + +LXXXVIII. + + +Qual pobre ajuntamento d'estudante +De quatro, cinco ou seis de camarada +Que vê que é pouco o vinho e não bastante, +Que ha para todos só uma canada; +Qualquer d'elles pertende andar diante, +Por lhe não tocar vez esfarrapada: +Tal pressa ha nos de fóra e nos da terra, +Mas todos se vão já chegando á serra. + + +LXXXIX. + + +Eis no estomago o fumo se levanta +Da furiosa e quente companhia, +Que de tal modo bebem que se encanta +O vendeiro que o vinho lhes vendia. +A multidão dos fumos era tanta +Do vinho que á cabeça lhes subia, +Que logo o Alcaide foge de medroso, +De que o Marques ficou mui desgostoso. + + +XC. + + +Não deixam os que ficam sua empreza, +Mas o muito que bebem mal os trata, +Que se o beber tomavam por defeza, +Esse mesmo beber os desbarata. +Alegres ficam todos sem tristeza, +Já julgam a amizade por barata, +E trocam seus enganos á porfia +Pelo amor que do vinho lhes nascia. + + +XCI. + + +Vae-se cada um a casa retirando, +Porque quer vomitar muito apressado; +Quem arrota, e alli vae engulhando, +Na boca mette a mão desatinado. +O vendeiro fugiu, desamparando +A venda, do beber amedrontado; +Gloriam-se os que ficam do seu braço +Que a tantos afugenta em breve espaço. + + +XCII. + + +Uns deixam por alli suas espadas, +Dos outros quem a leva não o sente; +Quem se deixa cair ás tres passadas, +Quem bebe o vinho e o deita juntamente. +Arrombam as medidas ás pancadas, +Á parede se arruma o mais valente; +Assim que a gente d'antes inimiga +Com tão alto beber se torna amiga. + + +XCIII. + + +Passando isto, fica a camarada +Com gosto de haver feito tal empreza; +Manda logo fazer de vinho agoada, +Porque d'alli não quer outra riqueza. +Ficou a alma do Marques magoada, +No odio antigo mais que nunca acceza; +E vendo sem vingança tanto dano, +Sómente estriba no segundo engano. + + +XCIV. + + +Torna-se a elles, tendo-a já cozido, +Levando alguns refrescos que ha na terra, +Com um frasco de vinho mui comprido, +Mas sob capa de paz armado em guerra. +Piloto lhe offerece conhecido, +Dizendo que em taes vias jámais erra, +Com o qual se fizesse o que esperava, +Que a Evora os levaria confiava. + + +XCV. + + +O gran Vasco Bagulho, a quem convinha +Fazer já seu caminho desejado, +Que Borrachões não poucos cheos tinha, +Para buscar Louredo tão amado; +Recebendo o piloto que lhe vinha, +Foi d'elle alegremente agasalhado. +Despede-se com gran contentamento, +C'o guia, sem saber o falso intento. + + +XCVI. + + +Dest'arte despedida a gente honrada, +Começou a seguir o falso guia. +Não tinham meia legoa bem andada, +Quando do bom caminho se desvia. +O bom Vasco que não cahia em nada +Do grande engano que este tal lhe urdia, +D'elle mui largamente se informava +A que parte Louredo lhe ficava. + + +XCVII. + + +Mas o guia instruido nos enganos +Que o malvado do Marques lh'ensinára, +Leva-os por partes onde crueis danos +E morte em fim em agoas lhe prepara. +Diz-lhes que vão contentes, vão ufanos, +Que mui prestes verão a terra cara; +Porque elle caminhava por tal via, +Que cedo a Peramanca os levaria. + + +XCVIII. + + +E diz-lhes mais, com falso pensamento, +Que esta via por mais breve tomou, +Posto que um rio tem, mas sem tormento +E sem perigo sempre se passou. +O Bagulho que a tudo estava attento, +Muito com estas novas se alegrou; +E com grandes copadas lhe rogava +Os levasse por donde o porto estava. + + +XCIX. + + +O falso guia, porque determina +Dar-lhe porto, mas não qual elle pede, +Posto em Rio Marinho lh'o imagina +N'um pégo que em altura os mais excede. +Aqui o engano e a morte lhe maquina, +Para que tal beber com pressa véde; +E para o porto verem logo os chama +Onde lhe arma perderem vida e fama. + + +C. + + +Já para lá inclina a leda frota +E em chegando ao rio da cilada, +Um descalça o sapato, o outro a bota, +Para ir buscar a morte não cuidada. +Chega um bebado n'isto, que remota +Lhe parece esta gente e enganada, +E com duras palavras reprehendia +D'entrarem em tal pégo a ousadia. + + +CI. + + +Mas o malvado guia conhecendo +Ser manifesto o engano, n'um instante, +Se vae por uns outeiros acolhendo, +Corrido de não ir a sua ávante. +Os outros que ficavam 'stão tremendo, +Cuidando qu'inda o engano era diante; +Mas o que os tirou d'elle, mui contente +Lhes diz que irá com elles juntamente. + + +CII. + + +Ficam todos então com alegria, +Bebem