diff options
| author | Roger Frank <rfrank@pglaf.org> | 2025-10-14 19:56:21 -0700 |
|---|---|---|
| committer | Roger Frank <rfrank@pglaf.org> | 2025-10-14 19:56:21 -0700 |
| commit | 5a251090ba95e57da25318d409505970a7cb4de6 (patch) | |
| tree | ac4f09f35767c38a6e7eb04faca58a156b5ac2dc | |
| -rw-r--r-- | .gitattributes | 3 | ||||
| -rw-r--r-- | 31743-8.txt | 2312 | ||||
| -rw-r--r-- | 31743-8.zip | bin | 0 -> 37129 bytes | |||
| -rw-r--r-- | 31743-h.zip | bin | 0 -> 39693 bytes | |||
| -rw-r--r-- | 31743-h/31743-h.htm | 2500 | ||||
| -rw-r--r-- | LICENSE.txt | 11 | ||||
| -rw-r--r-- | README.md | 2 |
7 files changed, 4828 insertions, 0 deletions
diff --git a/.gitattributes b/.gitattributes new file mode 100644 index 0000000..6833f05 --- /dev/null +++ b/.gitattributes @@ -0,0 +1,3 @@ +* text=auto +*.txt text +*.md text diff --git a/31743-8.txt b/31743-8.txt new file mode 100644 index 0000000..19505f1 --- /dev/null +++ b/31743-8.txt @@ -0,0 +1,2312 @@ +The Project Gutenberg EBook of Portugal enfermo por vicios, e abusos de +ambos os sexos, by José Daniel Rodrigues da Costa + +This eBook is for the use of anyone anywhere at no cost and with +almost no restrictions whatsoever. You may copy it, give it away or +re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included +with this eBook or online at www.gutenberg.org + + +Title: Portugal enfermo por vicios, e abusos de ambos os sexos + +Author: José Daniel Rodrigues da Costa + +Release Date: March 23, 2010 [EBook #31743] + +Language: Portuguese + +Character set encoding: ISO-8859-1 + +*** START OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK PORTUGAL ENFERMO POR VICIOS *** + + + + +Produced by Pedro Saborano (produced from scanned images +of public domain material from Google Book Search) + + + + + + + PORTUGAL ENFERMO + + POR VICIOS, E ABUSOS DE AMBOS OS SEXOS. + + DEDICADO AO SENHOR + + JOSÉ LUIZ GUERNER, + + CONSUL DE S. M. SICILIANNA, + + POR + + JOSÉ DANIEL RODRIGUES DA COSTA, + + ENTRE OS PASTORES DO TEJO + + JOSINO LEIRIENSE + + + LISBOA: + NA IMPRESSÃO REGIA. + ANNO 1819 + + _Com Licença._ + + + + +SENHOR JOSE LUIZ GUERNER: + + +_Quando comecei a compor esta Obra, intitulada=Portugal Enfermo por +vicios, e abusos=logo me veio á lembrança o dedicar-lha. E approveitando +estas primeiras idéas, foi tal o prazer, que concebi, por huma tão +acertada escolha, que parecia que com mais facilidade, e affluencia me +occorião pensamentos para a ultimar._ + +_Eu faria huma injuria á Gratidão, se me lembrasse de outra pessoa para +esta Dedicatoria; quando por experiencia tenho conhecido quanto a sua +curiosidade, applicação, e talentos ambicionão as minhas Producções._ + +_Aqui me offerecia agora a minha imaginação hum vasto assumpto, para +tecer-lhe o Elogio, que merece hum homem amador das Bellas Letras, e ornado +d'aquellas virtudes moraes, que tanto caracterizão o verdadeiro homem de +bem. Mas fazer das suas apreciaveis qualidades huma extensa narração, seria +dar por nova huma pintura ao mesmo Pintor, que a desenhou._ + +_O Céo dilate a sua estimavel vida para consolação dos seus amigos; +sendo hum dos que mais o preza, e respeita_ + + _José Daniel Rodrigues da Costa_ + + + + +PROLOGO. + + +Nem a vaidade de ser Author, nem a presumpção de exceder os Escriptores +do meu tempo, nem o desvanecimento dos repetidos elogios, que muitas +Pessoas me fazem, serião incentivos bastantes para eu escrever com tanta +assiduidade, como escrevo. Não me ufanão semelhantes apavonações; porque +o deixar-me possuir destes fôfos sentimentos seria em mim huma bem +notada mania. + +Devem capacitar-se os meus amabilissimos Leitores que o meu genio, hum +pouco propenso ás Bellas Letras, e mais que tudo, o muito, que prezo +quanto he honesto, e civíl, he que me desafia a desembainhar a espada da +Critica contra os vicios em todas as minhas Obras, acutilando estes, e +poupando com tudo os seus adoradores. + +He por tanto que exponho ao Público esta Obra dos achaques chrónicos, +com que o tempo tem contaminado os antigos, memoraveis, e bem acceitos +costumes do nosso Portugal; que quanto mais se reprehendem os +d'agora, tanto maiores elogios se fazem aos passados. + +Tem os vicios, e os abusos chegado ao maior auge na presente época em +ambos os sexos. Não se lhes acha mediania; e neste labyrintho de cousas +não fica ao homem, que bem pensa, mais que os dois refrigerios: ou de +chorar, ou de rir dos destemperos deste Seculo nos excessos, que se +observão no luxo, nas educações, e no viver de agora. + +Com effeito eu vejo os tempos bem desgraçados para composições de +qualquer natureza. Nos principios do Seculo dezoito houve muito quem +escrevesse, porque havia muito quem lêsse; depois ainda houve muito quem +lêsse, e menos quem escrevesse; mas presentemente nem ha quem escreva, +nem quem lêa; porque as minimas cousas, que apparecem, nem essas mesmas +se gastão. + +Vamos porém sempre compondo alguma cousa para huma parte da mocidade bem +morigerada, que ainda se encontra tanto nesta Cidade, como por essas +Provincias; Rapazes applicados, de perfeita educação, e que faz gosto +ouvillos na sociedade: com estes me entenderei; em quanto os outros +entregues ás desenfreadas paixões, que os illudem, se fazem verdugos de +si mesmos. Sobre estes he que recahe a critica desta pequena +composição, que desenvolve os achaques de Portugal, causados pela +epidemia dos vicios, e abusos de huma grande parte de gente. + +Leitor, perdôa aos defeitos da Obra; mas não perdôes aos teus, para não +seres contado no catalogo dos viciosos: compra, e lê, que he o melhor +modo de saberes quanto isto + + Vale. + + + + +PORTUGAL ENFERMO PELOS VICIOS, E ABUSOS. + + _Os escritos que saê da mão fóra + Tantas Sentenças tem, tantos Ledores, + Assim Miranda o canta, assim o chora. + Sempre a verdade achou murmuradores; + A mentira que damna, e lisongea + Sempre (em pouco saber) grandes favores._ + + Bernard. Cart. XV. + + + Portugal, Portugal! Eu te lastimo! + E bem que velho sou inda me animo + A mostrar-te os defeitos, e os excessos + Dos costumes, que tens já tão avessos + Dos costumes, que tinhas algum dia, + Quando mais reflexão na gente havia. + Tu de estranhas Nações foste invejado; + Hoje faz compaixão teu pobre estado: + Cada vez te vão mais enfraquecendo, + Todo o brilho, que tinhas, vais perdendo: + Paraiso do Mundo te chamavão; + As mais Nações com tigo se animavão; + Ellas porém ficárão sans, e fortes; + E tu a todo o instante exposto aos córtes + Da usura, da ambição, da falsidade, + Do egoismo, da fuga, da impiedade: + Males, que aos que bem pensão causão tedio, + A que apenas descubro hum só remedio, + Que outro melhor não ha, a que se apelle, + E muita gente chora a falta d'Elle[1].... + + Portugal, Portugal! Eu te lastimo! + E o pezar, que me causas, mal reprimo! + Estás presentemente na figura + Do enfermo, que não póde com a cura, + Por ter molestias taes tão complicadas, + Que parte das receitas são baldadas. + + Vai aos banhos do mar a Dama bella, + Porque delles precisa, ou por cautela; + O Velho busca estuporado as Caldas, + E alli da mocidade purga as baldas, + Consegue movimento em braço, e perna, + E a perdida cabeça já governa; + Frouxo Taful, que tem debilidade, + Por excessos de toda a qualidade + Recorre ás infusões d'aquacia, e quina; + Mas tambem pouco e pouco se defina, + Se não acautelou mais a saude, + E não tem depois disto quem o ajude; + Todos a tempo buscão curativo, + Para vêr se em seu mal tem lenitivo: + E só tu, Portugal, chegaste a estado + De seres paralitico entrevado! + Todos de fóra vem sangue tirar-te; + Porisso nada póde aproveitar-te. + Os Estrangeiros, que a Lisboa chegão, + Te vem bichas deitar, e todas pegão, + Sempre em proveito seu com abundancia, + Té ficares de todo sem sustancia. + Medicina não sei, mas tenho lido + Dois Livros, que me tem muito instruido, + Hum da propria exp'riencia, outro do mundo, + E só nesta lição he que me fundo, + Para bem conhecer por estes meios + Tanto os achaques meus, como os alheios. + Ora antes que de todo a vida exhales, + Ouve parte da origem de teus males. + + Eu vejo de alguns homens apartados + Os deveres mais puros, e sagrados; + Atropellada a honra, a probidade, + A razão, a decencia, a sãa verdade: + Isto por homens, que apparencias tem + De honrados, de Christãos, de homens de bem + + Eu vejo o feroz crime a garra alçando, + Os trêfegos viventes subjugando, + Só a fim de os trazer ao seu partido, + Deixando o bom caracter corrompido. + + Eu vejo huns indivíduos mui sagazes, + De transtornar os outros bem capazes; + Porque com o systema de egoistas + Ao que os outros possuem botão vistas. + Lanção-lhes rede, rede que não falha, + Peixe grosso, e miudo cahe na malha, + Dizendo-nos depois, como em resposta: + Eu por aqui me sirvo, ou dei á costa. + Que em limpo Portuguez, nada confuso, + He fugir, ou quebrar, como hoje he uso. + Eu sei que hum Guarda-Livros foi chamado, + Para as Contas fazer de hum Ex-quebrado; + E como aquella quebra era segunda, + Não podia acertar-lhe bem a funda. + Té que lhe perguntou com desengano: + Com quanto quer quebrar, Senhor Fulano? + Esta pergunta prova que ha bicheiro, + Que inda que quebre, fica sempre inteiro. + + Eu vejo hoje os amigos desfrutantes, + Palradores de officio, e bem fallantes, + Muito promptos em toda a patuscada; + Porém, em se occupando, tudo he nada, + De função em função, em bons jantares, + Por não ficarem vagos os lugares; + Mas que, se alguem lhes pede algum soccorro, + Virárão logo a peça para fôrro, + Fugindo de valer por amizade + Aos que fôrão da sua sociedade: + Vileza sem igual, que achar não pensa + O que tem hum vexame, ou tem doença, + Que em banquetes largou bastante a pelle, + Para nutrir os que hoje fogem delle. + + Vejo homens, que de seu muito tiverão, + Que de tudo o que tinhão, conta derão + No teimoso valete, sota, e az, + Nos trez dados, que o copo saltar faz, + No grande tratamento afidalgado, + Na sege, no jardim, luzido estado, + Banquetes, sociedades, mancebías, + E outras taes, e quejandas bizarrias: + Tudo feito sem calculo seguro, + Sem minima lembrança do futuro, + Para agora se vêrem sem ter nada + N'huma vida bem triste, e desgraçada. + + Eu vejo outros mesquinhos, e forretas, + Que não passão de velhas meias pretas, + Sua casaca eterna, já virada + No anno, em que a náo Cabrea foi queimada; + Ferrolhando o dinheiro no bahú, + Para que não lho leve belzebu; + Contado, e recontado na alta noite, + Porque a pedir algum ninguem se affoite. + Tudo á porta fechada sós vivendo, + Vestindo muito mal, peior comendo; + E que vive assim bem hum destes pensa, + Ou seja na saude, ou na doença; + Té que toda a reserva finaliza + Nas garras de hum irmão lá de Galliza. + Eis aqui hum dinheiro que não gira, + E por isso a outra gente não respira, + Isto he que faz que toda a casa gema; + Pois outros ricos ha de igual systema. + + Vejo huns homens, que são muito abastados, + E de semblantes sempre carregados; + Caras _de sum es fui_, mas _por causar_, + Hum bom modo a ninguem sabem mostrar: + Eu bem sei que quem tem muito dinheiro, + Grosseiro fica sempre, se he grosseiro; + Porque pejada burra de riqueza + Não emenda o que vem de natureza. + Eu chamo a huns homens taes _verbos de encher_, + Vivem só de ajuntar, e de comer, + De cabeça mais leve do que a escuma, + Gosto não sabem ter por cousa alguma; + Para valer aos mais nunca tem geito, + Para si são _Dativo de proveito_ + Taes pinturas; a mal nunca se tomem + O que lêr, e apontar he que he máo homem. + + Portugal, Portugal! eu te lastimo! + E teus flagellos na memoria imprimo! + Eu vejo homens solteiros, sem emprego, + Porém tendo de môças bom conchego; + Parece que por magica he que passão; + Pois sem que diligencia alguma fação + Por grangear a vida, a tudo acodem; + Não sei como nutrir os vicios podem! + Eu trabalho, e não vivo satisfeito; + E elles andão de corpo mui direito, + Mil aproxes fazendo á bolsa alheia, + Sem acharem tal vida indigna e feia. + Hum lhes diz: _Eu não posso; outro: não tenho:_ + E a concluir d'aqui sómente venho + Que tem esta comedia por final + Cadêa, Portaria, ou Hospital. + + Eu vejo outros sem rendas, nem officio, + Do Matrimonio entrar no sacrificio: + Marido pobretão, mulher sem nada; + Em crescendo dos filhos a manada, + O mesmo he que ter sella sem cavallo, + Casa sem tecto, e sino sem badalo. + Acabou-se huma cousa, faltão mil, + De dinheiro não ha nem hum ceitil: + Olha hum para o outro, as razões crescem; + Os filhos nús, de fome desfalecem; + Té que o Marido toma o desafôgo + De se ir metter na casa que dá jogo. + Alli se perde a noite quasi toda, + A vêr se de huma vez desanda a roda, + Com as iscas de emprestimos de Amigos, + Que só em casos taes servem de abrigos; + E a familia em cuidados, em tormento, + Que inda he peior que a falta de sustento. + + Eu vejo, nestes tempos desditosos, + Povos empobrecidos, e chorosos; + Pois quando vém hum mal, outros se seguem, + Que os Mortaes atenúão, e perseguem. + Mas a pezar da falta de dinheiro, + Apparece nos bairros o gaiteiro, + As bandeiras nas cordas penduradas, + Por onde as festas são annunciadas, + Tudo feito com lustre, e com grandeza, + Foi Juiza a Senhora Dona Andreza. + Os festeiros não tem nada de seu; + Mas a festa da rua tudo deu. + Anda o velho engraçado co' os Leilões + Dos cargos, que custárão bons tostões. + Temos fogo de vistas, vistas raras, + N'hum beco, que de largo tem tres varas; + Que huma roda, que salta em Fogo ardendo, + Vem desordens fazer nos que estão vendo; + E póde muito bem a propriedade + Com fogo reduzir-se em ametade. + Estes p'rigos não são muito pequenos, + E já tem succedido mais, ou menos. + Nunca vi de dinheiro tanta fome, + Nem tantas festas de despeza, e nome. + Eu louvo, e não crimino a devoção; + Haja festa de Igreja, e bom Sermão; + Tenha a festividade do arrayal + Cousas, que fação bem, e nunca mal. + O dinheiro de máscaras, e fogo + Vá gastar-se com outro desafogo + Mais util, mais vistoso, mais louvavel + Em acudir a tanto miseravel. + Dem rações á pobreza dessa rua, + E a festa christãmente se conclua. + No lugar, em que o fogo armar se havia, + Haja comprida meza neste dia; + Hum, ou dois caldeirões de mantimento, + Que sirvão aos mendigos de sustento, + Ministrados por esses bons festeiros, + Que se fação da meza dispenseiros, + Sem tumulto, em socego, e com cuidado + No cégo, na criança, no aleijado. + Isto he que dá exemplo, he que edifica; + Deste modo a função completa fica; + E não com fogo, máscaras, e bulhas, + Tornando-se as esmolas em fagulhas. + Na terra, e Céo nada ha mais relevante, + Que acudirmos ao nosso semelhante. + Se não querem na rua estar com isto, + Fação o que eu a muitos tenho visto: + Vão ás Cadêas, que isto dá bom nome, + Repartão de comer por quem tem fome: + Arme-se em gravidade a Confraria, + Vá consummar esta obra santa, e pia; + Que disto inda se tira hum bom partido; + O mais tudo he trabalho desluzido, + Motivos de desordens, e de insultos, + Indecentes tornando aquelles cultos; + Porque destas funcções he raro o brinco, + Em que não saião prezos quatro, ou cinco. + + He bem digno tambem de se notar + Andarem hoje os pobres a cantar, + De guitarra, ou viola má, ou boa + Por todas essas ruas de Lisboa. + Parece que festejão a pobreza, + Ou que ella, lhes não dá muita tristeza! + Eu bem sei o ditado, de quem canta, + Seus males mais, ou menos sempre espanta; + Mas co' a Musica, a fome não se cura; + E he só (bemdito Deos) de que ha fartura! + + Portugal, Portugal, eu te lastimo! + E de sentir comtigo não me eximo! + Eu vejo velhos Pais cheios de vicios, + Pondo os filhos nos mesmos precipicios. + Co' os exemplos, que dão em casa, e fóra, + Sem pejo, sem cautela, e sem melhora. + Quando hum Pai deve ser (ou moço, ou velho), + Da familia de casa hum vivo espelho; + Mas se elle he o primeiro em se infamar, + Como póde a seus filhos doutrinar! + Filho houve já, que entrando no Oratorio + Aos Padres fez primeiro hum peditorio: + Que chamassem seu Pai, porque queria; + Beijar-lhe a mão por fim, pois que morria, + E que só acabava descançado + Se fosse por seu Pai abençoado. + Chegou o Pai gemendo, sem conforto, + Em lagrimas banhado, e quasi morto. + Então o filho, dando-lhe hum abraço, + Desconjuntou-lhe os ossos do espinhaço, + Dizendo-lhe: Receba o pago seu + Da creação perversa, que me deo; + Quando nos armazens se embebedava; + Se tres cópos bebia, tres me dava; + Humas vezes em paz, outras em guerra. + Fazendo bordos hiamos a terra. + Ás casas, em que jogo sempre havia; + Levava-me na sua companhia; + Eu pois n'hum vicio tal sempre embebido, + Me vi por muitas vezes bem perdido; + Jogava o que era meu, e mais o alheio, + Até que já sem brio, e sem receio, + Achando que de meu não tinha nada, + Voltei-me para ser ladrão de estrada. + Ficar deve em memoria esta lição, + Que o bem, e o mal provém da educação. + Banida deve ser da Sociedade + Perdida, e viciosa mocidade: + Bem como nas searas acontece, + Que toda a herva inutil, que alli cresce, + Pela raiz se corta, aos pés se deita, + Por não damnar o grão, que se aproveita. + + Eu vejo a mocidade brava, e louca, + Vaporando fumaças pela boca, + Mostrando da doudice o sobrescrito + No queimado xaruto por palito. + Eu vi, não me contárão, isto he certo, + Ir á Loja da Neve muito esperto + Hum tafulão Gigante pela altura, + Mas bem proporcionado na figura, + Fumando com excesso de tal sorte, + Que lançava da boca hum fumo forte: + Pedio carapinhada, e foi fumando, + Alimpando o suor de quando em quando, + O fogo com a neve a hum tempo unindo, + Pelo mesmo canal tudo embutindo: + Sahia huma fumaça lá do centro, + Hia hum gole de neve para dentro. + Mas não posso acertar bem na razão + Do fogo, e neve ter combinação! + No que se alcança bem, sem muito estudo, + Que hum taful tem guelas para tudo. + + Eu vejo rapazinhos enfeitados + Mui bem nascidos, muito mal creados, + Que ficão sem estudos, e sem bens, + Tafúes de quarteirão a dois vintens, + Com hum procedimento escandaloso, + Envolto no calote attencioso, + Que com boas palavras disfarçado, + Depois de conseguido, he declarado. + Não fallemos nas bellas qualidades + De tomarem bastantes amizades; + E nas casas de bem entrada tendo, + Pouco e pouco se vão desenvolvendo, + As innocentes filhas illudindo, + Requestando, escrevendo, persuadindo; + E ellas acreditando os rendimentos, + Nas vozes, que se dão de casamentos, + Com fantasticos teres, e promessas, + Té irem de candêas ás avessas; + Porque o pai presentio, a mãi espreita; + Leva o Senhor fulano huma desfeita. + E em este penetrando o contratempo, + Cuida logo em mudar-se antes de tempo; + E vai com esta mesma synfonia + Dar Trevas para outra freguezia. + Da má educação lhe provém tudo; + Pais, que deixão seus filhos sem estudo, + Ou não escolhem Mestres com recato, + Porque só querem ir ao mais barato! + + Eu vejo huns fôfos Mestres de Collegios, + Inculcando sciencia, e privilegios, + Porém jogando a Ronda co' os Meninos + Nas horas vagas dos seus bons ensinos; + Que por estas razões bem se conhece + Que entre tanto Collegio, que apparece, + Não obstante haver Mestres a cardumes, + Vão de mal em peior nossos costumes. + Os rapazes mimosos de algum dia + Apreciavão Musica, e Poesia, + Séria Dança, discreta Sociedade, + Mostrando sempre certa gravidade. + Não digo que não ha inda hoje disto; + Mas destas prendas poucos tenho visto. + Hoje ha muitos tafues com outras prendas, + Morgados de Pantana, mas sem rendas. + Só presumpção de sabios tem comsigo, + E obrigallos a lêr he hum castigo, + Até parece já, por desvario, + Que a muita discrição lhes faz fastio: + Prezão mais hum cavallo, que ande bem, + Que o melhor Livro, que hum Livreiro tem; + E o que escapa de ter esta paixão, + Vai a ser hum acérrimo Glotão + Quer biffes a _lamoda_ de _planchetas_, + Cabeça de vitella, e costeletas, + A geléa da boa mão de vacca + Que isto he que fortalece a gente fraca: + Desmancha-se depois com misturadas, + Em merendas, e outras patuscadas; + Com ranchos de solteiras, e viuvas, + Manda vir aves, hervas, ovos, uvas, + Melancias, melões, maçãs, morangos, + Nisto largão a penna os novos frangos; + Donde a cólica vem, e a indigestão, + Que, de fraqueza, os põe á Santa Unção: + Julgão que tem estomago de ferro; + Mas tarde a conhecer vem o seu erro: + Depois de relaxados, sem vigor, + E alguns co' seu raminho de estupor, + Então com mais cautela se procura + Onde a pinga haverá, que seja pura; + Vinho de Lavradio, ou Carcavellos, + Bucellas, ou Chamusca, vinhos bellos; + Porque esta Livraria fortifica, + A quem de ameijoadas[2] entisica. + Entenda-me o Leitor, como quizer, + No resto que a saude faz perder: + E para o bom patusca[3] ter dinheiro, + Vê se póde encontrar farto banqueiro. + Assenta que he melhor, e lhe convém + Partidas de lucrar algum vintem; + Nascendo excessos taes, e tal doudice, + Da escacez do dinheiro, que já disse, + Huma escacez que faz damnos immensos, + Que os calotes, e crimes traz appensos. + Na gente má, ou boa, môça, e idosa, + A penuria geral se faz penosa: + Cada qual anda vendo o melhor meio + De achar á sua casa algum esteio; + E quando se vê muito desgraçado, + Lança-se aos vicios já desesperado; + Porque os tempos de muita Loteria, + Sortes, rifas, e jôgo em demasia, + São tempos de miseria, em cuja lida + Se perde pouco e pouco o amor á vida. + + Eu vejo mil Bilhares por Lisboa, + Outros tantos Cafés com gente boa, + Rapazes gigantescos, e corados, + Sem ter algum defeito de aleijados; + Tem estes mocetões o mesmo gasto + Pelas casas das Sortes, Neve, e Pasto; + E as simples Legiões na sua alçada + Apenas achão gente estropeada. + + Eu vejo alguns modernos falladores, + Que em todas as sciencias são Doutores; + Fallão de Leis, sem nellas se formarem, + E de guerra, sem nunca millitarem, + Mathematicos são por nigromancia, + Porque nelles não ha senão jactancia; + Com Filosofos querem ter parelha, + Mas com Filosofia só de orelha; + E com taes espertezas sem mais fundo, + Resolvem pela sonça meio mundo. + Se vão em Gabinetes discorrer, + Sabem tudo o que ha feito, e por fazer: + Nos governos dos Reinos dão pennada, + Mas andão sempre em vida desgraçada; + Não sabem governar a casa sua, + E vão governar Reinos pela rua, + Dando planos, fingindo descubertas, + Pondo discursos vãos em regras certas, + Mettendo de Latim palavras finas, + Que mais parecem Mouras, que Latinas; + Que a tanto os pantalões se deliberão, + Quando nem _Musa musae_ conhecêrão. + Mas se alguem, com razão, lhes vai ao fato, + Em nada se tornou tanto apparato. + + Outros, vejo, que querem ser fidalgos, + Por irem atrás delles, como galgos; + E com justas, e herdadas Excellencias, + Querem estes tambem ter preferencias, + Enthusiasmados tanto na manía, + Que não passão sem huma Senhoria; + Por virem de Friellas, e Frieiras, + Seus Avos de Melgaços, e Melgeiras, + Que ainda destes fumos ha sinaes + Em huma sege velha sem varaes, + Que no canto da loja se conserva, + Com hum brazão pintado, de reserva. + Porém sempre he preciso ser mui tonto + Quem não vê que hoje ha nisto algum desconto; + Que altivos pensamentos, qualidades, + Alicerces de antigas fatuidades, + Hoje consistem só em ser herdeiro, + Ou a torto, e direito ter dinheiro. + + Eu vejo papelões, que não passárão + Das linhas para lá, nem encararão + Sequer com o inimigo n'hum só ponto, + Mas em tudo o que fallão vem hum conto + Do muito, que soffrêrão pela guerra, + Nadando em rios, avançando terra + Com tal fome, que atrás de tres galinhas + Os Pyrenéos subírão de gatinhas: + Que depois lá n'hum choque, que tiverão, + A hum batalhão Francez a morte derão; + Que o do zabumba só livrou a pelle, + Porque escapou mettido dentro delle. + Destas, e outras basofias apparecem: + Quando sabemos de outros, que merecem + Hum eterno louvor, eterna fama, + A quem a Patria dignos filhos chama, + Portuguezes honrados, valorosos, + Do inimigo terror, varões briosos, + Que as cicatrizes mostrão pelo peito + Com que attestão melhor quanto tem