summaryrefslogtreecommitdiff
diff options
context:
space:
mode:
authorRoger Frank <rfrank@pglaf.org>2025-10-14 19:56:20 -0700
committerRoger Frank <rfrank@pglaf.org>2025-10-14 19:56:20 -0700
commitc0f9b7c1dc774c0e9920c9ce5b7a9f43db3633ad (patch)
tree81aa1e646689382290ef781215312a57e2a9aa17
initial commit of ebook 31744HEADmain
-rw-r--r--.gitattributes3
-rw-r--r--31744-8.txt2528
-rw-r--r--31744-8.zipbin0 -> 34942 bytes
-rw-r--r--31744-h.zipbin0 -> 37150 bytes
-rw-r--r--31744-h/31744-h.htm2695
-rw-r--r--LICENSE.txt11
-rw-r--r--README.md2
7 files changed, 5239 insertions, 0 deletions
diff --git a/.gitattributes b/.gitattributes
new file mode 100644
index 0000000..6833f05
--- /dev/null
+++ b/.gitattributes
@@ -0,0 +1,3 @@
+* text=auto
+*.txt text
+*.md text
diff --git a/31744-8.txt b/31744-8.txt
new file mode 100644
index 0000000..347ebf7
--- /dev/null
+++ b/31744-8.txt
@@ -0,0 +1,2528 @@
+The Project Gutenberg EBook of Continuação do Portugal enfermo por vicios,
+e abusos de ambos os sexos, by José Daniel Rodrigues da Costa
+
+This eBook is for the use of anyone anywhere at no cost and with
+almost no restrictions whatsoever. You may copy it, give it away or
+re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included
+with this eBook or online at www.gutenberg.org
+
+
+Title: Continuação do Portugal enfermo por vicios, e abusos de ambos os sexos
+
+Author: José Daniel Rodrigues da Costa
+
+Release Date: March 23, 2010 [EBook #31744]
+
+Language: Portuguese
+
+Character set encoding: ISO-8859-1
+
+*** START OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK CONTINUACAO DO PORTUGAL ENFERMO ***
+
+
+
+
+Produced by Pedro Saborano (produced from scanned images
+of public domain material from Google Book Search)
+
+
+
+
+
+ CONTINUAÇÃO DO
+
+ PORTUGAL ENFERMO
+
+ POR VICIOS, E ABUSOS
+
+ DE AMBOS OS SEXOS.
+
+
+ _PART. II_
+
+
+ DEDICADO AO SENHOR
+
+ JOSÉ LUIZ GUERNER,
+
+ CONSUL DE S. M. SICILIANNA,
+
+ POR
+
+ JOSÉ DANIEL RODRIGUES DA COSTA,
+
+ ENTRE OS PASTORES DO TEJO
+
+ JOSINO LEIRIENSE
+
+
+ LISBOA:
+ NA IMPRESSÃO REGIA.
+ ANNO 1820
+
+ _Com Licença._
+
+
+
+
+_Em louvor do Autor, hum Genio dado ás Musas, bem conhecido, e muito
+applicado, mandou o seguinte_
+
+
+MADRIGAL.
+
+ Musa, (disse eu á gentil Clio hum dia)
+ Pois que ao jovial Josino
+ A palma déste da immortal Poezia,
+ Mimoso Dom Divino,
+ Com que louva a virtude, o vicio prostra,
+ E aponta as causas, e os effeitos mostra
+ Da decadencia nossa;
+ Dá-me tambem, que eu possa,
+ Cantando o Vate, que do Ceo nos veio...
+ «Basta (me torna Clio);
+ Suas obras, e não louvor alheio,
+ São o seu Elogio.»
+
+ _Campelo._
+
+
+
+
+Chama-se a isto hum
+
+PROLOGO.
+
+
+Curioso Leitor, ou Ouvidor, que não te escandalizo neste segundo nome,
+porque tambem he de lugar de letras, consta este Folheto da Segunda
+Parte de Portugal Enfermo por vicios, e abusos: continúa na mesma
+critica, na mesma boa moral, e com a costumada jovialidade. Mas se ainda
+assim mesmo achares este Folheto sem sal, dá-lhe alguma desculpa; porque
+foi acabado agora, e por isso vai muito fresco. Primeiro que o
+publicasse, fui consultar (como costumo em todas as minhas Obras,
+seguindo o preceito dos nossos antigos Mestres) com talentos superiores
+aos meus, judiciosos, e de bom criterio, que com sinceridade me
+asseverárão que este Folheto levava vantagem ao primeiro. _Si ita est,
+fiat._
+
+Não passárão de quatro até cinco genios mordazes, que não lhe podendo
+pôr outro defeito, forão publicando que a Obra não era minha, a ver se
+isto pegava, como pegou a moda do _Tiro-liro_ por toda a parte. Ora
+vejão Vossas Mercês, pelo amor de Deos, que tal ficaria eu quando
+mo disserão! A Obra não será minha; mas o primeiro Folheto imprimio-se,
+e reimprimio-se, e eu recebi o producto de mil e quinhentos Folhetos.
+Talvez que estes individuos campem melhor no público com cavallos
+emprestados, trastes, e dinheiros alheios, do que eu com versos de
+outrem! Nunca fui plagiario; antes os tenho encontrado de obras minhas:
+e desde a primeira, que imprimi, que foi a Obra dos Opios, ainda não
+mudei de estilo; porque me não acho com forças, para imitar os Guindados
+do tempo.
+
+Leitor, o primeiro paragrafo pertence-te, o segundo pertence aos quatro,
+ou cinco Ruminadores, que com caracter de mal intencionados Zoilos,
+mastigão toda a qualidade de papel, como fazem os que enjoão pelo mar: e
+diz muita gente boa ser isto hum remedio contra os enjôos; o que eu dou
+quasi por certo, porque já o vi verificado em varias Senhoras, que são
+as que enjôão no mar com mais facilidade.
+
+Aqui acabou o Prologo de repente. Coitado! Ainda ha pouco tempo estava
+de perfeita saude! Que não somos nada neste mundo, este Prologo o prova;
+porque, tambem na minha estimação, tornou-se em nada, e foi-se sem
+se despedir no Latino idioma, como os outros Prologos fazem talvez por
+não entender mais.
+
+Agora, Leitor, com ingenuidade dirás se a Obra em si alguma cousa
+
+
+ Vale em Portuguez.
+
+
+
+
+PORTUGAL ENFERMO PELOS VICIOS, E ABUSOS.
+
+ _Não sou Poeta de palavras crespas,_
+ _Com que alguns dão picadas, como vespas:_
+ _E no zunzum de termos exquisitos,_
+ _Só fazem o zunido dos mosquitos_
+ _Não escrevo por cifra, nem por cetra,_
+ _Nem sei fallar, senão ao pé da letra._
+
+ Do Autor.
+
+
+ Portugal, Portugal, não te conheço?
+ Vives esmorecido, e eu esmoreço,
+ Vendo-te com achaque tão profundo,
+ Que pouco já figuras neste mundo:
+ Perdeste toda a tua bizarria;
+ As familias perdêrão a alegria;
+ Todos andam de caras tristes, serias,
+ Não ouço senão prantos de miserias:
+ Ficarás só com casas, mas sem gente;
+ Pois muitos, de paixão, já vão morrendo;
+ Porque com a desgraça não podendo,
+ Caloteão, mendigão, degenerão,
+ E só na morte o seu descanço esperão.
+ Não se encontra em ti outro desafogo,
+ Que não seja o do jôgo, jôgo, jôgo,
+ Que he onde inda apparece algum dinheiro,
+ E já se faz officio de Banqueiro:
+ Nelle se encartão mais os ajudantes,
+ Socios olheiros, sempre vigilantes:
+ Qual rapaz, que nas terras põe gaiola,
+ Onde passaro mestre desenrola
+ Agradavel gorgeio, com que chama,
+ E as aves novas faz cahir na trama
+ Das varas enviscadas da costella:
+ Assim subtil Banqueiro arma a esparrella,
+ Sendo passaro mestre, que appresenta
+ De moedas em cruzios mais de oitenta,
+ Que estão chamando ao visco os coitadinhos,
+ Os quaes lhe vão cair, pobres patinhos!
+ Que quando o caso em sortes bem não corra,
+ O seu, e alheio vai tudo á desforra.
+ Hoje em qualquer função por essas sallas,
+ Depois do chá, escutão-se estas fallas:
+ A Senhora quer Ronda, ou quer Banquinha?
+ Vão se chegando a mãi, tia, e sobrinha,
+ E por desgraça (aqui fique entre nós)
+ Té para a Ronda vão mesmo as avós:
+ Quegilando o que tem cartas na mão,
+ Que a primeira inda deo, segunda não:
+ E se por hum acaso deo segunda,
+ Era vez de a pespegar recebe tunda;
+ Porque succede ás vezes, cousa rara,
+ Recolher inda menos que parára,
+ E attribue logo ao córte da velhinha
+ Ser a sorte com elle tão mesquinha.
+ Em outra sala estão tafues armados
+ De copos novos, grozas de bons dados:
+ Treze primeiro que oito, barro, topo:
+ Levou trez onças de ouro, passa o copo.
+ Busca para o passar qualquer aresto,
+ Que o parceiro não quer jogo de resto.
+
+ Dinheiro só se vê nestes combates,
+ E em cartuxos nas lojas dos rebates:
+ Ou seja em Baptizado, ou Casamento,
+ Função d'annos, ou outro ajuntamento,
+ Com outra qualquer cousa não se atina,
+ Vai-se seguindo sempre esta rutina;
+ Té depois de hum enterro huns enojados
+ Em casa do defunto os vi sentados
+ Jogando o Voltarete com franqueza,
+ Para se distrahir mais a tristeza.
+ Esta a paixão, que he hoje dominante,
+ E nisto he que a função se faz brilhante,
+ Sendo do Alcorão que no outro dia
+ Se murmure de quem nella perdia,
+ Dizendo-se: Fulano perdeo munto!
+ Cento e tantos mil reis tinha elle junto,
+ Em menos de huma hora, mas virou,
+ Perdeo o ganho, e a bolça despejou.
+ Hum Fulano de tal, que appareceo,
+ Esse quanto puxou tudo perdeo.
+ Cento e tantas moedas lá disserão,
+ Fóra cincoenta mais, que se não derão.
+
+ Aonde, Portugal, estão sumidos
+ Teus entretenimentos divertidos!
+ Aonde estão as Arias, as Modinhas,
+ Os Quartetos, que ao cravo sempre tinhas?
+ Os graves Minuetes bem dançados,
+ Pelas regras da Dança executados!
+ E no intrevallo a Dama mais discreta,
+ Dando o Mote engenhoso ao bom Poeta
+ Que em Sonetos, e Decimas galantes,
+ Parecião as horas huns instantes.
+ Estão divertimentos tão luzidos
+ A baralhos de cartas reduzidos;
+ Mas se julgas que nisso te confortas,
+ Verás que o jogo te ha de pôr por portas.
+
+ Portugal, Portugal! não te conheço!
+ De te vêr nesse estado desfaleço!
+ Quanto mais faltas vejo de dinheiro,
+ Mais vejo pôr-se o luxo de poleiro!
+ Até nos tratamentos tenho visto
+ Cousas, que fazem rir no meio disto.
+ Ninguem--Vossa Mercê--quer hoje em dia,
+ Hão de dar-lhe por força Senhoria:
+ E por maior nobreza, e mais decencia,
+ Já puxa a Senhoria huma Excellencia.
+ Tem este desacordo muita gente,
+ Mesmo sem nada ter com que a sustente:
+ Sem rendas, nem brazôes, tudo devendo,
+ Desta aura popular se vão mantendo;
+ E a quem nesta mania assim se ceva,
+ Ninguem lhe vá lembrar Adão, e Eva.
+ E que direi dos _Dons_? parecem praga!
+ Em qualquer parte o _Dom_ nasce, e propaga.
+ Ha _Dons_ já muito velhos, outros novos,
+ Além dos _Dons_, que estão inda nos ovos:
+ E se a menina em prendas se affamou,
+ O _Dom_ sahe logo á luz, não se gorou.
+
+ Eu vejo pais ás filhas embutindo
+ A escolha de Convento, persuadindo
+ Que passa vida santa, e descançada
+ Quem vive no Mosteiro clausurada.
+ E caminhando vão por este trilho,
+ Para que boa casa fique ao filho,
+ Fazendo professar as innocentes
+ Com festas, e visitas de parentes.
+ Em quanto os pais são vivos bem vai tudo,
+ As mezadas se cobrão a miudo;
+ Vive huma Freira em paz com alegria;
+ Conformando-se hum dia, e outro dia.
+ Mas em morrendo os pais tudo vai mal,
+ Nem pelo São João, nem no Natal
+ Se faz á pobre Freira pagamento,
+ Té ficar em total esquecimento;
+ Que o irmão, das mezadas incumbido,
+ Cuida só em fazer o seu partido:
+ Destroe a casa toda, como louco,
+ Que para nutrir vicios tudo he pouco;
+ Fica a mizera Freira mendigando
+ Pelas outras, que estão tambem penando.
+ Repetindo escrever a quem conhece,
+ Té vêr quem de seu mal se compadece.
+ Aqui temos os grandes beneficios,
+ Que os pais fazem com estes sacrificios,
+ Obrigando a Clausura, e Profissão
+ Quem nunca teve aquella vocação;
+ Sem ver que só acceita a Divindade
+ Esta vida abraçada por vontade;
+ Que huma Freira, por força alli metida,
+ A maldizer-se leva sempre a vida.
+ E armou-se rede tal com este dolo,
+ Para se regalar hum filho tolo,
+ Que estraga tudo, sem de si ter dó,
+ Ficando todos pobres, como Jó.
+
+ Eu vejo as circunstancias malignadas,
+ As origens dos ganhos estagnadas,
+ Os generos subindo, nós descendo,
+ Ora tristes chorando, ora gemendo.
+ Precisa-se dinheiro, não o temos;
+ E por desgraça nossa até já vemos
+ Os meios de o haver difficultosos.
+ Mas entretanto os homens viciosos
+ Não querem conhecer esta diff'rença:
+ Não ha flagello alheio, que os convença
+ A regular a vida de outro modo;
+ Não se apartão d'aquelle mesmo engodo;
+ O mal encaminhado continúa,
+ Gastando o que não tem, que he balda sua.
+ Deixa a mulher sem pão, filhos sem fato;
+ E a moça desfrutando hum grande trato;
+ Sem vêr que huma mulher deshonestada
+ Não tem caracter firme, he descarada;
+ Pois basta a causa ser, como he sabido,
+ Da mulher viver mal com seu marido.
+ Estas loucas ruina são do homem,
+ Que quantos reaes tem tudo lhe comem;
+ E porque para tanto não tem rendas,
+ De ladrão mui subtil nos mostra as prendas:
+ Qual fogo, que devora quanto apanha,
+ Com o que não he seu tambem se amanha;
+ E quando se descobre, e se receia,
+ Ou quebra, ou foge, ou vai a huma cadeia.
+ O que joga, e que em jogos passa a vida,
+ Joga sem conta, pezo, nem medida;
+ O que se trata bem, e dá jantares,
+ Em funções tudo vai por esses ares;
+ O que tem outros vicios adoptado,
+ Porque nelles está habituado,
+ Nutrillos he o seu mais bello vinho,
+ Nem o tempo lhe ensina outro caminho;
+ Não ha destes hum só, que se contenha,
+ Antes nestas despezas mais se empenha;
+ E não sabendo donde lhe hão de vir,
+ Como quer ás basofias acudir,
+ Fingindo que a escacez lhe não faz mossa,
+ E que inda tem dinheiro, com que possa
+ Ostentar o que d'antes ostentava,
+ O remate he furtar, pois não o cava.
+
+ Portugal, Portugal! não te conheço!
+ Cada vez mais de ti me compadeço!
+ Eu vejo humas familias tolineiras,
+ Que nunca em suas casas são festeiras;
+ Ajustão as funções botando a idéa
+ A terem meza posta em casa alhêa.
+ Rio-se muito, bastante se brincou;
+ A familia da casa he que o pagou.
+ A noite foi da vespera perdida,
+ Só para se acudir com tanta lida
+ As massas, aos recheios, aos guizados,
+ A depenar as aves, aos assados:
+ As criadinhas postas aos fogões,
+ Padecendo depois constipações,
+ Que todas trabalhárão na officina,
+ Para prompta se pôr a pappa fina.
+ Quando o dono da casa sente a asneira,
+ Já não póde sahir da ratoeira;
+ Mas he bem bom que assim fique ensinado,
+ Para vir a ser mais acautelado,
+ E fugir dos ajustes puxativos,
+ Feitos por certos genios logrativos,
+ Promptos para banquetes, onde os ha,
+ Porém que em suas casas só dão chá.
+
+ Eu vejo certos homens costumados
+ A mostrarem-se muito desvairados;
+ A cousa alguma prestão attenção;
+ Nas cousas de maior ponderação
+ Com chufas, e risadas só respondem,
+ E ás vezes muita asneira nisto escondem;
+ Por systema, por vicio, ou por maldade
+ Fogem de conversar com seriedade:
+ De todas as perguntas fazem mofa,
+ Só por tratarem tudo de galhofa;
+ Deixando os dependentes mais afflictos,
+ Por verem termos taes tão esquisitos:
+ Sujeitão-se, calando, os que dependem,
+ Mas ficão em jejum no que pertendem.