e dão de beber ao que os guiava. +Um olha para o ceo, e diz que via +Mais luas do que d'antes costumava. +Duas luas a mi, Senhor, dizia, +Ao Mouro, ao infiel que vos aggrava. +Outro a um tronco diz; bebei, Senhora, +Senão deitar-vos-hei os olhos fóra. + + +CIII. + + +E tendo esta ribeira já passada, +Onde os quiz afogar o falso guia, +A torre appareceu n'uma assomada +Onde matou Giraldo a má vigia. +Á mão direita fica situada +Uma povoação de que bebia +A gente principal da nossa idade, +Peramanca é o nome da cidade. + + +CIV. + + +E sendo o capitão aqui chegado +Estranhamente ledo, porque espera +De ser alli mui bem agasalhado +Dos refrescos que ha n'aquella terra: +Eis vem frascos de vinho com recado +De Diogo que sabe a gente que era, +Porque Baccho já d'antes o avisára +Que de bom vinho alli os regalára. + + +CV. + + +Agasalha-os a todos como amigos; +Preza-se já cada um de fallar certo, +Dando conta de todos os perigos, +Que em caminho passaram tão desertos. +Não curam de lhe dar uvas nem figos, +Mas o licor que deixa o olho esperto. +Quer imitar cada um o gran Barbança +Que pôz n'este licor sua esperança. + + +CVI. + + +Aqui já vem tomar, livre d'engano +Anda esta gente pouco conhecida, +E debaixo de um vil e pobre panno +Tão alta bebedice anda escondida, +Quem bebe vinho velho, quem d'este anno, +D'um e d'outro s'entorna sem medida. +E assi favoreceu o Ceo sereno +A quem deixou por vinho o seu terreno. + + +FIM. + + + + + +End of the Project Gutenberg EBook of Paródia ao primeiro canto dos Lusíadas +de Camões por quatro estudantes de Évora em 1589, by Anonymous + +*** END OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK PARÓDIA AO PRIMEIRO CANTO *** + +***** This file should be named 20149-8.txt or 20149-8.zip ***** +This and all associated files of various formats will be found in: + http://www.gutenberg.org/2/0/1/4/20149/ + +Produced by Rita Farinha and the Online Distributed +Proofreading Team. The images for this file were generously +made available by Biblioteca Nacional Digital +(http://bnd.bn.pt). + + +Updated editions will replace the previous one--the old editions +will be renamed. + +Creating the works from public domain print editions means that no +one owns a United States copyright in these works, so the Foundation +(and you!) can copy and distribute it in the United States without +permission and without paying copyright royalties. Special rules, +set forth in the General Terms of Use part of this license, apply to +copying and distributing Project Gutenberg-tm electronic works to +protect the PROJECT GUTENBERG-tm concept and trademark. Project +Gutenberg is a registered trademark, and may not be used if you +charge for the eBooks, unless you receive specific permission. If you +do not charge anything for copies of this eBook, complying with the +rules is very easy. You may use this eBook for nearly any purpose +such as creation of derivative works, reports, performances and +research. They may be modified and printed and given away--you may do +practically ANYTHING with public domain eBooks. Redistribution is +subject to the trademark license, especially commercial +redistribution. + + + +*** START: FULL LICENSE *** + +THE FULL PROJECT GUTENBERG LICENSE +PLEASE READ THIS BEFORE YOU DISTRIBUTE OR USE THIS WORK + +To protect the Project Gutenberg-tm mission of promoting the free +distribution of electronic works, by using or distributing this work +(or any other work associated in any way with the phrase "Project +Gutenberg"), you agree to comply with all the terms of the Full Project +Gutenberg-tm License (available with this file or online at +http://gutenberg.org/license). + + +Section 1. General Terms of Use and Redistributing Project Gutenberg-tm +electronic works + +1.A. By reading or using any part of this Project Gutenberg-tm +electronic work, you indicate that you have read, understand, agree to +and accept all the terms of this license and intellectual property +(trademark/copyright) agreement. If you do not agree to abide by all +the terms of this agreement, you must cease using and return or destroy +all copies of Project Gutenberg-tm electronic works in your possession. +If you paid a fee for obtaining a copy of or access to a Project +Gutenberg-tm electronic work and you do not agree to be bound by the +terms of this