feito. + + Portugal, Portugal! eu te lastimo! + Com pena de te vêr, meus versos rimo! + Eu agora he que bem tenho alcançado + Quanto de tudo estás necessitado! + Pois perdeste a sciencia, engenho, e arte, + Que te deo sempre fama em toda a parte. + Hoje vejo o teu mal, que não melhora, + Se tudo o que precisas vem de fóra. + Tens nos Collegios Mestres Estrangeiros, + Tens de muitas Nações cem mezinheiros, + Que com pós, e com balsamos subidos + Vão as bocas limpando aos presumidos; + E ainda não se dando por contentes, + Té nos querem levar da boca os dentes; + Equilibrios, Balões, e Peloticas, + Urso, e Macacos com trezentas nicas, + Figurinhas gesso, outras de cera, + Nynfa, que n'harpa em dedilhar se esmera; + A Menina, que falla pendurada, + A boa Dançarina escripturada, + Que hum par de mil cruzados vem buscar; + E nós he que ficamos a dançar! + Outra, que tem a voz quasi divina, + Como já se chamou á Zamparina; + Outro, que engole espadas brancas, pretas, + Como nós engulimos estas petas; + E outras mil subtilezas deste lote; + Vistas de praça, ou sala, ou camarote, + Com armadilhas taes vem esta gente + Na vagante esperar a grossa enchente, + E carregando vão, como as formigas, + Quanto podem tirar destas fadigas! + Só Portuguezes nunca tenho visto, + Que vão aos outros Reinos fazer disto. + Estrangeiras Modistas se apresentão, + Com letreiro á janella do que inventão; + Que as Modistas de cá, bem que trabalhão, + Á vista das de fóra já não calhão. + A si se accolhe o pobre aventureiro; + Porque lhe basta o nome de Estrangeiro, + Para abrir loja, e ser afortunado. + Veio do seu paiz esporeado, + Chegou aqui, poz loja de vestidos; + E ficão os tafues mui bem sortidos. + Tem fato para magro, e para gordo, + Té desapparecer, pondo-se a bordo: + Caridade em tal gente sempre luz, + Pois vem a Portugal vestir os nús. + Mas dizem muitas lingoas mal dizentes + Que elles não vestem; vem despir as gentes. + Nada tem escapado, ou esquecido, + Para o metal, que tinhas, ser sumido. + Nós gememos em quanto os outros luzem; + Té barricas de pinos se introduzem; + Porque o pino de fóra, por mais duro, + Deixa o tacão mais forte, e mais seguro. + Se até vejo substancias combinadas, + Nos paizes estranhos preparadas, + Para pôr bom cherume nas panellas, + E fazer hum bom molho ás cabidellas: + E disto haverem lojas em Lisboa, + Que por caixeira tem Madama Grôa! + Eu inda espero vêr na Barra entrados + Navios com almoços já temp'rados; + Que ha de ser huma cousa bem acceita + Vir já prompto o Café, torrada feita! + Porém nós he que disto culpa temos, + Porque de nós apreço não fazemos. + Até he riso vêr, termos trocado + O traje, que entre nós foi sempre usado, + Pelos trajes de todas as Nações, + Que abandonão çapatos, e calções. + Nem a meia comprida já governa, + Anda dentro da bota nua a perna, + Como eu a boa gente tenho visto; + Os Mouros pouco mais fazem do que isto. + Vejo entrar em lugares mui sisudos + Velhos, e moços, quaes pintos calçudos, + Pantalonas; polainas de Galegos; + Só resta usarem calças, como os Gregos. + Confessemos que he este o nosso fraco; + Que arremedar he o uso do macaco. + + Eu vejo pela classe dos Livreiros + Lucros tirarem só os Estranjeiros. + Que direi de Edições, que vem de fóra? + Façamos aqui pausa por agora. + Só sei que a mocidade, com deleite, + Bebe em taes livros venenoso leite; + E os Livreiros de cá postos ás moscas; + Que as obras Portuguezas são mui toscas; + O sainete não tem, nem a belleza, + Que mostra qualquer obra, se he Franceza. + Arte de cortar callos sem tisoura, + Modo de conservar a barba loura, + As Cartas de Madama Patulher, + A Novella da Meza sem Talher: + Instrucções, e Preceitos de Dentistas, + Invento de crear galos sem cristas. + O caso he ser Francez o tal livrinho, + Que he da meza d'agora o melhor vinho. + Livreiro Portuguez apenas vende + Cartas, por onde o A, B, C se aprende, + Bilhetes, com que Boas Festas damos, + Outros de Enterro, que he que mais gastamos, + Letras de Cambio, Pautas, Taboada, + Roteiros de Pilotos, e mais nada. + Parece que ninguem já hoje estima + Composições em Prosa, nem em Rima. + Acabou todo o gosto da Leitura, + Tudo vejo mudado de figura. + Nas obras, que se imprimem, (não se crê) + Ha tal, que assigna, accoita, e não as lê! + N'hum destes o trabalho se perdeo, + Que não póde achar gosto ao que não lêo. + + Portugal, Portugal! tu tens comtigo + Immensa gente, de quem és abrigo, + Que devendo-te mil obrigações, + Mostrar-te sabem só ingratidões. + A primeira, que vejo praticar-se, + He nada, do que he teu, hoje estimar-se. + Fabricantes de cá morrem de fome; + A sedinha estrangeira he que tem nome. + Não valem nada Artistas Portuguezes; + Os de fóra são só as boas rezes. + As obras do Paiz não são perfeitas, + Não tem fama, ou valor, são mal acceitas; + Mas a quinquilheria de armação, + Se he de fóra, tem logo estimação, + E serve para o luxo, e para a moda, + Que Damas, e Tafúes tudo se engoda + Com estas bugiarias de tecidos + De pedraria falsa, ouros fingidos; + Té vemos entre tantas bagatellas + Os Mouros com caixotes de chinelas, + E tão bem feitas como os seus narizes, + Que bem mostrão ser obra de aprendizes. + Todos tem aqui seu manancial, + Até ficarmos todos sem real. + N'outro tempo hum Fidalgo desta Côrte, + Homem de bom pensar, e de bom porte, + Puxou por huma caixa rica, e boa, + Feita por certo Ourives de Lisboa. + Todos os circumstantes, que se achavão + Sentados ao jantar, vendo-a, pasmavão + Por tanta perfeição, lavor, e arte, + Que se lhe descobria em toda a parte. + Na mente de ser obra estrangeirada, + Foi por todos a caixa elogiada. + Logo o dono da casa mui gostoso, + Porque ficasse o Ourives mais famoso, + Conhecer mesmo alli a todos fez + Mão d'obra ser de Ourives Portuguez. + Apenas semelhante voz se larga, + Como quem prova cousa, que lhe amarga, + Hum notava d'alli certo defeito, + Outro lhe achava falta de preceito. + Então o bom Fidalgo decisivo + Os reprehendeo dizendo: Eis o motivo, + Porque a nossa Nação tanto padece, + E entre as outras Nações nunca florece; + Nós he que assim fazemos desgraçados + Homens, que devem ser eternizados; + E estes devem queixar-se com razão, + Vendo dos seus o premio, que lhes dão. + + Portugal, Portugal! eu te lastimo! + Porque sou próle tua mais te estimo! + Pois não entro no rol das almas fracas, + Que a tudo, e a todos vírão as casacas! + Eu vejo formigueiros de usurarios, + Que vão muito subtís por modos varios + Movendo sagazmente a real mola, + Até tudo ficar pedindo esmola. + Some-se pouco a pouco o numerario, + Todos vão lendo o mesmo breviario; + Para a vida mui poucas cousas bastão, + As superfluas são as que mais gastão; + O luxo, os appetites, as vaidades, + A grande emulação das amizades: + Só porque usa Fulana, e traja assim, + Querêllas desbancar he logo o fim: + Isto em todas as cousas se está vendo, + Donde nasce o calote, e empenho horrendo; + Que inda vendo que os lucros não acodem, + Todos querem fazer mais do que podem: + Por isso hoje bons trastes são vendidos, + Que se herdárão de Avós mais comedidos; + Se estes das sepulturas resurgissem, + Talvez ficassem doudos do que vissem! + Destruindo-se assim, sem reflexão, + Cousas que tinhão tanta estimação; + Que antes do que as penhoras as escalem, + Vão pela terça parte do que valem; + E ainda compradoras custa a achar, + Porque todos estão a jejuar. + Grande cousa he viver hoje demente, + Para não dar valor ao que se sente! + Inquietações, costumes, tempo, e mundo, + Tudo atira c'os os homens para o fundo + Porque por mais que nadem na desgraça, + Velhice, Doença, e Morte, os ameaça: + No que passamos, temos o presagio + De ninguem escapar deste naufragio: + Porém no mar dos damnos a tormenta, + Nem o Ceo, nem a terra he que a fomenta: + Huns aos outros nós mesmos atormentamos, + Com coração de bronze, flagellamos: + Só o proprio interesse he que nos guia + E pene quem penar nesta ingrezia. + Assim dando se vai cabo de tudo, + Té acabarmos todos em agudo: + Todos vamos ficando como espetos, + Em tristes descarnados esqueletos, + Huns de calvas á mostra, outros tapadas, + Que a urgencia faz cabeças escalvadas; + Seguem-se os estupores, e malinas, + Paralysias, mortes repentinas. + Nunca vi tantos homens com achaques + Pelas repetições destes ataques. + Nestes tempos só vive satisfeito + O homem de baixa esfera, porque o peito + Não toma nem fortuna, nem desgraça; + Com o pouco, que tem, com isso passa; + Pois não pezão sobre elle obrigações + De familias com certas sujeições. + O homem de bens, de honrados sentimentos + Vive sem ter resurça hoje em tormentos; + Vive, mas hum viver apouquentado, + Com a fome, e miseria sempre ao lado. + Porque hum pai de familias com despeza, + Vendo os recursos todos em fraqueza, + Se nas faltas, que sente, mais discorre, + Chora, pasma, esmorece, abate, e morre. + Ora seja em desconto de peccados, + Irmos todos á cova entisicados! + Para não carregarmos aos irmãos, + Que andão tambem (coitados!) pouco sãos. + + Eu vejo cambiar, vender dinheiro, + Que põe quem compra, e vende de poleiro; + E os pobres opprimidos, arrastados, + Que estes são quasi sempre os cambiados. + E pegou em Lisboa o novo officio, + Com a capa de ser hum beneficio: + Tudo especulações destes Senhores + Compassivos, civís rebatedores, + Que pudérão achar seguro meio + De mostrar não querer suor alheio; + Porque _in verbo_ papel a conta he justa, + Pois o vendem por menos que lhes custa; + E mostra na consciencia ser exacto + Quem compra caro, e vende mais barato. + Disto nossos Avós nunca tiverão; + Forão-se, não sabendo o que perdêrão. + Parece que por manha, ou por estudo, + Se esconde o ouro, e prata, cobre, e tudo, + A fim de com tal fome, e taes empates, + Não se acabar a praga dos rebates. + Lembro-me que na minha mocidade + Tinha o dinheiro a mesma validade; + Hoje o Papel Moeda dominante + Sempre o recebo em quarto minguante; + Pois se em metal o quero vêr tornado, + Logo he por _manos limpias_ maquiado. + Porém do mal o menos, feliz eu, + Se alcançasse em Papel tudo o que he meu. + Se o dinheiro se vende assim patente, + Tambem se vende gente á mesma gente. + O Commercio afrouxou, todos se chorão, + Vendo que de fortuna não melhorão. + Tem atacado a Praça em viva guerra + Tantos Piratas, que ha por mar, e terra. + São entre nós fazendas genuinas. + Chinelas, suspensorios, lamparinas, + Papeis de castiçaes, graixa a tostão, + Caixas de obrêas, bolas de carvão. + As escôvas, que dão lustros mimosos, + Porque inda não estamos bem lustrosos. + Só nisto he que se faz algum negocio, + Tudo o mais pede chuva posto em ocio. + + Eu vejo homens hypócritas tratando + Negocios de ir os outros depennando + Com fallas divinas, astutas manhas, + Com Deos na boca, e o demo nas entranhas. + Não querem encarregos para a morte, + Por isso se regulão desta sorte. + He desta gente o calculo seguinte; + Tudo que vale cem, comprar por vinte. + Alminhas boas, que andão entre nós! + Que do dinheiro são sempre hum cadoz. + Eu rio quando vejo estes beatos, + Sanguisugas, e esponjas de contratos; + De olhos meios fechados a fallarem, + Até os seus int'resses ultimarem; + Mas depois dos ajustes serem feitos, + Abrem os olhos tortos, ou direitos, + Ora pondo-os no chão, ora no Céo, + Que este he da hypocrisia o grande véo: + Té que lhe chega ás vezes neste estudo + Revéz, em que o diabo leva tudo. + + Portugal, Portugal! eu te lastimo! + E quando te analyso, desanimo! + Destes estratagemas, e usos novos + Provém os muitos damnos dos teus Povos, + Eu vejo certos homens presumidos, + E nos cargos, que tem, tão embebidos, + Que por viverem fartos sem desgraça, + Assentão que são feitos de outra massa, + E mostrão se a fallar todos inchados, + Que parecem perús enchouriçados, + As palavras soltando, como Oraculo, + Decidindo por si em todo o obstaculo: + Tratando os que lhes são inferiores, + Com soberba, impostura, e dissabores, + Sem verem que huma falla mais ardente + Dobra o flagello ao triste dependente; + Que tem de hum bom Despacho a qualidade + A resposta civil de humanidade. + + Eu vejo homens de grandes ordenados, + Que fazem os dos outros ser quartados; + Os que elles tem, sempre achão ser pequenos, + Mas querem que o dos outros fique em menos; + Que o triste pão, que o empregado come, + He que augmenta a despesa, e que faz nome; + Mas o que elles desfrutão inda occulto + He huma bagatella, não faz vulto. + Não maculo ninguem, porém ha disto, + Como eu por muitas vezes tenho visto. + Isto com alvo certo não se entende; + Quem tiver este vicio, que se emende, + E singular fazer-se não intente + Á custa do flagello da outra gente. + + Eu vejo té nas mesmas Irmandades + Disputarem-se em meza qualidades; + E nos públicos actos distincções, + Como se a Deos servissem gerações; + Quando a Igreja é a Mãi do rico, e pobre, + Do velho, e moço, do plebéo, e nobre. + Porém assombrar isto me não deve; + Se ha Juiz de irmandade, que se atreve + A separar na Igreja o challe, e a manta + Da capa e lenço; isto mais espanta. + + Eu vejo gente mui temente a Deos, + Que até quer penetrar segredos seus. + Prognosticando está tremor de terra,...[4] + Bem como se o tremor fosse huma guerra, + Que os homens entre si movem, se querem, + Só pelos seus caprichos defenderem. + Se o Repertorio désse hum tremor certo, + Tinhamos hum Profeta descuberto; + Que os fundos mineraes em quem bem pensa, + Pódem casar co' os astros sem dispensa; + Nem Deos castigo algum ao mundo envia + Por calculos geraes d'Astrologia. + Mas he para pasmar vêr que houve gente + Tão crédula, tão frouxa, tão demente, + Que para o campo grande se ausentava + Com susto do tremor, que se esperava! + Como se taes estragos, e ruinas + Houvessem de ter vesp'ras, e matinas. + Com effeito o tremor foi grande assumpto + Para gente, que espera inda hum defunto. + Em fim houve no campo nova feira, + Onde a gente passou a noite inteira + Em huma companhia historiada. + A noite das fogueiras em Almada + Não se passa com mais satisfação! + Foi huma noite mais de São João! + Com medo do tremor, que não havia, + Na vespera fugião já de dia + Para o campo lindissimas mochachas + Com os seus taboleiros de bolachas. + Homens de quartas de agoa se ajuntárão, + Que apezar do seu medo, inda lucrárão. + De guitarras sómente havia falta, + Que he com que nas Gavotas mais se salta. + Não se fazia Terço, ou Oração, + Porque o susto pôz tudo em confusão. + Se viesse instrumento, tarde, ou cedo, + Perdião as meninas mais o medo. + De acabar com os homens já são horas; + Vamos ajustar contas ás Senhoras. + + Eu vejo o luxo as bolsas devorando, + E as Fabricas estranhas sustentando, + Pondo a nossa Nação empobrecida + Co' appetite das modas illudida. + Cada mez huma cousa de outro gosto, + Que a maridos, e pais lhes dá de rosto. + E as tafulas cahindo a todo o risco, + Bem como o passarinho cahe no visco: + Vestidos de magnifico valor, + Chailes, e mantas de mimosa côr. + Muitas diversidades de filós, + E outras taes tentações: pobres de nós! + Eu vejo muita cousa vir de França, + Enfeites, que de os vêr a vista cança; + Té cabelleiras vem para Senhoras, + A quem as calvas são mui devedoras, + Feitas de coifa elastica, e mui preta, + Com hum monête, em ar de maçaneta: + Porém estes modernos penteados. + De cabellos puxados, repuxados, + As cabeças vão pondo em tal figura, + Que fazem seja calva a formosura. + De França nos vem outra corriola, + De que usão as Senhoras como estola: + He numa tira elastica de rufos, + De espaço a espaço tem tambem seus tufos, + E chamão-lhes da moda as inventoras + Os modernos caprichos das Senhoras: + Custão a tres mil réis, outros a mais; + E assim com estas cousas, e outras tais, + Vem o sagaz, e o lepido estrangeiro, + A trocar aqui trapos, por dinheiro. + Resta virem de França bem bordados, + Elasticos cueiros perfumados, + Que ha de ser hum aceio bem acceito + Para tanta criança que ha de peito. + A filha da arrastada vendedeira + Quer trajar á fidalga, e ser primeira. + Leiteiras, e outras taes eu tenho visto, + Que de todas as modas são hum misto; + Atrás de hum burro de ceirão cançadas, + De rufos, e de folhos enfeitadas, + Que vão com estas vãs tafularias + Vendendo leite, nabos, melancias; + Mas no que esta gentalha tem errado + He não conhecer bem o seu estado; + Querendo co'a mais louca presumpção + Huns, e outros mostrar o que não são: + Procedendo huma tal desigualdade + Da falta de juizo, e honestidade. + E porque não ha nisto meio termo, + Te vejo, Portugal, bastante enfermo! + Da fórma que isto indico, não insulto; + Mas póde percebello o mais estulto. + + As nossas circumstancias, nosso estado + Pedem hum viver hoje acautelado. + Os tempos para o rico, e para o pobre + Já são de pouca prata, e muito cobre. + Ninguem póde fazer hoje thesouro, + He hum milagre o vêr quartinho em ouro: + Muito faz quem com boa economia + Se sustentar hum dia, e outra dia; + Que se entrudos fizer amiudados, + Ha de ter muitos dias de finados. + Luxo na mêza, luxo no vestido, + Pelas funções hum luxo desmedido, + No fim se lhe acha o erro que desgosta; + Por isso tantas náos tem dado á costa! + + Eu vejo reviver nos nossos dias + Das velhas as ridiculas manias + De verem cousas más, pregando peças, + A pedir Missas, a ultimar Promessas, + Deixando-as as visões, que lhes fallárão, + Tão doentes do susto, que mamárão, + Que se queixão de dores nas barrigas, + Talvez por hemorroides, ou lombrigas. + Huma diz que observou, outra que vio, + Outra que até na cama lhe bolio. + Ha pouco em certa casa huma donzella + Levantou por medrosa huma balella, + Porque sentio á roda do seu leito + Andar hum ermitão muito direito. + Logo huma desdentada velha tia + Respondeo, que de noite ella sentia + Jogar-se pela salla muito a bola, + E outras vezes tambem tocar viola: + Que guardava comsigo este segredo, + Porque a familia não tomasse medo. + Acudio a criada delampeira, + Levantando na casa igual poeira, + Dizendo que ella vio na chaminé + Hum pretinho pequeno posto em pé: + Que vira fora de horas na cosinha + A cantar, como gallo, huma gallinha, + E que lhe forão pôr o seu capote, + E côco de esfregar dentro do pote. + Mas tudo isto fazia hum tal criado, + Que andava da criada namorado; + Porque o dono da casa com disfarce, + Macaco velho, por desenganar-se, + Foi-se na carvoeira introduzir + De noite, sem ninguem o presumir; + E vendo na alta noite bem a fundo + Duas almas, que inda erão deste mundo, + Que era o moço co' a moça conversando, + Ao encontro sahio, mas perguntando: + Que querião d'alli, ou a que vinhão? + Ou se restituições algumas tinhão? + Que trazia hum arrocho exp'rimentado, + Para lhes acabar aquelle fado. + E depois de molhar a sua sopa, + Impoz pela manhã, com vento em pôpa, + As duas cousas más, e nesse dia + Á familia pagou igual quantia. + + Tambem em Campolide hoje acontece + Hum caso, que aos das velhas se parece. + Pois houve hum pobre alarve, que morrêo, + E a seu filho em fantasma appareceo, + Determinando a venda de huma vacca, + Para pagar o panno da borjaca, + Que escava ao mercador inda devendo, + Por cuja causa andava padecendo. + O filho foi fallar-lhe, por esperto, + Porém veio de lá de horror cuberto; + Cahio na cama trémulo, e doente, + Que inda concorre a ir vêllo muita gente. + + As cousas más serão cousa mui boa, + Huma vez que appareção por Lisboa; + Porque havendo nas casas esta fama, + Foi-se dos Senhorios a derrama, + Que vão a excesso tal subindo a renda, + Que não ha já com casas quem se entenda; + E se o inquilino pede huma equidade, + Tirão-lhe seis tostões por caridade. + Porém motins de noite nos sobrados, + Fantasmas de lençoes pelos telhados, + Deitada a fama destas pataratas, + Só assim se acharão casas baratas. + + Eu vejo das Tafulas a mania + No luxo, com tão grande bizarria, + Que parece, que perdem da lembrança + Da vida á morte a funebre mudança; + Engolfadas na moda dos vestidos, + Nas guarnições, nos fôlhos, e franzidos, + Não lhes vem hum instante ao pensamento + Da guerra, fome, e peste o abatimento. + Quem vê, que pelo mundo ha destes p'rigos, + Deve temellos mais, como castigos + Das vaidades, caprichos, soberbias, + Desmazelos, excessos, fantasias; + E pôr a tanto luxo hum meio termo, + Que serve de enfeitar hum corpo enfermo. + O tempo em consumir-nos he veloz, + Não respeita Toukins, Rendas, Filós; + He preciso pensar, com seriedade, + N'um tempo de huma tal calamidade! + Reformando-se vidas, e costumes, + Que este tempo não he de antigos Numes, + Huns fabulosos Deoses, que illudião + Os povos, que a seu gosto he que os fazião. + Vigia sobre nós a MÃO ETERNA, + Que nos castiga, ampara, e nos governa; + Escandaliza aos olhos da razão, + Tanta desenvoltura, e perdição. + + Tocando nas que são de baixa esfera, + Esta gente tambem não se modera; + Raparigas de brutos o retrato, + Nutridas só, de vicios, sem recato, + Criadas sem algum regulamento, + Nem querem trabalhar para o sustento; + Não buscão de servir decentes meios, + Não querem aturar genios alheios; + Quando muitas, que em casas tem servido. + Fortunas tem achado, e bom marido; + Mas querem exceder os seus limites, + Sustentar luzimentos, e appetites, + Nos péssimos int'resses embebidas, + Se fazem desgraçadas, e perdidas, + Máos exemplos de Mãis, Pais inhumanos, + He que põem estas tristes em taes damnos; + A Mãi, que a filha achar por manha tonta, + Huma tunda lhe dê, por minha conta. + + Vejo muitas Senhoras pela rua, + Como se andassem pela casa sua, + De sáia, e de jaleco sem mais nada, + A cabeça composta de palhada, + Na mão o indispensavel, n'outra o leque, + Andando como doudas, téque téque: + E isto sempre com tal desembaraço, + Que hum passo não alcança o outro passo. + Sem chaile, manta, capa, nem capote, + Tendo a desenvoltura por hum dote: + Perdida assim aquella gravidade + Das sérias Portuguezas d'outra idade. + Não digo, nem direi que he uso em todas + Os excessos ridiculos das modas, + Inda ha muitas familias commedidas, + Honestas, sérias, graves, bem regidas. + Fallo da que na rua encontro só, + Sem Mãi, tia, cunhada, nem avó: + Bem como a expatriada taverneira, + Que partio do seu reino aventureira, + Para pôr em Lisboa em qualquer parte + Tasca com hum fogão, e hum estandarte; + E que sem mais decencia, nem reparo, + Vai ás praças comprar o seu preparo, + Com vestido de chita, nús os braços, + Touca de folhos liza, ou com seus laços. + Por isto os homens todos mais se atrevem, + Quando fallando estão, ou quando escrevem + Contra hum sexo, que sempre foi perfeito, + Mas que em parte vai tendo algum defeito + Nos trajes, que adoptou á estrangeira, + Com a capa de ser tudo á ligeira. + + Ah mantos, mantos! tempo abençoado, + Em que tudo se via respeitado! + Inda que ouço dizer a alguns espertos, + Que os olhos estão hoje muito abertos. + Tomára perguntar-lhes: Que tivemos + Desta grande esperteza, que hoje vemos? + Andarem raparigas pelas praças + De noite, e dia expostas a desgraças? + Mãis, e filhas chegando a tal estado, + Que não temem do mundo o máo olhado? + Agourar os cometas, que apparecem? + Vêr Balões, que no ar desapparecem? + Não dar credito a nada, que se lê; + Porém dos Repertorios fazer fé? + Viver de muitas tramas, e illusões? + Usar-se pantalonas por calções? + O cabello sem pós, chapéo redondo? + Fallar, sem fundamento, com estrondo + Nos Barcos de vapôr, e seu destino? + No rapé ordinario, grosso, e fino? + Não me devo metter n'outras materias; + A decencia me pede lhes dê ferias. + E viviamos nós tão atrazados? + Traziamos os olhos bem fechados! + Porém não sei de que he que quando havião + Esses olhos, que d'antes não se abrião, + Havia a boa fé, humanidade, + Consciencia, moral, honestidade, + Nos Officios Divinos devoção, + Sério, respeito, boa educação: + Disto nascião genios de ternura, + Juizo, compaixão, amor, candura; + Hoje notão-se, como raridades + Encontrarem-se destas qualidades. + Por todo o mundo espiritos inquietos + Andão-se levantando como insectos, + Não abração a paz, nem o socego, + O de olhos