+ Homens assim não são muito seguros,
+ Que trazem a cabeça sempre a juros.
+ Cuidado lhes não dá o alheio int'resse,
+ Pobre de quem depende, e quem padece.
+
+ Eu vejo muitas casas de partidas,
+ Que são com as dos doudos parecidas.
+ Vem entrando co' a noite os assignantes,
+ Passão em conversar breves instantes.
+ A Prima conta á Prima o máo successo
+ De huma esperta gatinha côr de gesso,
+ Com malhas no focinho, e no costado,
+ Que fazem o animal muito engraçado:
+ Relata o muito amor, que ella lhe tem,
+ Enlevada naquelle bom desdem.
+ Sahe d'alli logo Dona Presumida,
+ Meia tafulla, meia convertida,
+ (Que ao certo ninguem sabe inda entendella,
+ Se ella he que deixa o mundo, ou elle a ella)
+ E diz que tem por cousa do demonio
+ Haver homem, que fuja ao Matrimonio.
+ Como a materia he vasta, vai durando,
+ Huns mettendo-a em questões, outros mofando.
+ Chega o chá co' as fatias transparentes,
+ Que lhes ficão pegadas pelos dentes.
+ Assim se passa aquelle bocadinho,
+ Té que as bancas se põem para o joguinho.
+ Então he que a criada da cozinha
+ Desenferruja a lingoa co' a vizinha;
+ Então he que outra á porta do jardim
+ De seus amores vai tratar o fim:
+ E a velha Preta á chaminé, qual mono,
+ Sempre a cabecear, pôdre de somno;
+ Porque os donos da casa divertidos,
+ Da Partida tirar querem partidos.
+ Nada os póde fazer deixar o jôgo,
+ Só vindo-lhes dizer que em casa ha fogo;
+ E em quanto se entretem com este aresto,
+ Fica á vontade da familia o resto;
+ Que por isso da casa mal guardada
+ Se tem visto fugir filha, ou criada;
+ Ou succeder a alguma rapariga
+ O que a decencia manda que eu não diga.
+ Muita cautela, e não facilidades,
+ Evita nas familias novidades;
+ Porque donas de casa não previstas,
+ Que não sabem deitar por tudo vistas,
+ Sem determinação, amanho, e zelo,
+ Hão de achar muito roubo, e desmazelo:
+ Nos armarios mil cousas estruidas,
+ As casas int'riores nem varridas,
+ Sobejos de comer dentro do cobre,
+ Por se não dar de esmola a tempo ao pobre:
+ Sem duração a roupa, nem aceio,
+ As lingoas das criadas sem ter freio;
+ Pouco, e pouco a dispensa dizimada;
+ Louça fina escondida por quebrada;
+ E os vexados maridos com prudencia,
+ Dizendo lá comsigo: Ora paciencia!
+ Porque se ralhão, são insupportaveis,
+ Se fechão tudo, são huns miseraveis,
+ Se trombudos, são mal encaminhados,
+ Se castigão, são homens mal criados;
+ Ellas querem sómente andar nas palmas,
+ E os maridos, que peção para as Almas;
+ Com tanto que ande Sempre a bolsa aberta,
+ Que he quando com marido bom se acerta.
+ Conheço que ha familias de bom porte;
+ Não he nestas que assenta este meu corte:
+ Nem ás outras tambem me determino
+ Levando nesta critica destino.
+ Atiro estes meus botes não pequenos,
+ Porque o mundo tem disto mais, ou menos.
+
+ Eu vejo huns homens ricos suffocados,
+ Té da sombra dos mais desconfiados,
+ Que vão, por ver se fica bem segura,
+ Mil vezes apalpar a fechadura
+ Da burra, que n'hum lado tem da cama,
+ Temendo da familia alguma trama;
+ E homens taes, afogados em riquezas,
+ Raras vezes se lembrão da pobreza;
+ Havendo casas tão necessitadas,
+ Nunca por elles são remediadas:
+ Por mais ouro, que tenhão, que lhes sobre,
+ He raro quando dão dez reis a hum pobre.
+ Hum só rasgo não tem de caridade
+ Para a triste viuva, ou orfandade.
+ Não sei que contas fazem homens taes
+ Ajuntando, e escondendo os cabedaes!
+ Morrem té sem fazerem testamento,
+ Espirando n'hum trato o mais nojento,
+ Depois de vida sórdida, e mesquinha,
+ Que nem mandão comprar huma gallinha.
+ E vão-se deste mundo rebolindo,
+ Em quanto delles fica o mundo rindo:
+ Acabão supportando aquella surra,
+ Botando sempre os olhos para a burra.
+ Ora descance em paz, senhor defunto;
+ Cá fica quem lhe espalhe o que tem junto!
+
+ Eu vejo certos homens systematicos,
+ Que em tudo quanto pensão são fanaticos:
+ Cada falla he o estrondo de huma bomba,
+ Até parecem ter de porco tromba;
+ Fallão pouco, e não gostão de ouvir nada,
+ Tudo quanto se diz tudo os enfada.
+ Hum Cavalheiro deste paladar
+ Na loja de hum barbeiro foi entrar.
+ O mestre fez-lhe a barba in continente,
+ Mas no muito fallar impertinente.
+ Feita a barba, o soturno Cavalheiro
+ Disse ao tal fallador mestre barbeiro:
+ Pois que o vejo verboso em novidades,
+ E em discursos de varias qualidades,
+ Queira dizer-me, que saber preciso,
+ Qual he o animal de mais juizo?
+ Que era o boi, respondeo o mestre prompto.
+ Isso somente expressa hum homem tonto,
+ Lhe disse o cavalheiro, e não cuidava
+ Que huma resposta avêssa assim me dava.
+ Tornou-lhe o mestre: he o cão ao dono grato.
+ Tambem não acertou por mentecapto,
+ Lhe disse o Cavalheiro, ouça-me attento,
+ Para tirar d'aqui hum documento.
+ O bode he o animal nada ignorante,
+ Porque sendo de barbas abundante,
+ Tendo-as compridas, nunca as quiz fazer,
+ Sómente por barbeiros não soffrer.
+ Assim ficou o mestre corrigido,
+ Para ser em fallar mais comedido.
+
+ Portugal, Portugal! não te conheço!
+ E quanto tu padeces, eu padeço!
+ Pois te vejo mais triste do que o dia
+ De envernosa estação! Quem tal diria!
+ Andas debilitado, empobrecido,
+ Saudoso, sem descanço, e esmorecido!
+ O teu Xavier de Mattos bem fallou,
+ No galante Soneto, que traçou,
+ Quando disse com arte, e natureza,
+ Que da soturna imagem da tristeza
+ Era hum retrato vivo, e verdadeiro
+ _Qualquer homem de bem sem ter dinheiro_;
+ Cuja falta tem feito no presente
+ A ruina fatal de tanta gente.
+ Mas no meio de quanto se padece,
+ Hum genio creador nos apparece,
+ Que por nossa fortuna nos offerta.
+ Huma bem importante descuberta:
+ E bem se deixa ver no raro invento
+ O quanto póde hum homem de talento.
+ De bons engenhos nasce a emulação,
+ Com que se aperfeiçôa huma nação.
+ Receba parabens toda a Cidade
+ De huma cousa de tanta utilidade.
+ Não supponhão que he plano, ou são maneiras
+ D'a ferrugem tirar ás oliveiras:
+ Não cuidem que he fazer dar direcção
+ Hum viajante aerio ao seu Balão:
+ Nem deve presumir tambem o povo
+ Que tem de guarda-quedas molde novo:
+ Este invento os perigos acautela,
+ Mas em substancia he cousa mui singela.
+ Agora me parece estar ouvindo
+ O Leitor curioso serio, ou rindo,
+ Dizer-me ou assentado, ou posto em pé:
+ Basta de franja, acabe, diga o que he!
+ Ora eu o satisfaço: Ha hum Fulano
+ Dos que vestem casaca de bom panno,
+ Que por idéa sua, e risco seu
+ Para huma tenaz o molde deu.
+ Eu a vi, a qual era fabricada
+ De hum poído metal, obra aceada:
+ Hum destes ferros de encrespar cabello
+ He mesmo o da tenaz fiel modelo.
+ De curioso eu, que o traste via,
+ Logo quiz indagar de que servia?
+ Disse-me o inventor que fora feito
+ Por servir a quem fuma de proveito:
+ Que o lume no sigarro mais atura,
+ Huma vez que a tenaz he que o segura;
+ Que faz esta invenção perder os medos
+ Aos sigarristas de queimar os dedos;
+ Que os Mouros tem cachimbos de huma vara,
+ Que a tenaz he aceio, e moda rara.
+
+ Agora se descobrem novas minas,
+ Com outras invenções mais genuinas;
+ Já temos hum moinho de vapor,
+ Que o de vento não móe talvez melhor.
+ De vapor hão de haver carros tambem:
+ Nas seges eu espero o mesmo trem.
+ Se a cousa for feliz, e se pegar,
+ Muitas cousas havemos de poupar!
+ Os machos, desta sorte, escusos são,
+ Hão de ficar em bestas de ceirão
+ Não terão preço a palha, nem cevada.
+ Se chego a ver tal maquina ultimada,
+ Affectando de grande personagem,
+ Protesto sempre andar de carruagem.
+ Grande cousa ha de ser, se se inventar
+ O modo do vapor nos sustentar!
+ Despeço-me de açougues, e Ribeira,
+ E digo adeos á Praça da Figueira.
+ He tudo isto bem bom; mas o peior
+ He faltar o dinheiro no melhor!
+ E assim como nas Caldas toda a gente
+ Se anda sempre queixando de doente,
+ Nós aqui com a mesma singeleza,
+ Só ouvimos clamores de pobreza:
+ Molestia, que amofina, e que faz tedio,
+ Que nem nas Caldas póde achar remedio.
+ Luxo, e mais luxo, pôdres, e mais pôdres,
+ Tudo cheio de vento, como os ôdres!
+ Ha huns homens sagazes de tal sorte,
+ Que desfrutarem muito he o seu forte;
+ Pois no ramo, em que lidão, e em que estão,
+ Não deixão escapar occasião:
+ Vão-se enchendo, e fazendo caramunha,
+ Só para que ninguem lhes veja a unha:
+ Mostrão-se mui zelosos com systemas,
+ Mas tem sempre o seu ovo duas gemas.
+ E aqui fica a razão verificada
+ De huns virem a ter tudo, e outros nada!
+ A huns tudo lhes vai bater á porta;
+ Outros não passão já da cepa torta!
+ Isto mesmo succede a mais de mil,
+ E eu comparo estas cousas a hum funil.
+ O que póde beber pelo bocal,
+ Sacia-se, e não vai de todo mal;
+ E quem pelo canudo sorve o vinho,
+ Tira quinhão, porém muito mesquinho.
+
+ Portugal, Portugal! o que bem pensa,
+ Tem encontrado em ti grande diff'rença!
+ Perdeste em alguns homens a verdade,
+ Que dava sempre tom á sociedade.
+ Em poucas partes ha palavra firme,
+ E não falta com que isto se confirme.
+ A minha Musa de apontar se izenta,
+ Melhor o ha de applicar quem o exp'rimenta.
+ Eu admiro nos homens hoje em dia
+ De tocar os extremos a mania!
+ Que ou perdularios gastão quanto tem,
+ Fazendo mal a si, e aos outros bem;
+ Ou tão mesquinhos são, tão acanhados,
+ Que nem bons dias dão, por serem dados.
+ Pouco briosos são, faltos de acções,
+ Remoques não lhes fazem vexações:
+ Nada querem, que custe hum só vintem,
+ Só o que he de tolã lhes sabe bem.
+ Não querem acertar n'hum meio termo;
+ Estes, e outros que taes te pôem enfermo.
+ Os homens de algum dia praticavão
+ A boa educação que os Pais lhes davão;
+ Mas hoje alguns modernos estou vendo,
+ Que logrativos vão o tempo enchendo,
+ Porque o que de espertezas mais se jacta,
+ Engana aquelle mesmo com quem trata.
+ Tem-se hoje descuberto novos trilhos;
+ Nem ha filhos por pais, nem pais por filhos:
+ Não vejo senão genios desiguaes;
+ Usão todos de termos mui geraes:
+ _Verbi gratia_, Desejo-lhe prestar;
+ Se precisar de mim, ha de me achar;
+ Conheça que sou sempre seu amigo;
+ Em tudo o que eu puder, conte comigo.
+ Tudo palavras ocas, sem substancia,
+ Ditas sem fé, com arte, e sem constancia.
+
+ Tambem vejo alguns homens em balanças
+ Navegando no mar só de esperanças:
+ Figurões, que povôão este mundo,
+ Mas tem os fundos seus todos no fundo.
+ Abalrôão co'a gente empavezados,
+ Em quanto se não mostrão naufragados;
+ Depois são qual a uva já passada,
+ Que mostra baga, e pelle, e çumo nada.
+ Portugal, tu tens tido alguma gente,
+ Que se tem feito a si, e a ti doente.
+ Muita especulação vejo eu fazer,
+ Que em lugar de lucrar, bota a perder;
+ Pois de ter perda certa não se izenta
+ Quem para tirar dez dispende oitenta.
+
+ Portugal, Portugal! não te conheço!
+ Que me fazes tristeza te confesso!
+ Homens ha mais nocivos do que a peste,
+ E senhoras tambem de genio agreste:
+ Enfadão-se com todos, e com tudo,
+ E parece que o fazem por estudo!
+ Não cessão de ralhar, e de moer
+ As familias, por dar-lhes que soffrer:
+ Trazem a casa toda em labyrintho,
+ Pela condição aspera, que pinto.
+ Tambem homens encontro de tal modo,
+ Que assentão que he já seu o mundo todo;
+ Humas caras, que estão sempre estanhadas,
+ Que ou riem muito, ou são embuziadas.
+ Com condições assim não ha quem possa,
+ A reprehensão não vexa, nem faz mossa.
+ Isto nasce dos mimos, que lhes dão
+ Nas faltas da primeira educação.
+
+ Vejo huns homens tambem affeminados,
+ No gesto, e no fallar muito affectados,
+ Todos sentimentaes, cheios de nicas,
+ Que algum dia chamavão-se Maricas;
+ Mas assentárão hoje bons engenhos,
+ Que devião chamar-se homens gamenhos.
+ A origem deste nome bem se aponta
+ N'hum caso jovial, que ahi se conta.
+ E são recommendaveis taes figuras
+ Nos tregeitos, e vãs caricaturas;
+ Té mastigão fazendo muito mômo
+ O cheiroso Indiano cardamômo,
+ O qual trazem na boca largas horas,
+ Para terem bom bafo entre as senhoras;
+ Nem perdoão ao seu mestre barbeiro
+ A dedada de banha de bom cheiro.
+ E já houve hum, que tendo a irmã de parto,
+ E entrando casualmente no seu quarto,
+ O cheiro da tal banha muito activo
+ Da pobre endoudecer foi o motivo.
+ Antes do Terremoto se munião
+ De pastilhas de cheiro, que trazião,
+ Em pivete, e em almiscar enfrascados,
+ Parecião de alcorce ser formados.
+ Destas verdades não se escandalizem,
+ Que ainda ha velhos vivos, que isto dizem.
+ Então erão faceiras, e casquilhos
+ No principio da moda dos polvilhos;
+ Pelos tempos vierão a peraltas,
+ Mas hoje são tafues, e alguns com faltas:
+ Os quaes agora tem por maravilha
+ A barriga apertarem co' huma cilha,
+ Enfivelada com tal arte, e geito,
+ Que a barriga se encolha, e altêe o peito;
+ Porque querem mostrar que podem ter
+ Perfeitos _patriotismos_ de mulher.
+ Que errei esta palavra não se pense;
+ Pois vem na biblioteca Tafulense
+ Com _pitéo_, com _pinóia_, com _chalaça_,
+ _Cucanha_, _mujangué_, _Caurím_, que embaça
+ E para o peito ter maior altura,
+ E mostrar o que querem na figura,
+ Dão aos seus alfaiates a matraca
+ De almofadar as bandas da casaca.
+ Ora em trazerem cilha acho razão,
+ Visto haver ferradura por tacão!
+ São estas invenções todas de fóra,
+ Nós somos de outros reinos firme escora.
+ Os mais aprestes elles virão vindo,
+ Pois que as outras nações ficão-se rindo,
+ Mandando engodos taes a Portugal
+ Por sommas de dinheiro em bom metal.
+ Tomára persuadir aos que usão disto
+ Que usassem o que a muitos tenho visto:
+ Nas modas meio termo, e na despeza,
+ E nada de emendar a natureza.
+ Deixemos que hum tal sestro as Damas tomem;
+ Que a perfeição do homem he ser homem,
+ E não trazer pescoço almofadado,
+ Tingir cabello já esbranquiçado,
+ Ou pôr grande chinó da côr da amora
+ Co' as bellezas mui brancas, e de fóra,
+ Como vejo aos que são de meia idade
+ Filhos só do amor proprio, e da vaidade:
+ Com outros desacordos deste lote,
+ Que de certo não falta quem os note.