agreement, you may obtain a refund from the person or +entity to whom you paid the fee as set forth in paragraph 1.E.8. + +1.B. "Project Gutenberg" is a registered trademark. It may only be +used on or associated in any way with an electronic work by people who +agree to be bound by the terms of this agreement. There are a few +things that you can do with most Project Gutenberg-tm electronic works +even without complying with the full terms of this agreement. See +paragraph 1.C below. There are a lot of things you can do with Project +Gutenberg-tm electronic works if you follow the terms of this agreement +and help preserve free future access to Project Gutenberg-tm electronic +works. See paragraph 1.E below. + +1.C. The Project Gutenberg Literary Archive Foundation ("the Foundation" +or PGLAF), owns a compilation copyright in the collection of Project +Gutenberg-tm electronic works. Nearly all the individual works in the +collection are in the public domain in the United States. If an +individual work is in the public domain in the United States and you are +located in the United States, we do not claim a right to prevent you from +copying, distributing, performing, displaying or creating derivative +works based on the work as long as all references to Project Gutenberg +are removed. Of course, we hope that you will support the Project +Gutenberg-tm mission of promoting free access to electronic works by +freely sharing Project Gutenberg-tm works in compliance with the terms of +this agreement for keeping the Project Gutenberg-tm name associated with +the work. You can easily comply with the terms of this agreement by +keeping this work in the same format with its attached full Project +Gutenberg-tm License when you share it without charge with others. + +1.D. The copyright laws of the place where you are located also govern +what you can do with this work. Copyright laws in most countries are in +a constant state of change. If you are outside the United States, check +the laws of your country in addition to the terms of this agreement +before downloading, copying, displaying, performing, distributing or +creating derivative works based on this work or any other Project +Gutenberg-tm work. The Foundation makes no representations concerning +the copyright status of any work in any country outside the United +States. + +1.E. Unless you have removed all references to Project Gutenberg: + +1.E.1. The following sentence, with active links to, or other immediate +access to, the full Project Gutenberg-tm License must appear prominently +whenever any copy of a Project Gutenberg-tm work (any work on which the +phrase "Project Gutenberg" appears, or with which the phrase "Project +Gutenberg" is associated) is accessed, displayed, performed, viewed, +copied or distributed: + +This eBook is for the use of anyone anywhere at no cost and with +almost no restrictions whatsoever. You may copy it, give it away or +re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included +with this eBook or online at www.gutenberg.org + +1.E.2. If an individual Project Gutenberg-tm electronic work is derived +from the public domain (does not contain a notice indicating that it is +posted with permission of the copyright holder), the work can be copied +and distributed to anyone in the United States without paying any fees +or charges. If you are redistributing or providing access to a work +with the phrase "Project Gutenberg" associated with or appearing on the +work, you must comply either with the requirements of paragraphs 1.E.1 +through 1.E.7 or obtain permission for the use of the work and the +Project Gutenberg-tm trademark as set forth in paragraphs 1.E.8 or +1.E.9. + +1.E.3. If an individual Project Gutenberg-tm electronic work is posted +with the permission of the copyright holder, your use and distribution +must comply with both paragraphs 1.E.1 through 1.E.7 and any additional +terms imposed by the copyright holder. Additional terms will be linked +to the Project Gutenberg-tm License for all works posted with the +permission of the copyright holder found at the beginning of this work. + +1.E.4. Do not unlink or detach or remove the full Project Gutenberg-tm +License terms from this work, or any files containing a part of this +work or any other work associated with Project