mais abertos anda cego, + Sendo desta mania o fim primeiro + O saciar de sangue, e de dinheiro. + + Portugal, Portugal! eu te lastimo, + Porque he tudo verdade quanto exprimo! + Eu vejo homens casados namorando, + Que se vão por solteiros inculcando; + Ás mulheres dos mais arrastão aza, + E ardem se o mesmo mal lhes vai por casa, + Sem se lembrarem que estas influencias + Trazem comsigo tristes consequencias, + E que fazer aos mais nunca devemos + O que para nós outros não queremos. + + Eu vejo huma menina das d'agora, + Que por casar não quer estar hum' hora, + E que inda que naufrague, e vá ao fundo + Parece-lhe fugir-lhe já o mundo; + Que até já de doze annos vejo muitas + Fazendo aos chichisbéos certas perguntas, + Dirigidas sómente a casamento, + Que ás vezes se converte n'hum tormento; + Quando algum dia poucas se casavão, + Em quanto os dezenove não contavão. + Mas que ha de ser, se a mãi de pequeninas + Quer que pisquem os olhos as meninas! + E fica por gracinha da criança + O saber namorar muito em lembrança. + Com esta educação se desenvolvem, + Té que de graça a sério se resolvem, + E sem que esperem ser fruta do tarde, + Vão sujeitar-se ao jugo (Deos as guarde.) + + Eu vejo certos genios de Senhoras, + Que variando estão todas as horas, + Muito doudas no modo de pensar, + Por isso bem não podem acertar. + Se adormecem mui fixas n'hum intento, + Acordão já com outro pensamento: + Fazem desta inconstancia mesmo alarde, + O que são de manhã, não são de tarde. + Em muitas se descobre este defeito, + O qual tomão os homens muito a peito; + Porque não sabem, vendo esta incerteza, + Quando a mulher he falsa, ou tem firmeza, + Quando zomba, entretem, ou falla serio, + Ou se anda louca, de juizo aério. + + Vejo algumas de genio impertinente, + Que postas a fallar matarão gente + Com gritos, que se mettem nos ouvidos, + Que muitas ensurdecem os maridos. + Surdos devião elles todos ser, + Para o luxo das filhas, e mulher, + Prendas, e dotes n'huma Dama boa + No luxo não estão, sim na pessoa. + Nossas avós, que em moças se casárão, + De luxo com excesso não usárão; + E se alguma comsigo mais gastava, + Lindas sedas do Reino he que comprava: + Das quaes, inda depois de ser usadas, + Se fazião cubertas aceadas; + E não podre filó com bordadura, + Que tres, quatro lavagens só atura, + Comprado por hum mimo rico e guapo, + Que no fim de seis mezes he hum trapo; + E o dinheiro a cahir pela invenção, + Apezar da barriga não ter pão. + Luxo no frontespicio he que apparece, + Em tudo o mais pobreza se conhece. + + Tambem do compromisso he a partida: + E porque a gente seja bem servida, + Vêm o opio do chá tambem por luxo, + Ou agoa quente de enxagoar o buxo; + Que não passando de agoa, e de fatia, + Leva hum par de tostões: quem tal diria! + E para que se bote a conta a tudo, + Vamos vêr o que leva por miudo. + Aparelho aceado, igual bandeja, + Porque o brio da casa alli se veja: + Perola, Aljôfar, ou Hisson, e Uxim; + Carvão, manteiga, e assucar não ruim; + Criadas de trazer, e de levar; + Agoa a ferver até isto acabar. + Anda a Dona da casa sem descanço + Dando por toda a copa o seu balanço; + Se de humas cousas tem, ha de outras falta; + No aparelho o gatinho ás vezes salta; + O estrondo, que elle faz, ouve-se fora, + Parte á cozinha em sustos a Senhora: + Vê seis, ou sete chavanas quebradas, + E por desgraça são das emprestadas. + Dá co'hum páo na criada, e mais no gato; + Põe-se a moça a chorar, juntando o fato. + Este o risco, este o trem, he esta a lida, + Para pão com manteiga, agoa fervida! + Ah tempos, tempos! Como estaes mudados! + Onde estão as merendas dos estrados? + Onde a crespa salada, e a ella junto + O saboroso paio, o bom presunto? + Perdeste, Portugal, costumes taes, + E com elles perdeste os cabedaes! + Querendo só com chá em abundancia, + Que he tudo fórma, e nada de substancia, + Crear todo o vigor, de que careces + Nestas enfermidades, que padeces. + + Vejo tambem Senhoras mui teimosas, + E nas teimas, que tem, tão caprichosas, + Que por levarem só a sua avante, + Levantão testemunhos n'hum instante. + Accelerão-se, gritão, e esbravejão, + Só porque accreditadas melhor sejão. + Se alguem as desmentio, temos historia, + He offensa, que fica de memoria; + Porque quem commetter tal attentado, + Conte ficar por ellas mal olhado; + Que huma mulher tem tanto de extremosa, + Compassiva, amoravel, carinhosa, + Como tem de raivosa, e vingativa, + Delirante, indomavel, cega, e altiva, + Se offendida se vê, ou tem ciume, + Parece que dos olhos lhe sahe lume, + E n'hum tal frenesi a pobre cai, + Que d'alli a morrer mui pouco vai. + Tambem as modas lhes vão dando a morte; + Pois vejo-as em Janeiro áspero, e forte, + De panninho, e de chitas armadinhas, + De caças, de filós, ou de sedinhas: + De dia em dia passão constipadas, + Por isso vemos tantas descoradas, + Com dôr de peito, com tossinha secca, + Com pertinazes dores de enxaqueca. + O homem no anno tem quatro estações; + As Senhoras não tem senão verões. + Elles abafão-se, ellas põem-se á fresca; + Que he quando o reumatismo mais se pesca. + Algum dia o baetão, panno, ou veludo + Da Senhora era o trajo mais sisudo, + Com que de inverno andava reparada + Dos grandes frios, e áspera geada; + E inda, além de ser isto uso decente, + Raras vezes se via huma doente, + Hoje agoas ferreas, ares de Bemfica, + Banhos de mar, remedios de botica, + Vão as Senhoras pondo em tal frescura, + Que vão fartas de fresco á sepultura. + + Ora pois, Portugal, eu te lastimo! + E só para teu bem he que te intimo, + Visto haver já mui pouco quem te entenda, + Que tenhas nos abusos mais emenda. + Quem a qualquer faisca acode logo, + Não vê arder em casa hum grande fogo. + Talvez por eu dizer isto, que sinto, + Apezar de saber-se que não minto, + Muita gente dirá que cuide em mim: + Que deixe Portugal, e o Mundo assim; + Que por mais que me empenhe na reforma, + O Mundo não se afasta desta norma. + Eu isso lhe concedo, não lho nego; + Porém se em verso, e prosa assim lhe prégo, + He para no sermão fazer-lhe certo + Que o sei conhecer bem, e bem de perto. + + E tu, ó Portugal, se inda te illudes, + Os vicios confundindo co'as virtudes, + Enlevado na moda, e nos abusos, + Esquecido dos teus antigos usos, + Filosofias novas não abraces, + Com estes modernismos não te enlaces; + Modifica os costumes, que te arrastão, + Que inda o pouco, que tens, isso te gastão: + Faze que resuscite de huma vez + O honrado, e bom caracter Portuguez: + Faze que as Bellas Letras possão inda + Mostrar aos nacionaes a face linda, + Que raiando de novo, como a Aurora, + Dêm aos genios enfermos a melhora. + E talvez possa então a mocidade + Criar-lhes mais amor, mais amizade; + Que n'hum espasmo tal, nesta inação + De tão perniciosa educação, + A tudo, quanto he bom, se perde o gosto, + Nem de hum livro se lê sequer o rosto. + + A mesma encantadora alta Poesia + Appreço já não tem, como algum dia: + Então era por todos estimada; + Hoje está, como tudo, desgraçada. + Feliz tempo de antigos Portuguezes! + Camões, Sá de Miranda, Sá Menezes; + Hum Castilho, huns Andrades, hum Ferreira, + Castro, Teive, Bernardes, e Silveira; + George de Monte-Mór, Franco Barreto, + Do almo Virgilio Traductor completo; + Candido Lisitano Mestre da Arte, + Hum Bacellar, que em meu louvor tem parte; + Hum Matos Traductor do grande Tasso, + Educado das Musas no regaço; + Homens de gosto, de arte, e natureza, + Honra da Lingoagem Portugueza! + Nos escriptos de então se descobria + A sentença, a doçura co' a harmonia. + Mais proximos a nós muitos respeitão + Outros mil, cujas obras nos deleitão: + Hum Tarouca, hum Penalva, hum Ericeira, + De quem a alada Fama he pregoeira; + Hum Gregorio de Matos bem sabido, + Hum Alexandre, hum Pinto Renascido, + Frei Simão, nos seus versos implicado + Com este Renascido mal fadado; + Hum Lobo Leiriense, Cunha, e Pina, + Hum Padre Bras, que em graça não declina; + Hum Duarte Ferrão muito erudito, + Que produzio o Metrico Palito; + (Se delle o proprio nome este não he, + Conheça-se em Reitor da Nazaré;) + Hum Brito de Vianna, hum Meliseu, + Pimenta jovial no que escreveu; + Hum Vilella, hum Basilio, hum Paradiz, + Hum Gonzaga, hum Garção, douto Diniz; + Claudio, Quita, Alvarenga, Hum Amaral, + Hum Bandeira bastante social; + O Sabio, e inimitavel Tolentino, + Que aprendeo a viver no seu ensino; + Bocage, Pimentel, Curvo Semmedo, + O actual Orador Padre Macedo; + Hum Padre Nascimento, hum Quintanilha, + Com quem Apollo fez igual partilha; + Dias em Bellas Letras eminente, + Figueiredo no Cómico eloquente; + Hum Torres, hum Massuellos, Lara, Azedo, + Moraes, e outro estimavel Figueiredo: + Cujos Nomes a Febo enchem de gloria, + A Fama os leva ao Templo da Memoria. + + Matos, que desde a idade juvenil + Se casou com a Musa Pastoril: + Tudo quanto escreveo hoje se preza; + Por mostrar huma rara natureza. + Dois Ribeiros, Brandão, hum vago Lobo, + Que de critico a fama lhe não roubo; + O celebrado Abbade de Jacente, + Hum Theodoro com elle contendente; + Hum Caldas Brazileiro, no improviso + Engraçado, modesto, e com juizo: + Sempre em qualquer assumpto discorria, + Deixando, satisfeita a companhia: + Se delle algum rival ha por desgraça, + Aponte-me segundo, que isto faça! + + Dois Barunchos, Otone, e mais Coutinho, + Que acertárão das Musas no caminho; + Hum Medina, hum Novaes, Maya, e Delgado; + Hum Bersane no Lirico affamado, + Severino, e Soares Portuense, + Hum Maximo, que o iguala, se o não vence; + Hum engenhoso Barros, que em viveza + Prodigio mostra ser da natureza; + Hum Cabral Transmontano ás Musas dado, + Nobrega, que viveo tão desgraçado; + Hum Guerreiro, e Belmiro, que honra o Douro: + Todos a C'rôa tem do Febeo Louro. + + Mais tres Vates, a quem faltou a vista, + (Que remedio não ha, que lhe resista.) + Hum Thomaz, hum Martins, novo Castilho, + Qualquer delles de Apollo digno filho. + Mas se dos olhos toda a luz perdêrão, + No juizo outras luzes accendêrão. + Hum Araujo, hum Lopes, hum Moniz, + Mayo e Lima, que já ferir me quiz: + Que inda apezar do ataque, que me fez, + Jamais de o elogiar perderei vez; + Que ataques de Poeta, inda os maiores, + Como foguetes são de jogadores. + Estes Genios harmonicos, que pinto, + Lá no Premesse tem lugar distinto, + + Hum Durão Padre Mestre Graciano + Com Estro divertido Americano. + Serra, Ferreira Lobo, o bom Forjaz, + E o Beneficiado Velho Vaz + (O consoante aqui me deo conselho, + Para pôr Velho Vaz, e não Vaz Velho.) + O Conego José São Bernardino, + Filho tambem de Apollo, homem de tino; + Campello, os dois Malhões, Mello, e Raposo, + Carvalho, igual ao jovial Barroso; + H[~u] Costa, h[~u] Bingre, h[~u] Camera, h[~u] Verné, + Quintella, Xavier, Padre Soye. + Dois Botelhos Professo, e Secular, + Hum Antonio Ricardo, hum Aguiar. + Estes Vates, que aponto, se conhecem, + E huma eterna saudade nos merecem: + Qualquer delles crédor de melhor sorte, + «E outros, em quem poder não teve a morte.» + Quasi todos nas obras, que deixárão, + Seus Nomes sem vaidade eternizárão. + Destes Vates mui poucos vivos são, + E todos elles honrão a Nação. + Confesso que hoje tenho a maior gloria + Em trazer estes Genios á memoria. + Mas que serve escrever grandes volumes, + Se estão prevaricados os costumes! + Quatro velhos, que lêm estes Authores, + São os que inda lhes dão justos louvores; + Que estes meninos de hoje (coitadinhos!) + Estudão n'outras classes de livrinhos, + Livrinhos, com que o demo quiz campar, + Para as bolsas de todo entisicar. + Pouca gente conhece, ou avalia + O trabalho, que dá qualquer Poesia. + Lêr, e rir bem se vê não custar nada; + Compor empreza foi sempre arriscada; + E por isso estimar-se mais se deve + A penna, que em qualquer assumpto escreve. + + Portugal, Portugal! eu te lastimo, + Se com verdades taes te não animo! + Sem se lêr, nada bom póde fazer-se; + Edificios não ha sem alicer-se. + Quem lê, e estuda a fundo sem jactancia, + Dissipa as densas nuvens da ignorancia. + Se já puzeste as Armas em descanco, + Vai dar nas Livrarias hum balanço: + Escolhe, compra, e lê; porque a lição + Ha de accender-te as luzes da razão: + Ella ensina, interessa, ella diverte, + E póde dar juízo ao mais inerte. + E se, seguindo a ordem, que me espera, + «Eu nunca mais serei quem d'antes era,» + Recordando o que eu digo alguns instantes, + Portugal, tu serás qual eras d'antes. + + + * * * * * + + _As cousas todas veja aqui mudadas + Em tristes as que ledas ser soyão + As tristes muito mais tristes tornadas._ + Bernard. Cart. VI. + + +SONETO. + + Soffreo Lysia hum Tremor de terra horrendo,[5] + Seguio-se-lhe depois Traição ferina,[6] + Rebateo de hum Leão furia, e rapina,[7] + E pouco a pouco foi a fronte erguendo:[8] + Por morte do seu Rei ficou gemendo,[9] + E o Céo, por consolalla, lhe destina + Soberana immortal quasi divina,[10] + Que em paz o Povo seu ficou regendo: + Hum Monstro de ambição, e de vingança[11] + Surge do centro do sulfureo Averno, + Perde a Europa o equilibrio da balança: + Restaura Portugal seu bom Governo; + Mas não vêr o seu Rei!.. Esta lembrança[12] + O põe banhado em pranto, e em luto eterno. + + + + +Ao Author se mandou pelo Correio carta sem nome, datada de 22 de Julho +do presente anno de 1819, na qual se lhe pedia, com o maior empenho, +quizesse decifrar o seguinte Epitaphio enigmatico; e que na primeira +Obra, que désse á luz, puzesse a sua definição. + +Suspeita-se porém que a carta veio de pessoa gorda; e ou fosse escrita +por basofía, ou por divertido ataque ao Author, seja qual for o motivo, +elle vai a satisfazer. + + _Epitaphio Enigmatico._ + + Ci git le fils, ci git la mere, + Ci git la fille avec le pere, + Ci git la soeur, ci git le frere, + Ci git la femme, et le mari, + Et ne sont que trois corps ici. + +Responde o Author: Que logo que o filho seja hermaphrodito, temos neste +aborto da natureza filho, e filha, irmão, e irmã em hum corpo só. No +pai, e mãi temos marido, e mulher, que são dois corpos: por morte de +todos, jazem só tres no tumulo. + +Por outra: Tendo hum homem huma filha, e deíxando-a ainda criança, para +ir viajar, quando voltou, casou com ella, por hum acaso, ignorando +ser a mesma, que deixou de pequenina; e vindo a ter hum filho della, e a +morrer todos tres pela ordem do tempo, indo todos á mesma sepultura, +fica bem claro que alli se achão filho, e mãi, filha, e pai, irmão, e +irmã, mulher, e marido, tudo em tres corpos. + +Estimará o Author ter acertado, ou que algum dos seus curiosos Leitores +descubrão melhor intelligencia, com tanto que não seja a que vem +explicada no primeiro tomo do Divertimento de Estudiosos pag. 59, onde +se acha este mesmo Enigma mais resumido; porque aponta, seis pessoas, e +dá enterrados só dois corpos, como se vê no seguinte: + + Cy gist le pere, cy gist la mere, + Cy gist la soeur, cy gist le frere: + Cy gist la femme, e le mary; + Et n'y a que deux corps icy. + + _Divertim. de Estud. Tom. I. pag. 59._ + +Agora roga o Author ao Amigo, que lhe escreveo a mencionada carta, +queira decifrar-lhe tambem os Enigmas, Advinhação, e Charades, que se +seguem, e que se não tirárão de Livros. + + +_1.º Enigma._ + + Eu sou hum Mundo sem gente, + Figuro em qualquer trabalho; + Humas vezes não sou nada, + Outras vezes muito valho: + Eu entro no Purgatorio, + E tambem vou ao Inferno, + Entrada tenho no Ceo, + E estou ao lado do Eterno: + Os Anjos de mim dependem, + Os Virtuosos, e os Santos; + No Mundo, sem ser aranha, + Ando sempre pelos cantos. + + O que isto será * + O Leitor o dirá. * + + +_2.º Enigma._ + + Vinte e hum homens se embarcárão, + Temporal os apanhou; + Morrêrão vinte afogados, + Temos hum, que se salvou: + Este seguio a viagem; + Mas comsigo sempre achou + A conta dos mesmos vinte, + Com que na praia embarcou; + Que por sinal de amizade, + Que sempre se praticou, + Alguns as mãos apertavão + Aos socios do que escapou. + + Desejava-se saber * + Dos vinte quaes vem a ser. * + + +_3.º Enigma._ + + Comprárão-se doze, + Mas seis estruidos, + E forão por doze, + Os seis repartidos: + Com partes iguaes + Os doze ficárão; + Porém os perdidos + Aqui não entrárão: + E faz esta conta + Ser certa, e ser boa, + Caber huma inteira, + A cada pessoa. + + Para melhor perceberes * + Resta saber soletrar; * + Depois disto conheceres, * + Luzes podes alcançar * + Vastas, para me entenderes. * + + +_Adivinhação._ + + Julgão-me todos riqueza, + Porém ando esfrangalhado; + E quem me vê neste estado, + He que mais me estima, e preza: + Minha mulher, sem benzer + De quebranto, os mais defende; + E quem de mófas se offende, + A vai a outro off'recer: + O ser branco, ou ser vermelho, + Não me faz algum destrôço; + Tanto me estimão em moço + Como depois que sou velho. + + Fita os olhos no que digo, * + Gostarás disto comigo. * + + +1.ª Charade. + + Se o principio do meu nome + Vem d'Astro de claridade, + He bem, que, sendo celeste, + Seja o meio a caridade: + E que o fim, de igual razão, + Vos denote a compaixão; + Vindo unido a defender, + Vossa vida, e vosso ter. + + Solta as redeas ao discurso, * + Dá combinação, ás cousas; * + Do Sabio he este o recurso. * + + +2.ª Charade. + + A primeira, e segunda he mui veloz; + Sendo aguda a terceira afflige, e mata; + E quem reúne as tres, faz-se hum algoz. + + Cabe na mente do esperto * + Saber o quanto te digo; * + Dorme, sahirás deste apêrto. * + + ====== + + Amigo, escusas cançar-te; + Por ter de ti compaixão, + Nos versos, que tem estrella, + Acharás a explicação. + + Se Acrosticos não entendes, + (O que não he natural,) + He por que tens a cabeça + Formada de pedra, e cal. + + + + +CATALOGO + +_Das Obras impressas de José Daniel Rodrigues da Costa._ + + * Rimas I. e II. Tomo. + * Theatro Cómico de pequenas Peças. + * Almocreve de Petas, dividido na 2.ª impressão, em 3 Tomos. + * Comboi de mentiras. + * Espreitador do Mundo novo, em que vem as 6 partes dos Opios. + * Barco da Carreira dos tôlos. + * Jôgo dos Dotes. + * Hospital do Mundo. + * Camera Optica. + * Tribunal da Razão. + * Revista dos Genios. + * Roda da Fortuna. + * Os Enjeitados da Fortuna. + * O Poema do Balão aos Habitantes da Lua. + * E esta de Portugal enfermo por vicios, e abusos. + +_Do mesmo Author se imprimírão avulsos os Folhetos seguintes._ + + * Quadras alegres aos Annos do Serenissimo Senhor D. Pedro Carlos, + em 1804. + * Quintilhas ao mesmo Senhor, em 1805. + * Ditas ao mesmo assumpto, em 1806. + * Quadras divertidas ao mesmo, em 1807. + * Espelho de jogadores. Este Folheto vem tambem impresso na Revista + dos Genios. + +_Obras do mesmo Author, impressas do anno de 1808 por diante, ao vasto, +e calamitoso assumpto da invasão dos Francezes em Portugal._ + + * Protecção á Franceza I. e II. Parte. + * Partidista contra Partidistas. + * Resposta á Proclamação, que em Hespanha fez o General Augereau. + * Cantigas Patrioticas. + * Surriada a Massena I. e II. Parte. + * Conversação Nocturna das Esquinas do Rocío de Lisboa. + * Carta de parabens, com hum Dialogo dos dois Generaes Francezes + Filippon, e Bertier. + * Encontro na Eternidade dos dois Generaes Francezes Marmont, e Bonnet. + * Silva ao memoravel Lord Wellington. + * Testamento engenhoso do Dom Quixote da França, ao partir para a + Russia. + * Canto funebre na sentida Morte da nossa Soberana a Senhora D. + MARIA I. + + + * * * * * + +As pessoas curiosas podem esperar pela Parte II. desta Obra, para +poderem então mandalla encadernar, junta com o Poema do Balão aos +Habitantes da Lua, que assim lhes ficará hum Livro de 8.º completo. + +_Vende-se esta Obra na Loja de Francisco Xavier de Carvalho, defronte da +Rua de S. Francisco da Cidade; na de Antonio Manoel Polycarpo da Silva, +junto ao Senado; na de Antonio Xavier Moreira, da Impressão Regia +debaixo da Arcada; na de João Henriques, no principio da Rua Augusta; na +de Antonio Pedro, na Rua do Ouro; na de Luiz José de Carvalho, aos +Paulistas; e em Belém, na da Viuva de José Tiburcio. Preço 240 réis._ + + * * * * * + + [1] ... A desejada vinda dos nossos Soberanos. + + [2] _Ameijoadas_, são noites perdidas: tirada esta palavra do + Diccionario novo dos Tafues. + + [3] _Patusca_, palavra tirada do mencionado Diccionario apenso. + + [4] Hum tremor imaginario, com que em 20 de Agosto do presente anno + de 1819 se intimidou parte do Povo de Lisboa, tomando em diverso + sentido o que lhes dizia o Reportorio naquelle mez. + + [5] O grande Terremoto do 1 de Novembro de 1755. + + [6] O horroroso attentado na infausta noite de 3 de Setembro de + 1758. + + [7] A guerra da Hespanha contra Portugal em 1761. + + [8] A reedificação da Cidade de Lisboa. + + [9] A morte do sempre memoravel Rei o Senhor D. JOSÉ I. + + [10] O feliz Reinado da Fidelissima Senhora D. MARIA I. + + [11] O Tyranno do Mundo, assollador dos Povos, Napoleão Bonaparte. + + [12] O nosso amabilissimo Monarcha o Senhor D. JOÃO VI. + + + + +Notas de transcrição: + +O texto aqui transcrito, é uma cópia integral e inalterada do livro +impresso em 1819. + +Mantivemos a grafia usada na edição impressa, tendo sido corrigidos alguns +pequenos erros tipográficos evidentes, que não alteram a leitura do texto, +e que por isso não considerámos necessário assinalá-los. Mantivemos +inclusivamente as eventuais incoerências de grafia de algumas palavras, em +particular quanto à acentuação. + +Nesta versão electrónica, em texto simples, não é possível representar +alguns caracteres usados no livro impresso. Usamos como substituto desses +caracteres os seguintes marcadores: + +[~u] = u com til por cima, corresponde aproximadamente a "um"; + + + + + + + +End of the Project Gutenberg EBook of Portugal enfermo por vicios, e abusos +de ambos os sexos, by José Daniel Rodrigues da Costa + +*** END OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK PORTUGAL ENFERMO POR VICIOS *** + +***** This file should be named 31743-8.txt or 31743-8.zip ***** +This and all associated files of various formats will be found in: + https://www.gutenberg.org/3/1/7/4/31743/ + +Produced by Pedro Saborano (produced from scanned images +of public domain material from Google Book Search) + + +Updated editions will replace the previous one--the old editions +will be renamed. + +Creating the works from public domain print editions means that no +one owns a United States copyright in these works, so the Foundation +(and you!) can copy and distribute it in the United States without +permission and without paying copyright royalties. Special rules, +set forth in the General Terms of Use part of this license, apply to +copying and distributing Project Gutenberg-tm electronic works to +protect the PROJECT GUTENBERG-tm concept and trademark. Project +Gutenberg is a registered trademark, and may not be used if you +charge for the eBooks, unless you receive specific permission. If you +do not charge anything for copies of this eBook, complying with the +rules is very easy. You may use this eBook for nearly any purpose +such as creation of derivative works, reports, performances and +research. They may be modified and printed and given away--you may do +practically ANYTHING with public domain eBooks. Redistribution is +subject to the trademark license, especially commercial +redistribution. + + + +*** START: FULL LICENSE *** + +THE FULL PROJECT GUTENBERG LICENSE +PLEASE READ THIS BEFORE YOU DISTRIBUTE OR USE THIS WORK + +To protect the Project Gutenberg-tm mission of promoting the free +distribution of electronic works, by using or distributing this work +(or any other work associated in any way with the phrase "Project +Gutenberg"), you agree to comply with all the terms of the Full Project +Gutenberg-tm License (available with this file or online at +https://gutenberg.org/license). + + +Section 1. General Terms of Use and Redistributing Project Gutenberg-tm +electronic works + +1.A. By reading or using any part of this Project Gutenberg-tm +electronic work, you indicate that you have read, understand, agree to +and accept all the terms of this license and intellectual property +(trademark/copyright) agreement. If you do not agree to abide by all +the terms