+
+ E que direi de velhos enfeitados,
+ Que são a hum cêpo bem assemelhados?
+ Assim como eu, que o digo, a quem os annos
+ Feito hum espelho tem de desenganos,
+ Mas se viuvo estou, e já maduro,
+ Viuvo ficarei pelo seguro.
+ Não obstante elles verem-se encolhidos,
+ De pernas a vergarem carcomidos,
+ Assim mesmo meninas vão buscar,
+ Querendo-lhes fazer seu pé d'altar:
+ Sem se lembrarem que huma franga nova
+ Atira com hum velho para a cova.
+ Se buscassem dos annos a igualdade,
+ Inda lhes perdoaria a leviandade;
+ Mas quererem que as pobres raparigas,
+ Que por pouco escapárão das bexigas,
+ Atrás de algum vintem vão á lambugem,
+ E que morrão de nojo, e de rabugem!
+ Não posso levar tal á paciencia!
+ Amor isto não he: conveniencia.
+ Que em casamentos taes bem se conhece
+ Serem ellas escravas do interesse.
+ Que prazer póde ter muito a seu salvo
+ A que se liga a hum velho chôcho e calvo?
+ He muito natural mais lhe aborreça,
+ Se calvo for de quanto ha na cabeça;
+ Pois velho, que namora, e que se enlaça,
+ Tem a cabeça igual a huma cabaça;
+ E porque a natureza lhe he avessa,
+ Se tem dor de vazio he na cabeça.
+ Coitado! na figura, em que se vê,
+ Já podião chamar-lhe a morte em pé.
+ Mas no dia do alegre casamento
+ Resuscita com tal contentamento,
+ Que he pena ter o velho, que faz rizo!
+ Resurreição sem dia de juizo.
+
+ Tambem noto que hum velho de algum dia
+ Para a terra curvado he que pendia,
+ Grossa bengala a corpo hia sustendo,
+ E sobre as costas a marrã crescendo
+ Mas parece que a mesma natureza
+ Nos quer mostrar que nada tem firmeza;
+ Pois que os velhos, a quem tudo desanda,
+ Andão hoje tombados a huma banda.
+ Na velhice o estupor se reconcentra,
+ E não torna a sahir huma vez que entra.
+ Por acaso algum dia se fallava
+ Que em alguma pessoa estupor dava.
+ Eu sim me enganarei, mas ajuizo
+ Que nos vem este grande prejuizo
+ Do pão, do vinho, do vinagre, e azeite,
+ Quando generos taes levão enfeite.
+ E se isto assim não he, porque razão
+ Só em Lisboa ha tal repitição?
+ E lá fóra nas Villas, e Cidades
+ São estas cousas humas raridades?
+ Porque ha lá menos gente? Não convence;
+ Bem que he mui natural que assim se pense.
+ E hoje até na florida mocidade
+ Se está vendo huma tal calamidade;
+ Mas os moços, álem da razão dada,
+ Tem outra circunstancia mais pezada,
+ Que he o irem por gosto aos sacrificios,
+ Para as forças perderem pelos vicios.
+
+ São a saude, e o tempo dois objectos
+ Estimados dos homens circunspectos;
+ E diz a mocidade que tambem
+ Estas cousas em grande valor tem:
+ Porém com appetites, e loucuras
+ Enxadadas vão dar nas sepulturas.
+ Hum perdeo a substancia, o outro a côr
+ Aquelle anda tolhido de huma dor.
+ E já tantas molestias lhes acodem.
+ Que nem armas, nem letras seguir podem:
+ Sobrevindo-lhes tal debilidade,
+ Que não podem gozar de longa idade.
+ Perdem filhos os pais, o Rei vassallos,
+ Porque a chusma dos vicios vem cortallos.
+ Nelles a mocidade he que se illude
+ Para estrago do tempo, e da saude:
+ Preciosidades estas, que perdidas,
+ Não vemos com que possa o ser suppridas.
+
+ Portugal, Portugal! não te conheço!
+ Do que és, e do que foste não me esqueço!
+ Dos teus usos antigos te tiraste,
+ E he problema entre nós se melhoraste!
+ Do que tinhas melhor já te esqueceste,
+ E o que perder devias não perdeste!
+ Puzeste cousas mil em confusões
+ Das modas, que te vêm de outras naçõês:
+ Té desprezas o solido alimento,
+ E por isso te vejo tão gosmento;
+ Não tens senão defluxos catarrosos,
+ Indigestões, topôres perigosos,
+ Com que continuamente te prantêas,
+ Fruto de altos jantares, grandes cêas:
+ Ha cinco, e seis cubertas, e ha pessoa,
+ Que a hum só prato que seja não perdoa.
+ Hum individuo assim Pai Pai segundo,
+ He capaz de comer quanto ha no mundo.
+ Fica esmola a pedir quem o supporta:
+ Tal gente longe vá da minha porta!
+ Portugal, sê na meza acautelado;
+ A gula te vai pondo em triste estado:
+ Já nas cazas de pasto frequentadas,
+ Já nas mezas dos ricos enfeitadas,
+ Mostras fastio á sôpa, vaca, arroz,
+ Só queres fricassés, e fricandoz;
+ O rosbife, que em sangue inda escorrendo,
+ Os estômagos vai assim perdendo;
+ Rabiolos, fatia á Prussiana,
+ Pitéos de toda a casta de chanfana;
+ Que ha cozinheiro tal, tão delicado,
+ Que de folhas de parras faz guizado,
+ Mujangués, varios môlhos, e frituras,
+ Leite creme, pudins, e outras misturas,
+ Compotas com as caldas refervidas;
+ Tudo isto pouco a pouco acaba as vidas.
+ Depois tens nos cafés vastos licôres,
+ Que alguns até se bebem pelas côres:
+ Hum porque he côr de roza muito vivo,
+ Outro o ser côr de goivo faz motivo;
+ O de cravo, que agita, bem que esquenta,
+ Hum, que se estima de hortelã pimenta;
+ O licor de canela, o marrasquino,
+ Licor de ouro tambem que he caro, e fino.
+ Eu inda espero ver licor de cardos,
+ De alfazema, tomilho, e lirios pardos.
+ Sahe hum Taful d'alli, que he todo braza;
+ Se tomasse cantharides em casa,
+ Não julgava ficar assim tão forte;
+ Quer conservar a vida, e busca a morte.
+ Se não se emenda disto, anda enganado,
+ Cuida que morre cru, morrendo assado.
+
+ Portugal, em mil couzas tens mudado!
+ Só te vejo aos abusos afferrado!
+ Por exemplo: jogar-se tanto o entrudo,
+ Em que se insulta o homem mais sisudo,
+ Com agua, pós, laranjas, pulhas, peças,
+ Em que aberto se tem tantas cabeças!
+ Louvo que jantes bem nesses tres dias,
+ Mas reprovo da cêa as demazias.
+ Pois comes sem discurso, ou reflexão,
+ Para teres p'rigoza indigestão!
+ Tens outro abuso, que he serrar a velha,
+ Tolice, que não póde ter parelha;
+ Para andarem por frios, e por lamas
+ Os homens a fugir das suas camas,
+ Fazendo levantar, vir á janella,
+ Para se constipar esta, e aquella,
+ Que sem juizo algum ama, e criada
+ Perdem a noite nessa mascarada,
+ Até que no outro dia a cozinheira
+ Dá ao demo tão grande babozeira;
+ Pois não podendo o somno disfarçar,
+ Deixou entrar o caturro no jantar.
+ E que direi tambem das boas Festas?
+ Não devo criticar couzas como estas;
+ Porque trazem motivo mui sagrado,
+ Com que todo o Christão, bem educado,
+ Deve ter alegria, e grande gloria
+ Em trazer taes motivos á memoria.
+ Mas quizera, encontrando-se as pessoas,
+ Que abraçando-se, dessem Festas boas;
+ E que os que mais pudessem nestes dias,
+ Embora uzassem grandes bizarrias,
+ Mandando, não Bilhetes de prezente,
+ Mas sim couzas, que alegrem o olho á gente:
+ Bons perús, porcos, patos, ou perdizes,
+ Seis gallinhas com doze codornizes,
+ Tortas, pudins, pasteis, ou pastelões,
+ Finas broas, gostozos massapões.
+ Eis-aqui humas Festas de prazer,
+ Que são de consolar, e agradecer.
+ Isto prova a amizade ser fiel,
+ E val mais que tirinhas de papel,
+ Ou Bilhetes de nomes em cartão,
+ Que os criados ás vezes nem os dão:
+ A sege mui fechada á porta chega
+ A procurar aquelle, que se nega;
+ E muito digno he de se notar
+ O que de ambos devemos ajuizar;
+ No da sege bem he que se supponha
+ Que de dar Boas Festas se envergonha;
+ Porque vai tão fechado, e tão occulto,
+ Que parece que teme algum insulto.
+ E esse, que em caza está, do amigo á espreita,
+ Em não fallar-lhe faz-lhe huma desfeita.
+ Por isso implicão taes formalidades
+ Com as bem reguladas amizades.
+
+ Dizem que quanto mais se vai vivendo,
+ Mais couzas, nunca vistas, se vão vendo;
+ Mas eu outro conceito he bem que forme,
+ Que quanto mais se vive, mais se dorme;
+ E dou esta razão, porque supponho
+ Que viver, e dormir he tudo hum sonho.
+ Sonho parece quanto vejo, e digo,
+ Além do quanto fica só comigo.
+ Porém vamos a couzas divertidas,
+ E fallemos de velhas presumidas,
+ Que algumas ha de tanta affectação,
+ Que por invencioneiras dão penção.
+ Huma velha vi eu tão melindroza,
+ Que fugia do cheiro de huma roza,
+ Dizendo lhe exaltava logo o flato;
+ Tão estragado estava aquelle olfato!
+ Succedeo de vizita ir esta lesma
+ A caza de outra igual Dona Seresma
+ A tempo que entrou logo outra vizita
+ De huma grave Senhora, mui bonita,
+ A qual tinha nas tranças espetada
+ Huma perfeita roza avermelhada;
+ E porque ao pé da velha se assentou,
+ Logo a velha aos arrotos começou,
+ Dando desta molestia por motivo
+ Daquella roza o cheiro muito activo:
+ Foi crescendo a afflicção a mais e mais,
+ E com afrontamentos grandes ais;
+ Cahio do canapé torcida toda
+ Com huma convulsão destas da moda.
+ Acodio-lhe a Senhora a toda a pressa,
+ Que trazia a tal roza na cabeça,
+ Dizendo que era sêca, e que a comprára,
+ Por ser roza de musgo, linda, e rara;
+ Obra feita por mão de huma Franceza,
+ Que nas flores imita a Natureza.
+ Quando a velha ouvio tal, envergonhada,
+ Fingio tornar a si com lã queimada;
+ E foi então geral a zombaria,
+ Que fez da dita velha a companhia.
+ Eis-aqui as molestias, que dão rizo,
+ E a que se expõem com faltas de juizo
+ As velhas infundidas em vaidade,
+ Que querem sempre estar na flor da idade;
+ Que ha velha, que no modo de trajar,
+ Presume as raparigas desbancar.
+
+ Eu vejo raparigas enfeitadas,
+ Rethoricas, porém pouco applicadas,
+ De orelha palavrinhas apanhando,
+ Com as quaes aos tafues vão affectando.
+ Huma carta vi eu de huma senhora,
+ Muito desvanecida de Doutora,
+ Cuja carta era em verso, e era de amores:
+ Queixas de auzencias, zelos raladores;
+ Quando só tinha lido a mocetona
+ As guerras de Alecrim, e Mangerona.
+ A carta não me lembra até ao fim,
+ Porém o seu principio vinha assim;
+
+ _De pungentes receios combatida,
+ Lembrando-me talvez o ser trahida,
+ O meu ciume trepido, fervente
+ Adeja sobre mim avidamente:
+ Eu desafio a magoa, e a impaciencia
+ No campo dilatado de huma auzencia,
+ Ululando, e exprimindo o sentimento,
+ Que me despenha em grande abatimento:
+ Anhelando appellar nesta fraqueza
+ Para o tribunal dubio da fineza._
+
+ Que tal foi este parto sem parteira?
+ Ella chamou-lhe carta, eu chamo asneira.
+ Não critico as Senhoras instruidas
+ Em bons Autores, e Obras escolhidas,
+ Que com principios bons de educação
+ Mostrão que tem juizo, e tem lição:
+ Senhoras ha discretas, que nas fallas
+ Tomárão muitos homens imitallas.
+ Tambem não noto aquellas coitadinhas,
+ Que lidão com dedal, agulha e linhas,
+ Vivem do bastidor, ou da almofada,
+ Que essas tempo não tem para mais nada.
+ Só murmuro daquella não sizuda,
+ Que em trez dias a fórma ás modas muda,
+ Que só cuida do luxo mui garrida,
+ Da belleza, que tem, desvanecida;
+ Não lhe importa nem ler, nem trabalhar,
+ E o que sabe he somente namorar,
+ De janella esperando os valdevinos,
+ Feitas huns papagaios femeninos;
+ Formosuras pasmadas quanto a mim,
+ Bem proprias para estátuas de jardim.
+
+ Portugal, Portugal! não te conheço!
+ Cada vez te vou vendo mais avêço.
+ Eu vejo tambem homens presumidos,
+ Com desvanecimento de instruidos;
+ Porém he hum saber tão fôfo, e escasso,
+ Que andão a tropeçar a cada passo.
+ Criticão tudo, nada se respeita,
+ Sem saber onde tem a mão direita.
+ Soffrer já mais se póde que a ignorancia
+ O merito confunda co' a jactancia.
+ A ponto se me está reprezentando
+ Hum caso, que nos vem aqui frizando:
+ Nosso insigne Pintor Alexandrino
+ Fallou ao Preto velho Pai Justino,
+ Para que lhe caiasse a propriedade
+ De humas casas, que tinha na Cidade.
+ Caiou-lhe o Preto a frente muito bem,
+ E no fim não lhe quiz levar vintem,
+ Dizendo que hum a outro companheiro
+ Era desattenção levar dinheiro.
+ Ora, assim como o preto, muita gente
+ Sonha em ser grande cousa de repente!
+
+ Assentemos que o mundo cada dia
+ He de doudos extensa enfermaria;
+ Porque hum ser Mathematico projecta,
+ Outro insigne Pintor, outro Poeta;
+ Hum a Musico vai, outro a Letrado,
+ Outro na Medicina he enfronhado;
+ Hum he Filósofo, outro he Arquitecto,
+ Outro quer ser da Lua, e do Sol neto;
+ E muitos sem principios, nem razão,
+ Não sabem mostrar mais que presumpção;
+ Pertendendo roubar a fama, e gloria
+ A quem cançou com livros a memoria.
+ He tudo enthusiasmo, e parvoice,
+ Desconcertos nascidos da doudice:
+ E nas varias manias, que contém,
+ Assenta cada qual que assim vai bem.
+ Mas se viver por gosto assim pertendem,
+ Que nem já huns aos outros bem se entendem,
+ Vão vivendo, que as cousas deste mundo
+ Humas ficão em cima, outras no fundo;
+ Porque a razão nos mostra, e nos ensina
+ Que tudo toca a meta, e então declina.
+
+ Portugal, Portugal! nao te conheço!
+ Quanto mais penso em ti, mais esmoreço.
+
+ * * * * *
+
+
+_Explicação dos Enigmas, Adivinhações, e Charades do 1.º Folheto, ou
+primeira Parte desta Obra._
+
+O 1.º Enigma he = a letra _O_ = o 2.º = _Dedos_ == o 3.º = _Pares de
+luvas_ = a Adivinhação = _Figos_ = a 1.ª Charade = _hum Soldado_ = a 2.ª
+Charade = _hum Caçador_ =.
+
+
+
+
+_Escolher té acertar._
+
+_Improvizo do Autor._
+
+ Tafueszinhos deste tempo,
+ Se estado quereis tomar,
+ Deveis com muito sentido
+ _Escolher té acertar._
+
+ Daquella, que rir sem tempo,
+ E esperta de mais fallar,
+ Fugir de se lhe dar corda,
+ _Escolher té acertar._
+
+ A que de lograr os homens
+ Com jactancia se gabar,
+ Nem mais pôr-lhe a vista em cima,
+ _Escolher té acertar._
+
+ Rapariga janelleira,
+ He bom della não fiar,
+ Namora a muitos, pois quer
+ _Escolher té acertar._
+
+ A que ás modas afferrada
+ A moda não perdoar,
+ Deixalla, mas logo ir outra
+ _Escolher té acertar._
+
+ A que der costura fóra,
+ E meias a accrescentar,
+ Deixalla ir pela malha,
+ _Escolher té acertar._
+
+ Daquella, que crê em bruxas,
+ Que se anda sempre a assustar,
+ Fazer-lhe huma cruz á porta,
+ _Escolher té acertar._
+
+ Não vos enleve a menina,
+ Porque canta, e vai walçar;
+ Sem tempo, não ha escolha,
+ _Escolher té acertar._
+
+ Fingi ter paixão por todas,
+ Depois huma exceptuar,
+ Fazei o que ellas vos fazem,
+ _Escolher té acertar._
+
+ Mal que a escolha se fizer,
+ Sem demoras ir cazar,
+ Mas tomar bem as medidas,
+ _Escolher té acertar._
+
+ Qualidades da senhora
+ Podeis por fóra indagar,
+ Indagar não dá, nem tira,
+ _Escolher té acertar._
+
+ O laço do Matrimonio,
+ Dado sem se ponderar,
+ Traz depois sempre a desordem,
+ _Escolher té acertar._
+
+ Todos sabem que he melhor
+ Prevenir do que emendar,
+ Com brio, honra, e decencia
+ _Escolher té acertar._
+
+ Ser amante, e não velhaco,
+ Prometter, e não faltar,
+ E para mais segurança
+ _Escolher té acertar._
+
+ Os que nada tem de seu,
+ Nem tem genio de casar,
+ Desenganem, porque escusão
+ _Escolher té acertar._
+
+ Hoje as mulheres não querem
+ Os maridos sustentar,
+ Antes tomão por systema
+ _Escolher té acertar._
+
+ Donzella, ou viuva rica
+ Pobretões não vão buscar,
+ Vão entre os homens chineiros.