Gutenberg-tm. + +1.E.5. Do not copy, display, perform, distribute or redistribute this +electronic work, or any part of this electronic work, without +prominently displaying the sentence set forth in paragraph 1.E.1 with +active links or immediate access to the full terms of the Project +Gutenberg-tm License. + +1.E.6. You may convert to and distribute this work in any binary, +compressed, marked up, nonproprietary or proprietary form, including any +word processing or hypertext form. However, if you provide access to or +distribute copies of a Project Gutenberg-tm work in a format other than +"Plain Vanilla ASCII" or other format used in the official version +posted on the official Project Gutenberg-tm web site (www.gutenberg.org), +you must, at no additional cost, fee or expense to the user, provide a +copy, a means of exporting a copy, or a means of obtaining a copy upon +request, of the work in its original "Plain Vanilla ASCII" or other +form. Any alternate format must include the full Project Gutenberg-tm +License as specified in paragraph 1.E.1. + +1.E.7. Do not charge a fee for access to, viewing, displaying, +performing, copying or distributing any Project Gutenberg-tm works +unless you comply with paragraph 1.E.8 or 1.E.9. + +1.E.8. You may charge a reasonable fee for copies of or providing +access to or distributing Project Gutenberg-tm electronic works provided +that + +- You pay a royalty fee of 20% of the gross profits you derive from + the use of Project Gutenberg-tm works calculated using the method + you already use to calculate your applicable taxes. The fee is + owed to the owner of the Project Gutenberg-tm trademark, but he + has agreed to donate royalties under this paragraph to the + Project Gutenberg Literary Archive Foundation. Royalty payments + must be paid within 60 days following each date on which you + prepare (or are legally required to prepare) your periodic tax + returns. Royalty payments should be clearly marked as such and + sent to the Project Gutenberg Literary Archive Foundation at the + address specified in Section 4, "Information about donations to + the Project Gutenberg Literary Archive Foundation." + +- You provide a full refund of any money paid by a user who notifies + you in writing (or by e-mail) within 30 days of receipt that s/he + does not agree to the terms of the full Project Gutenberg-tm + License. You must require such a user to return or + destroy all copies of the works possessed in a physical medium + and discontinue all use of and all access to other copies of + Project Gutenberg-tm works. + +- You provide, in accordance with paragraph 1.F.3, a full refund of any + money paid for a work or a replacement copy, if a defect in the + electronic work is discovered and reported to you within 90 days + of receipt of the work. + +- You comply with all other terms of this agreement for free + distribution of Project Gutenberg-tm works. + +1.E.9. If you wish to charge a fee or distribute a Project Gutenberg-tm +electronic work or group of works on different terms than are set +forth in this agreement, you must obtain permission in writing from +both the Project Gutenberg Literary Archive Foundation and Michael +Hart, the owner of the Project Gutenberg-tm trademark. Contact the +Foundation as set forth in Section 3 below. + +1.F. + +1.F.1. Project Gutenberg volunteers and employees expend considerable +effort to identify, do copyright research on, transcribe and proofread +public domain works in creating the Project Gutenberg-tm +collection. Despite these efforts, Project Gutenberg-tm electronic +works, and the medium on which they may be stored, may contain +"Defects," such as, but not limited to, incomplete, inaccurate or +corrupt data, transcription errors, a copyright or other intellectual +property infringement, a defective or damaged disk or other medium, a +computer virus, or computer codes that damage or cannot be read by +your equipment. + +1.F.2. LIMITED WARRANTY, DISCLAIMER OF DAMAGES - Except for the "Right +of Replacement or Refund" described in paragraph 1.F.3, the Project +Gutenberg Literary Archive Foundation, the owner of the Project +Gutenberg-tm trademark, and any other party distributing a Project +Gutenberg-tm electronic work under this agreement, disclaim all +liability to you for damages, costs and