of this agreement, you must cease using and return or destroy +all copies of Project Gutenberg-tm electronic works in your possession. +If you paid a fee for obtaining a copy of or access to a Project +Gutenberg-tm electronic work and you do not agree to be bound by the +terms of this agreement, you may obtain a refund from the person or +entity to whom you paid the fee as set forth in paragraph 1.E.8. + +1.B. "Project Gutenberg" is a registered trademark. It may only be +used on or associated in any way with an electronic work by people who +agree to be bound by the terms of this agreement. There are a few +things that you can do with most Project Gutenberg-tm electronic works +even without complying with the full terms of this agreement. See +paragraph 1.C below. There are a lot of things you can do with Project +Gutenberg-tm electronic works if you follow the terms of this agreement +and help preserve free future access to Project Gutenberg-tm electronic +works. See paragraph 1.E below. + +1.C. The Project Gutenberg Literary Archive Foundation ("the Foundation" +or PGLAF), owns a compilation copyright in the collection of Project +Gutenberg-tm electronic works. Nearly all the individual works in the +collection are in the public domain in the United States. If an +individual work is in the public domain in the United States and you are +located in the United States, we do not claim a right to prevent you from +copying, distributing, performing, displaying or creating derivative +works based on the work as long as all references to Project Gutenberg +are removed. Of course, we hope that you will support the Project +Gutenberg-tm mission of promoting free access to electronic works by +freely sharing Project Gutenberg-tm works in compliance with the terms of +this agreement for keeping the Project Gutenberg-tm name associated with +the work. You can easily comply with the terms of this agreement by +keeping this work in the same format with its attached full Project +Gutenberg-tm License when you share it without charge with others. + +1.D. The copyright laws of the place where you are located also govern +what you can do with this work. Copyright laws in most countries are in +a constant state of change. If you are outside the United States, check +the laws of your country in addition to the terms of this agreement +before downloading, copying, displaying, performing, distributing or +creating derivative works based on this work or any other Project +Gutenberg-tm work. The Foundation makes no representations concerning +the copyright status of any work in any country outside the United +States. + +1.E. Unless you have removed all references to Project Gutenberg: + +1.E.1. The following sentence, with active links to, or other immediate +access to, the full Project Gutenberg-tm License must appear prominently +whenever any copy of a Project Gutenberg-tm work (any work on which the +phrase "Project Gutenberg" appears, or with which the phrase "Project +Gutenberg" is associated) is accessed, displayed, performed, viewed, +copied or distributed: + +This eBook is for the use of anyone anywhere at no cost and with +almost no restrictions whatsoever. You may copy it, give it away or +re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included +with this eBook or online at www.gutenberg.org + +1.E.2. If an individual Project Gutenberg-tm electronic work is derived +from the public domain (does not contain a notice indicating that it is +posted with permission of the copyright holder), the work can be copied +and distributed to anyone in the United States without paying any fees +or charges. If you are redistributing or providing access to a work +with the phrase "Project Gutenberg" associated with or appearing on the +work, you must comply either with the requirements of paragraphs 1.E.1 +through 1.E.7 or obtain permission for the use of the work and the +Project Gutenberg-tm trademark as set forth in paragraphs 1.E.8 or +1.E.9. + +1.E.3. If an individual Project Gutenberg-tm electronic work is posted +with the permission of the copyright holder, your use and distribution +must comply with both paragraphs 1.E.1 through 1.E.7 and any additional +terms imposed by the copyright holder. Additional terms will be linked +to the Project Gutenberg-tm License for all works posted with the +permission of the copyright holder found at the beginning of this work. + +1.E.4. Do not unlink or detach or remove the full Project Gutenberg-tm +License terms from this work, or any files containing a part of this +work or any other work associated with Project Gutenberg-tm. + +1.E.5. Do not copy, display, perform, distribute or redistribute this +electronic work, or any part of this electronic work, without +prominently displaying the sentence set forth in paragraph 1.E.1 with +active links or immediate access to the full terms of the Project +Gutenberg-tm License. + +1.E.6. You may convert to and distribute this work in any binary, +compressed, marked up, nonproprietary or proprietary form, including any +word processing or hypertext form. However, if you provide access to or +distribute copies of a Project Gutenberg-tm work in a format other than +"Plain Vanilla ASCII" or other format used in the official version +posted on the official Project Gutenberg-tm web site (www.gutenberg.org), +you must, at no additional cost, fee or expense to the user, provide a +copy, a means of exporting a copy, or a means of obtaining a copy upon +request, of the work in its original "Plain Vanilla ASCII" or other +form. Any alternate format must include the full Project Gutenberg-tm +License as specified in paragraph 1.E.1. + +1.E.7. Do not charge a fee for access to, viewing, displaying, +performing, copying or distributing any Project Gutenberg-tm works +unless you comply with paragraph 1.E.8 or 1.E.9. + +1.E.8. You may charge a reasonable fee for copies of or providing +access to or distributing Project Gutenberg-tm electronic works provided +that + +- You pay a royalty fee of 20% of the gross profits you derive from + the use of Project Gutenberg-tm works calculated using the method + you already use to calculate your applicable taxes. The fee is + owed to the owner of the Project Gutenberg-tm trademark, but he + has agreed to donate royalties under this paragraph to the + Project Gutenberg Literary Archive Foundation. Royalty payments + must be paid within 60 days following each date on which you + prepare (or are legally required to prepare) your periodic tax + returns. Royalty payments should be clearly marked as such and + sent to the Project Gutenberg Literary Archive Foundation at the + address specified in Section 4, "Information about donations to + the Project Gutenberg Literary Archive Foundation." + +- You provide a full refund of any money paid by a user who notifies + you in writing (or by e-mail) within 30 days of receipt that s/he + does not agree to the terms of the full Project Gutenberg-tm + License. You must require such a user to return or + destroy all copies of the works possessed in a physical medium + and discontinue all use of and all access to other copies of + Project Gutenberg-tm works. + +- You provide, in accordance with paragraph 1.F.3, a full refund of any + money paid for a work or a replacement copy, if a defect in the + electronic work is discovered and reported to you within 90 days + of receipt of the work. + +- You comply with all other terms of this agreement for free + distribution of Project Gutenberg-tm works. + +1.E.9. If you wish to charge a fee or distribute a Project Gutenberg-tm +electronic work or group of works on different terms than are set +forth in this agreement, you must obtain permission in writing from +both the Project Gutenberg Literary Archive Foundation and Michael +Hart, the owner of the Project Gutenberg-tm trademark. Contact the +Foundation as set forth in Section 3 below. + +1.F. + +1.F.1. Project Gutenberg volunteers and employees expend considerable +effort to identify, do copyright research on, transcribe and proofread +public domain works in creating the Project Gutenberg-tm +collection. Despite these efforts, Project Gutenberg-tm electronic +works, and the medium on which they may be stored, may contain +"Defects," such as, but not limited to, incomplete, inaccurate or +corrupt data, transcription errors, a copyright or other intellectual +property infringement, a defective or damaged disk or other medium, a +computer virus, or computer codes that damage or cannot be read by +your equipment. + +1.F.2. LIMITED WARRANTY, DISCLAIMER OF DAMAGES - Except for the "Right +of Replacement or Refund" described in paragraph 1.F.3, the Project +Gutenberg Literary Archive Foundation, the owner of the Project +Gutenberg-tm trademark, and any other party distributing a Project +Gutenberg-tm electronic work under this agreement, disclaim all +liability to you for damages, costs and expenses, including legal +fees. YOU AGREE THAT YOU HAVE NO REMEDIES FOR NEGLIGENCE, STRICT +LIABILITY, BREACH OF WARRANTY OR BREACH OF CONTRACT EXCEPT THOSE +PROVIDED IN PARAGRAPH F3. YOU AGREE THAT THE FOUNDATION, THE +TRADEMARK OWNER, AND ANY DISTRIBUTOR UNDER THIS AGREEMENT WILL NOT BE +LIABLE TO YOU FOR ACTUAL, DIRECT, INDIRECT, CONSEQUENTIAL, PUNITIVE OR +INCIDENTAL DAMAGES EVEN IF YOU GIVE NOTICE OF THE POSSIBILITY OF SUCH +DAMAGE. + +1.F.3. LIMITED RIGHT OF REPLACEMENT OR REFUND - If you discover a +defect in this electronic work within 90 days of receiving it, you can +receive a refund of the money (if any) you paid for it by sending a +written explanation to the person you received the work from. If you +received the work on a physical medium, you must return the medium with +your written explanation. The person or entity that provided you with +the defective work may elect to provide a replacement copy in lieu of a +refund. If you received the work electronically, the person or entity +providing it to you may choose to give you a second opportunity to +receive the work electronically in lieu of a refund. If the second copy +is also defective, you may demand a refund in writing without further +opportunities to fix the problem. + +1.F.4. Except for the limited right of replacement or refund set forth +in paragraph 1.F.3, this work is provided to you 'AS-IS' WITH NO OTHER +WARRANTIES OF ANY KIND, EXPRESS OR IMPLIED, INCLUDING BUT NOT LIMITED TO +WARRANTIES OF MERCHANTIBILITY OR FITNESS FOR ANY PURPOSE. + +1.F.5. Some states do not allow disclaimers of certain implied +warranties or the exclusion or limitation of certain types of damages. +If any disclaimer or limitation set forth in this agreement violates the +law of the state applicable to this agreement, the agreement shall be +interpreted to make the maximum disclaimer or limitation permitted by +the applicable state law. The invalidity or unenforceability of any +provision of this agreement shall not void the remaining provisions. + +1.F.6. INDEMNITY - You agree to indemnify and hold the Foundation, the +trademark owner, any agent or employee of the Foundation, anyone +providing copies of Project Gutenberg-tm electronic works in accordance +with this agreement, and any volunteers associated with the production, +promotion and distribution of Project Gutenberg-tm electronic works, +harmless from all liability, costs and expenses, including legal fees, +that arise directly or indirectly from any of the following which you do +or cause to occur: (a) distribution of this or any Project Gutenberg-tm +work, (b) alteration, modification, or additions or deletions to any +Project Gutenberg-tm work, and (c) any Defect you cause. + + +Section 2. Information about the Mission of Project Gutenberg-tm + +Project Gutenberg-tm is synonymous with the free distribution of +electronic works in formats readable by the widest variety of computers +including obsolete, old, middle-aged and new computers. It exists +because of the efforts of hundreds of volunteers and donations from +people in all walks of life. + +Volunteers and financial support to provide volunteers with the +assistance they need are critical to reaching Project Gutenberg-tm's +goals and ensuring that the Project Gutenberg-tm collection will +remain freely available for generations to come. In 2001, the Project +Gutenberg Literary Archive Foundation was created to provide a secure +and permanent future for Project Gutenberg-tm and future generations. +To learn more about the Project Gutenberg Literary Archive Foundation +and how your efforts and donations can help, see Sections 3 and 4 +and the Foundation web page at https://www.pglaf.org. + + +Section 3. Information about the Project Gutenberg Literary Archive +Foundation + +The Project Gutenberg Literary Archive Foundation is a non profit +501(c)(3) educational corporation organized under the laws of the +state of Mississippi and granted tax exempt status by the Internal +Revenue Service. The Foundation's EIN or federal tax identification +number is 64-6221541. Its 501(c)(3) letter is posted at +https://pglaf.org/fundraising. Contributions to the Project Gutenberg +Literary Archive Foundation are tax deductible to the full extent +permitted by U.S. federal laws and your state's laws. + +The Foundation's principal office is located at 4557 Melan Dr. S. +Fairbanks, AK, 99712., but its volunteers and employees are scattered +throughout numerous locations. Its business office is located at +809 North 1500 West, Salt Lake City, UT 84116, (801) 596-1887, email +business@pglaf.org. Email contact links and up to date contact +information can be found at the Foundation's web site and official +page at https://pglaf.org + +For additional contact information: + Dr. Gregory B. Newby + Chief Executive and Director + gbnewby@pglaf.org + + +Section 4. Information about Donations to the Project Gutenberg +Literary Archive Foundation + +Project Gutenberg-tm depends upon and cannot survive without wide +spread public support and donations to carry out its mission of +increasing the number of public domain and licensed works that can be +freely distributed in machine readable form accessible by the widest +array of equipment including outdated equipment. Many small donations +($1 to $5,000) are particularly important to maintaining tax exempt +status with the IRS. + +The Foundation is committed to complying with the laws regulating +charities and charitable donations in all 50 states of the United +States. Compliance requirements are not uniform and it takes a +considerable effort, much paperwork and many fees to meet and keep up +with these requirements. We do not solicit donations in locations +where we have not received written confirmation of compliance. To +SEND DONATIONS or determine the status of compliance for any +particular state visit https://pglaf.org + +While we cannot and do not solicit contributions from states where we +have not met the solicitation requirements, we know of no prohibition +against accepting unsolicited donations from donors in such states who +approach us with offers to donate. + +International donations are gratefully accepted, but we cannot make +any statements concerning tax treatment of donations received from +outside the United States. U.S. laws alone swamp our small staff. + +Please check the Project Gutenberg Web pages for current donation +methods and addresses. Donations are accepted in a number of other +ways including including checks, online payments and credit card +donations. To donate, please visit: https://pglaf.org/donate + + +Section 5. General Information About Project Gutenberg-tm electronic +works. + +Professor Michael S. Hart was the originator of the Project Gutenberg-tm +concept of a library of electronic works that could be freely shared +with anyone. For thirty years, he produced and distributed Project +Gutenberg-tm eBooks with only a loose network of volunteer support. + + +Project Gutenberg-tm eBooks are often created from several printed +editions, all of which are confirmed as Public Domain in the U.S. +unless a copyright notice is included. Thus, we do not necessarily +keep eBooks in compliance with any particular paper edition. + + +Most people start at our Web site which has the main PG search facility: + + https://www.gutenberg.org + +This Web site includes information about Project Gutenberg-tm, +including how to make donations to the Project Gutenberg Literary +Archive Foundation, how to help produce our new eBooks, and how to +subscribe to our email newsletter to hear about new eBooks. diff --git a/31743-8.zip b/31743-8.zip Binary files differnew file mode 100644 index 0000000..5f50eb2 --- /dev/null +++ b/31743-8.zip diff --git a/31743-h.zip b/31743-h.zip Binary files differnew file mode 100644 index 0000000..3fc36d0 --- /dev/null +++ b/31743-h.zip diff --git a/31743-h/31743-h.htm b/31743-h/31743-h.htm new file mode 100644 index 0000000..41d39c4 --- /dev/null +++ b/31743-h/31743-h.htm @@ -0,0 +1,2500 @@ +<!DOCTYPE html PUBLIC "-//W3C//DTD HTML 4.01 Transitional//EN" + "http://www.w3.org/TR/html4/loose.dtd"> +<html> +<head> + <title>Portugal enfermo por vicios e abusos de ambos os sexos, por José + Daniel Rodrigues da Costa</title> + <meta name="Author" content="José Daniel Rodrigues da Costa"> + <meta name="Publisher" content="Impressão Regia"> + <meta name="Date" content="1819"> + <meta http-equiv="content-type" content="text/html; charset=iso-8859-15"> + <style type="text/css"> + body{margin-left: 10%; + margin-right: 10%; + } + .pn { + text-indent: 0em; + position: absolute; + left: 92%; + font-size: smaller; + text-align: right; + color: silver; + } + #corpo p{text-align: justify; text-indent: 1em;} + h1 {text-align: center; margin-top: 3em; margin-bottom: 2em;} + h2, h3 {text-align: center;} + h3 {font-size: small;} + a {text-decoration: none;} + #corpo p.sinopse {margin: 0; font-size: small; text-indent: 0;} + hr {border: 0; border-top: solid 1px #000; } + blockquote {margin-left: 10%;} + .rodape { + font-size: 0.8em; + margin: 2em; + } + #corpo .ilustracao p{text-align: center; font-size: small;} +span.accent sup {margin-right: -0.9em; margin-left: 0;} + +/* Opera fix tilde positioning over non utf chars */ +@media all and (-webkit-min-device-pixel-ratio:10000), not all and (-webkit-min-device-pixel-ratio:0) +{ +span.accent sup {margin-right: -0.55em; margin-left: 0; margin-top: 0.1em;} +} + +span.accent sup { .margin-right: -0.5em;} + .fbox {border: solid black 1px; background-color: #FFFFCC; font-size: 0.8em; + margin-left: 10%; margin-right: 10%;} + + </style> +</head> + +<body> + + +<pre> + +The Project Gutenberg EBook of Portugal enfermo por vicios, e abusos de +ambos os sexos, by José Daniel Rodrigues da Costa + +This eBook is for the use of anyone anywhere at no cost and with +almost no restrictions whatsoever. You may copy it, give it away or +re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included +with this eBook or online at www.gutenberg.org + + +Title: Portugal enfermo por vicios, e abusos de ambos os sexos + +Author: José Daniel Rodrigues da Costa + +Release Date: March 23, 2010 [EBook #31743] + +Language: Portuguese + +Character set encoding: ISO-8859-1 + +*** START OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK PORTUGAL ENFERMO POR VICIOS *** + + + + +Produced by Pedro Saborano (produced from scanned images +of public domain material from Google Book Search) + + + + + + +</pre> + +<p> </p> + +<div style="text-align:center;"> +<p style="font-size: 2em;">PORTUGAL ENFERMO</p> + +<p style="font-size: 1.4em;">POR VICIOS, E ABUSOS</p> + +<p style="font-size: 1.6em;">DE AMBOS OS SEXOS.</p> + +<p>DEDICADO AO SENHOR</p> + +<p style="font-size: 1.6em;">JOSÉ LUIZ GUERNER,</p> + +<p>CONSUL DE S. M. SICILIANNA,</p> + +<p>POR</p> + +<p style="font-size: 1.4em;">JOSÉ DANIEL RODRIGUES DA COSTA,</p> + +<p>ENTRE OS PASTORES DO TEJO</p> + +<p style="font-size: 1.4em;">JOSINO LEIRIENSE</p> + +<p> </p> + +<p> </p> + +<p style="font-size: 1.4em;">LISBOA:</p> + +<p style="font-size: 1.4em;">NA IMPRESSÃO REGIA.</p> + +<p>ANNO 1819</p> +<hr style="width: 30%"> + +<p><em>Com Licença.</em></p> +</div> + +<p> </p> + +<p> </p> + +<p> </p> + +<p> </p> + +<div id="corpo"> +<h2>SENHOR JOSE LUIZ GUERNER:</h2> + +<p> </p> + +<p> </p> + +<p><em>Quando comecei a compor esta Obra, intitulada=Portugal Enfermo por +vicios, e abusos=logo me veio á lembrança o dedicar-lha. E approveitando estas +primeiras idéas, foi tal o prazer, que concebi, por huma tão acertada escolha, +que parecia que com mais facilidade, e affluencia me occorião pensamentos para +a ultimar.</em></p> + +<p><em>Eu faria huma injuria á Gratidão, se me lembrasse de outra pessoa para +esta Dedicatoria; quando por experiencia tenho conhecido quanto a sua +curiosidade, applicação, e talentos ambicionão as minhas Producções.</em></p> + +<p><em>Aqui me offerecia agora a minha imaginação hum vasto assumpto, para +tecer-lhe o<span class="pn">{IV}</span> Elogio, que merece hum homem amador das +Bellas Letras, e ornado d'aquellas virtudes moraes, que tanto caracterizão o +verdadeiro homem de bem. Mas fazer das suas apreciaveis qualidades huma extensa +narração, seria dar por nova huma pintura ao mesmo Pintor, que a desenhou.</em> +</p> + +<p><em>O Céo dilate a sua estimavel vida para consolação dos seus amigos; sendo +hum dos que mais o preza, e respeita</em></p> + +<p> </p> + +<p style="text-align: right;"><em>José Daniel Rodrigues da Costa<span +class="pn">{V}</span> </em></p> + +<p> </p> + +<h2>PROLOGO.</h2> + +<p>Nem a vaidade de ser Author, nem a presumpção de exceder os Escriptores do +meu tempo, nem o desvanecimento dos repetidos elogios, que muitas Pessoas me +fazem, serião incentivos bastantes para eu escrever com tanta assiduidade, como +escrevo. Não me ufanão semelhantes apavonações; porque o deixar-me possuir +destes fôfos sentimentos seria em mim huma bem notada mania.</p> + +<p>Devem capacitar-se os meus amabilissimos Leitores que o meu genio, hum pouco +propenso ás Bellas Letras, e mais que tudo, o muito, que prezo quanto he +honesto, e civíl, he que me desafia a desembainhar a espada da Critica contra +os vicios em todas as minhas Obras, acutilando estes, e poupando com tudo os +seus adoradores.</p> + +<p>He por tanto que exponho ao Público esta Obra dos achaques chrónicos, com +que o tempo tem contaminado os antigos, memoraveis, e bem acceitos costumes do +nosso Portugal; que quanto mais se reprehendem os d'agora,<span +class="pn">{VI}</span> tanto maiores elogios se fazem aos passados.</p> + +<p>Tem os vicios, e os abusos chegado ao maior auge na presente época em ambos +os sexos. Não se lhes acha mediania; e neste labyrintho de cousas não fica ao +homem, que bem pensa, mais que os dois refrigerios: ou de chorar, ou de rir dos +destemperos deste Seculo nos excessos, que se observão no luxo, nas educações, +e no viver de agora.</p> + +<p>Com effeito eu vejo os tempos bem desgraçados para composições de qualquer +natureza. Nos principios do Seculo dezoito houve muito quem escrevesse, porque +havia muito quem lêsse; depois ainda houve muito quem lêsse, e menos quem +escrevesse; mas presentemente nem ha quem escreva, nem quem lêa; porque as +minimas cousas, que apparecem, nem essas mesmas se gastão.</p> + +<p>Vamos porém sempre compondo alguma cousa para huma parte da mocidade bem +morigerada, que ainda se encontra tanto nesta Cidade, como por essas +Provincias; Rapazes applicados, de perfeita educação, e que faz gosto ouvillos +na sociedade: com estes me entenderei; em quanto os outros entregues ás +desenfreadas paixões, que os illudem, se fazem verdugos de si mesmos. Sobre +estes he que recahe<span class="pn">{VII}</span> a critica desta pequena +composição, que desenvolve os achaques de Portugal, causados pela epidemia dos +vicios, e abusos de huma grande parte de gente.</p> + +<p>Leitor, perdôa aos defeitos da Obra; mas não perdôes aos teus, para não +seres contado no catalogo dos viciosos: compra, e lê, que he o melhor modo de +saberes quanto isto</p> + +<p> </p> + +<p> </p> + +<p> </p> + +<p style="text-align: right;">Vale.