+ _Escolher té acertar._
+
+ Casamentos com juizo
+ Poucos vejo effectuar,
+ Se Amor vai com o interesse
+ _Escolher té acertar._
+
+ Formosura, e qualidades
+ Já ninguem vai disputar,
+ Se o dinheiro he quem traz tudo,
+ _Escolher té acertar._
+
+ Porém siga embora o mundo
+ Esse modo de pensar,
+ Ide só honra, e juizo
+ _Escolher té acertar._
+
+ Vós deveis sem ambição,
+ Se tendes com que passar,
+ Nas honestas, recolhidas
+ _Escolher té acertar._
+
+ As ricas devem tambem
+ Homens de bem amparar,
+ E nos mais bem comportados
+ _Escolher té acertar._
+
+ Se todos isto seguissem,
+ Melhor se havião de achar;
+ Mas dinheiro quer dinheiro,
+ _Escolher té acertar._
+
+ A final será virtude
+ Pensões do estado notar,
+ E depois outro destino
+ _Escolher té acertar._
+
+ * * * * *
+
+
+_Minhas filhas não caseis._
+
+_Improvizo do Autor._
+
+ Namoradinhas da moda,
+ Vede bem o que fazeis,
+ Com tafues atordoados,
+ _Minhas Filhas não caseis._
+
+ Se tomais paixões de amor,
+ De velhas não morrereis;
+ Tira amor annos de vida,
+ _Minhas Filhas não caseis._
+
+ Todos huns santos se inculcão,
+ Namorando cinco, e seis,
+ Em lhes conhecendo a balda,
+ _Minhas Filhas não caseis._
+
+ São huns em quanto pertendem,
+ Depois são hydras crueis,
+ Como a cobra, a pelle mudão,
+ _Minhas Filhas não caseis._
+
+ Destes frangainhos novos,
+ Ó Filhas, não vos fieis;
+ Andão sempre dando ás azas,
+ _Minhas Filhas não caseis._
+
+ Trazem-vos anneis das feiras
+ De vintem, e de dez reis,
+ Porque a mais chegar não podem,
+ _Minhas Filhas não caseis._
+
+ De educação, e de genio
+ He justo vos informeis;
+ Com homens desconfiados,
+ _Minhas Filhas não caseis._
+
+ Entre a guerra dos ciumes
+ N'hum tormento vivereis;
+ Meninas, coração livre,
+ _Minhas Filhas não caseis._
+
+ Depois da primeira offensa
+ Segunda não espereis,
+ Fugi sempre a lograções,
+ _Minhas Filhas não caseis._
+
+ Como he raro em Lotarias
+ Achar a dos dezeseis,
+ He raro achar bom marido,
+ _Minhas Filhas não caseis._
+
+ Não duvido que finezas,
+ E mil excessos acheis;
+ Mas são iscas para a rêde,
+ _Minhas Filhas não caseis._
+
+ As cartinhas amorozas,
+ São finezas em papeis,
+ O papel tudo consente,
+ _Minhas Filhas não caseis._
+
+ Por huma verdade só
+ Mentiras mil soffrereis,
+ Olho vivo, prevenção,
+ _Minhas Filhas não caseis._
+
+ Como Amor cego se pinta,
+ A mesma queixa tereis,
+ Se haveis cahir por cegueira,
+ _Minhas Filhas não caseis._
+
+ Aturar os pequerruxos,
+ Do marido os aranzeis,
+ São cousas, que custão muito!
+ _Minhas Filhas não caseis._
+
+ Vós em casa com mil sustos,
+ Elles por outros quarteis;
+ Vós em jejum, elles fartos,
+ _Minhas Filhas não caseis._
+
+ Casar, e ficar depois,
+ Como muitas achareis,
+ Viuvas, pobres, doentes,
+ _Minhas Filhas não caseis._
+
+ Os velhos são rabugentos,
+ Os moços são infieis;
+ Como ha pouco, onde se escolha,
+ _Minhas Filhas não caseis._
+
+ Por sustos, penas, cuidados
+ O descanco não troqueis,
+ Solteiras não sois escravas;
+ _Minhas Filhas não caseis._
+
+ Rir, brincar, zombar de todos
+ He bem bom, se isto fazeis,
+ Não vos enterreis em vida,
+ _Minhas Filhas não caseis._
+
+ Vivei libertas, Meninas,
+ Que contentes vivereis;
+ Boi solto lambe-se todo,
+ _Minhas Filhas não caseis._
+
+ Bem conheço, minhas Filhas,
+ Que em velhas pouco valeis;
+ Mas que serve acertar mal?
+ _Minhas Filhas não caseis._
+
+ Amor, juizo, e fortuna
+ He com que acertar deveis;
+ Isto he bom, mas onde ha disto?
+ _Minhas Filhas não caseis._
+
+ Nisto, que digo, vos mostro
+ O fruto, que tirareis;
+ Só por trez dias de festa,
+ _Minhas Filhas não caseis._
+
+ Abraçai os meus conselhos,
+ Porque vos não enganeis,
+ Mandai Amor á tabúa,
+ _Minhas Filhas não caseis._
+
+ * * * * *
+
+
+APÓLOGO.
+
+_A Gallinha, e os Pardaes._
+
+ N'huma reserva de estrume
+ Gallinha sôfrega andava,
+ Espalhando com os pés
+ O deposito, que achava.
+ Bando de espertos Pardaes
+ Muito de perto a seguião,
+ Quanto ella esgaravatava
+ Elles, famintos, comião:
+ Neste, naquelle lugar
+ Andava a triste cançada;
+ Os Pardaes comião tudo,
+ A pobre Gallinha nada:
+ Té que sacudindo as azas,
+ Virou de repente, e vio
+ A manada charleadora,
+ Que áquelle estrume acudio.
+ Então disse: Está mui bom
+ Esse modo de viver!
+ Eu descobrindo, e espalhando,
+ Para os mais virem comer!
+ Por certo que estou lograda!
+ N'outra não torno a cahir:
+ Donde vir estes golosos
+ Eu cuidarei de fugir.
+ Hum Pardal de escuro bico
+ Dos outros sahio á frente,
+ Que por ser Pardal ja velho,
+ Se julgava intelligente:
+ E querendo despicar
+ Aquella descompostura,
+ Deo á Gallinha em resposta
+ Esta sentença madura:
+ Este lugar, em que andamos,
+ Não he vedado a ninguem;
+ Temos a elle o direito,
+ Que qualquer Gallinha tem:
+ De mais ha outro motivo;
+ Quem por espalhar trabalha,
+ He certo que já não quer
+ As mesmas cousas, que espalha:
+ Nós aproveitamos tudo
+ Fiados nesta razão;
+ Ninguem he tolo, que deixe
+ De acceitar o que lhe dão.
+ A Gallinha envergonhada
+ Das satisfações, que ouvio,
+ Deo huma volta em redondo,
+ E nem mais o bico abrio.
+ Os que achão dinheiro junto,
+ Como herdeiros de seus pais,
+ Fazendas, cópa de prata,
+ E outros muitos cabedaes;
+ Que espalhão tudo por vicios,
+ Appetites, e funcções,
+ Dando cabo do que tem
+ Com loucas combinações,
+ Talvez que mais se acautelem,
+ Se disto se recordarem:
+ A Gallinha espalha, espalha,
+ Para os mais se aproveitarem.
+
+ * * * * *
+
+
+CONTO EPIGRAMMATICO.
+
+ Ha pelas casas das Sortes
+ Tres Tabellas penduradas
+ Com attractivas fortunas,
+ Mas são fortunas pintadas.
+ Tem por cima Premios grandes,
+ Que se chamão de cabeça;
+ Por baixo os mais diminutos,
+ Em que a gente nada int'ressa.
+ Entrou na loja um Laponio,
+ Querendo Sortes comprar,
+ Metteo prompto a mão na caixa
+ A rir muito, e a perguntar:
+ Diga-me senhor caixeiro,
+ Porque saber me convem,
+ Se esses Premios de cabeça
+ Todos esta caixa tem?
+ Respondeo hum dos que estavão
+ Arrumados ao balcão:
+ Descance; que os de cabeça
+ Todos nessa caixa estão:
+ Cabeça he que nós não temos
+ Em vir sentar-nos n'hum banco
+ A trocarmos o dinheiro
+ Por iscas de papel branco.
+
+ * * * * *
+
+
+CONTO
+
+_Do Sabio por imaginação._
+
+ Certo Rapaz de Provincia
+ A Lisboa veio dar,
+ O qual não sabia ler,
+ Nem escrever, nem contar.
+ Para ganhar o sustento
+ Pôz-se a servir hum Letrado,
+ Esperto, prompto, e fiel,
+ Mostrando-se hum bom criado.
+ De tres a tres mezes o Amo
+ Por costume lhe dizia:
+ Esfrega-me essas estantes,
+ Limpa-me essa Livraria.
+ Ajuntou alguns vintens,
+ E a sua patria buscou,
+ Onde se estabeleceo
+ Com fazendas que comprou.
+ Lá na Botica da terra
+ Elle hia as noites passar
+ Com o Cura, e mais pessoas,
+ Que alli vinhão palestrar.
+ N'huma noite huma questão
+ Se moveo co'hum Estudante,
+ Em que elle se foi metter
+ Por atrevido e ignorante.
+ Instava sem reflexão
+ Dizendo: He que me faltava;
+ Se por ter aberto livros
+ Vossa Mercê me encovava.
+ Eu tambem Livros abri,
+ Lidei com discreta gente;
+ Não jugue o senhor novato
+ Que acha em mim algum demente.
+ O estudante, que sabia
+ Que o tal servíra hum Letrado,
+ Querendo-o desmascarar,
+ Lhe respondeo enjoado:
+ Eu sei que livros abrio,
+ Mas diz gente verdadeira,
+ Que abria livros alheios,
+ Para tirar-lhe a poeira
+ Eis como alguns impostores
+ De sabios querem ter fama,
+ Lendo só rostos de Livros,
+ Nada fruto, e tudo rama.
+ Não estudão, nem se canção;
+ Querem que a sabedoria
+ Se pegue, bem como a febre
+ Em tempo de epidemia.
+
+ * * * * *
+
+
+CONTO EPIGRAMMATICO.
+
+ Havia hum homem sagaz,
+ E bastante indagador;
+ Sempre das vidas alhêas
+ Queria ser sabedor.
+ Por conseguir o seu fim
+ Valia-se de mil modos,
+ Louvando, ou dizendo mal
+ Sabia tudo de todos:
+ Com perguntas, e rodeios
+ Botava a rede em cautela:
+ Quem conversava com elle
+ Por força cahia nella.
+ Adoeceo gravemente;
+ E hum Medico foi chamado,
+ Que da lingoa deste enfermo
+ Vivia escandalizado:
+ Receitou-lhe hum vomitorio,
+ Mas com elle não lançou;
+ Repetio segunda dose,
+ Igualmente se frustrou;
+ Até que o Medico disse:
+ Pasmo do caso presente!
+ Não vomitar quem tem feito
+ Vomitar a tanta gente!
+ E pois que o meu vomitorio
+ Nada, ou pouco lhe aproveita,
+ Se quer vomitar, amigo,
+ Use da sua receita.
+
+ * * * * *
+
+
+CONTO
+
+_Do Homem, e o Macaco._
+
+ Hum Capitão de Navios
+ Trouxe do Brazil hum Mono
+ De condição vingativo,
+ Mas fagueiro com seu dono.
+ O dono estimava-o muito,
+ E o Macaco o conhecia;
+ Disto dava o bruto provas
+ Nas festas, que lhe fazia.
+ Trepava por elle a cima,
+ Catava-o de quando em quando,
+ Punha-lhe a mão pela cara,
+ De roda delle pulando.
+ Ao animal finalmente
+ So lhe faltava fallar;
+ Tendo o dono ao pé de si,
+ O seu forte era brincar.
+ Vio o Macaco huma vez
+ Seu dono matar hum gallo;
+ Pilhou-o fóra de caza,
+ Tentou tambem imitallo:
+ Entrou pela capoeira
+ Com huma faca na mão,
+ Foi matando tudo a eito,
+ E atirando para o chão.
+ Vindo o dono para casa,
+ E achando tal mortandade,
+ Esconjurou o Macaco,
+ Mais a sua habilidade;
+ Mas passando-lhe a paixão,
+ Co' hum páo o ameaçou,
+ Deo-lhe huma leve pancada,
+ E com dó delle ficou.
+ O bruto, que não perdeo
+ A pancada da lembrança,
+ Mesmo á bruta não deixou
+ De tomar delle vingança;
+ E pilhando no outro dia
+ O dono ao pé descuidado,
+ Botou-lhe com dentes, e unhas
+ A cara abaixo de hum lado.
+ Quem dissera que por tempos
+ Se mostrasse tão cruel
+ Hum bruto, que parecia
+ Tão submisso, e tão fiel!
+ Ha duas moralidades,
+ Que d'aqui se hão de tirar:
+ A primeira he que nos brutos
+ Ninguem se deve fiar:
+ A segunda de que ha homens
+ De huma apparente bondade;
+ São huns, e parecem outros
+ Por manha, e sagacidade.
+
+ * * * * *
+
+
+APÓLOGO.
+
+_A Pulga, e o Mosquito._
+
+ N'huma noite de Verão,
+ E de bastante calor,
+ Encontrou-se co' hum Mosquito
+ A Pulga n'hum cobertor:
+ Cumprimentárão-se muito
+ Co' a politica devida;
+ E disse a Pulga ao Mosquito:
+ Ando aqui desfalecida;
+ De vossa mercê me queixo,
+ Que do sustento me priva;
+ Estou tisica, e esfalfada,
+ Não sei como já sou viva:
+ Ando por cima de leitos,
+ Ando nas camas de chão;
+ Vem vossa mercê tocando,
+ Começa a minha afflicção;
+ Se dou alguma picada,
+ He sempre em sustos, e medos;
+ Porque temo de cahir
+ Na ratoeira dos dedos.
+ N'hum individuo, que dorme,
+ He onde janto, onde ceio;
+ Mas não me presta o que como,
+ Pelo meu justo receio:
+ Se lhe chupo n'huma perna
+ Sempre com cinco sentidos,
+ Vem logo a sua trombeta
+ Metter-se-lhe nos ouvidos.
+ Acorda o que está dormindo,
+ Dando a cantiga ao diabo;
+ Se me sente, põe-me o dedo,
+ E entre as unhas me dá cabo.
+ Por tanto quero pedir-lhe
+ Tenha de mim compaixão;
+ Que toque á gente acordada,
+ Porém á que dorme não.
+ Ó filha, disse o Mosquito,
+ Eu tambem soffro, e padeço;
+ Pois levo ás vezes boléos,
+ Que da vida me despeço.
+ Dão bofetadas em si
+ Os que andão comigo em guerra;
+ E se me apanhão no lance,
+ Atirão comigo a terra.
+ Os desastres que me conta,
+ Por certo me mettem dó;
+ Mas he preciso tambem
+ Que não queira comer só.
+ Nestes termos, minha rica,
+ A vontade lhe farei;
+ Que engorde, e que viva farta,
+ He que eu muito estimarei.
+ Despedirão-se hum do outro:
+ E o Mosquito atraiçoado
+ Não fez nada do que disse,
+ Que he traidor dissimulado.
+ Perseguia a toda a gente;
+ A quem dormia acordava,
+ Por emulação á Pulga
+ Fazia o que costumava.
+ A Pulguinha muito afouta,
+ Vendo hum homem a dormir,
+ Ferrou-se-lhe no cachaço,
+ Sem lhe lembrar o fugir.
+ O Mosquito pelos olhos
+ A zunir muito, e a morder,
+ Acordou o homem da sesta,
+ Para a Pulga surprender:
+ Que, coitadinha! espirou,
+ Acabando o seu flagello,
+ Entalada entre o sobrado,
+ E entre a sola de hum chinelo.
+ Daqui colligir se deve
+ Que quando a vingança cega,
+ Quasi sempre hum malfeitor
+ O seu semelhante entrega.
+
+ * * * * *
+
+
+APÓLOGO.
+
+_O Burro, e a Ratazana._
+
+ Estava hum Burro comendo
+ Á noite a sua ração,
+ E huma velha Ratazana
+ Quiz ter com elle quinhão.