expenses, including legal +fees. YOU AGREE THAT YOU HAVE NO REMEDIES FOR NEGLIGENCE, STRICT +LIABILITY, BREACH OF WARRANTY OR BREACH OF CONTRACT EXCEPT THOSE +PROVIDED IN PARAGRAPH F3. YOU AGREE THAT THE FOUNDATION, THE +TRADEMARK OWNER, AND ANY DISTRIBUTOR UNDER THIS AGREEMENT WILL NOT BE +LIABLE TO YOU FOR ACTUAL, DIRECT, INDIRECT, CONSEQUENTIAL, PUNITIVE OR +INCIDENTAL DAMAGES EVEN IF YOU GIVE NOTICE OF THE POSSIBILITY OF SUCH +DAMAGE. + +1.F.3. LIMITED RIGHT OF REPLACEMENT OR REFUND - If you discover a +defect in this electronic work within 90 days of receiving it, you can +receive a refund of the money (if any) you paid for it by sending a +written explanation to the person you received the work from. If you +received the work on a physical medium, you must return the medium with +your written explanation. The person or entity that provided you with +the defective work may elect to provide a replacement copy in lieu of a +refund. If you received the work electronically, the person or entity +providing it to you may choose to give you a second opportunity to +receive the work electronically in lieu of a refund. If the second copy +is also defective, you may demand a refund in writing without further +opportunities to fix the problem. + +1.F.4. Except for the limited right of replacement or refund set forth +in paragraph 1.F.3, this work is provided to you 'AS-IS' WITH NO OTHER +WARRANTIES OF ANY KIND, EXPRESS OR IMPLIED, INCLUDING BUT NOT LIMITED TO +WARRANTIES OF MERCHANTIBILITY OR FITNESS FOR ANY PURPOSE. + +1.F.5. Some states do not allow disclaimers of certain implied +warranties or the exclusion or limitation of certain types of damages. +If any disclaimer or limitation set forth in this agreement violates the +law of the state applicable to this agreement, the agreement shall be +interpreted to make the maximum disclaimer or limitation permitted by +the applicable state law. The invalidity or unenforceability of any +provision of this agreement shall not void the remaining provisions. + +1.F.6. INDEMNITY - You agree to indemnify and hold the Foundation, the +trademark owner, any agent or employee of the Foundation, anyone +providing copies of Project Gutenberg-tm electronic works in accordance +with this agreement, and any volunteers associated with the production, +promotion and distribution of Project Gutenberg-tm electronic works, +harmless from all liability, costs and expenses, including legal fees, +that arise directly or indirectly from any of the following which you do +or cause to occur: (a) distribution of this or any Project Gutenberg-tm +work, (b) alteration, modification, or additions or deletions to any +Project Gutenberg-tm work, and (c) any Defect you cause. + + +Section 2. Information about the Mission of Project Gutenberg-tm + +Project Gutenberg-tm is synonymous with the free distribution of +electronic works in formats readable by the widest variety of computers +including obsolete, old, middle-aged and new computers. It exists +because of the efforts of hundreds of volunteers and donations from +people in all walks of life. + +Volunteers and financial support to provide volunteers with the +assistance they need, is critical to reaching Project Gutenberg-tm's +goals and ensuring that the Project Gutenberg-tm collection will +remain freely available for generations to come. In 2001, the Project +Gutenberg Literary Archive Foundation was created to provide a secure +and permanent future for Project Gutenberg-tm and future generations. +To learn more about the Project Gutenberg Literary Archive Foundation +and how your efforts and donations can help, see Sections 3 and 4 +and the Foundation web page at http://www.pglaf.org. + + +Section 3. Information about the Project Gutenberg Literary Archive +Foundation + +The Project Gutenberg Literary Archive Foundation is a non profit +501(c)(3) educational corporation organized under the laws of the +state of Mississippi and granted tax exempt status by the Internal +Revenue Service. The Foundation's EIN or federal tax identification +number is 64-6221541. Its 501(c)(3) letter is posted at +http://pglaf.org/fundraising. Contributions to the Project Gutenberg +Literary Archive Foundation are tax deductible to the full extent +permitted by U.S. federal laws and your state's laws. + +The Foundation's principal