<span class="pn">{VIII}</span></p> + +<p><span class="pn">{1}</span></p> + +<p> </p> + +<h2>PORTUGAL ENFERMO<br> +PELOS VICIOS, E ABUSOS.</h2> + +<div style="margin-left: 30%; font-size: small;"> +<hr> + +<blockquote> + <em>Os escritos que saê da mão fóra<br> + Tantas Sentenças tem, tantos Ledores,<br> + Assim Miranda o canta, assim o chora.<br> + Sempre a verdade achou murmuradores;<br> + A mentira que damna, e lisongea<br> + Sempre (em pouco saber) grandes favores.</em><br> + Bernard. Cart. XV.</blockquote> +<hr> +</div> + +<p> </p> + +<blockquote> + Portugal, Portugal! Eu te lastimo!<br> + E bem que velho sou inda me animo<br> + A mostrar-te os defeitos, e os excessos<br> + Dos costumes, que tens já tão avessos<br> + Dos costumes, que tinhas algum dia,<br> + Quando mais reflexão na gente havia.<br> + Tu de estranhas Nações foste invejado;<br> + Hoje faz compaixão teu pobre estado:<br> + Cada vez te vão mais enfraquecendo,<br> + Todo o brilho, que tinhas, vais perdendo:<br> + Paraiso do Mundo te chamavão;<span class="pn">{2}</span><br> + As mais Nações com tigo se animavão;<br> + Ellas porém ficárão sans, e fortes;<br> + E tu a todo o instante exposto aos córtes<br> + Da usura, da ambição, da falsidade,<br> + Do egoismo, da fuga, da impiedade:<br> + Males, que aos que bem pensão causão tedio,<br> + A que apenas descubro hum só remedio,<br> + Que outro melhor não ha, a que se apelle,<br> + E muita gente chora a falta d'Elle<a name="tex2html1" + href="#foot71"><sup>[1]</sup></a>....<br> + <br> + Portugal, Portugal! Eu te lastimo!<br> + E o pezar, que me causas, mal reprimo!<br> + Estás presentemente na figura<br> + Do enfermo, que não póde com a cura,<br> + Por ter molestias taes tão complicadas,<br> + Que parte das receitas são baldadas.<br> + <br> + Vai aos banhos do mar a Dama bella,<br> + Porque delles precisa, ou por cautela;<br> + O Velho busca estuporado as Caldas,<br> + E alli da mocidade purga as baldas,<br> + Consegue movimento em braço, e perna,<br> + E a perdida cabeça já governa;<br> + Frouxo Taful, que tem debilidade,<br> + Por excessos de toda a qualidade<br> + Recorre ás infusões d'aquacia, e quina;<span class="pn">{3}</span><br> + Mas tambem pouco e pouco se defina,<br> + Se não acautelou mais a saude,<br> + E não tem depois disto quem o ajude;<br> + Todos a tempo buscão curativo,<br> + Para vêr se em seu mal tem lenitivo:<br> + E só tu, Portugal, chegaste a estado<br> + De seres paralitico entrevado!<br> + Todos de fóra vem sangue tirar-te;<br> + Porisso nada póde aproveitar-te.<br> + Os Estrangeiros, que a Lisboa chegão,<br> + Te vem bichas deitar, e todas pegão,<br> + Sempre em proveito seu com abundancia,<br> + Té ficares de todo sem sustancia.<br> + Medicina não sei, mas tenho lido<br> + Dois Livros, que me tem muito instruido,<br> + Hum da propria exp'riencia, outro do mundo,<br> + E só nesta lição he que me fundo,<br> + Para bem conhecer por estes meios<br> + Tanto os achaques meus, como os alheios.<br> + Ora antes que de todo a vida exhales,<br> + Ouve parte da origem de teus males.<br> + <br> + Eu vejo de alguns homens apartados<br> + Os deveres mais puros, e sagrados;<br> + Atropellada a honra, a probidade,<br> + A razão, a decencia, a sãa verdade:<br> + Isto por homens, que apparencias tem<br> + De honrados, de Christãos, de homens de bem<span class="pn">{4}</span><br> + <br> + Eu vejo o feroz crime a garra alçando,<br> + Os trêfegos viventes subjugando,<br> + Só a fim de os trazer ao seu partido,<br> + Deixando o bom caracter corrompido.<br> + <br> + Eu vejo huns indivíduos mui sagazes,<br> + De transtornar os outros bem capazes;<br> + Porque com o systema de egoistas<br> + Ao que os outros possuem botão vistas.<br> + Lanção-lhes rede, rede que não falha,<br> + Peixe grosso, e miudo cahe na malha,<br> + Dizendo-nos depois, como em resposta:<br> + Eu por aqui me sirvo, ou dei á costa.<br> + Que em limpo Portuguez, nada confuso,<br> + He fugir, ou quebrar, como hoje he uso.<br> + Eu sei que hum Guarda-Livros foi chamado,<br> + Para as Contas fazer de hum Ex-quebrado;<br> + E como aquella quebra era segunda,<br> + Não podia acertar-lhe bem a funda.<br> + Té que lhe perguntou com desengano:<br> + Com quanto quer quebrar, Senhor Fulano?<br> + Esta pergunta prova que ha bicheiro,<br> + Que inda que quebre, fica sempre inteiro.<br> + <br> + Eu vejo hoje os amigos desfrutantes,<br> + Palradores de officio, e bem fallantes,<br> + Muito promptos em toda a patuscada;<br> + Porém, em se occupando, tudo he nada,<span class="pn">{5}</span><br> + De função em função, em bons jantares,<br> + Por não ficarem vagos os lugares;<br> + Mas que, se alguem lhes pede algum soccorro,<br> + Virárão logo a peça para fôrro,<br> + Fugindo de valer por amizade<br> + Aos que fôrão da sua sociedade:<br> + Vileza sem igual, que achar não pensa<br> + O que tem hum vexame, ou tem doença,<br> + Que em banquetes largou bastante a pelle,<br> + Para nutrir os que hoje fogem delle.<br> + <br> + Vejo homens, que de seu muito tiverão,<br> + Que de tudo o que tinhão, conta derão<br> + No teimoso valete, sota, e az,<br> + Nos trez dados, que o copo saltar faz,<br> + No grande tratamento afidalgado,<br> + Na sege, no jardim, luzido estado,<br> + Banquetes, sociedades, mancebías,<br> + E outras taes, e quejandas bizarrias:<br> + Tudo feito sem calculo seguro,<br> + Sem minima lembrança do futuro,<br> + Para agora se vêrem sem ter nada<br> + N'huma vida bem triste, e desgraçada.<br> + <br> + Eu vejo outros mesquinhos, e forretas,<br> + Que não passão de velhas meias pretas,<br> + Sua casaca eterna, já virada<br> + No anno, em que a náo Cabrea foi queimada;<span class="pn">{6}</span><br> + Ferrolhando o dinheiro no bahú,<br> + Para que não lho leve belzebu;<br> + Contado, e recontado na alta noite,<br> + Porque a pedir algum ninguem se affoite.<br> + Tudo á porta fechada sós vivendo,<br> + Vestindo muito mal, peior comendo;<br> + E que vive assim bem hum destes pensa,<br> + Ou seja na saude, ou na doença;<br> + Té que toda a reserva finaliza<br> + Nas garras de hum irmão lá de Galliza.<br> + Eis aqui hum dinheiro que não gira,<br> + E por isso a outra gente não respira,<br> + Isto he que faz que toda a casa gema;<br> + Pois outros ricos ha de igual systema.<br> + <br> + Vejo huns homens, que são muito abastados,<br> + E de semblantes sempre carregados;<br> + Caras <em>de sum es fui</em>, mas <em>por causar</em>,<br> + Hum bom modo a ninguem sabem mostrar:<br> + Eu bem sei que quem tem muito dinheiro,<br> + Grosseiro fica sempre, se he grosseiro;<br> + Porque pejada burra de riqueza<br> + Não emenda o que vem de natureza.<br> + Eu chamo a huns homens taes <em>verbos de encher</em>,<br> + Vivem só de ajuntar, e de comer,<br> + De cabeça mais leve do que a escuma,<br> + Gosto não sabem ter por cousa alguma;<br> + Para valer aos mais nunca tem geito,<span class="pn">{7}</span><br> + Para si são <em>Dativo de proveito</em><br> + Taes pinturas; a mal nunca se tomem<br> + O que lêr, e apontar he que he máo homem.<br> + <br> + Portugal, Portugal! eu te lastimo!<br> + E teus flagellos na memoria imprimo!<br> + Eu vejo homens solteiros, sem emprego,<br> + Porém tendo de môças bom conchego;<br> + Parece que por magica he que passão;<br> + Pois sem que diligencia alguma fação<br> + Por grangear a vida, a tudo acodem;<br> + Não sei como nutrir os vicios podem!<br> + Eu trabalho, e não vivo satisfeito;<br> + E elles andão de corpo mui direito,<br> + Mil aproxes fazendo á bolsa alheia,<br> + Sem acharem tal vida indigna e feia.<br> + Hum lhes diz: <em>Eu não posso; outro: não tenho:</em><br> + E a concluir d'aqui sómente venho<br> + Que tem esta comedia por final<br> + Cadêa, Portaria, ou Hospital.<br> + <br> + Eu vejo outros sem rendas, nem officio,<br> + Do Matrimonio entrar no sacrificio:<br> + Marido pobretão, mulher sem nada;<br> + Em crescendo dos filhos a manada,<br> + O mesmo he que ter sella sem cavallo,<br> + Casa sem tecto, e sino sem badalo.<br> + Acabou-se huma cousa, faltão mil,<span class="pn">{8}</span><br> + De dinheiro não ha nem hum ceitil:<br> + Olha hum para o outro, as razões crescem;<br> + Os filhos nús, de fome desfalecem;<br> + Té que o Marido toma o desafôgo<br> + De se ir metter na casa que dá jogo.<br> + Alli se perde a noite quasi toda,<br> + A vêr se de huma vez desanda a roda,<br> + Com as iscas de emprestimos de Amigos,<br> + Que só em casos taes servem de abrigos;<br> + E a familia em cuidados, em tormento,<br> + Que inda he peior que a falta de sustento.<br> + <br> + Eu vejo, nestes tempos desditosos,<br> + Povos empobrecidos, e chorosos;<br> + Pois quando vém hum mal, outros se seguem,<br> + Que os Mortaes atenúão, e perseguem.<br> + Mas a pezar da falta de dinheiro,<br> + Apparece nos bairros o gaiteiro,<br> + As bandeiras nas cordas penduradas,<br> + Por onde as festas são annunciadas,<br> + Tudo feito com lustre, e com grandeza,<br> + Foi Juiza a Senhora Dona Andreza.<br> + Os festeiros não tem nada de seu;<br> + Mas a festa da rua tudo deu.<br> + Anda o velho engraçado co' os Leilões<br> + Dos cargos, que custárão bons tostões.<br> + Temos fogo de vistas, vistas raras,<br> + N'hum beco, que de largo tem tres varas;<span class="pn">{9}</span><br> + Que huma roda, que salta em Fogo ardendo,<br> + Vem desordens fazer nos que estão vendo;<br> + E póde muito bem a propriedade<br> + Com fogo reduzir-se em ametade.<br> + Estes p'rigos não são muito pequenos,<br> + E já tem succedido mais, ou menos.<br> + Nunca vi de dinheiro tanta fome,<br> + Nem tantas festas de despeza, e nome.<br> + Eu louvo, e não crimino a devoção;<br> + Haja festa de Igreja, e bom Sermão;<br> + Tenha a festividade do arrayal<br> + Cousas, que fação bem, e nunca mal.<br> + O dinheiro de máscaras, e fogo<br> + Vá gastar-se com outro desafogo<br> + Mais util, mais vistoso, mais louvavel<br> + Em acudir a tanto miseravel.<br> + Dem rações á pobreza dessa rua,<br> + E a festa christãmente se conclua.<br> + No lugar, em que o fogo armar se havia,<br> + Haja comprida meza neste dia;<br> + Hum, ou dois caldeirões de mantimento,<br> + Que sirvão aos mendigos de sustento,<br> + Ministrados por esses bons festeiros,<br> + Que se fação da meza dispenseiros,<br> + Sem tumulto, em socego, e com cuidado<br> + No cégo, na criança, no aleijado.<br> + Isto he que dá exemplo, he que edifica;<br> + Deste modo a função completa fica;<span class="pn">{10}</span><br> + E não com fogo, máscaras, e bulhas,<br> + Tornando-se as esmolas em fagulhas.<br> + Na terra, e Céo nada ha mais relevante,<br> + Que acudirmos ao nosso semelhante.<br> + Se não querem na rua estar com isto,<br> + Fação o que eu a muitos tenho visto:<br> + Vão ás Cadêas, que isto dá bom nome,<br> + Repartão de comer por quem tem fome:<br> + Arme-se em gravidade a Confraria,<br> + Vá consummar esta obra santa, e pia;<br> + Que disto inda se tira hum bom partido;<br> + O mais tudo he trabalho desluzido,<br> + Motivos de desordens, e de insultos,<br> + Indecentes tornando aquelles cultos;<br> + Porque destas funcções he raro o brinco,<br> + Em que não saião prezos quatro, ou cinco.<br> + <br> + He bem digno tambem de se notar<br> + Andarem hoje os pobres a cantar,<br> + De guitarra, ou viola má, ou boa<br> + Por todas essas ruas de Lisboa.<br> + Parece que festejão a pobreza,<br> + Ou que ella, lhes não dá muita tristeza!<br> + Eu bem sei o ditado, de quem canta,<br> + Seus males mais, ou menos sempre espanta;<br> + Mas co' a Musica, a fome não se cura;<br> + E he só (bemdito Deos) de que ha fartura!<span class="pn">{11}</span><br> + <br> + Portugal, Portugal, eu te lastimo!<br> + E de sentir comtigo não me eximo!<br> + Eu vejo velhos Pais cheios de vicios,<br> + Pondo os filhos nos mesmos precipicios.<br> + Co' os exemplos, que dão em casa, e fóra,<br> + Sem pejo, sem cautela, e sem melhora.<br> + Quando hum Pai deve ser (ou moço, ou velho),<br> + Da familia de casa hum vivo espelho;<br> + Mas se elle he o primeiro em se infamar,<br> + Como póde a seus filhos doutrinar!<br> + Filho houve já, que entrando no Oratorio<br> + Aos Padres fez primeiro hum peditorio:<br> + Que chamassem seu Pai, porque queria;<br> + Beijar-lhe a mão por fim, pois que morria,<br> + E que só acabava descançado<br> + Se fosse por seu Pai abençoado.<br> + Chegou o Pai gemendo, sem conforto,<br> + Em lagrimas banhado, e quasi morto.<br> + Então o filho, dando-lhe hum abraço,<br> + Desconjuntou-lhe os ossos do espinhaço,<br> + Dizendo-lhe: Receba o pago seu<br> + Da creação perversa, que me deo;<br> + Quando nos armazens se embebedava;<br> + Se tres cópos bebia, tres me dava;<br> + Humas vezes em paz, outras em guerra.<br> + Fazendo bordos hiamos a terra.<br> + Ás casas, em que jogo sempre havia;<br> + Levava-me na sua companhia;<span class="pn">{12}</span><br> + Eu pois n'hum vicio tal sempre embebido,<br> + Me vi por muitas vezes bem perdido;<br> + Jogava o que era meu, e mais o alheio,<br> + Até que já sem brio, e sem receio,<br> + Achando que de meu não tinha nada,<br> + Voltei-me para ser ladrão de estrada.<br> + Ficar deve em memoria esta lição,<br> + Que o bem, e o mal provém da educação.<br> + Banida deve ser da Sociedade<br> + Perdida, e viciosa mocidade:<br> + Bem como nas searas acontece,<br> + Que toda a herva inutil, que alli cresce,<br> + Pela raiz se corta, aos pés se deita,<br> + Por não damnar o grão, que se aproveita.<br> + <br> + Eu vejo a mocidade brava, e louca,<br> + Vaporando fumaças pela boca,<br> + Mostrando da doudice o sobrescrito<br> + No queimado xaruto por palito.<br> + Eu vi, não me contárão, isto he certo,<br> + Ir á Loja da Neve muito esperto<br> + Hum tafulão Gigante pela altura,<br> + Mas bem proporcionado na figura,<br> + Fumando com excesso de tal sorte,<br> + Que lançava da boca hum fumo forte:<br> + Pedio carapinhada, e foi fumando,<br> + Alimpando o suor de quando em quando,<br> + O fogo com a neve a hum tempo unindo,<span class="pn">{13}</span><br> + Pelo mesmo canal tudo embutindo:<br> + Sahia huma fumaça lá do centro,<br> + Hia hum gole de neve para dentro.<br> + Mas não posso acertar bem na razão<br> + Do fogo, e neve ter combinação!<br> + No que se alcança bem, sem muito estudo,<br> + Que hum taful tem guelas para tudo.<br> + <br> + Eu vejo rapazinhos enfeitados<br> + Mui bem nascidos, muito mal creados,<br> + Que ficão sem estudos, e sem bens,<br> + Tafúes de quarteirão a dois vintens,<br> + Com hum procedimento escandaloso,<br> + Envolto no calote attencioso,<br> + Que com boas palavras disfarçado,<br> + Depois de conseguido, he declarado.<br> + Não fallemos nas bellas qualidades<br> + De tomarem bastantes amizades;<br> + E nas casas de bem entrada tendo,<br> + Pouco e pouco se vão desenvolvendo,<br> + As innocentes filhas illudindo,<br> + Requestando, escrevendo, persuadindo;<br> + E ellas acreditando os rendimentos,<br> + Nas vozes, que se dão de casamentos,<br> + Com fantasticos teres, e promessas,<br> + Té irem de candêas ás avessas;<br> + Porque o pai presentio, a mãi espreita;<span class="pn">{14}</span><br> + Leva o Senhor fulano huma desfeita.<br> + E em este penetrando o contratempo,<br> + Cuida logo em mudar-se antes de tempo;<br> + E vai com esta mesma synfonia<br> + Dar Trevas para outra freguezia.<br> + Da má educação lhe provém tudo;<br> + Pais, que deixão seus filhos sem estudo,<br> + Ou não escolhem Mestres com recato,<br> + Porque só querem ir ao mais barato!<br> + <br> + Eu vejo huns fôfos Mestres de Collegios,<br> + Inculcando sciencia, e privilegios,<br> + Porém jogando a Ronda co' os Meninos<br> + Nas horas vagas dos seus bons ensinos;<br> + Que por estas razões bem se conhece<br> + Que entre tanto Collegio, que apparece,<br> + Não obstante haver Mestres a cardumes,<br> + Vão de mal em peior nossos costumes.<br> + Os rapazes mimosos de algum dia<br> + Apreciavão Musica, e Poesia,<br> + Séria Dança, discreta Sociedade,<br> + Mostrando sempre certa gravidade.<br> + Não digo que não ha inda hoje disto;<br> + Mas destas prendas poucos tenho visto.<br> + Hoje ha muitos tafues com outras prendas,<br> + Morgados de Pantana, mas sem rendas.<br> + Só presumpção de sabios tem comsigo,<span class="pn">{15}</span><br> + E obrigallos a lêr he hum castigo,<br> + Até parece já, por desvario,<br> + Que a muita discrição lhes faz fastio:<br> + Prezão mais hum cavallo, que ande bem,<br> + Que o melhor Livro, que hum Livreiro tem;<br> + E o que escapa de ter esta paixão,<br> + Vai a ser hum acérrimo Glotão<br> + Quer biffes a <em>lamoda</em> de <em>planchetas</em>,<br> + Cabeça de vitella, e costeletas,<br> + A geléa da boa mão de vacca<br> + Que isto he que fortalece a gente fraca:<br> + Desmancha-se depois com misturadas,<br> + Em merendas, e outras patuscadas;<br> + Com ranchos de solteiras, e viuvas,<br> + Manda vir aves, hervas, ovos, uvas,<br> + Melancias, melões, maçãs, morangos,<br> + Nisto largão a penna os novos frangos;<br> + Donde a cólica vem, e a indigestão,<br> + Que, de fraqueza, os põe á Santa Unção:<br> + Julgão que tem estomago de ferro;<br> + Mas tarde a conhecer vem o seu erro:<br> + Depois de relaxados, sem vigor,<br> + E alguns co' seu raminho de estupor,<br> + Então com mais cautela se procura<br> + Onde a pinga haverá, que seja pura;<br> + Vinho de Lavradio, ou Carcavellos,<br> + Bucellas, ou Chamusca, vinhos bellos;<br> + Porque esta Livraria fortifica,<span class="pn">{16}</span><br> + A quem de ameijoadas<a name="tex2html2" href="#foot251"><sup>[2]</sup></a> + entisica.<br> + Entenda-me o Leitor, como quizer,<br> + No resto que a saude faz perder:<br> + E para o bom patusca<a name="tex2html3" href="#foot252"><sup>[3]</sup></a> + ter dinheiro,<br> + Vê se póde encontrar farto banqueiro.<br> + Assenta que he melhor, e lhe convém<br> + Partidas de lucrar algum vintem;<br> + Nascendo excessos taes, e tal doudice,<br> + Da escacez do dinheiro, que já disse,<br> + Huma escacez que faz damnos immensos,<br> + Que os calotes, e crimes traz appensos.<br> + Na gente má, ou boa, môça, e idosa,<br> + A penuria geral se faz penosa:<br> + Cada qual anda vendo o melhor meio<br> + De achar á sua casa algum esteio;<br> + E quando se vê muito desgraçado,<br> + Lança-se aos vicios já desesperado;<br> + Porque os tempos de muita Loteria,<br> + Sortes, rifas, e jôgo em demasia,<br> + São tempos de miseria, em cuja lida<br> + Se perde pouco e pouco o amor á vida.<br> + <br> + Eu vejo mil Bilhares por Lisboa,<span class="pn">{17}</span><br> + Outros tantos Cafés com gente boa,<br> + Rapazes gigantescos, e corados,<br> + Sem ter algum defeito de aleijados;<br> + Tem estes mocetões o mesmo gasto<br> + Pelas casas das Sortes, Neve, e Pasto;<br> + E as simples Legiões na sua alçada<br> + Apenas achão gente estropeada.<br> + <br> + Eu vejo alguns modernos falladores,<br> + Que em todas as sciencias são Doutores;<br> + Fallão de Leis, sem nellas se formarem,<br> + E de guerra, sem nunca millitarem,<br> + Mathematicos são por nigromancia,<br> + Porque nelles não ha senão jactancia;<br> + Com Filosofos querem ter parelha,<br> + Mas com Filosofia só de orelha;<br> + E com taes espertezas sem mais fundo,<br> + Resolvem pela sonça meio mundo.<br> + Se vão em Gabinetes discorrer,<br> + Sabem tudo o que ha feito, e por fazer:<br> + Nos governos dos Reinos dão pennada,<br> + Mas andão sempre em vida desgraçada;<br> + Não sabem governar a casa sua,<br> + E vão governar Reinos pela rua,<br> + Dando planos, fingindo descubertas,<br> + Pondo discursos vãos em regras certas,<br> + Mettendo de Latim palavras finas,<br> + Que mais parecem Mouras, que Latinas;<span class="pn">{18}</span><br> + Que a tanto os pantalões se deliberão,<br> + Quando nem <em>Musa musae</em> conhecêrão.<br> + Mas se alguem, com razão, lhes vai ao fato,<br> + Em nada se tornou tanto apparato.<br> + <br> + Outros, vejo, que querem ser fidalgos,<br> + Por irem atrás delles, como galgos;<br> + E com justas, e herdadas Excellencias,<br> + Querem estes tambem ter preferencias,<br> + Enthusiasmados tanto na manía,<br> + Que não passão sem huma Senhoria;<br> + Por virem de Friellas, e Frieiras,<br> + Seus Avos de Melgaços, e Melgeiras,<br> + Que ainda destes fumos ha sinaes<br> + Em huma sege velha sem varaes,<br> + Que no canto da loja se conserva,<br> + Com hum brazão pintado, de reserva.<br> + Porém sempre he preciso ser mui tonto<br> + Quem não vê que hoje ha nisto algum desconto;<br> + Que altivos pensamentos, qualidades,<br> + Alicerces de antigas fatuidades,<br> + Hoje consistem só em ser herdeiro,<br> + Ou a torto, e direito ter dinheiro.<br> + <br> + Eu vejo papelões, que não passárão<br> + Das linhas para lá, nem encararão<br> + Sequer com o inimigo n'hum só ponto,<br> + Mas em tudo o que fallão vem hum conto<span class="pn">{19}</span><br> + Do muito, que soffrêrão pela guerra,<br> + Nadando em rios, avançando terra<br> + Com tal fome, que atrás de tres galinhas<br> + Os Pyrenéos subírão de gatinhas:<br> + Que depois lá n'hum choque, que tiverão,<br> + A hum batalhão Francez a morte derão;<br> + Que o do zabumba só livrou a pelle,<br> + Porque escapou mettido dentro delle.<br> + Destas, e outras basofias apparecem:<br> + Quando sabemos de outros, que merecem<br> + Hum eterno louvor, eterna fama,<br> + A quem a Patria dignos filhos chama,<br> + Portuguezes honrados, valorosos,<br> + Do inimigo terror, varões briosos,<br> + Que as cicatrizes mostrão pelo peito<br> + Com que attestão melhor quanto tem feito.<br> + <br> + Portugal, Portugal! eu te lastimo!<br> + Com pena de te vêr, meus versos rimo!<br> + Eu agora he que bem tenho alcançado<br> + Quanto de tudo estás necessitado!<br> + Pois perdeste a sciencia, engenho, e arte,<br> + Que te deo sempre fama em toda a parte.<br> + Hoje vejo o teu mal, que não melhora,<br> + Se tudo o que precisas vem de fóra.<br> + Tens nos Collegios Mestres Estrangeiros,<br> + Tens de muitas Nações cem mezinheiros,<br> + Que com pós, e com balsamos subidos<span class="pn">{20}</span><br> + Vão as bocas limpando aos presumidos;<br> + E ainda não se dando por contentes,<br> + Té nos querem levar da boca os dentes;<br> + Equilibrios, Balões, e Peloticas,<br> + Urso, e Macacos com trezentas nicas,<br> + Figurinhas gesso, outras de cera,<br> + Nynfa, que n'harpa em dedilhar se esmera;<br> + A Menina, que falla pendurada,<br> + A boa Dançarina escripturada,<br> + Que hum par de mil cruzados vem buscar;<br> + E nós he que ficamos a dançar!<br> + Outra, que tem a voz quasi divina,<br> + Como já se chamou á Zamparina;<br> + Outro, que engole espadas brancas, pretas,<br> + Como nós engulimos estas petas;<br> + E outras mil subtilezas deste lote;<br> + Vistas de praça, ou sala, ou camarote,<br> + Com armadilhas taes vem esta gente<br> + Na vagante esperar a grossa enchente,<br> + E carregando vão, como as formigas,<br> + Quanto podem tirar destas fadigas!<br> + Só Portuguezes nunca tenho visto,<br> + Que vão aos outros Reinos fazer disto.<br> + Estrangeiras Modistas se apresentão,<br> + Com letreiro á janella do que inventão;<br> + Que as Modistas de cá, bem que trabalhão,<br> + Á vista das de fóra já não calhão.<br> + A si se accolhe o pobre aventureiro;<span class="pn">{21}</span><br> + Porque lhe basta o nome de Estrangeiro,<br> + Para abrir loja, e ser afortunado.<br> + Veio do seu paiz esporeado,<br> + Chegou aqui, poz loja de vestidos;<br> + E ficão os tafues mui bem sortidos.<br> + Tem fato para magro, e para gordo,<br> + Té desapparecer, pondo-se a bordo:<br> + Caridade em tal gente sempre luz,<br> + Pois vem a Portugal vestir os nús.<br> + Mas dizem muitas lingoas mal dizentes<br> + Que elles não vestem; vem despir as gentes.<br> + Nada tem escapado, ou esquecido,<br> + Para o metal, que tinhas, ser sumido.<br> + Nós gememos em quanto os outros luzem;<br> + Té barricas de pinos se introduzem;<br> + Porque o pino de fóra, por mais duro,<br> + Deixa o tacão mais forte, e mais seguro.