+ Disse-lhe o Burro: Malvada,
+ Vai a outro sitio comer:
+ Não basta a ração ser pouca?
+ Mais pequena a vens fazer?
+ Respondeo-lhe a Ratazana:
+ Por hoje licença dá;
+ Que por estes oito dias
+ Prometto de não vir cá:
+ Eu sei mui bem que teu dono
+ Hum grande queijo comprou;
+ Espreitei onde o metteo,
+ E á manhã com elle dou:
+ Hei de fartar-me á vontade,
+ Roendo-lho muito bem:
+ Sei que a vizinha debaixo
+ Bolos n'huma cópa tem:
+ O criado, que te trata,
+ Tem lá n'huma parteleira
+ Hum grande monte de cebo
+ Junto dentro de huma ceira:
+ Lá pelas aguas furtadas
+ Já atinei co' huns buracos
+ Para saltar n'hum pombal,
+ E chupar pombos dos cacos.
+ Á vista das descubertas,
+ Que já hoje tenho feito,
+ Espero passar sem fome,
+ Com subtileza, e com geito,
+ Foi tasquinhando a ração
+ Naquella doce esperança,
+ Co'a imaginada fartura
+ Sempre posta na lembrança.
+ Do Burro se despedio
+ Com affago, e cortezia;
+ E foi de rabo estendido
+ Para a cova, em que vivia.
+ Porém lá pela alta noite
+ Tornou depois a sahir,
+ E foi-se por certo atalho
+ Nas casas introduzir.
+ Andou em busca do queijo,
+ Porém já o não achou
+ No sitio, que imaginava,
+ Onde d'antes se guardou.
+ Voltou-se ao primeiro andar
+ Para os bolos da vizinha,
+ Basculhou a copa toda,
+ E nem hum só bolo tinha.
+ Cançada, raivosa, e triste
+ Ao quarto do moço veio;
+ E porque estava acordado,
+ Entrou com algum receio.
+ Saltou para a parteleira
+ Com o cebo no sentido;
+ Mas no dia antecedente
+ O tinha o moço vendido.
+ A sahida deste quarto
+ Empreza foi arriscada;
+ Por se safar tão ligeira,
+ Não mammou huma arrochada.
+ Lá por outros escaninhos
+ Ao telhado caminhou,
+ Só para entrar no pombal,
+ Onde outras vezes entrou.
+ Mal que se pilhou de dentro,
+ Vio huns ninheiros mais baxos,
+ Ficou-lhe o olho luzindo
+ Co' o sentido nos borrachos.
+ O dono, que de outros ratos
+ Se via mais perseguido,
+ Pôz-lhe armada ratoeira
+ Com petisco appetecido.
+ Foi então que a Ratazana,
+ Não se podendo conter,
+ Cheirou-lhe a isca por fóra,
+ Quiz entrar dentro, e comer.
+ Deo voltas, metteo focinho;
+ Mas á dentada primeira
+ Ficou a pobre engasgada
+ Nos ferros da ratoeira.
+ Quanto esperava falhou,
+ E por mais infausta sorte,
+ Toda a alegria passada
+ Acabou nas mãos da morte.
+
+ * * * * *
+
+
+CONTO EPIGRAMMATICO.
+
+ Hum Author compunha hum livro,
+ Livros velhos folheando:
+ Perguntou-lhe hum seu collega:
+ Que estás ahi procurando?
+ Respondeo: Como não ha
+ Livro algum que tão máo seja
+ Que não tenha alguma cousa
+ Boa, que se note, e veja:
+ De cada hum tiro hum pouco.
+ Disto hum novo livro ageito
+ Ficando de cousas boas
+ Formado hum livro perfeito.
+ Desta lição eu quisera
+ Que os homens se aproveitassem,
+ De cada hum imitando
+ As virtudes, que lhe achassem.
+ O homem, que isto fizesse,
+ Hum grande brazão teria;
+ Ficava sendo hum compôsto,
+ Que ao Mundo exemplo daria.
+
+ * * * * *
+
+
+APOLOGO.
+
+_O Saloio, e huma Sorte de papel._
+
+ Vendo nas casas das Sortes
+ Premio de oitenta mil reis,
+ Foi hum Saloio comprar
+ Oito tostões de papeis:
+ E tudo desembrulhando
+ Hum Premio só não achou,
+ Repetio dobrando a dóze,
+ Da mesma sorte ficou:
+ Foi comprando mais e mais,
+ Quanto comprava perdia,
+ Gastou dezoito mil reis,
+ E delles nem bóia via.
+ Raivoso se foi á caixa,
+ Dizendo: Forte castigo!
+ Tirou mais seis tostões dellas,
+ Que era o que tinha comsigo:
+ Tambem lhe sahírão brancas,
+ E o homem desesperou;
+ Mas a ultima entre os dedos
+ Deste modo lhe fallou:
+ Saloio, quem quer que sejas,
+ Toma do mundo lição,
+ Todas as cousas pintadas
+ Como parecem não são;
+ Não te illudas com os Premios,
+ Que he natural o falharem,
+ E nesse engodo emmagreces,
+ Para os outros engordarem:
+ Se o acaso der hum Premio,
+ Põe logo no pensamento,
+ Que para hum só ser feliz,
+ São desgraçados hum cento:
+ O que tira tres moedas,
+ Já veio vinte deixar,
+ E se inda não as largou,
+ He isca para as largar.
+ O que tira tres tostões,
+ Fica de nós muito amigo,
+ Sem ver que deixou o porco,
+ E leva a corda comsigo.
+ Os prudentes conceituão
+ Ser tudo isto huma Tragedia,
+ Que os felizes nestas casas
+ São como os Reis de comedia.
+ E porque em lojas de Sortes
+ Não gastes nem hum vintem,
+ Huns conselhos vou a dar-te,
+ Com os quaes te acharás bem.
+ Nao olhes para as Tabellas,
+ Nem os mais vejas jogar,
+ Que se algum tem sorte em preto,
+ A ambição te vai tentar;
+ Olha sim, para a dinheiro,
+ Que está perdido no chão
+ Em sortes desembrulhadas
+ Da porta até ao balcão.
+ O Saloio respondeo:
+ Teu desengano me embaça,
+ Se se promettem fortunas
+ Onde se encontra a desgraça.
+ Á vista disto he razão
+ Que este vicio em mim se quebre,
+ Fugirei de toda a casa,
+ Que vende gato por lebre.
+
+
+
+
+Vindo ás mãos do Author huma Quadra bastantemente conceituosa, tentou
+glosala pelo seguinte modo:
+
+
+QUADRA.
+
+ _Dois Entes regem o mundo_
+ _Doce Amor, e Morte impía,_
+ _A Morte co' a fouce corta_
+ _Quanto Amor semêa, e cria._
+
+
+GLOSA.
+
+1.
+
+ Logo que foi construida
+ Esta Maquina brilhante,
+ Não falhou hum só instante
+ Na conta, pezo, e medida:
+ Nem podia ser falida
+ Obra de hum Saber profundo;
+ He seu creador segundo
+ O Tempo, que não faz pausa,
+ Por mando da Eterna Causa
+ _Dois Entes regem o mundo_
+
+2.
+
+ Hum he Amor, outro a Morte,
+ Cada qual com fortaleza,
+ Entre alegria, e tristeza,
+ Mudão dos Mortaes a sorte:
+ No que hum faz outro dá córte,
+ Que a desordem desafia,
+ Disputão de noite, e dia,
+ A qual mais poder encerra,
+ Andão sempre em viva guerra
+ _Doce Amor, e Morte impía,_
+
+3.
+
+ Nesta horrorosa campanha
+ Não faz figura a Razão,
+ Nem ha capitulação
+ (O que já se não estranha)
+ Tudo de terror se banha,
+ He immensa a gente morta;
+ E por mais que Amor a exhorta,
+ Sem respeito ás creaturas,
+ Searas verdes, maduras
+ _A Morte co' a fouce corta_
+
+4.
+
+ Quando a paixão se declara
+ De Amor entre dois amantes,
+ Porque não fiquem triunfantes,
+ A Morte vê se os separa:
+ Como he das vidas avara,
+ Em suffocallas porfia;
+ De balde Amor a vigia,
+ Que a Morte, que tudo extingue,
+ Trabalha porque não vingue
+ _Quanto Amor semêa, e cria._
+
+
+
+
+Quadra, que mandou huma Senhora ao Author (talvez sem reflectir) com
+muito empenho, para que lha glosasse; sendo assás bem difficultosa, pelo
+veneno do tempo que tem comsigo, etc.
+
+QUADRA.
+
+ _Não sigas, Bella, os caprichos,_
+ _Que os Mortaes tem fabricado;_
+ _Segue as Leis da Natureza,_
+ _Felicita hum desgraçado._
+
+GLOSA.
+
+1.
+
+ Bella Nize, o Creador,
+ Que o Mundo fez, e governa,
+ Que com Providencia eterna
+ He, e foi de tudo Author,
+ He em quem devemos pôr
+ Os nossos desejos fixos;
+ De genios que estão perfixos,
+ Com a maior impiedade,
+ Em negar esta verdade
+ _Não sigas, Bella, os caprichos._
+
+2.
+
+ Dar a todos a entender
+ Por Fabula Ceo, e Inferno;
+ Que não ha castigo eterno;
+ Que nem premio póde haver;
+ Que ha só nascer, e morrer
+ Sem lembrança de peccado,
+ Bem como bruto esfaimado,
+ Eis a perversa doutrina,
+ Só para nossa ruina,
+ _Que os Mortaes tem fabricado._
+
+3.
+
+ Quem na Pia do Baptismo
+ As luzes da Fé recebe,
+ O bom caracter concebe
+ No Gremio do Christianismo:
+ Não temer penas do Abismo
+ He ser de Lucifer preza
+ Na Religião firmeza
+ He quanto todos convem
+ Inculto Gentio he quem
+ _Segue as Leis da Natureza,_
+
+4.
+
+ Ó Deos Eterno! he possivel
+ Que o Christão, que tu creaste,
+ Dos teus preceitos se afaste,
+ Á tua voz insensivel!
+ Sua pena era infallivel
+ Por ter a Lei quebrantado;
+ Mas o teu Poder sagrado
+ Fallando-lhe ao coração,
+ O salve da escravidão;
+ _Felicita hum desgraçado._
+
+
+
+
+CHARADE.
+
+ Guarda a primeira e segunda
+ Dos rigores da estação,
+ E guarda a terceira as duas
+ Por amor, e gratidão:
+ As tres conchegão seu dono,
+ Seja de inverno, ou verão.
+
+
+CHARADE.
+
+ Não quer demora a primeira,
+ A segunda he contra a fome,
+ Separadas não tem bocca,
+ Ambas juntas muita toca,
+ Muita gente tem, que come.
+
+
+CHARADE.
+
+ He criminosa a primeira,
+ E aos crimes, que commetteo
+ Logo a segunda, e terceira
+ Justa sentença lhes deo;
+ Porém juntando-se as trez
+ Entrão em tanta harmonia,
+ Que o mal, que a primeira fez,
+ Torna-se em grande alegria.
+
+
+CHARADE.
+
+ A primeira diz aonde,
+ Esta, e segunda cultiva,
+ Evita a terceira o pó,
+ E de precipicios priva:
+ Primeira, e ultima afflige,
+ Nutre segunda, e primeira:
+ Ha nas quintas, e fazendas
+ A segunda co' a terceira:
+ O bom commodo dos homens
+ Nas tres syllabas se encerra
+ Em couza, que serve muito
+ Na paz, e tambem na guerra.
+
+
+CHARADE.
+
+ Da primeira, e segunda se gosta,
+ Que he onde se chora, se folga, e se ri:
+ Na segunda, e terceira apparece
+ O aspecto da gente por bom, ou ruim;
+ A segunda, e terceira dá nome
+ A huma alta serra do nosso paiz;
+ Mas se as três ajuntarmos, veremos
+ Hum peixe saltante na praia a cahir.
+
+
+ADIVINHAÇÃO.
+
+ Eu visito toda a casa,
+ E co' a gente desespero,
+ Como com ElRei á meza
+ Daquelles pratos, que quero;
+ Seja a Dama a mais formosa,
+ Mais pobre, ou mais abastada,
+ Mesmo diante de todos
+ Por mim ha de ser beijada;
+ Ando sempre em viva guerra,
+ Vivo entre muito inimigo;
+ Mas sendo debil de forças,
+ Só póde o tempo comigo.
+
+
+ADIVINHAÇÃO.
+
+ Não tenho sete cabeças,
+ Co' a que tenho me governo,
+ Meu rosto não tem feitio,
+ Até sou da côr do Inferno:
+ Pareço no meu sustento
+ Nascer no Signo de Aquario;
+ E a minha condição he
+ Semelhante á do usurario;
+ Morro de huma ingratidão,
+ Que me faz ser infeliz;
+ Pois dão-me a morte por paga
+ Do beneficio, que fiz.
+
+
+
+
+Significação das Charades, e Adivinhações deste Folheto.
+
+_= ecraeb = amõacar = ãzoccaa = sgausgenua = alacvo = oapaj = osacm =_
+
+A Significação destas _Xarades_, e _Adivinhações_ aqui vão não por sua
+ordem, e até cada huma de per si com as letras trocadas, para maior
+confusão, e gosto de quem as adivinhar: cujos nomes escolherá para os
+appropriar, e collocar onde pertencerem, visto não haver outro Folheto,
+em que se explique, por ser este o ultimo desta Obra, que torno a
+advertir se deve encadernar com a _primeira Parte_, e com o _Poema do
+Balão aos Habitantes da Lua; que fica hum Livro divertido._
+
+_Tudo se vende nas lojas: de Francisco Xavier de Carvalho defronte da
+rua de S. Francisco da Cidade; de Antonio Manoel Polycarpo da Silva
+junto ao Senado; de Antonio Xavier Moreira da Impressão Regia debaixo da
+Arcada; de João Henriques no principio da rua Augusta, de Antonio Pedro
+na rua do Ouro; de Luiz José de Carvalho aos Paulistas; e em Belém na
+loja da Viuva de José Tiburcio. Custa este Folheto 240; a primeira Parte
+outro tanto; e o Balão 160._
+
+
+
+
+Notas de transcrição:
+
+O texto aqui transcrito, é uma cópia integral e inalterada do livro
+impresso em 1820.
+
+Mantivemos a grafia usada na edição impressa, tendo sido corrigidos alguns
+pequenos erros tipográficos evidentes, que não alteram a leitura do texto,
+e que por isso não considerámos necessário assinalá-los. Mantivemos
+inclusivamente as eventuais incoerências de grafia de algumas palavras, em
+particular quanto à acentuação.
+
+
+
+
+
+End of the Project Gutenberg EBook of Continuação do Portugal enfermo por
+vicios, e abusos de ambos os sexos, by José Daniel Rodrigues da Costa
+
+*** END OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK CONTINUACAO DO PORTUGAL ENFERMO ***
+
+***** This file should be named 31744-8.txt or 31744-8.zip *****
+This and all associated files of various formats will be found in:
+ https://www.gutenberg.org/3/1/7/4/31744/
+
+Produced by Pedro Saborano (produced from scanned images
+of public domain material from Google Book Search)
+
+
+Updated editions will replace the previous one--the old editions
+will be renamed.
+
+Creating the works from public domain print editions means that no
+one owns a United States copyright in these works, so the Foundation
+(and you!) can copy and distribute it in the United States without
+permission and without paying copyright royalties. Special rules,
+set forth in the General Terms of Use part of this license, apply to
+copying and distributing Project Gutenberg-tm electronic works to
+protect the PROJECT GUTENBERG-tm concept and trademark. Project
+Gutenberg is a registered trademark, and may not be used if you
+charge for the eBooks, unless you receive specific permission. If you
+do not charge anything for copies of this eBook, complying with the
+rules is very easy. You may use this eBook for nearly any purpose
+such as creation of derivative works, reports, performances and
+research. They may be modified and printed and given away--you may do
+practically ANYTHING with public domain eBooks. Redistribution is
+subject to the trademark license, especially commercial
+redistribution.
+
+
+
+*** START: FULL LICENSE ***
+
+THE FULL PROJECT GUTENBERG LICENSE
+PLEASE READ THIS BEFORE YOU DISTRIBUTE OR USE THIS WORK
+
+To protect the Project Gutenberg-tm mission of promoting the free
+distribution of electronic works, by using or distributing this work
+(or any other work associated in any way with the phrase "Project
+Gutenberg"), you agree to comply with all the terms of the Full Project
+Gutenberg-tm License (available with this file or online at
+https://gutenberg.org/license).
+
+
+Section 1. General Terms of Use and Redistributing Project Gutenberg-tm
+electronic works
+
+1.A. By reading or using any part of this Project Gutenberg-tm
+electronic work, you indicate that you have read, understand, agree to
+and accept all the terms of this license and intellectual property
+(trademark/copyright) agreement. If you do not agree to abide by all
+the terms of this agreement, you must cease using and return or destroy
+all copies of Project Gutenberg-tm electronic works in your possession.