office is located at 4557 Melan Dr. S. +Fairbanks, AK, 99712., but its volunteers and employees are scattered +throughout numerous locations. Its business office is located at +809 North 1500 West, Salt Lake City, UT 84116, (801) 596-1887, email +business@pglaf.org. Email contact links and up to date contact +information can be found at the Foundation's web site and official +page at http://pglaf.org + +For additional contact information: + Dr. Gregory B. Newby + Chief Executive and Director + gbnewby@pglaf.org + + +Section 4. Information about Donations to the Project Gutenberg +Literary Archive Foundation + +Project Gutenberg-tm depends upon and cannot survive without wide +spread public support and donations to carry out its mission of +increasing the number of public domain and licensed works that can be +freely distributed in machine readable form accessible by the widest +array of equipment including outdated equipment. Many small donations +($1 to $5,000) are particularly important to maintaining tax exempt +status with the IRS. + +The Foundation is committed to complying with the laws regulating +charities and charitable donations in all 50 states of the United +States. Compliance requirements are not uniform and it takes a +considerable effort, much paperwork and many fees to meet and keep up +with these requirements. We do not solicit donations in locations +where we have not received written confirmation of compliance. To +SEND DONATIONS or determine the status of compliance for any +particular state visit http://pglaf.org + +While we cannot and do not solicit contributions from states where we +have not met the solicitation requirements, we know of no prohibition +against accepting unsolicited donations from donors in such states who +approach us with offers to donate. + +International donations are gratefully accepted, but we cannot make +any statements concerning tax treatment of donations received from +outside the United States. U.S. laws alone swamp our small staff. + +Please check the Project Gutenberg Web pages for current donation +methods and addresses. Donations are accepted in a number of other +ways including checks, online payments and credit card donations. +To donate, please visit: http://pglaf.org/donate + + +Section 5. General Information About Project Gutenberg-tm electronic +works. + +Professor Michael S. Hart is the originator of the Project Gutenberg-tm +concept of a library of electronic works that could be freely shared +with anyone. For thirty years, he produced and distributed Project +Gutenberg-tm eBooks with only a loose network of volunteer support. + + +Project Gutenberg-tm eBooks are often created from several printed +editions, all of which are confirmed as Public Domain in the U.S. +unless a copyright notice is included. Thus, we do not necessarily +keep eBooks in compliance with any particular paper edition. + + +Most people start at our Web site which has the main PG search facility: + + http://www.gutenberg.org + +This Web site includes information about Project Gutenberg-tm, +including how to make donations to the Project Gutenberg Literary +Archive Foundation, how to help produce our new eBooks, and how to +subscribe to our email newsletter to hear about new eBooks. diff --git a/20149-8.zip b/20149-8.zip Binary files differnew file mode 100644 index 0000000..3e97610 --- /dev/null +++ b/20149-8.zip diff --git a/LICENSE.txt b/LICENSE.txt new file mode 100644 index 0000000..6312041 --- /dev/null +++ b/LICENSE.txt @@ -0,0 +1,11 @@ +This eBook, including all associated images, markup, improvements, +metadata, and any other content or labor, has been confirmed to be +in the PUBLIC DOMAIN IN THE UNITED STATES. + +Procedures for determining public domain status are described in +the "Copyright How-To" at https://www.gutenberg.org. + +No investigation has been made concerning possible copyrights in +jurisdictions other than the United States. Anyone seeking to utilize +this eBook outside of the United States should confirm copyright +status under the laws that apply to them. diff --git a/README.md b/README.md new file mode 100644 index 0000000..2e7ed4e --- /dev/null +++ b/README.md @@ -0,0 +1,2 @@ +Project Gutenberg (https://www.gutenberg.org) public repository for +eBook #20149 (https://www.gutenberg.org/ebooks/20149) |