<br> + Se até vejo substancias combinadas,<br> + Nos paizes estranhos preparadas,<br> + Para pôr bom cherume nas panellas,<br> + E fazer hum bom molho ás cabidellas:<br> + E disto haverem lojas em Lisboa,<br> + Que por caixeira tem Madama Grôa!<br> + Eu inda espero vêr na Barra entrados<br> + Navios com almoços já temp'rados;<br> + Que ha de ser huma cousa bem acceita<br> + Vir já prompto o Café, torrada feita!<br> + Porém nós he que disto culpa temos,<span class="pn">{22}</span><br> + Porque de nós apreço não fazemos.<br> + Até he riso vêr, termos trocado<br> + O traje, que entre nós foi sempre usado,<br> + Pelos trajes de todas as Nações,<br> + Que abandonão çapatos, e calções.<br> + Nem a meia comprida já governa,<br> + Anda dentro da bota nua a perna,<br> + Como eu a boa gente tenho visto;<br> + Os Mouros pouco mais fazem do que isto.<br> + Vejo entrar em lugares mui sisudos<br> + Velhos, e moços, quaes pintos calçudos,<br> + Pantalonas; polainas de Galegos;<br> + Só resta usarem calças, como os Gregos.<br> + Confessemos que he este o nosso fraco;<br> + Que arremedar he o uso do macaco.<br> + <br> + Eu vejo pela classe dos Livreiros<br> + Lucros tirarem só os Estranjeiros.<br> + Que direi de Edições, que vem de fóra?<br> + Façamos aqui pausa por agora.<br> + Só sei que a mocidade, com deleite,<br> + Bebe em taes livros venenoso leite;<br> + E os Livreiros de cá postos ás moscas;<br> + Que as obras Portuguezas são mui toscas;<br> + O sainete não tem, nem a belleza,<br> + Que mostra qualquer obra, se he Franceza.<br> + Arte de cortar callos sem tisoura,<br> + Modo de conservar a barba loura,<span class="pn">{23}</span><br> + As Cartas de Madama Patulher,<br> + A Novella da Meza sem Talher:<br> + Instrucções, e Preceitos de Dentistas,<br> + Invento de crear galos sem cristas.<br> + O caso he ser Francez o tal livrinho,<br> + Que he da meza d'agora o melhor vinho.<br> + Livreiro Portuguez apenas vende<br> + Cartas, por onde o A, B, C se aprende,<br> + Bilhetes, com que Boas Festas damos,<br> + Outros de Enterro, que he que mais gastamos,<br> + Letras de Cambio, Pautas, Taboada,<br> + Roteiros de Pilotos, e mais nada.<br> + Parece que ninguem já hoje estima<br> + Composições em Prosa, nem em Rima.<br> + Acabou todo o gosto da Leitura,<br> + Tudo vejo mudado de figura.<br> + Nas obras, que se imprimem, (não se crê)<br> + Ha tal, que assigna, accoita, e não as lê!<br> + N'hum destes o trabalho se perdeo,<br> + Que não póde achar gosto ao que não lêo.<br> + <br> + Portugal, Portugal! tu tens comtigo<br> + Immensa gente, de quem és abrigo,<br> + Que devendo-te mil obrigações,<br> + Mostrar-te sabem só ingratidões.<br> + A primeira, que vejo praticar-se,<br> + He nada, do que he teu, hoje estimar-se.<br> + Fabricantes de cá morrem de fome;<span class="pn">{24}</span><br> + A sedinha estrangeira he que tem nome.<br> + Não valem nada Artistas Portuguezes;<br> + Os de fóra são só as boas rezes.<br> + As obras do Paiz não são perfeitas,<br> + Não tem fama, ou valor, são mal acceitas;<br> + Mas a quinquilheria de armação,<br> + Se he de fóra, tem logo estimação,<br> + E serve para o luxo, e para a moda,<br> + Que Damas, e Tafúes tudo se engoda<br> + Com estas bugiarias de tecidos<br> + De pedraria falsa, ouros fingidos;<br> + Té vemos entre tantas bagatellas<br> + Os Mouros com caixotes de chinelas,<br> + E tão bem feitas como os seus narizes,<br> + Que bem mostrão ser obra de aprendizes.<br> + Todos tem aqui seu manancial,<br> + Até ficarmos todos sem real.<br> + N'outro tempo hum Fidalgo desta Côrte,<br> + Homem de bom pensar, e de bom porte,<br> + Puxou por huma caixa rica, e boa,<br> + Feita por certo Ourives de Lisboa.<br> + Todos os circumstantes, que se achavão<br> + Sentados ao jantar, vendo-a, pasmavão<br> + Por tanta perfeição, lavor, e arte,<br> + Que se lhe descobria em toda a parte.<br> + Na mente de ser obra estrangeirada,<br> + Foi por todos a caixa elogiada.<br> + Logo o dono da casa mui gostoso,<span class="pn">{25}</span><br> + Porque ficasse o Ourives mais famoso,<br> + Conhecer mesmo alli a todos fez<br> + Mão d'obra ser de Ourives Portuguez.<br> + Apenas semelhante voz se larga,<br> + Como quem prova cousa, que lhe amarga,<br> + Hum notava d'alli certo defeito,<br> + Outro lhe achava falta de preceito.<br> + Então o bom Fidalgo decisivo<br> + Os reprehendeo dizendo: Eis o motivo,<br> + Porque a nossa Nação tanto padece,<br> + E entre as outras Nações nunca florece;<br> + Nós he que assim fazemos desgraçados<br> + Homens, que devem ser eternizados;<br> + E estes devem queixar-se com razão,<br> + Vendo dos seus o premio, que lhes dão.<br> + <br> + Portugal, Portugal! eu te lastimo!<br> + Porque sou próle tua mais te estimo!<br> + Pois não entro no rol das almas fracas,<br> + Que a tudo, e a todos vírão as casacas!<br> + Eu vejo formigueiros de usurarios,<br> + Que vão muito subtís por modos varios<br> + Movendo sagazmente a real mola,<br> + Até tudo ficar pedindo esmola.<br> + Some-se pouco a pouco o numerario,<br> + Todos vão lendo o mesmo breviario;<br> + Para a vida mui poucas cousas bastão,<br> + As superfluas são as que mais gastão;<span class="pn">{26}</span><br> + O luxo, os appetites, as vaidades,<br> + A grande emulação das amizades:<br> + Só porque usa Fulana, e traja assim,<br> + Querêllas desbancar he logo o fim:<br> + Isto em todas as cousas se está vendo,<br> + Donde nasce o calote, e empenho horrendo;<br> + Que inda vendo que os lucros não acodem,<br> + Todos querem fazer mais do que podem:<br> + Por isso hoje bons trastes são vendidos,<br> + Que se herdárão de Avós mais comedidos;<br> + Se estes das sepulturas resurgissem,<br> + Talvez ficassem doudos do que vissem!<br> + Destruindo-se assim, sem reflexão,<br> + Cousas que tinhão tanta estimação;<br> + Que antes do que as penhoras as escalem,<br> + Vão pela terça parte do que valem;<br> + E ainda compradoras custa a achar,<br> + Porque todos estão a jejuar.<br> + Grande cousa he viver hoje demente,<br> + Para não dar valor ao que se sente!<br> + Inquietações, costumes, tempo, e mundo,<br> + Tudo atira c'os os homens para o fundo<br> + Porque por mais que nadem na desgraça,<br> + Velhice, Doença, e Morte, os ameaça:<br> + No que passamos, temos o presagio<br> + De ninguem escapar deste naufragio:<br> + Porém no mar dos damnos a tormenta,<br> + Nem o Ceo, nem a terra he que a fomenta:<span class="pn">{27}</span><br> + Huns aos outros nós mesmos atormentamos,<br> + Com coração de bronze, flagellamos:<br> + Só o proprio interesse he que nos guia<br> + E pene quem penar nesta ingrezia.<br> + Assim dando se vai cabo de tudo,<br> + Té acabarmos todos em agudo:<br> + Todos vamos ficando como espetos,<br> + Em tristes descarnados esqueletos,<br> + Huns de calvas á mostra, outros tapadas,<br> + Que a urgencia faz cabeças escalvadas;<br> + Seguem-se os estupores, e malinas,<br> + Paralysias, mortes repentinas.<br> + Nunca vi tantos homens com achaques<br> + Pelas repetições destes ataques.<br> + Nestes tempos só vive satisfeito<br> + O homem de baixa esfera, porque o peito<br> + Não toma nem fortuna, nem desgraça;<br> + Com o pouco, que tem, com isso passa;<br> + Pois não pezão sobre elle obrigações<br> + De familias com certas sujeições.<br> + O homem de bens, de honrados sentimentos<br> + Vive sem ter resurça hoje em tormentos;<br> + Vive, mas hum viver apouquentado,<br> + Com a fome, e miseria sempre ao lado.<br> + Porque hum pai de familias com despeza,<br> + Vendo os recursos todos em fraqueza,<br> + Se nas faltas, que sente, mais discorre,<br> + Chora, pasma, esmorece, abate, e morre.<span class="pn">{28}</span><br> + Ora seja em desconto de peccados,<br> + Irmos todos á cova entisicados!<br> + Para não carregarmos aos irmãos,<br> + Que andão tambem (coitados!) pouco sãos.<br> + <br> + Eu vejo cambiar, vender dinheiro,<br> + Que põe quem compra, e vende de poleiro;<br> + E os pobres opprimidos, arrastados,<br> + Que estes são quasi sempre os cambiados.<br> + E pegou em Lisboa o novo officio,<br> + Com a capa de ser hum beneficio:<br> + Tudo especulações destes Senhores<br> + Compassivos, civís rebatedores,<br> + Que pudérão achar seguro meio<br> + De mostrar não querer suor alheio;<br> + Porque <em>in verbo</em> papel a conta he justa,<br> + Pois o vendem por menos que lhes custa;<br> + E mostra na consciencia ser exacto<br> + Quem compra caro, e vende mais barato.<br> + Disto nossos Avós nunca tiverão;<br> + Forão-se, não sabendo o que perdêrão.<br> + Parece que por manha, ou por estudo,<br> + Se esconde o ouro, e prata, cobre, e tudo,<br> + A fim de com tal fome, e taes empates,<br> + Não se acabar a praga dos rebates.<br> + Lembro-me que na minha mocidade<br> + Tinha o dinheiro a mesma validade;<br> + Hoje o Papel Moeda dominante<span class="pn">{29}</span><br> + Sempre o recebo em quarto minguante;<br> + Pois se em metal o quero vêr tornado,<br> + Logo he por <em>manos limpias</em> maquiado.<br> + Porém do mal o menos, feliz eu,<br> + Se alcançasse em Papel tudo o que he meu.<br> + Se o dinheiro se vende assim patente,<br> + Tambem se vende gente á mesma gente.<br> + O Commercio afrouxou, todos se chorão,<br> + Vendo que de fortuna não melhorão.<br> + Tem atacado a Praça em viva guerra<br> + Tantos Piratas, que ha por mar, e terra.<br> + São entre nós fazendas genuinas.<br> + Chinelas, suspensorios, lamparinas,<br> + Papeis de castiçaes, graixa a tostão,<br> + Caixas de obrêas, bolas de carvão.<br> + As escôvas, que dão lustros mimosos,<br> + Porque inda não estamos bem lustrosos.<br> + Só nisto he que se faz algum negocio,<br> + Tudo o mais pede chuva posto em ocio.<br> + <br> + Eu vejo homens hypócritas tratando<br> + Negocios de ir os outros depennando<br> + Com fallas divinas, astutas manhas,<br> + Com Deos na boca, e o demo nas entranhas.<br> + Não querem encarregos para a morte,<br> + Por isso se regulão desta sorte.<br> + He desta gente o calculo seguinte;<br> + Tudo que vale cem, comprar por vinte.<span class="pn">{30}</span><br> + Alminhas boas, que andão entre nós!<br> + Que do dinheiro são sempre hum cadoz.<br> + Eu rio quando vejo estes beatos,<br> + Sanguisugas, e esponjas de contratos;<br> + De olhos meios fechados a fallarem,<br> + Até os seus int'resses ultimarem;<br> + Mas depois dos ajustes serem feitos,<br> + Abrem os olhos tortos, ou direitos,<br> + Ora pondo-os no chão, ora no Céo,<br> + Que este he da hypocrisia o grande véo:<br> + Té que lhe chega ás vezes neste estudo<br> + Revéz, em que o diabo leva tudo.<br> + <br> + Portugal, Portugal! eu te lastimo!<br> + E quando te analyso, desanimo!<br> + Destes estratagemas, e usos novos<br> + Provém os muitos damnos dos teus Povos,<br> + Eu vejo certos homens presumidos,<br> + E nos cargos, que tem, tão embebidos,<br> + Que por viverem fartos sem desgraça,<br> + Assentão que são feitos de outra massa,<br> + E mostrão se a fallar todos inchados,<br> + Que parecem perús enchouriçados,<br> + As palavras soltando, como Oraculo,<br> + Decidindo por si em todo o obstaculo:<br> + Tratando os que lhes são inferiores,<br> + Com soberba, impostura, e dissabores,<br> + Sem verem que huma falla mais ardente<span class="pn">{31}</span><br> + Dobra o flagello ao triste dependente;<br> + Que tem de hum bom Despacho a qualidade<br> + A resposta civil de humanidade.<br> + <br> + Eu vejo homens de grandes ordenados,<br> + Que fazem os dos outros ser quartados;<br> + Os que elles tem, sempre achão ser pequenos,<br> + Mas querem que o dos outros fique em menos;<br> + Que o triste pão, que o empregado come,<br> + He que augmenta a despesa, e que faz nome;<br> + Mas o que elles desfrutão inda occulto<br> + He huma bagatella, não faz vulto.<br> + Não maculo ninguem, porém ha disto,<br> + Como eu por muitas vezes tenho visto.<br> + Isto com alvo certo não se entende;<br> + Quem tiver este vicio, que se emende,<br> + E singular fazer-se não intente<br> + Á custa do flagello da outra gente.<br> + <br> + Eu vejo té nas mesmas Irmandades<br> + Disputarem-se em meza qualidades;<br> + E nos públicos actos distincções,<br> + Como se a Deos servissem gerações;<br> + Quando a Igreja é a Mãi do rico, e pobre,<br> + Do velho, e moço, do plebéo, e nobre.<br> + Porém assombrar isto me não deve;<br> + Se ha Juiz de irmandade, que se atreve<span class="pn">{32}</span><br> + A separar na Igreja o challe, e a manta<br> + Da capa e lenço; isto mais espanta.<br> + <br> + Eu vejo gente mui temente a Deos,<br> + Que até quer penetrar segredos seus.<br> + Prognosticando está tremor de terra,...<a name="tex2html4" + href="#foot114"><sup>[4]</sup></a><br> + Bem como se o tremor fosse huma guerra,<br> + Que os homens entre si movem, se querem,<br> + Só pelos seus caprichos defenderem.<br> + Se o Repertorio désse hum tremor certo,<br> + Tinhamos hum Profeta descuberto;<br> + Que os fundos mineraes em quem bem pensa,<br> + Pódem casar co' os astros sem dispensa;<br> + Nem Deos castigo algum ao mundo envia<br> + Por calculos geraes d'Astrologia.<br> + Mas he para pasmar vêr que houve gente<br> + Tão crédula, tão frouxa, tão demente,<br> + Que para o campo grande se ausentava<br> + Com susto do tremor, que se esperava!<br> + Como se taes estragos, e ruinas<br> + Houvessem de ter vesp'ras, e matinas.<br> + Com effeito o tremor foi grande assumpto<br> + Para gente, que espera inda hum defunto.<span class="pn">{33}</span><br> + Em fim houve no campo nova feira,<br> + Onde a gente passou a noite inteira<br> + Em huma companhia historiada.<br> + A noite das fogueiras em Almada<br> + Não se passa com mais satisfação!<br> + Foi huma noite mais de São João!<br> + Com medo do tremor, que não havia,<br> + Na vespera fugião já de dia<br> + Para o campo lindissimas mochachas<br> + Com os seus taboleiros de bolachas.<br> + Homens de quartas de agoa se ajuntárão,<br> + Que apezar do seu medo, inda lucrárão.<br> + De guitarras sómente havia falta,<br> + Que he com que nas Gavotas mais se salta.<br> + Não se fazia Terço, ou Oração,<br> + Porque o susto pôz tudo em confusão.<br> + Se viesse instrumento, tarde, ou cedo,<br> + Perdião as meninas mais o medo.<br> + De acabar com os homens já são horas;<br> + Vamos ajustar contas ás Senhoras.<br> + <br> + Eu vejo o luxo as bolsas devorando,<br> + E as Fabricas estranhas sustentando,<br> + Pondo a nossa Nação empobrecida<br> + Co' appetite das modas illudida.<br> + Cada mez huma cousa de outro gosto,<br> + Que a maridos, e pais lhes dá de rosto.<br> + E as tafulas cahindo a todo o risco,<span class="pn">{34}</span><br> + Bem como o passarinho cahe no visco:<br> + Vestidos de magnifico valor,<br> + Chailes, e mantas de mimosa côr.<br> + Muitas diversidades de filós,<br> + E outras taes tentações: pobres de nós!<br> + Eu vejo muita cousa vir de França,<br> + Enfeites, que de os vêr a vista cança;<br> + Té cabelleiras vem para Senhoras,<br> + A quem as calvas são mui devedoras,<br> + Feitas de coifa elastica, e mui preta,<br> + Com hum monête, em ar de maçaneta:<br> + Porém estes modernos penteados.<br> + De cabellos puxados, repuxados,<br> + As cabeças vão pondo em tal figura,<br> + Que fazem seja calva a formosura.<br> + De França nos vem outra corriola,<br> + De que usão as Senhoras como estola:<br> + He numa tira elastica de rufos,<br> + De espaço a espaço tem tambem seus tufos,<br> + E chamão-lhes da moda as inventoras<br> + Os modernos caprichos das Senhoras:<br> + Custão a tres mil réis, outros a mais;<br> + E assim com estas cousas, e outras tais,<br> + Vem o sagaz, e o lepido estrangeiro,<br> + A trocar aqui trapos, por dinheiro.<br> + Resta virem de França bem bordados,<br> + Elasticos cueiros perfumados,<br> + Que ha de ser hum aceio bem acceito<span class="pn">{35}</span><br> + Para tanta criança que ha de peito.<br> + A filha da arrastada vendedeira<br> + Quer trajar á fidalga, e ser primeira.<br> + Leiteiras, e outras taes eu tenho visto,<br> + Que de todas as modas são hum misto;<br> + Atrás de hum burro de ceirão cançadas,<br> + De rufos, e de folhos enfeitadas,<br> + Que vão com estas vãs tafularias<br> + Vendendo leite, nabos, melancias;<br> + Mas no que esta gentalha tem errado<br> + He não conhecer bem o seu estado;<br> + Querendo co'a mais louca presumpção<br> + Huns, e outros mostrar o que não são:<br> + Procedendo huma tal desigualdade<br> + Da falta de juizo, e honestidade.<br> + E porque não ha nisto meio termo,<br> + Te vejo, Portugal, bastante enfermo!<br> + Da fórma que isto indico, não insulto;<br> + Mas póde percebello o mais estulto.<br> + <br> + As nossas circumstancias, nosso estado<br> + Pedem hum viver hoje acautelado.<br> + Os tempos para o rico, e para o pobre<br> + Já são de pouca prata, e muito cobre.<br> + Ninguem póde fazer hoje thesouro,<br> + He hum milagre o vêr quartinho em ouro:<br> + Muito faz quem com boa economia<br> + Se sustentar hum dia, e outra dia;<span class="pn">{36}</span><br> + Que se entrudos fizer amiudados,<br> + Ha de ter muitos dias de finados.<br> + Luxo na mêza, luxo no vestido,<br> + Pelas funções hum luxo desmedido,<br> + No fim se lhe acha o erro que desgosta;<br> + Por isso tantas náos tem dado á costa!<br> + <br> + Eu vejo reviver nos nossos dias<br> + Das velhas as ridiculas manias<br> + De verem cousas más, pregando peças,<br> + A pedir Missas, a ultimar Promessas,<br> + Deixando-as as visões, que lhes fallárão,<br> + Tão doentes do susto, que mamárão,<br> + Que se queixão de dores nas barrigas,<br> + Talvez por hemorroides, ou lombrigas.<br> + Huma diz que observou, outra que vio,<br> + Outra que até na cama lhe bolio.<br> + Ha pouco em certa casa huma donzella<br> + Levantou por medrosa huma balella,<br> + Porque sentio á roda do seu leito<br> + Andar hum ermitão muito direito.<br> + Logo huma desdentada velha tia<br> + Respondeo, que de noite ella sentia<br> + Jogar-se pela salla muito a bola,<br> + E outras vezes tambem tocar viola:<br> + Que guardava comsigo este segredo,<br> + Porque a familia não tomasse medo.<br> + Acudio a criada delampeira,<span class="pn">{37}</span><br> + Levantando na casa igual poeira,<br> + Dizendo que ella vio na chaminé<br> + Hum pretinho pequeno posto em pé:<br> + Que vira fora de horas na cosinha<br> + A cantar, como gallo, huma gallinha,<br> + E que lhe forão pôr o seu capote,<br> + E côco de esfregar dentro do pote.<br> + Mas tudo isto fazia hum tal criado,<br> + Que andava da criada namorado;<br> + Porque o dono da casa com disfarce,<br> + Macaco velho, por desenganar-se,<br> + Foi-se na carvoeira introduzir<br> + De noite, sem ninguem o presumir;<br> + E vendo na alta noite bem a fundo<br> + Duas almas, que inda erão deste mundo,<br> + Que era o moço co' a moça conversando,<br> + Ao encontro sahio, mas perguntando:<br> + Que querião d'alli, ou a que vinhão?<br> + Ou se restituições algumas tinhão?<br> + Que trazia hum arrocho exp'rimentado,<br> + Para lhes acabar aquelle fado.<br> + E depois de molhar a sua sopa,<br> + Impoz pela manhã, com vento em pôpa,<br> + As duas cousas más, e nesse dia<br> + Á familia pagou igual quantia.<br> + <br> + Tambem em Campolide hoje acontece<br> + Hum caso, que aos das velhas se parece.<span class="pn">{38}</span><br> + Pois houve hum pobre alarve, que morrêo,<br> + E a seu filho em fantasma appareceo,<br> + Determinando a venda de huma vacca,<br> + Para pagar o panno da borjaca,<br> + Que escava ao mercador inda devendo,<br> + Por cuja causa andava padecendo.<br> + O filho foi fallar-lhe, por esperto,<br> + Porém veio de lá de horror cuberto;<br> + Cahio na cama trémulo, e doente,<br> + Que inda concorre a ir vêllo muita gente.<br> + <br> + As cousas más serão cousa mui boa,<br> + Huma vez que appareção por Lisboa;<br> + Porque havendo nas casas esta fama,<br> + Foi-se dos Senhorios a derrama,<br> + Que vão a excesso tal subindo a renda,<br> + Que não ha já com casas quem se entenda;<br> + E se o inquilino pede huma equidade,<br> + Tirão-lhe seis tostões por caridade.<br> + Porém motins de noite nos sobrados,<br> + Fantasmas de lençoes pelos telhados,<br> + Deitada a fama destas pataratas,<br> + Só assim se acharão casas baratas.<br> + <br> + Eu vejo das Tafulas a mania<br> + No luxo, com tão grande bizarria,<br> + Que parece, que perdem da lembrança<br> + Da vida á morte a funebre mudança;<span class="pn">{39}</span><br> + Engolfadas na moda dos vestidos,<br> + Nas guarnições, nos fôlhos, e franzidos,<br> + Não lhes vem hum instante ao pensamento<br> + Da guerra, fome, e peste o abatimento.<br> + Quem vê, que pelo mundo ha destes p'rigos,<br> + Deve temellos mais, como castigos<br> + Das vaidades, caprichos, soberbias,<br> + Desmazelos, excessos, fantasias;<br> + E pôr a tanto luxo hum meio termo,<br> + Que serve de enfeitar hum corpo enfermo.<br> + O tempo em consumir-nos he veloz,<br> + Não respeita Toukins, Rendas, Filós;<br> + He preciso pensar, com seriedade,<br> + N'um tempo de huma tal calamidade!<br> + Reformando-se vidas, e costumes,<br> + Que este tempo não he de antigos Numes,<br> + Huns fabulosos Deoses, que illudião<br> + Os povos, que a seu gosto he que os fazião.<br> + Vigia sobre nós a M<small>ÃO </small>E<small>TERNA</small>,<br> + Que nos castiga, ampara, e nos governa;<br> + Escandaliza aos olhos da razão,<br> + Tanta desenvoltura, e perdição.<br> + <br> + Tocando nas que são de baixa esfera,<br> + Esta gente tambem não se modera;<br> + Raparigas de brutos o retrato,<br> + Nutridas só, de vicios, sem recato,<br> + Criadas sem algum regulamento,<span class="pn">{40}</span><br> + Nem querem trabalhar para o sustento;<br> + Não buscão de servir decentes meios,<br> + Não querem aturar genios alheios;<br> + Quando muitas, que em casas tem servido.<br> + Fortunas tem achado, e bom marido;<br> + Mas querem exceder os seus limites,<br> + Sustentar luzimentos, e appetites,<br> + Nos péssimos int'resses embebidas,<br> + Se fazem desgraçadas, e perdidas,<br> + Máos exemplos de Mãis, Pais inhumanos,<br> + He que põem estas tristes em taes damnos;<br> + A Mãi, que a filha achar por manha tonta,<br> + Huma tunda lhe dê, por minha conta.<br> + <br> + Vejo muitas Senhoras pela rua,<br> + Como se andassem pela casa sua,<br> + De sáia, e de jaleco sem mais nada,<br> + A cabeça composta de palhada,<br> + Na mão o indispensavel, n'outra o leque,<br> + Andando como doudas, téque téque:<br> + E isto sempre com tal desembaraço,<br> + Que hum passo não alcança o outro passo.<br> + Sem chaile, manta, capa, nem capote,<br> + Tendo a desenvoltura por hum dote:<br> + Perdida assim aquella gravidade<br> + Das sérias Portuguezas d'outra idade.<br> + Não digo, nem direi que he uso em todas<br> + Os excessos ridiculos das modas,<span class="pn">{41}</span><br> + Inda ha muitas familias commedidas,<br> + Honestas, sérias, graves, bem regidas.<br> + Fallo da que na rua encontro só,<br> + Sem Mãi, tia, cunhada, nem avó:<br> + Bem como a expatriada taverneira,<br> + Que partio do seu reino aventureira,<br> + Para pôr em Lisboa em qualquer parte<br> + Tasca com hum fogão, e hum estandarte;<br> + E que sem mais decencia, nem reparo,<br> + Vai ás praças comprar o seu preparo,<br> + Com vestido de chita, nús os braços,<br> + Touca de folhos liza, ou com seus laços.<br> + Por isto os homens todos mais se atrevem,<br> + Quando fallando estão, ou quando escrevem<br> + Contra hum sexo, que sempre foi perfeito,<br> + Mas que em parte vai tendo algum defeito<br> + Nos trajes, que adoptou á estrangeira,<br> + Com a capa de ser tudo á ligeira.<br> + <br> + Ah mantos, mantos! tempo abençoado,<br> + Em que tudo se via respeitado!<br> + Inda que ouço dizer a alguns espertos,<br> + Que os olhos estão hoje muito abertos.<br> + Tomára perguntar-lhes: Que tivemos<br> + Desta grande esperteza, que hoje vemos?<br> + Andarem raparigas pelas praças<br> + De noite, e dia expostas a desgraças?<br> + Mãis, e filhas chegando a tal estado,<span class="pn">{42}</span><br> + Que não temem do mundo o máo olhado?<br> + Agourar os cometas, que apparecem?<br> + Vêr Balões, que no ar desapparecem?<br> + Não dar credito a nada, que se lê;<br> + Porém dos Repertorios fazer fé?<br> + Viver de muitas tramas, e illusões?<br> + Usar-se pantalonas por calções?<br> + O cabello sem pós, chapéo redondo?