+If you paid a fee for obtaining a copy of or access to a Project
+Gutenberg-tm electronic work and you do not agree to be bound by the
+terms of this agreement, you may obtain a refund from the person or
+entity to whom you paid the fee as set forth in paragraph 1.E.8.
+
+1.B. "Project Gutenberg" is a registered trademark. It may only be
+used on or associated in any way with an electronic work by people who
+agree to be bound by the terms of this agreement. There are a few
+things that you can do with most Project Gutenberg-tm electronic works
+even without complying with the full terms of this agreement. See
+paragraph 1.C below. There are a lot of things you can do with Project
+Gutenberg-tm electronic works if you follow the terms of this agreement
+and help preserve free future access to Project Gutenberg-tm electronic
+works. See paragraph 1.E below.
+
+1.C. The Project Gutenberg Literary Archive Foundation ("the Foundation"
+or PGLAF), owns a compilation copyright in the collection of Project
+Gutenberg-tm electronic works. Nearly all the individual works in the
+collection are in the public domain in the United States. If an
+individual work is in the public domain in the United States and you are
+located in the United States, we do not claim a right to prevent you from
+copying, distributing, performing, displaying or creating derivative
+works based on the work as long as all references to Project Gutenberg
+are removed. Of course, we hope that you will support the Project
+Gutenberg-tm mission of promoting free access to electronic works by
+freely sharing Project Gutenberg-tm works in compliance with the terms of
+this agreement for keeping the Project Gutenberg-tm name associated with
+the work. You can easily comply with the terms of this agreement by
+keeping this work in the same format with its attached full Project
+Gutenberg-tm License when you share it without charge with others.
+
+1.D. The copyright laws of the place where you are located also govern
+what you can do with this work. Copyright laws in most countries are in
+a constant state of change. If you are outside the United States, check
+the laws of your country in addition to the terms of this agreement
+before downloading, copying, displaying, performing, distributing or
+creating derivative works based on this work or any other Project
+Gutenberg-tm work. The Foundation makes no representations concerning
+the copyright status of any work in any country outside the United
+States.
+
+1.E. Unless you have removed all references to Project Gutenberg:
+
+1.E.1. The following sentence, with active links to, or other immediate
+access to, the full Project Gutenberg-tm License must appear prominently
+whenever any copy of a Project Gutenberg-tm work (any work on which the
+phrase "Project Gutenberg" appears, or with which the phrase "Project
+Gutenberg" is associated) is accessed, displayed, performed, viewed,
+copied or distributed:
+
+This eBook is for the use of anyone anywhere at no cost and with
+almost no restrictions whatsoever. You may copy it, give it away or
+re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included
+with this eBook or online at www.gutenberg.org
+
+1.E.2. If an individual Project Gutenberg-tm electronic work is derived
+from the public domain (does not contain a notice indicating that it is
+posted with permission of the copyright holder), the work can be copied
+and distributed to anyone in the United States without paying any fees
+or charges. If you are redistributing or providing access to a work
+with the phrase "Project Gutenberg" associated with or appearing on the
+work, you must comply either with the requirements of paragraphs 1.E.1
+through 1.E.7 or obtain permission for the use of the work and the
+Project Gutenberg-tm trademark as set forth in paragraphs 1.E.8 or
+1.E.9.
+
+1.E.3. If an individual Project Gutenberg-tm electronic work is posted
+with the permission of the copyright holder, your use and distribution
+must comply with both paragraphs 1.E.1 through 1.E.7 and any additional
+terms imposed by the copyright holder. Additional terms will be linked
+to the Project Gutenberg-tm License for all works posted with the
+permission of the copyright holder found at the beginning of this work.
+
+1.E.4. Do not unlink or detach or remove the full Project Gutenberg-tm
+License terms from this work, or any files containing a part of this
+work or any other work associated with Project Gutenberg-tm.
+
+1.E.5. Do not copy, display, perform, distribute or redistribute this
+electronic work, or any part of this electronic work, without
+prominently displaying the sentence set forth in paragraph 1.E.1 with
+active links or immediate access to the full terms of the Project
+Gutenberg-tm License.
+
+1.E.6. You may convert to and distribute this work in any binary,
+compressed, marked up, nonproprietary or proprietary form, including any
+word processing or hypertext form. However, if you provide access to or
+distribute copies of a Project Gutenberg-tm work in a format other than
+"Plain Vanilla ASCII" or other format used in the official version
+posted on the official Project Gutenberg-tm web site (www.gutenberg.org),
+you must, at no additional cost, fee or expense to the user, provide a
+copy, a means of exporting a copy, or a means of obtaining a copy upon
+request, of the work in its original "Plain Vanilla ASCII" or other
+form. Any alternate format must include the full Project Gutenberg-tm
+License as specified in paragraph 1.E.1.
+
+1.E.7. Do not charge a fee for access to, viewing, displaying,
+performing, copying or distributing any Project Gutenberg-tm works
+unless you comply with paragraph 1.E.8 or 1.E.9.
+
+1.E.8. You may charge a reasonable fee for copies of or providing
+access to or distributing Project Gutenberg-tm electronic works provided
+that
+
+- You pay a royalty fee of 20% of the gross profits you derive from
+ the use of Project Gutenberg-tm works calculated using the method
+ you already use to calculate your applicable taxes. The fee is
+ owed to the owner of the Project Gutenberg-tm trademark, but he
+ has agreed to donate royalties under this paragraph to the
+ Project Gutenberg Literary Archive Foundation. Royalty payments
+ must be paid within 60 days following each date on which you
+ prepare (or are legally required to prepare) your periodic tax
+ returns. Royalty payments should be clearly marked as such and
+ sent to the Project Gutenberg Literary Archive Foundation at the
+ address specified in Section 4, "Information about donations to
+ the Project Gutenberg Literary Archive Foundation."
+
+- You provide a full refund of any money paid by a user who notifies
+ you in writing (or by e-mail) within 30 days of receipt that s/he
+ does not agree to the terms of the full Project Gutenberg-tm
+ License. You must require such a user to return or
+ destroy all copies of the works possessed in a physical medium
+ and discontinue all use of and all access to other copies of
+ Project Gutenberg-tm works.
+
+- You provide, in accordance with paragraph 1.F.3, a full refund of any
+ money paid for a work or a replacement copy, if a defect in the
+ electronic work is discovered and reported to you within 90 days
+ of receipt of the work.
+
+- You comply with all other terms of this agreement for free
+ distribution of Project Gutenberg-tm works.
+
+1.E.9. If you wish to charge a fee or distribute a Project Gutenberg-tm
+electronic work or group of works on different terms than are set
+forth in this agreement, you must obtain permission in writing from
+both the Project Gutenberg Literary Archive Foundation and Michael
+Hart, the owner of the Project Gutenberg-tm trademark. Contact the
+Foundation as set forth in Section 3 below.
+
+1.F.
+
+1.F.1. Project Gutenberg volunteers and employees expend considerable
+effort to identify, do copyright research on, transcribe and proofread
+public domain works in creating the Project Gutenberg-tm
+collection. Despite these efforts, Project Gutenberg-tm electronic
+works, and the medium on which they may be stored, may contain
+"Defects," such as, but not limited to, incomplete, inaccurate or
+corrupt data, transcription errors, a copyright or other intellectual
+property infringement, a defective or damaged disk or other medium, a
+computer virus, or computer codes that damage or cannot be read by
+your equipment.
+
+1.F.2. LIMITED WARRANTY, DISCLAIMER OF DAMAGES - Except for the "Right
+of Replacement or Refund" described in paragraph 1.F.3, the Project
+Gutenberg Literary Archive Foundation, the owner of the Project
+Gutenberg-tm trademark, and any other party distributing a Project
+Gutenberg-tm electronic work under this agreement, disclaim all
+liability to you for damages, costs and expenses, including legal
+fees. YOU AGREE THAT YOU HAVE NO REMEDIES FOR NEGLIGENCE, STRICT
+LIABILITY, BREACH OF WARRANTY OR BREACH OF CONTRACT EXCEPT THOSE
+PROVIDED IN PARAGRAPH F3. YOU AGREE THAT THE FOUNDATION, THE
+TRADEMARK OWNER, AND ANY DISTRIBUTOR UNDER THIS AGREEMENT WILL NOT BE
+LIABLE TO YOU FOR ACTUAL, DIRECT, INDIRECT, CONSEQUENTIAL, PUNITIVE OR
+INCIDENTAL DAMAGES EVEN IF YOU GIVE NOTICE OF THE POSSIBILITY OF SUCH
+DAMAGE.
+
+1.F.3. LIMITED RIGHT OF REPLACEMENT OR REFUND - If you discover a
+defect in this electronic work within 90 days of receiving it, you can
+receive a refund of the money (if any) you paid for it by sending a
+written explanation to the person you received the work from. If you
+received the work on a physical medium, you must return the medium with
+your written explanation. The person or entity that provided you with
+the defective work may elect to provide a replacement copy in lieu of a
+refund. If you received the work electronically, the person or entity
+providing it to you may choose to give you a second opportunity to
+receive the work electronically in lieu of a refund. If the second copy
+is also defective, you may demand a refund in writing without further
+opportunities to fix the problem.
+
+1.F.4. Except for the limited right of replacement or refund set forth
+in paragraph 1.F.3, this work is provided to you 'AS-IS' WITH NO OTHER
+WARRANTIES OF ANY KIND, EXPRESS OR IMPLIED, INCLUDING BUT NOT LIMITED TO
+WARRANTIES OF MERCHANTIBILITY OR FITNESS FOR ANY PURPOSE.
+
+1.F.5. Some states do not allow disclaimers of certain implied
+warranties or the exclusion or limitation of certain types of damages.
+If any disclaimer or limitation set forth in this agreement violates the
+law of the state applicable to this agreement, the agreement shall be
+interpreted to make the maximum disclaimer or limitation permitted by
+the applicable state law. The invalidity or unenforceability of any
+provision of this agreement shall not void the remaining provisions.
+
+1.F.6. INDEMNITY - You agree to indemnify and hold the Foundation, the
+trademark owner, any agent or employee of the Foundation, anyone
+providing copies of Project Gutenberg-tm electronic works in accordance
+with this agreement, and any volunteers associated with the production,
+promotion and distribution of Project Gutenberg-tm electronic works,
+harmless from all liability, costs and expenses, including legal fees,
+that arise directly or indirectly from any of the following which you do
+or cause to occur: (a) distribution of this or any Project Gutenberg-tm
+work, (b) alteration, modification, or additions or deletions to any
+Project Gutenberg-tm work, and (c) any Defect you cause.
+
+
+Section 2. Information about the Mission of Project Gutenberg-tm
+
+Project Gutenberg-tm is synonymous with the free distribution of
+electronic works in formats readable by the widest variety of computers
+including obsolete, old, middle-aged and new computers. It exists
+because of the efforts of hundreds of volunteers and donations from
+people in all walks of life.
+
+Volunteers and financial support to provide volunteers with the
+assistance they need are critical to reaching Project Gutenberg-tm's
+goals and ensuring that the Project Gutenberg-tm collection will
+remain freely available for generations to come. In 2001, the Project
+Gutenberg Literary Archive Foundation was created to provide a secure
+and permanent future for Project Gutenberg-tm and future generations.
+To learn more about the Project Gutenberg Literary Archive Foundation
+and how your efforts and donations can help, see Sections 3 and 4
+and the Foundation web page at https://www.pglaf.org.
+
+
+Section 3. Information about the Project Gutenberg Literary Archive
+Foundation
+
+The Project Gutenberg Literary Archive Foundation is a non profit
+501(c)(3) educational corporation organized under the laws of the
+state of Mississippi and granted tax exempt status by the Internal
+Revenue Service. The Foundation's EIN or federal tax identification
+number is 64-6221541. Its 501(c)(3) letter is posted at
+https://pglaf.org/fundraising. Contributions to the Project Gutenberg
+Literary Archive Foundation are tax deductible to the full extent
+permitted by U.S. federal laws and your state's laws.
+
+The Foundation's principal office is located at 4557 Melan Dr. S.
+Fairbanks, AK, 99712., but its volunteers and employees are scattered
+throughout numerous locations. Its business office is located at
+809 North 1500 West, Salt Lake City, UT 84116, (801) 596-1887, email
+business@pglaf.org. Email contact links and up to date contact
+information can be found at the Foundation's web site and official
+page at https://pglaf.org
+
+For additional contact information:
+ Dr. Gregory B. Newby
+ Chief Executive and Director
+ gbnewby@pglaf.org
+
+
+Section 4. Information about Donations to the Project Gutenberg
+Literary Archive Foundation
+
+Project Gutenberg-tm depends upon and cannot survive without wide
+spread public support and donations to carry out its mission of
+increasing the number of public domain and licensed works that can be
+freely distributed in machine readable form accessible by the widest
+array of equipment including outdated equipment. Many small donations
+($1 to $5,000) are particularly important to maintaining tax exempt
+status with the IRS.
+
+The Foundation is committed to complying with the laws regulating
+charities and charitable donations in all 50 states of the United
+States. Compliance requirements are not uniform and it takes a
+considerable effort, much paperwork and many fees to meet and keep up
+with these requirements. We do not solicit donations in locations
+where we have not received written confirmation of compliance. To
+SEND DONATIONS or determine the status of compliance for any
+particular state visit https://pglaf.org
+
+While we cannot and do not solicit contributions from states where we
+have not met the solicitation requirements, we know of no prohibition
+against accepting unsolicited donations from donors in such states who
+approach us with offers to donate.
+
+International donations are gratefully accepted, but we cannot make
+any statements concerning tax treatment of donations received from
+outside the United States. U.S. laws alone swamp our small staff.
+
+Please check the Project Gutenberg Web pages for current donation
+methods and addresses. Donations are accepted in a number of other
+ways including including checks, online payments and credit card
+donations. To donate, please visit: https://pglaf.org/donate
+
+
+Section 5. General Information About Project Gutenberg-tm electronic
+works.
+
+Professor Michael S. Hart was the originator of the Project Gutenberg-tm
+concept of a library of electronic works that could be freely shared
+with anyone. For thirty years, he produced and distributed Project
+Gutenberg-tm eBooks with only a loose network of volunteer support.
+
+
+Project Gutenberg-tm eBooks are often created from several printed
+editions, all of which are confirmed as Public Domain in the U.S.
+unless a copyright notice is included. Thus, we do not necessarily
+keep eBooks in compliance with any particular paper edition.
+
+
+Most people start at our Web site which has the main PG search facility:
+
+ https://www.gutenberg.org
+
+This Web site includes information about Project Gutenberg-tm,
+including how to make donations to the Project Gutenberg Literary
+Archive Foundation, how to help produce our new eBooks, and how to
+subscribe to our email newsletter to hear about new eBooks.