<br> + Fallar, sem fundamento, com estrondo<br> + Nos Barcos de vapôr, e seu destino?<br> + No rapé ordinario, grosso, e fino?<br> + Não me devo metter n'outras materias;<br> + A decencia me pede lhes dê ferias.<br> + E viviamos nós tão atrazados?<br> + Traziamos os olhos bem fechados!<br> + Porém não sei de que he que quando havião<br> + Esses olhos, que d'antes não se abrião,<br> + Havia a boa fé, humanidade,<br> + Consciencia, moral, honestidade,<br> + Nos Officios Divinos devoção,<br> + Sério, respeito, boa educação:<br> + Disto nascião genios de ternura,<br> + Juizo, compaixão, amor, candura;<br> + Hoje notão-se, como raridades<br> + Encontrarem-se destas qualidades.<br> + Por todo o mundo espiritos inquietos<br> + Andão-se levantando como insectos,<br> + Não abração a paz, nem o socego,<span class="pn">{43}</span><br> + O de olhos mais abertos anda cego,<br> + Sendo desta mania o fim primeiro<br> + O saciar de sangue, e de dinheiro.<br> + <br> + Portugal, Portugal! eu te lastimo,<br> + Porque he tudo verdade quanto exprimo!<br> + Eu vejo homens casados namorando,<br> + Que se vão por solteiros inculcando;<br> + Ás mulheres dos mais arrastão aza,<br> + E ardem se o mesmo mal lhes vai por casa,<br> + Sem se lembrarem que estas influencias<br> + Trazem comsigo tristes consequencias,<br> + E que fazer aos mais nunca devemos<br> + O que para nós outros não queremos.<br> + <br> + Eu vejo huma menina das d'agora,<br> + Que por casar não quer estar hum' hora,<br> + E que inda que naufrague, e vá ao fundo<br> + Parece-lhe fugir-lhe já o mundo;<br> + Que até já de doze annos vejo muitas<br> + Fazendo aos chichisbéos certas perguntas,<br> + Dirigidas sómente a casamento,<br> + Que ás vezes se converte n'hum tormento;<br> + Quando algum dia poucas se casavão,<br> + Em quanto os dezenove não contavão.<br> + Mas que ha de ser, se a mãi de pequeninas<br> + Quer que pisquem os olhos as meninas!<br> + E fica por gracinha da criança<span class="pn">{44}</span><br> + O saber namorar muito em lembrança.<br> + Com esta educação se desenvolvem,<br> + Té que de graça a sério se resolvem,<br> + E sem que esperem ser fruta do tarde,<br> + Vão sujeitar-se ao jugo (Deos as guarde.)<br> + <br> + Eu vejo certos genios de Senhoras,<br> + Que variando estão todas as horas,<br> + Muito doudas no modo de pensar,<br> + Por isso bem não podem acertar.<br> + Se adormecem mui fixas n'hum intento,<br> + Acordão já com outro pensamento:<br> + Fazem desta inconstancia mesmo alarde,<br> + O que são de manhã, não são de tarde.<br> + Em muitas se descobre este defeito,<br> + O qual tomão os homens muito a peito;<br> + Porque não sabem, vendo esta incerteza,<br> + Quando a mulher he falsa, ou tem firmeza,<br> + Quando zomba, entretem, ou falla serio,<br> + Ou se anda louca, de juizo aério.<br> + <br> + Vejo algumas de genio impertinente,<br> + Que postas a fallar matarão gente<br> + Com gritos, que se mettem nos ouvidos,<br> + Que muitas ensurdecem os maridos.<br> + Surdos devião elles todos ser,<br> + Para o luxo das filhas, e mulher,<br> + Prendas, e dotes n'huma Dama boa<span class="pn">{45}</span><br> + No luxo não estão, sim na pessoa.<br> + Nossas avós, que em moças se casárão,<br> + De luxo com excesso não usárão;<br> + E se alguma comsigo mais gastava,<br> + Lindas sedas do Reino he que comprava:<br> + Das quaes, inda depois de ser usadas,<br> + Se fazião cubertas aceadas;<br> + E não podre filó com bordadura,<br> + Que tres, quatro lavagens só atura,<br> + Comprado por hum mimo rico e guapo,<br> + Que no fim de seis mezes he hum trapo;<br> + E o dinheiro a cahir pela invenção,<br> + Apezar da barriga não ter pão.<br> + Luxo no frontespicio he que apparece,<br> + Em tudo o mais pobreza se conhece.<br> + <br> + Tambem do compromisso he a partida:<br> + E porque a gente seja bem servida,<br> + Vêm o opio do chá tambem por luxo,<br> + Ou agoa quente de enxagoar o buxo;<br> + Que não passando de agoa, e de fatia,<br> + Leva hum par de tostões: quem tal diria!<br> + E para que se bote a conta a tudo,<br> + Vamos vêr o que leva por miudo.<br> + Aparelho aceado, igual bandeja,<br> + Porque o brio da casa alli se veja:<br> + Perola, Aljôfar, ou Hisson, e Uxim;<br> + Carvão, manteiga, e assucar não ruim;<span class="pn">{46}</span><br> + Criadas de trazer, e de levar;<br> + Agoa a ferver até isto acabar.<br> + Anda a Dona da casa sem descanço<br> + Dando por toda a copa o seu balanço;<br> + Se de humas cousas tem, ha de outras falta;<br> + No aparelho o gatinho ás vezes salta;<br> + O estrondo, que elle faz, ouve-se fora,<br> + Parte á cozinha em sustos a Senhora:<br> + Vê seis, ou sete chavanas quebradas,<br> + E por desgraça são das emprestadas.<br> + Dá co'hum páo na criada, e mais no gato;<br> + Põe-se a moça a chorar, juntando o fato.<br> + Este o risco, este o trem, he esta a lida,<br> + Para pão com manteiga, agoa fervida!<br> + Ah tempos, tempos! Como estaes mudados!<br> + Onde estão as merendas dos estrados?<br> + Onde a crespa salada, e a ella junto<br> + O saboroso paio, o bom presunto?<br> + Perdeste, Portugal, costumes taes,<br> + E com elles perdeste os cabedaes!<br> + Querendo só com chá em abundancia,<br> + Que he tudo fórma, e nada de substancia,<br> + Crear todo o vigor, de que careces<br> + Nestas enfermidades, que padeces.<br> + <br> + Vejo tambem Senhoras mui teimosas,<br> + E nas teimas, que tem, tão caprichosas,<br> + Que por levarem só a sua avante,<span class="pn">{47}</span><br> + Levantão testemunhos n'hum instante.<br> + Accelerão-se, gritão, e esbravejão,<br> + Só porque accreditadas melhor sejão.<br> + Se alguem as desmentio, temos historia,<br> + He offensa, que fica de memoria;<br> + Porque quem commetter tal attentado,<br> + Conte ficar por ellas mal olhado;<br> + Que huma mulher tem tanto de extremosa,<br> + Compassiva, amoravel, carinhosa,<br> + Como tem de raivosa, e vingativa,<br> + Delirante, indomavel, cega, e altiva,<br> + Se offendida se vê, ou tem ciume,<br> + Parece que dos olhos lhe sahe lume,<br> + E n'hum tal frenesi a pobre cai,<br> + Que d'alli a morrer mui pouco vai.<br> + Tambem as modas lhes vão dando a morte;<br> + Pois vejo-as em Janeiro áspero, e forte,<br> + De panninho, e de chitas armadinhas,<br> + De caças, de filós, ou de sedinhas:<br> + De dia em dia passão constipadas,<br> + Por isso vemos tantas descoradas,<br> + Com dôr de peito, com tossinha secca,<br> + Com pertinazes dores de enxaqueca.<br> + O homem no anno tem quatro estações;<br> + As Senhoras não tem senão verões.<br> + Elles abafão-se, ellas põem-se á fresca;<br> + Que he quando o reumatismo mais se pesca.<br> + Algum dia o baetão, panno, ou veludo<span class="pn">{48}</span><br> + Da Senhora era o trajo mais sisudo,<br> + Com que de inverno andava reparada<br> + Dos grandes frios, e áspera geada;<br> + E inda, além de ser isto uso decente,<br> + Raras vezes se via huma doente,<br> + Hoje agoas ferreas, ares de Bemfica,<br> + Banhos de mar, remedios de botica,<br> + Vão as Senhoras pondo em tal frescura,<br> + Que vão fartas de fresco á sepultura.<br> + <br> + Ora pois, Portugal, eu te lastimo!<br> + E só para teu bem he que te intimo,<br> + Visto haver já mui pouco quem te entenda,<br> + Que tenhas nos abusos mais emenda.<br> + Quem a qualquer faisca acode logo,<br> + Não vê arder em casa hum grande fogo.<br> + Talvez por eu dizer isto, que sinto,<br> + Apezar de saber-se que não minto,<br> + Muita gente dirá que cuide em mim:<br> + Que deixe Portugal, e o Mundo assim;<br> + Que por mais que me empenhe na reforma,<br> + O Mundo não se afasta desta norma.<br> + Eu isso lhe concedo, não lho nego;<br> + Porém se em verso, e prosa assim lhe prégo,<br> + He para no sermão fazer-lhe certo<br> + Que o sei conhecer bem, e bem de perto.<br> + <br> + E tu, ó Portugal, se inda te illudes,<span class="pn">{49}</span><br> + Os vicios confundindo co'as virtudes,<br> + Enlevado na moda, e nos abusos,<br> + Esquecido dos teus antigos usos,<br> + Filosofias novas não abraces,<br> + Com estes modernismos não te enlaces;<br> + Modifica os costumes, que te arrastão,<br> + Que inda o pouco, que tens, isso te gastão:<br> + Faze que resuscite de huma vez<br> + O honrado, e bom caracter Portuguez:<br> + Faze que as Bellas Letras possão inda<br> + Mostrar aos nacionaes a face linda,<br> + Que raiando de novo, como a Aurora,<br> + Dêm aos genios enfermos a melhora.<br> + E talvez possa então a mocidade<br> + Criar-lhes mais amor, mais amizade;<br> + Que n'hum espasmo tal, nesta inação<br> + De tão perniciosa educação,<br> + A tudo, quanto he bom, se perde o gosto,<br> + Nem de hum livro se lê sequer o rosto.<br> + <br> + A mesma encantadora alta Poesia<br> + Appreço já não tem, como algum dia:<br> + Então era por todos estimada;<br> + Hoje está, como tudo, desgraçada.<br> + Feliz tempo de antigos Portuguezes!<br> + Camões, Sá de Miranda, Sá Menezes;<br> + Hum Castilho, huns Andrades, hum Ferreira,<br> + Castro, Teive, Bernardes, e Silveira;<span class="pn">{50}</span><br> + George de Monte-Mór, Franco Barreto,<br> + Do almo Virgilio Traductor completo;<br> + Candido Lisitano Mestre da Arte,<br> + Hum Bacellar, que em meu louvor tem parte;<br> + Hum Matos Traductor do grande Tasso,<br> + Educado das Musas no regaço;<br> + Homens de gosto, de arte, e natureza,<br> + Honra da Lingoagem Portugueza!<br> + Nos escriptos de então se descobria<br> + A sentença, a doçura co' a harmonia.<br> + Mais proximos a nós muitos respeitão<br> + Outros mil, cujas obras nos deleitão:<br> + Hum Tarouca, hum Penalva, hum Ericeira,<br> + De quem a alada Fama he pregoeira;<br> + Hum Gregorio de Matos bem sabido,<br> + Hum Alexandre, hum Pinto Renascido,<br> + Frei Simão, nos seus versos implicado<br> + Com este Renascido mal fadado;<br> + Hum Lobo Leiriense, Cunha, e Pina,<br> + Hum Padre Bras, que em graça não declina;<br> + Hum Duarte Ferrão muito erudito,<br> + Que produzio o Metrico Palito;<br> + (Se delle o proprio nome este não he,<br> + Conheça-se em Reitor da Nazaré;)<br> + Hum Brito de Vianna, hum Meliseu,<br> + Pimenta jovial no que escreveu;<br> + Hum Vilella, hum Basilio, hum Paradiz,<br> + Hum Gonzaga, hum Garção, douto Diniz;<span class="pn">{51}</span><br> + Claudio, Quita, Alvarenga, Hum Amaral,<br> + Hum Bandeira bastante social;<br> + O Sabio, e inimitavel Tolentino,<br> + Que aprendeo a viver no seu ensino;<br> + Bocage, Pimentel, Curvo Semmedo,<br> + O actual Orador Padre Macedo;<br> + Hum Padre Nascimento, hum Quintanilha,<br> + Com quem Apollo fez igual partilha;<br> + Dias em Bellas Letras eminente,<br> + Figueiredo no Cómico eloquente;<br> + Hum Torres, hum Massuellos, Lara, Azedo,<br> + Moraes, e outro estimavel Figueiredo:<br> + Cujos Nomes a Febo enchem de gloria,<br> + A Fama os leva ao Templo da Memoria.<br> + <br> + Matos, que desde a idade juvenil<br> + Se casou com a Musa Pastoril:<br> + Tudo quanto escreveo hoje se preza;<br> + Por mostrar huma rara natureza.<br> + Dois Ribeiros, Brandão, hum vago Lobo,<br> + Que de critico a fama lhe não roubo;<br> + O celebrado Abbade de Jacente,<br> + Hum Theodoro com elle contendente;<br> + Hum Caldas Brazileiro, no improviso<br> + Engraçado, modesto, e com juizo:<br> + Sempre em qualquer assumpto discorria,<br> + Deixando, satisfeita a companhia:<span class="pn">{52}</span><br> + Se delle algum rival ha por desgraça,<br> + Aponte-me segundo, que isto faça!<br> + <br> + Dois Barunchos, Otone, e mais Coutinho,<br> + Que acertárão das Musas no caminho;<br> + Hum Medina, hum Novaes, Maya, e Delgado;<br> + Hum Bersane no Lirico affamado,<br> + Severino, e Soares Portuense,<br> + Hum Maximo, que o iguala, se o não vence;<br> + Hum engenhoso Barros, que em viveza<br> + Prodigio mostra ser da natureza;<br> + Hum Cabral Transmontano ás Musas dado,<br> + Nobrega, que viveo tão desgraçado;<br> + Hum Guerreiro, e Belmiro, que honra o Douro:<br> + Todos a C'rôa tem do Febeo Louro.<br> + <br> + Mais tres Vates, a quem faltou a vista,<br> + (Que remedio não ha, que lhe resista.)<br> + Hum Thomaz, hum Martins, novo Castilho,<br> + Qualquer delles de Apollo digno filho.<br> + Mas se dos olhos toda a luz perdêrão,<br> + No juizo outras luzes accendêrão.<br> + Hum Araujo, hum Lopes, hum Moniz,<br> + Mayo e Lima, que já ferir me quiz:<br> + Que inda apezar do ataque, que me fez,<br> + Jamais de o elogiar perderei vez;<br> + Que ataques de Poeta, inda os maiores,<span class="pn">{53}</span><br> + Como foguetes são de jogadores.<br> + Estes Genios harmonicos, que pinto,<br> + Lá no Premesse tem lugar distinto,<br> + <br> + Hum Durão Padre Mestre Graciano<br> + Com Estro divertido Americano.<br> + Serra, Ferreira Lobo, o bom Forjaz,<br> + E o Beneficiado Velho Vaz<br> + (O consoante aqui me deo conselho,<br> + Para pôr Velho Vaz, e não Vaz Velho.)<br> + O Conego José São Bernardino,<br> + Filho tambem de Apollo, homem de tino;<br> + Campello, os dois Malhões, Mello, e Raposo,<br> + Carvalho, igual ao jovial Barroso;<br> + H<span class="accent"><sup>~</sup>u</span> Costa, h<span class="accent"><sup>~</sup>u</span> Bingre, h<span class="accent"><sup>~</sup>u</span> Camera, h<span class="accent"><sup>~</sup>u</span> Verné,<br> + Quintella, Xavier, Padre Soye.<br> + Dois Botelhos Professo, e Secular,<br> + Hum Antonio Ricardo, hum Aguiar.<br> + Estes Vates, que aponto, se conhecem,<br> + E huma eterna saudade nos merecem:<br> + Qualquer delles crédor de melhor sorte,<br> + «E outros, em quem poder não teve a morte.»<br> + Quasi todos nas obras, que deixárão,<br> + Seus Nomes sem vaidade eternizárão.<br> + Destes Vates mui poucos vivos são,<br> + E todos elles honrão a Nação.<br> + Confesso que hoje tenho a maior gloria<span class="pn">{54}</span><br> + Em trazer estes Genios á memoria.<br> + Mas que serve escrever grandes volumes,<br> + Se estão prevaricados os costumes!<br> + Quatro velhos, que lêm estes Authores,<br> + São os que inda lhes dão justos louvores;<br> + Que estes meninos de hoje (coitadinhos!)<br> + Estudão n'outras classes de livrinhos,<br> + Livrinhos, com que o demo quiz campar,<br> + Para as bolsas de todo entisicar.<br> + Pouca gente conhece, ou avalia<br> + O trabalho, que dá qualquer Poesia.<br> + Lêr, e rir bem se vê não custar nada;<br> + Compor empreza foi sempre arriscada;<br> + E por isso estimar-se mais se deve<br> + A penna, que em qualquer assumpto escreve.<br> + <br> + Portugal, Portugal! eu te lastimo,<br> + Se com verdades taes te não animo!<br> + Sem se lêr, nada bom póde fazer-se;<br> + Edificios não ha sem alicer-se.<br> + Quem lê, e estuda a fundo sem jactancia,<br> + Dissipa as densas nuvens da ignorancia.<br> + Se já puzeste as Armas em descanco,<br> + Vai dar nas Livrarias hum balanço:<br> + Escolhe, compra, e lê; porque a lição<br> + Ha de accender-te as luzes da razão:<br> + Ella ensina, interessa, ella diverte,<br> + E póde dar juízo ao mais inerte.<span class="pn">{55}</span><br> + E se, seguindo a ordem, que me espera,<br> + «Eu nunca mais serei quem d'antes era,»<br> + Recordando o que eu digo alguns instantes,<br> + Portugal, tu serás qual eras d'antes.<span class="pn">{56}</span></blockquote> +<span class="pn">{57}</span> + +<p> </p> + +<p> </p> + +<div style="margin-left: 30%; font-size: small;"> +<hr> + +<blockquote> + <em>As cousas todas veja aqui mudadas<br> + Em tristes as que ledas ser soyão<br> + As tristes muito mais tristes tornadas.</em><br> + Bernard. Cart. VI.</blockquote> +<hr> +</div> + +<p style="text-align:center;">SONETO.</p> + +<blockquote> + Soffreo Lysia hum Tremor de terra horrendo,<a name="tex2html5" + href="#foot154"><sup>[5]</sup></a><br> + Seguio-se-lhe depois Traição ferina,<a name="tex2html6" + href="#foot155"><sup>[6]</sup></a><br> + Rebateo de hum Leão furia, e rapina,<a name="tex2html7" + href="#foot156"><sup>[7]</sup></a><br> + E pouco a pouco foi a fronte erguendo:<a name="tex2html8" + href="#foot157"><sup>[8]</sup></a><br> + Por morte do seu Rei ficou gemendo,<a name="tex2html9" + href="#foot253"><sup>[9]</sup></a><br> + E o Céo, por consolalla, lhe destina<br> + Soberana immortal quasi divina,<a name="tex2html10" + href="#foot254"><sup>[10]</sup></a><br> + Que em paz o Povo seu ficou regendo:<br> + Hum Monstro de ambição, e de vingança<a name="tex2html11" + href="#foot161"><sup>[11]</sup></a><br> + Surge do centro do sulfureo Averno,<br> + Perde a Europa o equilibrio da balança:<br> + Restaura Portugal seu bom Governo;<br> + Mas não vêr o seu Rei!.. Esta lembrança<a name="tex2html12" + href="#foot255"><sup>[12]</sup></a><br> + O põe banhado em pranto, e em luto eterno.<span +class="pn">{58}</span></blockquote> +<span class="pn">{59}</span> + +<p> </p> + +<p> </p> + +<p>Ao Author se mandou pelo Correio carta sem nome, datada de 22 de Julho do +presente anno de 1819, na qual se lhe pedia, com o maior empenho, quizesse +decifrar o seguinte Epitaphio enigmatico; e que na primeira Obra, que désse á +luz, puzesse a sua definição.</p> + +<p>Suspeita-se porém que a carta veio de pessoa gorda; e ou fosse escrita por +basofía, ou por divertido ataque ao Author, seja qual for o motivo, elle vai a +satisfazer.</p> + +<blockquote> + <em> Epitaphio Enigmatico.<br> + <br> + </em>Ci git le fils, ci git la mere,<br> + Ci git la fille avec le pere,<br> + Ci git la soeur, ci git le frere,<br> + Ci git la femme, et le mari,<br> + Et ne sont que trois corps ici.</blockquote> + +<p>Responde o Author: Que logo que o filho seja hermaphrodito, temos neste +aborto da natureza filho, e filha, irmão, e irmã em hum corpo só. No pai, e mãi +temos marido, e mulher, que são dois corpos: por morte de todos, jazem só tres +no tumulo.</p> + +<p>Por outra: Tendo hum homem huma filha, e deíxando-a ainda criança, para ir +viajar,<span class="pn">{60}</span> quando voltou, casou com ella, por hum +acaso, ignorando ser a mesma, que deixou de pequenina; e vindo a ter hum filho +della, e a morrer todos tres pela ordem do tempo, indo todos á mesma sepultura, +fica bem claro que alli se achão filho, e mãi, filha, e pai, irmão, e irmã, +mulher, e marido, tudo em tres corpos.</p> + +<p>Estimará o Author ter acertado, ou que algum dos seus curiosos Leitores +descubrão melhor intelligencia, com tanto que não seja a que vem explicada no +primeiro tomo do Divertimento de Estudiosos pag. 59, onde se acha este mesmo +Enigma mais resumido; porque aponta, seis pessoas, e dá enterrados só dois +corpos, como se vê no seguinte:</p> + +<blockquote> + Cy gist le pere, cy gist la mere,<br> + Cy gist la soeur, cy gist le frere:<br> + Cy gist la femme, e le mary;<br> + Et n'y a que deux corps icy.<br> + <br> + <em>Divertim. de Estud. Tom. I. pag. 59.</em></blockquote> + +<p>Agora roga o Author ao Amigo, que lhe escreveo a mencionada carta, queira +decifrar-lhe tambem os Enigmas, Advinhação, e Charades, que se seguem, e que se +não tirárão de Livros.<span class="pn">{61}</span></p> + +<p> </p> + +<p style="text-align:center;"><em>1.º Enigma.</em></p> + +<blockquote> + Eu sou hum Mundo sem gente,<br> + Figuro em qualquer trabalho;<br> + Humas vezes não sou nada,<br> + Outras vezes muito valho:<br> + Eu entro no Purgatorio,<br> + E tambem vou ao Inferno,<br> + Entrada tenho no Ceo,<br> + E estou ao lado do Eterno:<br> + Os Anjos de mim dependem,<br> + Os Virtuosos, e os Santos;<br> + No Mundo, sem ser aranha,<br> + Ando sempre pelos cantos.<br> + + + <blockquote> + O que isto será *<br> + O Leitor o dirá. *<span class="pn">{62}</span></blockquote> +</blockquote> + +<p> </p> + +<p style="text-align:center;"><em>2.º Enigma.</em></p> + +<blockquote> + Vinte e hum homens se embarcárão,<br> + Temporal os apanhou;<br> + Morrêrão vinte afogados,<br> + Temos hum, que se salvou:<br> + Este seguio a viagem;<br> + Mas comsigo sempre achou<br> + A conta dos mesmos vinte,<br> + Com que na praia embarcou;<br> + Que por sinal de amizade,<br> + Que sempre se praticou,<br> + Alguns as mãos apertavão<br> + Aos socios do que escapou. + + <blockquote> + Desejava-se saber *<br> + Dos vinte quaes vem a ser. *<span class="pn">{63}</span></blockquote> +</blockquote> + +<p> </p> + +<p style="text-align:center;"><em>3.º Enigma.</em></p> + +<p> </p> + +<blockquote> + Comprárão-se doze,<br> + Mas seis estruidos,<br> + E forão por doze,<br> + Os seis repartidos:<br> + Com partes iguaes<br> + Os doze ficárão;<br> + Porém os perdidos<br> + Aqui não entrárão:<br> + E faz esta conta<br> + Ser certa, e ser boa,<br> + Caber huma inteira,<br> + A cada pessoa. + + <blockquote> + Para melhor perceberes *<br> + Resta saber soletrar; *<br> + Depois disto conheceres, *<br> + Luzes podes alcançar *<br> + Vastas, para me entenderes. *<span class="pn">{64}</span></blockquote> +</blockquote> + +<p> </p> + +<p style="text-align:center;"><em>Adivinhação.</em></p> + +<blockquote> + Julgão-me todos riqueza,<br> + Porém ando esfrangalhado;<br> + E quem me vê neste estado,<br> + He que mais me estima, e preza:<br> + Minha mulher, sem benzer<br> + De quebranto, os mais defende;<br> + E quem de mófas se offende,<br> + A vai a outro off'recer:<br> + O ser branco, ou ser vermelho,<br> + Não me faz algum destrôço;<br> + Tanto me estimão em moço<br> + Como depois que sou velho. + + <blockquote> + Fita os olhos no que digo, *<br> + Gostarás disto comigo. *<span class="pn">{65}</span></blockquote> +</blockquote> + +<p> </p> + +<p style="text-align:center;">1.ª Charade.</p> + +<blockquote> + Se o principio do meu nome<br> + Vem d'Astro de claridade,<br> + He bem, que, sendo celeste,<br> + Seja o meio a caridade:<br> + E que o fim, de igual razão,<br> + Vos denote a compaixão;<br> + Vindo unido a defender,<br> + Vossa vida, e vosso ter. + + <blockquote> + Solta as redeas ao discurso, *<br> + Dá combinação, ás cousas; *<br> + Do Sabio he este o recurso. *<span class="pn">{66}</span></blockquote> +</blockquote> + +<p> </p> + +<p style="text-align:center;">2.ª Charade.</p> + +<blockquote> + A primeira, e segunda he mui veloz;<br> + Sendo aguda a terceira afflige, e mata;<br> + E quem reúne as tres, faz-se hum algoz. + + <blockquote> + Cabe na mente do esperto *<br> + Saber o quanto te digo; *<br> + Dorme, sahirás deste apêrto. *</blockquote> +</blockquote> +<hr style="width: 30%;"> + +<p> </p> + +<blockquote> + Amigo, escusas cançar-te;<br> + Por ter de ti compaixão,<br> + Nos versos, que tem estrella,<br> + Acharás a explicação.<br> + <br> + Se Acrosticos não entendes,<br> + (O que não he natural,)<br> + He por que tens a cabeça<br> + Formada de pedra, e cal.<span class="pn">{67}</span></blockquote> + +<p> </p> + +<p> </p> + +<p style="text-align:center;">CATALOGO</p> + +<p style="text-align:center;"><em>Das Obras impressas de José Daniel Rodrigues +da Costa.</em></p> +<ul> + <li>Rimas I. e II. Tomo. </li> + <li>Theatro Cómico de pequenas Peças. </li> + <li>Almocreve de Petas, dividido na 2.ª impressão, em 3 Tomos. </li> + <li>Comboi de mentiras. </li> + <li>Espreitador do Mundo novo, em que vem as 6 partes dos Opios. </li> + <li>Barco da Carreira dos tôlos. </li> + <li>Jôgo dos Dotes. </li> + <li>Hospital do Mundo. </li> + <li>Camera Optica. </li> + <li>Tribunal da Razão. </li> + <li>Revista dos Genios. </li> + <li>Roda da Fortuna. </li> + <li>Os Enjeitados da Fortuna. </li> + <li>O Poema do Balão aos Habitantes da Lua. </li> + <li>E esta de Portugal enfermo por vicios, e abusos.<span + class="pn">{68}</span> </li> +</ul> + +<p> </p> + +<p style="text-align:center;"><em>Do mesmo Author se imprimírão avulsos os +Folhetos seguintes.</em> </p> +<ul> + <li>Quadras alegres aos Annos do Serenissimo Senhor D. Pedro Carlos, em 1804. + </li> + <li>Quintilhas ao mesmo Senhor, em 1805. </li> + <li>Ditas ao mesmo assumpto, em 1806. </li> + <li>Quadras divertidas ao mesmo, em 1807. </li> + <li>Espelho de jogadores. Este Folheto vem tambem impresso na Revista dos + Genios. </li> +</ul> + +<p> </p> + +<p style="text-align:center;"><em>Obras do mesmo Author, impressas do anno de +1808 por diante, ao vasto, e calamitoso assumpto da invasão dos Francezes em +Portugal.