diff --git a/31744-8.zip b/31744-8.zip
new file mode 100644
index 0000000..0d7875d
--- /dev/null
+++ b/31744-8.zip
Binary files differ
diff --git a/31744-h.zip b/31744-h.zip
new file mode 100644
index 0000000..232211b
--- /dev/null
+++ b/31744-h.zip
Binary files differ
diff --git a/31744-h/31744-h.htm b/31744-h/31744-h.htm
new file mode 100644
index 0000000..0d052bd
--- /dev/null
+++ b/31744-h/31744-h.htm
@@ -0,0 +1,2695 @@
+<!DOCTYPE html PUBLIC "-//W3C//DTD HTML 4.01 Transitional//EN"
+ "http://www.w3.org/TR/html4/loose.dtd">
+<html>
+<head>
+ <title>Continuação do Portugal enfermo por vicios e abusos de ambos os sexos, por José Daniel Rodrigues da Costa</title>
+ <meta name="Author" content="José Daniel Rodrigues da Costa">
+ <meta name="Publisher" content="Impressão Regia">
+ <meta name="Date" content="1820">
+ <meta http-equiv="content-type" content="text/html; charset=iso-8859-15">
+ <style type="text/css">
+ body{margin-left: 10%;
+ margin-right: 10%;
+ }
+ .pn {
+ text-indent: 0em;
+ position: absolute;
+ left: 92%;
+ font-size: smaller;
+ text-align: right;
+ color: silver;
+ }
+ #corpo p{text-align: justify; text-indent: 1em;}
+ h1 {text-align: center; margin-top: 3em; margin-bottom: 2em;}
+ h2, h3 {text-align: center;}
+ h3 {font-size: small;}
+ #corpo p.sinopse {margin: 0; font-size: small; text-indent: 0;}
+ hr {border: 0; border-top: solid 1px #000;}
+ blockquote {margin-left: 20%; }
+ .rodape {
+ font-size: 0.8em;
+ margin: 2em;
+ }
+ #corpo .ilustracao p{text-align: center; font-size: small;}
+ .fbox {border: solid black 1px; background-color: #FFFFCC; font-size: 0.8em;
+ margin-left: 10%; margin-right: 10%;}
+ </style>
+</head>
+
+<body>
+
+
+<pre>
+
+The Project Gutenberg EBook of Continuação do Portugal enfermo por vicios,
+e abusos de ambos os sexos, by José Daniel Rodrigues da Costa
+
+This eBook is for the use of anyone anywhere at no cost and with
+almost no restrictions whatsoever. You may copy it, give it away or
+re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included
+with this eBook or online at www.gutenberg.org
+
+
+Title: Continuação do Portugal enfermo por vicios, e abusos de ambos os sexos
+
+Author: José Daniel Rodrigues da Costa
+
+Release Date: March 23, 2010 [EBook #31744]
+
+Language: Portuguese
+
+Character set encoding: ISO-8859-1
+
+*** START OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK CONTINUACAO DO PORTUGAL ENFERMO ***
+
+
+
+
+Produced by Pedro Saborano (produced from scanned images
+of public domain material from Google Book Search)
+
+
+
+
+
+
+</pre>
+
+
+<div style="text-align:center;">
+<p style="font-size: 1.4em;">CONTINUAÇÃO DO</p>
+
+<p style="font-size: 2em;">PORTUGAL ENFERMO</p>
+
+<p style="font-size: 1.4em;">POR VICIOS, E ABUSOS</p>
+
+<p style="font-size: 1.6em;">DE AMBOS OS SEXOS.</p>
+
+<hr style="width: 30%">
+<p style="font-size: 1.4em;"><em>PART. II</em></p>
+<hr style="width: 30%">
+
+<p>DEDICADO AO SENHOR</p>
+
+<p style="font-size: 1.6em;">JOSÉ LUIZ GUERNER,</p>
+
+<p>CONSUL DE S. M. SICILIANNA,</p>
+
+<p>POR</p>
+
+<p style="font-size: 1.4em;">JOSÉ DANIEL RODRIGUES DA COSTA,</p>
+
+<p>ENTRE OS PASTORES DO TEJO</p>
+
+<p style="font-size: 1.4em;">JOSINO LEIRIENSE</p>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p style="font-size: 1.4em;">LISBOA:</p>
+
+<p style="font-size: 1.4em;">NA IMPRESSÃO REGIA.</p>
+
+<p>ANNO 1820</p>
+<hr style="width: 30%">
+
+<p><em>Com Licença.</em></p>
+</div>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<div id="corpo">
+<p><span class="pn">{II}</span></p>
+
+<p><em>Em louvor do Autor, hum Genio dado ás Musas, bem conhecido, e muito
+applicado, mandou o seguinte</em></p>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p style="margin-left: 25%;">MADRIGAL.</p>
+
+<blockquote>
+ Musa, (disse eu á gentil Clio hum dia)<br>
+     Pois que ao jovial Josino<br>
+ A palma déste da immortal Poezia,<br>
+     Mimoso Dom Divino,<br>
+ Com que louva a virtude, o vicio prostra,<br>
+ E aponta as causas, e os effeitos mostra<br>
+     Da decadencia nossa;<br>
+     Dá-me tambem, que eu possa,<br>
+ Cantando o Vate, que do Ceo nos veio...<br>
+     «Basta (me torna Clio);<br>
+ Suas obras, e não louvor alheio,<br>
+     São o seu Elogio.»<br>
+                      <em>Campelo.</em></blockquote>
+
+<p><span class="pn">{III}</span></p>
+<p>&nbsp;</p>
+<p>&nbsp;</p>
+<p>&nbsp;</p>
+<p>&nbsp;</p>
+
+<h2>Chama-se a isto hum</h2>
+
+<h2>PROLOGO.</h2>
+
+<p>Curioso Leitor, ou Ouvidor, que não te escandalizo neste segundo nome,
+porque tambem he de lugar de letras, consta este Folheto da Segunda Parte de
+Portugal Enfermo por vicios, e abusos: continúa na mesma critica, na mesma boa
+moral, e com a costumada jovialidade. Mas se ainda assim mesmo achares este
+Folheto sem sal, dá-lhe alguma desculpa; porque foi acabado agora, e por isso
+vai muito fresco. Primeiro que o publicasse, fui consultar (como costumo em
+todas as minhas Obras, seguindo o preceito dos nossos antigos Mestres) com
+talentos superiores aos meus, judiciosos, e de bom criterio, que com
+sinceridade me asseverárão que este Folheto levava vantagem ao primeiro. <em>Si
+ita est, fiat.</em></p>
+
+<p>Não passárão de quatro até cinco genios mordazes, que não lhe podendo pôr
+outro defeito, forão publicando que a Obra não era minha, a ver se isto pegava,
+como pegou a moda do <em>Tiro-liro</em> por toda a parte. Ora vejão<span class="pn">{IV}</span>
+Vossas Mercês, pelo amor de Deos, que tal ficaria eu quando mo disserão! A Obra
+não será minha; mas o primeiro Folheto imprimio-se, e reimprimio-se, e eu
+recebi o producto de mil e quinhentos Folhetos. Talvez que estes individuos
+campem melhor no público com cavallos emprestados, trastes, e dinheiros
+alheios, do que eu com versos de outrem! Nunca fui plagiario; antes os tenho
+encontrado de obras minhas: e desde a primeira, que imprimi, que foi a Obra dos
+Opios, ainda não mudei de estilo; porque me não acho com forças, para imitar os
+Guindados do tempo.</p>
+
+<p>Leitor, o primeiro paragrafo pertence-te, o segundo pertence aos quatro, ou
+cinco Ruminadores, que com caracter de mal intencionados Zoilos, mastigão toda
+a qualidade de papel, como fazem os que enjoão pelo mar: e diz muita gente boa
+ser isto hum remedio contra os enjôos; o que eu dou quasi por certo, porque já
+o vi verificado em varias Senhoras, que são as que enjôão no mar com mais
+facilidade.</p>
+
+<p>Aqui acabou o Prologo de repente. Coitado! Ainda ha pouco tempo estava de
+perfeita saude! Que não somos nada neste mundo, este Prologo o prova; porque,
+tambem<span class="pn">{V}</span> na minha estimação, tornou-se em nada, e foi-se sem se despedir no
+Latino idioma, como os outros Prologos fazem talvez por não entender mais.</p>
+
+<p>Agora, Leitor, com ingenuidade dirás se a Obra em si alguma cousa</p>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p style="text-align:right;margin-left:auto;margin-right:0;">  <br>
+Vale em Portuguez.</p>
+
+<p><span class="pn">{1}</span></p>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<h2>PORTUGAL ENFERMO PELOS VICIOS, E
+ABUSOS.</h2>
+
+<div style="margin-left: 40%; font-size: small;">
+<hr>
+
+<blockquote>
+ <em>Não sou Poeta de palavras crespas,</em><br>
+ <em>Com que alguns dão picadas, como vespas:</em><br>
+ <em>E no zunzum de termos exquisitos,</em><br>
+ <em>Só fazem o zunido dos mosquitos</em><br>
+ <em>Não escrevo por cifra, nem por cetra,</em><br>
+ <em>Nem sei fallar, senão ao pé da letra.</em><br>
+                 Do Autor.</blockquote>
+<hr>
+</div>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<blockquote>
+ Portugal, Portugal, não te conheço?<br>
+ Vives esmorecido, e eu esmoreço,<br>
+ Vendo-te com achaque tão profundo,<br>
+ Que pouco já figuras neste mundo:<br>
+ Perdeste toda a tua bizarria;<br>
+ As familias perdêrão a alegria;<br>
+ Todos andam de caras tristes, serias,<br>
+ Não ouço senão prantos de miserias:<br>
+ Ficarás só com casas, mas sem gente;<span class="pn">{2}</span><br>
+ Pois muitos, de paixão, já vão morrendo;<br>
+ Porque com a desgraça não podendo,<br>
+ Caloteão, mendigão, degenerão,<br>
+ E só na morte o seu descanço esperão.<br>
+ Não se encontra em ti outro desafogo,<br>
+ Que não seja o do jôgo, jôgo, jôgo,<br>
+ Que he onde inda apparece algum dinheiro,<br>
+ E já se faz officio de Banqueiro:<br>
+ Nelle se encartão mais os ajudantes,<br>
+ Socios olheiros, sempre vigilantes:<br>
+ Qual rapaz, que nas terras põe gaiola,<br>
+ Onde passaro mestre desenrola<br>
+ Agradavel gorgeio, com que chama,<br>
+ E as aves novas faz cahir na trama<br>
+ Das varas enviscadas da costella:<br>
+ Assim subtil Banqueiro arma a esparrella,<br>
+ Sendo passaro mestre, que appresenta<br>
+ De moedas em cruzios mais de oitenta,<br>
+ Que estão chamando ao visco os coitadinhos,<br>
+ Os quaes lhe vão cair, pobres patinhos!<br>
+ Que quando o caso em sortes bem não corra,<br>
+ O seu, e alheio vai tudo á desforra.<br>
+ Hoje em qualquer função por essas sallas,<br>
+ Depois do chá, escutão-se estas fallas:<br>
+ A Senhora quer Ronda, ou quer Banquinha?<br>
+ Vão se chegando a mãi, tia, e sobrinha,<br>
+ E por desgraça (aqui fique entre nós)<br>
+ Té para a Ronda vão mesmo as avós:<span class="pn">{3}</span><br>
+ Quegilando o que tem cartas na mão,<br>
+ Que a primeira inda deo, segunda não:<br>
+ E se por hum acaso deo segunda,<br>
+ Era vez de a pespegar recebe tunda;<br>
+ Porque succede ás vezes, cousa rara,<br>
+ Recolher inda menos que parára,<br>
+ E attribue logo ao córte da velhinha<br>
+ Ser a sorte com elle tão mesquinha.<br>
+ Em outra sala estão tafues armados<br>
+ De copos novos, grozas de bons dados:<br>
+ Treze primeiro que oito, barro, topo:<br>
+ Levou trez onças de ouro, passa o copo.<br>
+ Busca para o passar qualquer aresto,<br>
+ Que o parceiro não quer jogo de resto.<br>
+ <br>
+ Dinheiro só se vê nestes combates,<br>
+ E em cartuxos nas lojas dos rebates:<br>
+ Ou seja em Baptizado, ou Casamento,<br>
+ Função d'annos, ou outro ajuntamento,<br>
+ Com outra qualquer cousa não se atina,<br>
+ Vai-se seguindo sempre esta rutina;<br>
+ Té depois de hum enterro huns enojados<br>
+ Em casa do defunto os vi sentados<br>
+ Jogando o Voltarete com franqueza,<br>
+ Para se distrahir mais a tristeza.<br>
+ Esta a paixão, que he hoje dominante,<br>
+ E nisto he que a função se faz brilhante,<br>
+ Sendo do Alcorão que no outro dia<span class="pn">{4}</span><br>
+ Se murmure de quem nella perdia,<br>
+ Dizendo-se: Fulano perdeo munto!<br>
+ Cento e tantos mil reis tinha elle junto,<br>
+ Em menos de huma hora, mas virou,<br>
+ Perdeo o ganho, e a bolça despejou.<br>
+ Hum Fulano de tal, que appareceo,<br>
+ Esse quanto puxou tudo perdeo.<br>
+ Cento e tantas moedas lá disserão,<br>
+ Fóra cincoenta mais, que se não derão.<br>
+ <br>
+ Aonde, Portugal, estão sumidos<br>
+ Teus entretenimentos divertidos!<br>
+ Aonde estão as Arias, as Modinhas,<br>
+ Os Quartetos, que ao cravo sempre tinhas?<br>
+ Os graves Minuetes bem dançados,<br>
+ Pelas regras da Dança executados!<br>
+ E no intrevallo a Dama mais discreta,<br>
+ Dando o Mote engenhoso ao bom Poeta<br>
+ Que em Sonetos, e Decimas galantes,<br>
+ Parecião as horas huns instantes.<br>
+ Estão divertimentos tão luzidos<br>
+ A baralhos de cartas reduzidos;<br>
+ Mas se julgas que nisso te confortas,<br>
+ Verás que o jogo te ha de pôr por portas.<br>
+ <br>
+ Portugal, Portugal! não te conheço!<br>
+ De te vêr nesse estado desfaleço!<br>
+ Quanto mais faltas vejo de dinheiro,<span class="pn">{5}</span><br>
+ Mais vejo pôr-se o luxo de poleiro!<br>
+ Até nos tratamentos tenho visto<br>
+ Cousas, que fazem rir no meio disto.<br>
+ Ninguem&mdash;Vossa Mercê&mdash;quer hoje em dia,<br>
+ Hão de dar-lhe por força Senhoria:<br>
+ E por maior nobreza, e mais decencia,<br>
+ Já puxa a Senhoria huma Excellencia.<br>
+ Tem este desacordo muita gente,<br>
+ Mesmo sem nada ter com que a sustente:<br>
+ Sem rendas, nem brazôes, tudo devendo,<br>
+ Desta aura popular se vão mantendo;<br>
+ E a quem nesta mania assim se ceva,<br>
+ Ninguem lhe vá lembrar Adão, e Eva.<br>
+ E que direi dos <em>Dons</em>? parecem praga!<br>
+ Em qualquer parte o <em>Dom</em> nasce, e propaga.<br>
+ Ha <em>Dons</em> já muito velhos, outros novos,<br>
+ Além dos <em>Dons</em>, que estão inda nos ovos:<br>
+ E se a menina em prendas se affamou,<br>
+ O <em>Dom</em> sahe logo á luz, não se gorou.<br>
+ <br>
+ Eu vejo pais ás filhas embutindo<br>
+ A escolha de Convento, persuadindo<br>
+ Que passa vida santa, e descançada<br>
+ Quem vive no Mosteiro clausurada.<br>
+ E caminhando vão por este trilho,<br>
+ Para que boa casa fique ao filho,<br>
+ Fazendo professar as innocentes<br>
+ Com festas, e visitas de parentes.<span class="pn">{6}</span><br>
+ Em quanto os pais são vivos bem vai tudo,<br>
+ As mezadas se cobrão a miudo;<br>
+ Vive huma Freira em paz com alegria;<br>
+ Conformando-se hum dia, e outro dia.<br>
+ Mas em morrendo os pais tudo vai mal,<br>
+ Nem pelo São João, nem no Natal<br>
+ Se faz á pobre Freira pagamento,<br>
+ Té ficar em total esquecimento;<br>
+ Que o irmão, das mezadas incumbido,<br>
+ Cuida só em fazer o seu partido:<br>
+ Destroe a casa toda, como louco,<br>
+ Que para nutrir vicios tudo he pouco;<br>
+ Fica a mizera Freira mendigando<br>
+ Pelas outras, que estão tambem penando.<br>
+ Repetindo escrever a quem conhece,<br>
+ Té vêr quem de seu mal se compadece.<br>
+ Aqui temos os grandes beneficios,<br>
+ Que os pais fazem com estes sacrificios,<br>
+ Obrigando a Clausura, e Profissão<br>
+ Quem nunca teve aquella vocação;<br>
+ Sem ver que só acceita a Divindade<br>
+ Esta vida abraçada por vontade;<br>
+ Que huma Freira, por força alli metida,<br>
+ A maldizer-se leva sempre a vida.<br>
+ E armou-se rede tal com este dolo,<br>
+ Para se regalar hum filho tolo,<br>
+ Que estraga tudo, sem de si ter dó,<br>
+ Ficando todos pobres, como Jó.<span class="pn">{7}</span><br>
+ <br>
+ Eu vejo as circunstancias malignadas,<br>
+ As origens dos ganhos estagnadas,<br>
+ Os generos subindo, nós descendo,<br>
+ Ora tristes chorando, ora gemendo.<br>
+ Precisa-se dinheiro, não o temos;<br>
+ E por desgraça nossa até já vemos<br>
+ Os meios de o haver difficultosos.<br>
+ Mas entretanto os homens viciosos<br>
+ Não querem conhecer esta diff'rença:<br>
+ Não ha flagello alheio, que os convença<br>
+ A regular a vida de outro modo;<br>
+ Não se apartão d'aquelle mesmo engodo;<br>
+ O mal encaminhado continúa,<br>
+ Gastando o que não tem, que he balda sua.<br>
+ Deixa a mulher sem pão, filhos sem fato;<br>