</em> </p> +<ul> + <li>Protecção á Franceza I. e II. Parte. </li> + <li>Partidista contra Partidistas. </li> + <li>Resposta á Proclamação, que em Hespanha fez o General Augereau. </li> + <li>Cantigas Patrioticas. </li> + <li>Surriada a Massena I. e II. Parte. </li> + <li>Conversação Nocturna das Esquinas do Rocío de Lisboa. </li> + <li>Carta de parabens, com hum Dialogo dos dois Generaes Francezes Filippon, + e Bertier.<span class="pn">{70}</span> </li> + <li>Encontro na Eternidade dos dois Generaes Francezes Marmont, e Bonnet. + </li> + <li>Silva ao memoravel Lord Wellington. </li> + <li>Testamento engenhoso do Dom Quixote da França, ao partir para a Russia. + </li> + <li>Canto funebre na sentida Morte da nossa Soberana a Senhora D. + M<small>ARIA</small> I. </li> +</ul> + + +<p>As pessoas curiosas podem esperar pela Parte II. desta Obra, para poderem +então mandalla encadernar, junta com o Poema do Balão aos Habitantes da Lua, +que assim lhes ficará hum Livro de 8.º completo.</p> + +<p> </p> +<hr> + +<p><em>Vende-se esta Obra na Loja de Francisco Xavier de Carvalho, defronte da +Rua de S. Francisco da Cidade; na de Antonio Manoel Polycarpo da Silva, junto +ao Senado; na de Antonio Xavier Moreira, da Impressão Regia debaixo da Arcada; +na de João Henriques, no principio da Rua Augusta; na de Antonio Pedro, na Rua +do Ouro; na de Luiz José de Carvalho, aos Paulistas; e em Belém, na da Viuva de +José Tiburcio. Preço 240 réis.</em></p> +<hr> + +<p> </p> + +<p> </p> + +<div class="rodape"> +<p><a name="foot71" href="#tex2html1"><sup>[1]</sup></a> ... A desejada vinda +dos nossos Soberanos.</p> + +<p><a name="foot251" href="#tex2html2"><sup>[2]</sup></a> <em>Ameijoadas</em>, +são noites perdidas: tirada esta palavra do Diccionario novo dos Tafues.</p> + +<p><a name="foot252" href="#tex2html3"><sup>[3]</sup></a> <em>Patusca</em>, +palavra tirada do mencionado Diccionario apenso.</p> + +<p><a name="foot114" href="#tex2html4"><sup>[4]</sup></a> Hum tremor +imaginario, com que em 20 de Agosto do presente anno de 1819 se intimidou parte +do Povo de Lisboa, tomando em diverso sentido o que lhes dizia o Reportorio +naquelle mez.</p> + +<p><a name="foot154" href="#tex2html5"><sup>[5]</sup></a> O grande Terremoto do +1 de Novembro de 1755.</p> + +<p><a name="foot155" href="#tex2html6"><sup>[6]</sup></a> O horroroso attentado +na infausta noite de 3 de Setembro de 1758.</p> + +<p><a name="foot156" href="#tex2html7"><sup>[7]</sup></a> A guerra da Hespanha +contra Portugal em 1761.</p> + +<p><a name="foot157" href="#tex2html8"><sup>[8]</sup></a> A reedificação da +Cidade de Lisboa.</p> + +<p><a name="foot253" href="#tex2html9"><sup>[9]</sup></a> A morte do sempre +memoravel Rei o Senhor D. J<small>OSÉ</small> I.</p> + +<p><a name="foot254" href="#tex2html10"><sup>[10]</sup></a> O feliz Reinado da +Fidelissima Senhora D. M<small>ARIA</small> I.</p> + +<p><a name="foot161" href="#tex2html11"><sup>[11]</sup></a> O Tyranno do Mundo, +assollador dos Povos, Napoleão Bonaparte.</p> + +<p><a name="foot255" href="#tex2html12"><sup>[12]</sup></a> O nosso +amabilissimo Monarcha o Senhor D. J<small>OÃO</small> VI.</p> +</div> +</div> + +<p> </p> +<div class="fbox"><p><b>Notas de transcrição:</b></p> + +<p>O texto aqui transcrito, é uma cópia integral e inalterada do livro +impresso em 1819.</p> + +<p>Mantivemos a grafia usada na edição impressa, tendo sido corrigidos alguns +pequenos erros tipográficos evidentes, que não alteram a leitura do texto, +e que por isso não considerámos necessário assinalá-los. Mantivemos +inclusivamente as eventuais incoerências de grafia de algumas palavras, em +particular quanto à acentuação.</p> + +<p>Na edição impressa, foram usados caracteres que já não são usados, +em particular "u com til" ( <span class="accent"><sup>~</sup>u</span> ). Para representar esses caracteres +tirámos partido das potencialidades do html e css. O método usado foi testado com os <em>browsers</em> mais populares à data desta edição electrónica, mas ainda assim o resultado pode variar de utilizador para utilizador.</p> +</div> + + + + + + + + + +<pre> + + + + + +End of the Project Gutenberg EBook of Portugal enfermo por vicios, e abusos +de ambos os sexos, by José Daniel Rodrigues da Costa + +*** END OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK PORTUGAL ENFERMO POR VICIOS *** + +***** This file should be named 31743-h.htm or 31743-h.zip ***** +This and all associated files of various formats will be found in: + https://www.gutenberg.org/3/1/7/4/31743/ + +Produced by Pedro Saborano (produced from scanned images +of public domain material from Google Book Search) + + +Updated editions will replace the previous one--the old editions +will be renamed. + +Creating the works from public domain print editions means that no +one owns a United States copyright in these works, so the Foundation +(and you!) can copy and distribute it in the United States without +permission and without paying copyright royalties. Special rules, +set forth in the General Terms of Use part of this license, apply to +copying and distributing Project Gutenberg-tm electronic works to +protect the PROJECT GUTENBERG-tm concept and trademark. Project +Gutenberg is a registered trademark, and may not be used if you +charge for the eBooks, unless you receive specific permission. If you +do not charge anything for copies of this eBook, complying with the +rules is very easy. You may use this eBook for nearly any purpose +such as creation of derivative works, reports, performances and +research. They may be modified and printed and given away--you may do +practically ANYTHING with public domain eBooks. Redistribution is +subject to the trademark license, especially commercial +redistribution. + + + +*** START: FULL LICENSE *** + +THE FULL PROJECT GUTENBERG LICENSE +PLEASE READ THIS BEFORE YOU DISTRIBUTE OR USE THIS WORK + +To protect the Project Gutenberg-tm mission of promoting the free +distribution of electronic works, by using or distributing this work +(or any other work associated in any way with the phrase "Project +Gutenberg"), you agree to comply with all the terms of the Full Project +Gutenberg-tm License (available with this file or online at +https://gutenberg.org/license). + + +Section 1. General Terms of Use and Redistributing Project Gutenberg-tm +electronic works + +1.A. By reading or using any part of this Project Gutenberg-tm +electronic work, you indicate that you have read, understand, agree to +and accept all the terms of this license and intellectual property +(trademark/copyright) agreement. If you do not agree to abide by all +the terms of this agreement, you must cease using and return or destroy +all copies of Project Gutenberg-tm electronic works in your possession. +If you paid a fee for obtaining a copy of or access to a Project +Gutenberg-tm electronic work and you do not agree to be bound by the +terms of this agreement, you may obtain a refund from the person or +entity to whom you paid the fee as set forth in paragraph 1.E.8. + +1.B. "Project Gutenberg" is a registered trademark. It may only be +used on or associated in any way with an electronic work by people who +agree to be bound by the terms of this agreement. There are a few +things that you can do with most Project Gutenberg-tm electronic works +even without complying with the full terms of this agreement. See +paragraph 1.C below. There are a lot of things you can do with Project +Gutenberg-tm electronic works if you follow the terms of this agreement +and help preserve free future access to Project Gutenberg-tm electronic +works. See paragraph 1.E below. + +1.C. The Project Gutenberg Literary Archive Foundation ("the Foundation" +or PGLAF), owns a compilation copyright in the collection of Project +Gutenberg-tm electronic works. Nearly all the individual works in the +collection are in the public domain in the United States. If an +individual work is in the public domain in the United States and you are +located in the United States, we do not claim a right to prevent you from +copying, distributing, performing, displaying or creating derivative +works based on the work as long as all references to Project Gutenberg +are removed. Of course, we hope that you will support the Project +Gutenberg-tm mission of promoting free access to electronic works by +freely sharing Project Gutenberg-tm works in compliance with the terms of +this agreement for keeping the Project Gutenberg-tm name associated with +the work. You can easily comply with the terms of this agreement by +keeping this work in the same format with its attached full Project +Gutenberg-tm License when you share it without charge with others. + +1.D. The copyright laws of the place where you are located also govern +what you can do with this work. Copyright laws in most countries are in +a constant state of change. If you are outside the United States, check +the laws of your country in addition to the terms of this agreement +before downloading, copying, displaying, performing, distributing or +creating derivative works based on this work or any other Project +Gutenberg-tm work. The Foundation makes no representations concerning +the copyright status of any work in any country outside the United +States. + +1.E. Unless you have removed all references to Project Gutenberg: + +1.E.1. The following sentence, with active links to, or other immediate +access to, the full Project Gutenberg-tm License must appear prominently +whenever any copy of a Project Gutenberg-tm work (any work on which the +phrase "Project Gutenberg" appears, or with which the phrase "Project +Gutenberg" is associated) is accessed, displayed, performed, viewed, +copied or distributed: + +This eBook is for the use of anyone anywhere at no cost and with +almost no restrictions whatsoever. You may copy it, give it away or +re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included +with this eBook or online at www.gutenberg.org + +1.E.2. If an individual Project Gutenberg-tm electronic work is derived +from the public domain (does not contain a notice indicating that it is +posted with permission of the copyright holder), the work can be copied +and distributed to anyone in the United States without paying any fees +or charges. If you are redistributing or providing access to a work +with the phrase "Project Gutenberg" associated with or appearing on the +work, you must comply either with the requirements of paragraphs 1.E.1 +through 1.E.7 or obtain permission for the use of the work and the +Project Gutenberg-tm trademark as set forth in paragraphs 1.E.8 or +1.E.9. + +1.E.3. If an individual Project Gutenberg-tm electronic work is posted +with the permission of the copyright holder, your use and distribution +must comply with both paragraphs 1.E.1 through 1.E.7 and any additional +terms imposed by the copyright holder. Additional terms will be linked +to the Project Gutenberg-tm License for all works posted with the +permission of the copyright holder found at the beginning of this work. + +1.E.4. Do not unlink or detach or remove the full Project Gutenberg-tm +License terms from this work, or any files containing a part of this +work or any other work associated with Project Gutenberg-tm. + +1.E.5. Do not copy, display, perform, distribute or redistribute this +electronic work, or any part of this electronic work, without +prominently displaying the sentence set forth in paragraph 1.E.1 with +active links or immediate access to the full terms of the Project +Gutenberg-tm License. + +1.E.6. You may convert to and distribute this work in any binary, +compressed, marked up, nonproprietary or proprietary form, including any +word processing or hypertext form. However, if you provide access to or +distribute copies of a Project Gutenberg-tm work in a format other than +"Plain Vanilla ASCII" or other format used in the official version +posted on the official Project Gutenberg-tm web site (www.gutenberg.org), +you must, at no additional cost, fee or expense to the user, provide a +copy, a means of exporting a copy, or a means of obtaining a copy upon +request, of the work in its original "Plain Vanilla ASCII" or other +form. Any alternate format must include the full Project Gutenberg-tm +License as specified in paragraph 1.E.1. + +1.E.7. Do not charge a fee for access to, viewing, displaying, +performing, copying or distributing any Project Gutenberg-tm works +unless you comply with paragraph 1.E.8 or 1.E.9. + +1.E.8. You may charge a reasonable fee for copies of or providing +access to or distributing Project Gutenberg-tm electronic works provided +that + +- You pay a royalty fee of 20% of the gross profits you derive from + the use of Project Gutenberg-tm works calculated using the method + you already use to calculate your applicable taxes. The fee is + owed to the owner of the Project Gutenberg-tm trademark, but he + has agreed to donate royalties under this paragraph to the + Project Gutenberg Literary Archive Foundation. Royalty payments + must be paid within 60 days following each date on which you + prepare (or are legally required to prepare) your periodic tax + returns. Royalty payments should be clearly marked as such and + sent to the Project Gutenberg Literary Archive Foundation at the + address specified in Section 4, "Information about donations to + the Project Gutenberg Literary Archive Foundation." + +- You provide a full refund of any money paid by a user who notifies + you in writing (or by e-mail) within 30 days of receipt that s/he + does not agree to the terms of the full Project Gutenberg-tm + License. You must require such a user to return or + destroy all copies of the works possessed in a physical medium + and discontinue all use of and all access to other copies of + Project Gutenberg-tm works. + +- You provide, in accordance with paragraph 1.F.3, a full refund of any + money paid for a work or a replacement copy, if a defect in the + electronic work is discovered and reported to you within 90 days + of receipt of the work. + +- You comply with all other terms of this agreement for free + distribution of Project Gutenberg-tm works. + +1.E.9. If you wish to charge a fee or distribute a Project Gutenberg-tm +electronic work or group of works on different terms than are set +forth in this agreement, you must obtain permission in writing from +both the Project Gutenberg Literary Archive Foundation and Michael +Hart, the owner of the Project Gutenberg-tm trademark. Contact the +Foundation as set forth in Section 3 below. + +1.F. + +1.F.1. Project Gutenberg volunteers and employees expend considerable +effort to identify, do copyright research on, transcribe and proofread +public domain works in creating the Project Gutenberg-tm +collection. Despite these efforts, Project Gutenberg-tm electronic +works, and the medium on which they may be stored, may contain +"Defects," such as, but not limited to, incomplete, inaccurate or +corrupt data, transcription errors, a copyright or other intellectual +property infringement, a defective or damaged disk or other medium, a +computer virus, or computer codes that damage or cannot be read by +your equipment. + +1.F.2. LIMITED WARRANTY, DISCLAIMER OF DAMAGES - Except for the "Right +of Replacement or Refund" described in paragraph 1.F.3, the Project +Gutenberg Literary Archive Foundation, the owner of the Project +Gutenberg-tm trademark, and any other party distributing a Project +Gutenberg-tm electronic work under this agreement, disclaim all +liability to you for damages, costs and expenses, including legal +fees. YOU AGREE THAT YOU HAVE NO REMEDIES FOR NEGLIGENCE, STRICT +LIABILITY, BREACH OF WARRANTY OR BREACH OF CONTRACT EXCEPT THOSE +PROVIDED IN PARAGRAPH F3. YOU AGREE THAT THE FOUNDATION, THE +TRADEMARK OWNER, AND ANY DISTRIBUTOR UNDER THIS AGREEMENT WILL NOT BE +LIABLE TO YOU FOR ACTUAL, DIRECT, INDIRECT, CONSEQUENTIAL, PUNITIVE OR +INCIDENTAL DAMAGES EVEN IF YOU GIVE NOTICE OF THE POSSIBILITY OF SUCH +DAMAGE. + +1.F.3. LIMITED RIGHT OF REPLACEMENT OR REFUND - If you discover a +defect in this electronic work within 90 days of receiving it, you can +receive a refund of the money (if any) you paid for it by sending a +written explanation to the person you received the work from. If you +received the work on a physical medium, you must return the medium with +your written explanation. The person or entity that provided you with +the defective work may elect to provide a replacement copy in lieu of a +refund. If you received the work electronically, the person or entity +providing it to you may choose to give you a second opportunity to +receive the work electronically in lieu of a refund. If the second copy +is also defective, you may demand a refund in writing without further +opportunities to fix the problem. + +1.F.4. Except for the limited right of replacement or refund set forth +in paragraph 1.F.3, this work is provided to you 'AS-IS' WITH NO OTHER +WARRANTIES OF ANY KIND, EXPRESS OR IMPLIED, INCLUDING BUT NOT LIMITED TO +WARRANTIES OF MERCHANTIBILITY OR FITNESS FOR ANY PURPOSE. + +1.F.5. Some states do not allow disclaimers of certain implied +warranties or the exclusion or limitation of certain types of damages. +If any disclaimer or limitation set forth in this agreement violates the +law of the state applicable to this agreement, the agreement shall be +interpreted to make the maximum disclaimer or limitation permitted by +the applicable state law. The invalidity or unenforceability of any +provision of this agreement shall not void the remaining provisions. + +1.F.6. INDEMNITY - You agree to indemnify and hold the Foundation, the +trademark owner, any agent or employee of the Foundation, anyone +providing copies of Project Gutenberg-tm electronic works in accordance +with this agreement, and any volunteers associated with the production, +promotion and distribution of Project Gutenberg-tm electronic works, +harmless from all liability, costs and expenses, including legal fees, +that arise directly or indirectly from any of the following which you do +or cause to occur: (a) distribution of this or any Project Gutenberg-tm +work, (b) alteration, modification, or additions or deletions to any +Project Gutenberg-tm work, and (c) any Defect you cause. + + +Section 2. Information about the Mission of Project Gutenberg-tm + +Project Gutenberg-tm is synonymous with the free distribution of +electronic works in formats readable by the widest variety of computers +including obsolete, old, middle-aged and new computers. It exists +because of the efforts of hundreds of volunteers and donations from +people in all walks of life. + +Volunteers and financial support to provide volunteers with the +assistance they need are critical to reaching Project Gutenberg-tm's +goals and ensuring that the Project Gutenberg-tm collection will +remain freely available for generations to come. In 2001, the Project +Gutenberg Literary Archive Foundation was created to provide a secure +and permanent future for Project Gutenberg-tm and future generations. +To learn more about the Project Gutenberg Literary Archive Foundation +and how your efforts and donations can help, see Sections 3 and 4 +and the Foundation web page at https://www.pglaf.org. + + +Section 3. Information about the Project Gutenberg Literary Archive +Foundation + +The Project Gutenberg Literary Archive Foundation is a non profit +501(c)(3) educational corporation organized under the laws of the +state of Mississippi and granted tax exempt status by the Internal +Revenue Service. The Foundation's EIN or federal tax identification +number is 64-6221541. Its 501(c)(3) letter is posted at +https://pglaf.org/fundraising. Contributions to the Project Gutenberg +Literary Archive Foundation are tax deductible to the full extent +permitted by U.S. federal laws and your state's laws. + +The Foundation's principal office is located at 4557 Melan Dr. S. +Fairbanks, AK, 99712., but its volunteers and employees are scattered +throughout numerous locations. Its business office is located at +809 North 1500 West, Salt Lake City, UT 84116, (801) 596-1887, email +business@pglaf.org. Email contact links and up to date contact +information can be found at the Foundation's web site and official +page at https://pglaf.org + +For additional contact information: + Dr. Gregory B. Newby + Chief Executive and Director + gbnewby@pglaf.org + + +Section 4. Information about Donations to the Project Gutenberg +Literary Archive Foundation + +Project Gutenberg-tm depends upon and cannot survive without wide +spread public support and donations to carry out its mission of +increasing the number of public domain and licensed works that can be +freely distributed in machine readable form accessible by the widest +array of equipment including outdated equipment. Many small donations +($1 to $5,000) are particularly important to maintaining tax exempt +status with the IRS. + +The Foundation is committed to complying with the laws regulating +charities and charitable donations in all 50 states of the United +States. Compliance requirements are not uniform and it takes a +considerable effort, much paperwork and many fees to meet and keep up +with these requirements. We do not solicit donations in locations +where we have not received written confirmation of compliance. To +SEND DONATIONS or determine the status of compliance for any +particular state visit https://pglaf.org + +While we cannot and do not solicit contributions from states where we +have not met the solicitation requirements, we know of no prohibition +against accepting unsolicited donations from donors in such states who +approach us with offers to donate. + +International donations are gratefully accepted, but we cannot make +any statements concerning tax treatment of donations received from +outside the United States. U.S. laws alone swamp our small staff. + +Please check the Project Gutenberg Web pages for current donation +methods and addresses. Donations are accepted in a number of other +ways including including checks, online payments and credit card +donations. To donate, please visit: https://pglaf.org/donate + + +Section 5. General Information About Project Gutenberg-tm electronic +works. + +Professor Michael S. Hart was the originator of the Project Gutenberg-tm +concept of a library of electronic works that could be freely shared +with anyone. For thirty years, he produced and distributed Project +Gutenberg-tm eBooks with only a loose network of volunteer support. + + +Project Gutenberg-tm eBooks are often created from several printed +editions, all of which are confirmed as Public Domain in the U.S. +unless a copyright notice is included. Thus, we do not necessarily +keep eBooks in compliance with any particular paper edition. + + +Most people start at our Web site which has the main PG search facility: + + https://www.gutenberg.org + +This Web site includes information about Project Gutenberg-tm, +including how to make donations to the Project Gutenberg Literary +Archive Foundation, how to help produce our new eBooks, and how to +subscribe to our email newsletter to hear about new eBooks. + + +</pre> + +</body> +</html> diff --git a/LICENSE.txt b/LICENSE.txt new file mode 100644 index 0000000..6312041 --- /dev/null +++ b/LICENSE.txt @@ -0,0 +1,11 @@ +This eBook, including all associated images, markup, improvements, +metadata, and any other content or labor, has been confirmed to be +in the PUBLIC DOMAIN IN THE UNITED STATES. + +Procedures for determining public domain status are described in +the "Copyright How-To" at https://www.gutenberg.org. + +No investigation has been made concerning possible copyrights in +jurisdictions other than the United States. Anyone seeking to utilize +this eBook outside of the United States should confirm copyright +status under the laws that apply to them. diff --git a/README.md b/README.md new file mode 100644 index 0000000..0fcf418 --- /dev/null +++ b/README.md @@ -0,0 +1,2 @@ +Project Gutenberg (https://www.gutenberg.org) public repository for +eBook #31743 (https://www.gutenberg.org/ebooks/31743) |