+ E a moça desfrutando hum grande trato;<br>
+ Sem vêr que huma mulher deshonestada<br>
+ Não tem caracter firme, he descarada;<br>
+ Pois basta a causa ser, como he sabido,<br>
+ Da mulher viver mal com seu marido.<br>
+ Estas loucas ruina são do homem,<br>
+ Que quantos reaes tem tudo lhe comem;<br>
+ E porque para tanto não tem rendas,<br>
+ De ladrão mui subtil nos mostra as prendas:<br>
+ Qual fogo, que devora quanto apanha,<br>
+ Com o que não he seu tambem se amanha;<br>
+ E quando se descobre, e se receia,<br>
+ Ou quebra, ou foge, ou vai a huma cadeia.<span class="pn">{8}</span><br>
+ O que joga, e que em jogos passa a vida,<br>
+ Joga sem conta, pezo, nem medida;<br>
+ O que se trata bem, e dá jantares,<br>
+ Em funções tudo vai por esses ares;<br>
+ O que tem outros vicios adoptado,<br>
+ Porque nelles está habituado,<br>
+ Nutrillos he o seu mais bello vinho,<br>
+ Nem o tempo lhe ensina outro caminho;<br>
+ Não ha destes hum só, que se contenha,<br>
+ Antes nestas despezas mais se empenha;<br>
+ E não sabendo donde lhe hão de vir,<br>
+ Como quer ás basofias acudir,<br>
+ Fingindo que a escacez lhe não faz mossa,<br>
+ E que inda tem dinheiro, com que possa<br>
+ Ostentar o que d'antes ostentava,<br>
+ O remate he furtar, pois não o cava.<br>
+ <br>
+ Portugal, Portugal! não te conheço!<br>
+ Cada vez mais de ti me compadeço!<br>
+ Eu vejo humas familias tolineiras,<br>
+ Que nunca em suas casas são festeiras;<br>
+ Ajustão as funções botando a idéa<br>
+ A terem meza posta em casa alhêa.<br>
+ Rio-se muito, bastante se brincou;<br>
+ A familia da casa he que o pagou.<br>
+ A noite foi da vespera perdida,<br>
+ Só para se acudir com tanta lida<br>
+ As massas, aos recheios, aos guizados,<span class="pn">{9}</span><br>
+ A depenar as aves, aos assados:<br>
+ As criadinhas postas aos fogões,<br>
+ Padecendo depois constipações,<br>
+ Que todas trabalhárão na officina,<br>
+ Para prompta se pôr a pappa fina.<br>
+ Quando o dono da casa sente a asneira,<br>
+ Já não póde sahir da ratoeira;<br>
+ Mas he bem bom que assim fique ensinado,<br>
+ Para vir a ser mais acautelado,<br>
+ E fugir dos ajustes puxativos,<br>
+ Feitos por certos genios logrativos,<br>
+ Promptos para banquetes, onde os ha,<br>
+ Porém que em suas casas só dão chá.<br>
+ <br>
+ Eu vejo certos homens costumados<br>
+ A mostrarem-se muito desvairados;<br>
+ A cousa alguma prestão attenção;<br>
+ Nas cousas de maior ponderação<br>
+ Com chufas, e risadas só respondem,<br>
+ E ás vezes muita asneira nisto escondem;<br>
+ Por systema, por vicio, ou por maldade<br>
+ Fogem de conversar com seriedade:<br>
+ De todas as perguntas fazem mofa,<br>
+ Só por tratarem tudo de galhofa;<br>
+ Deixando os dependentes mais afflictos,<br>
+ Por verem termos taes tão esquisitos:<br>
+ Sujeitão-se, calando, os que dependem,<br>
+ Mas ficão em jejum no que pertendem.<span class="pn">{10}</span><br>
+ Homens assim não são muito seguros,<br>
+ Que trazem a cabeça sempre a juros.<br>
+ Cuidado lhes não dá o alheio int'resse,<br>
+ Pobre de quem depende, e quem padece.<br>
+ <br>
+ Eu vejo muitas casas de partidas,<br>
+ Que são com as dos doudos parecidas.<br>
+ Vem entrando co' a noite os assignantes,<br>
+ Passão em conversar breves instantes.<br>
+ A Prima conta á Prima o máo successo<br>
+ De huma esperta gatinha côr de gesso,<br>
+ Com malhas no focinho, e no costado,<br>
+ Que fazem o animal muito engraçado:<br>
+ Relata o muito amor, que ella lhe tem,<br>
+ Enlevada naquelle bom desdem.<br>
+ Sahe d'alli logo Dona Presumida,<br>
+ Meia tafulla, meia convertida,<br>
+ (Que ao certo ninguem sabe inda entendella,<br>
+ Se ella he que deixa o mundo, ou elle a ella)<br>
+ E diz que tem por cousa do demonio<br>
+ Haver homem, que fuja ao Matrimonio.<br>
+ Como a materia he vasta, vai durando,<br>
+ Huns mettendo-a em questões, outros mofando.<br>
+ Chega o chá co' as fatias transparentes,<br>
+ Que lhes ficão pegadas pelos dentes.<br>
+ Assim se passa aquelle bocadinho,<br>
+ Té que as bancas se põem para o joguinho.<br>
+ Então he que a criada da cozinha<span class="pn">{11}</span><br>
+ Desenferruja a lingoa co' a vizinha;<br>
+ Então he que outra á porta do jardim<br>
+ De seus amores vai tratar o fim:<br>
+ E a velha Preta á chaminé, qual mono,<br>
+ Sempre a cabecear, pôdre de somno;<br>
+ Porque os donos da casa divertidos,<br>
+ Da Partida tirar querem partidos.<br>
+ Nada os póde fazer deixar o jôgo,<br>
+ Só vindo-lhes dizer que em casa ha fogo;<br>
+ E em quanto se entretem com este aresto,<br>
+ Fica á vontade da familia o resto;<br>
+ Que por isso da casa mal guardada<br>
+ Se tem visto fugir filha, ou criada;<br>
+ Ou succeder a alguma rapariga<br>
+ O que a decencia manda que eu não diga.<br>
+ Muita cautela, e não facilidades,<br>
+ Evita nas familias novidades;<br>
+ Porque donas de casa não previstas,<br>
+ Que não sabem deitar por tudo vistas,<br>
+ Sem determinação, amanho, e zelo,<br>
+ Hão de achar muito roubo, e desmazelo:<br>
+ Nos armarios mil cousas estruidas,<br>
+ As casas int'riores nem varridas,<br>
+ Sobejos de comer dentro do cobre,<br>
+ Por se não dar de esmola a tempo ao pobre:<br>
+ Sem duração a roupa, nem aceio,<br>
+ As lingoas das criadas sem ter freio;<br>
+ Pouco, e pouco a dispensa dizimada;<span class="pn">{12}</span><br>
+ Louça fina escondida por quebrada;<br>
+ E os vexados maridos com prudencia,<br>
+ Dizendo lá comsigo: Ora paciencia!<br>
+ Porque se ralhão, são insupportaveis,<br>
+ Se fechão tudo, são huns miseraveis,<br>
+ Se trombudos, são mal encaminhados,<br>
+ Se castigão, são homens mal criados;<br>
+ Ellas querem sómente andar nas palmas,<br>
+ E os maridos, que peção para as Almas;<br>
+ Com tanto que ande Sempre a bolsa aberta,<br>
+ Que he quando com marido bom se acerta.<br>
+ Conheço que ha familias de bom porte;<br>
+ Não he nestas que assenta este meu corte:<br>
+ Nem ás outras tambem me determino<br>
+ Levando nesta critica destino.<br>
+ Atiro estes meus botes não pequenos,<br>
+ Porque o mundo tem disto mais, ou menos.<br>
+ <br>
+ Eu vejo huns homens ricos suffocados,<br>
+ Té da sombra dos mais desconfiados,<br>
+ Que vão, por ver se fica bem segura,<br>
+ Mil vezes apalpar a fechadura<br>
+ Da burra, que n'hum lado tem da cama,<br>
+ Temendo da familia alguma trama;<br>
+ E homens taes, afogados em riquezas,<br>
+ Raras vezes se lembrão da pobreza;<br>
+ Havendo casas tão necessitadas,<br>
+ Nunca por elles são remediadas:<span class="pn">{13}</span><br>
+ Por mais ouro, que tenhão, que lhes sobre,<br>
+ He raro quando dão dez reis a hum pobre.<br>
+ Hum só rasgo não tem de caridade<br>
+ Para a triste viuva, ou orfandade.<br>
+ Não sei que contas fazem homens taes<br>
+ Ajuntando, e escondendo os cabedaes!<br>
+ Morrem té sem fazerem testamento,<br>
+ Espirando n'hum trato o mais nojento,<br>
+ Depois de vida sórdida, e mesquinha,<br>
+ Que nem mandão comprar huma gallinha.<br>
+ E vão-se deste mundo rebolindo,<br>
+ Em quanto delles fica o mundo rindo:<br>
+ Acabão supportando aquella surra,<br>
+ Botando sempre os olhos para a burra.<br>
+ Ora descance em paz, senhor defunto;<br>
+ Cá fica quem lhe espalhe o que tem junto!<br>
+ <br>
+ Eu vejo certos homens systematicos,<br>
+ Que em tudo quanto pensão são fanaticos:<br>
+ Cada falla he o estrondo de huma bomba,<br>
+ Até parecem ter de porco tromba;<br>
+ Fallão pouco, e não gostão de ouvir nada,<br>
+ Tudo quanto se diz tudo os enfada.<br>
+ Hum Cavalheiro deste paladar<br>
+ Na loja de hum barbeiro foi entrar.<br>
+ O mestre fez-lhe a barba in continente,<br>
+ Mas no muito fallar impertinente.<br>
+ Feita a barba, o soturno Cavalheiro<span class="pn">{14}</span><br>
+ Disse ao tal fallador mestre barbeiro:<br>
+ Pois que o vejo verboso em novidades,<br>
+ E em discursos de varias qualidades,<br>
+ Queira dizer-me, que saber preciso,<br>
+ Qual he o animal de mais juizo?<br>
+ Que era o boi, respondeo o mestre prompto.<br>
+ Isso somente expressa hum homem tonto,<br>
+ Lhe disse o cavalheiro, e não cuidava<br>
+ Que huma resposta avêssa assim me dava.<br>
+ Tornou-lhe o mestre: he o cão ao dono grato.<br>
+ Tambem não acertou por mentecapto,<br>
+ Lhe disse o Cavalheiro, ouça-me attento,<br>
+ Para tirar d'aqui hum documento.<br>
+ O bode he o animal nada ignorante,<br>
+ Porque sendo de barbas abundante,<br>
+ Tendo-as compridas, nunca as quiz fazer,<br>
+ Sómente por barbeiros não soffrer.<br>
+ Assim ficou o mestre corrigido,<br>
+ Para ser em fallar mais comedido.<br>
+ <br>
+ Portugal, Portugal! não te conheço!<br>
+ E quanto tu padeces, eu padeço!<br>
+ Pois te vejo mais triste do que o dia<br>
+ De envernosa estação! Quem tal diria!<br>
+ Andas debilitado, empobrecido,<br>
+ Saudoso, sem descanço, e esmorecido!<br>
+ O teu Xavier de Mattos bem fallou,<br>
+ No galante Soneto, que traçou,<span class="pn">{15}</span><br>
+ Quando disse com arte, e natureza,<br>
+ Que da soturna imagem da tristeza<br>
+ Era hum retrato vivo, e verdadeiro<br>
+ <em>Qualquer homem de bem sem ter dinheiro</em>;<br>
+ Cuja falta tem feito no presente<br>
+ A ruina fatal de tanta gente.<br>
+ Mas no meio de quanto se padece,<br>
+ Hum genio creador nos apparece,<br>
+ Que por nossa fortuna nos offerta.<br>
+ Huma bem importante descuberta:<br>
+ E bem se deixa ver no raro invento<br>
+ O quanto póde hum homem de talento.<br>
+ De bons engenhos nasce a emulação,<br>
+ Com que se aperfeiçôa huma nação.<br>
+ Receba parabens toda a Cidade<br>
+ De huma cousa de tanta utilidade.<br>
+ Não supponhão que he plano, ou são maneiras<br>
+ D'a ferrugem tirar ás oliveiras:<br>
+ Não cuidem que he fazer dar direcção<br>
+ Hum viajante aerio ao seu Balão:<br>
+ Nem deve presumir tambem o povo<br>
+ Que tem de guarda-quedas molde novo:<br>
+ Este invento os perigos acautela,<br>
+ Mas em substancia he cousa mui singela.<br>
+ Agora me parece estar ouvindo<br>
+ O Leitor curioso serio, ou rindo,<br>
+ Dizer-me ou assentado, ou posto em pé:<br>
+ Basta de franja, acabe, diga o que he!<span class="pn">{16}</span><br>
+ Ora eu o satisfaço: Ha hum Fulano<br>
+ Dos que vestem casaca de bom panno,<br>
+ Que por idéa sua, e risco seu<br>
+ Para huma tenaz o molde deu.<br>
+ Eu a vi, a qual era fabricada<br>
+ De hum poído metal, obra aceada:<br>
+ Hum destes ferros de encrespar cabello<br>
+ He mesmo o da tenaz fiel modelo.<br>
+ De curioso eu, que o traste via,<br>
+ Logo quiz indagar de que servia?<br>
+ Disse-me o inventor que fora feito<br>
+ Por servir a quem fuma de proveito:<br>
+ Que o lume no sigarro mais atura,<br>
+ Huma vez que a tenaz he que o segura;<br>
+ Que faz esta invenção perder os medos<br>
+ Aos sigarristas de queimar os dedos;<br>
+ Que os Mouros tem cachimbos de huma vara,<br>
+ Que a tenaz he aceio, e moda rara.<br>
+ <br>
+ Agora se descobrem novas minas,<br>
+ Com outras invenções mais genuinas;<br>
+ Já temos hum moinho de vapor,<br>
+ Que o de vento não móe talvez melhor.<br>
+ De vapor hão de haver carros tambem:<br>
+ Nas seges eu espero o mesmo trem.<br>
+ Se a cousa for feliz, e se pegar,<br>
+ Muitas cousas havemos de poupar!<br>
+ Os machos, desta sorte, escusos são,<span class="pn">{17}</span><br>
+ Hão de ficar em bestas de ceirão<br>
+ Não terão preço a palha, nem cevada.<br>
+ Se chego a ver tal maquina ultimada,<br>
+ Affectando de grande personagem,<br>
+ Protesto sempre andar de carruagem.<br>
+ Grande cousa ha de ser, se se inventar<br>
+ O modo do vapor nos sustentar!<br>
+ Despeço-me de açougues, e Ribeira,<br>
+ E digo adeos á Praça da Figueira.<br>
+ He tudo isto bem bom; mas o peior<br>
+ He faltar o dinheiro no melhor!<br>
+ E assim como nas Caldas toda a gente<br>
+ Se anda sempre queixando de doente,<br>
+ Nós aqui com a mesma singeleza,<br>
+ Só ouvimos clamores de pobreza:<br>
+ Molestia, que amofina, e que faz tedio,<br>
+ Que nem nas Caldas póde achar remedio.<br>
+ Luxo, e mais luxo, pôdres, e mais pôdres,<br>
+ Tudo cheio de vento, como os ôdres!<br>
+ Ha huns homens sagazes de tal sorte,<br>
+ Que desfrutarem muito he o seu forte;<br>
+ Pois no ramo, em que lidão, e em que estão,<br>
+ Não deixão escapar occasião:<br>
+ Vão-se enchendo, e fazendo caramunha,<br>
+ Só para que ninguem lhes veja a unha:<br>
+ Mostrão-se mui zelosos com systemas,<br>
+ Mas tem sempre o seu ovo duas gemas.<span class="pn">{18}</span><br>
+ E aqui fica a razão verificada<br>
+ De huns virem a ter tudo, e outros nada!<br>
+ A huns tudo lhes vai bater á porta;<br>
+ Outros não passão já da cepa torta!<br>
+ Isto mesmo succede a mais de mil,<br>
+ E eu comparo estas cousas a hum funil.<br>
+ O que póde beber pelo bocal,<br>
+ Sacia-se, e não vai de todo mal;<br>
+ E quem pelo canudo sorve o vinho,<br>
+ Tira quinhão, porém muito mesquinho.<br>
+ <br>
+ Portugal, Portugal! o que bem pensa,<br>
+ Tem encontrado em ti grande diff'rença!<br>
+ Perdeste em alguns homens a verdade,<br>
+ Que dava sempre tom á sociedade.<br>
+ Em poucas partes ha palavra firme,<br>
+ E não falta com que isto se confirme.<br>
+ A minha Musa de apontar se izenta,<br>
+ Melhor o ha de applicar quem o exp'rimenta.<br>
+ Eu admiro nos homens hoje em dia<br>
+ De tocar os extremos a mania!<br>
+ Que ou perdularios gastão quanto tem,<br>
+ Fazendo mal a si, e aos outros bem;<br>
+ Ou tão mesquinhos são, tão acanhados,<br>
+ Que nem bons dias dão, por serem dados.<br>
+ Pouco briosos são, faltos de acções,<br>
+ Remoques não lhes fazem vexações:<br>
+ Nada querem, que custe hum só vintem,<span class="pn">{19}</span><br>
+ Só o que he de tolã lhes sabe bem.<br>
+ Não querem acertar n'hum meio termo;<br>
+ Estes, e outros que taes te pôem enfermo.<br>
+ Os homens de algum dia praticavão<br>
+ A boa educação que os Pais lhes davão;<br>
+ Mas hoje alguns modernos estou vendo,<br>
+ Que logrativos vão o tempo enchendo,<br>
+ Porque o que de espertezas mais se jacta,<br>
+ Engana aquelle mesmo com quem trata.<br>
+ Tem-se hoje descuberto novos trilhos;<br>
+ Nem ha filhos por pais, nem pais por filhos:<br>
+ Não vejo senão genios desiguaes;<br>
+ Usão todos de termos mui geraes:<br>
+ <em>Verbi gratia</em>, Desejo-lhe prestar;<br>
+ Se precisar de mim, ha de me achar;<br>
+ Conheça que sou sempre seu amigo;<br>
+ Em tudo o que eu puder, conte comigo.<br>
+ Tudo palavras ocas, sem substancia,<br>
+ Ditas sem fé, com arte, e sem constancia.<br>
+ <br>
+ Tambem vejo alguns homens em balanças<br>
+ Navegando no mar só de esperanças:<br>
+ Figurões, que povôão este mundo,<br>
+ Mas tem os fundos seus todos no fundo.<br>
+ Abalrôão co'a gente empavezados,<br>
+ Em quanto se não mostrão naufragados;<br>
+ Depois são qual a uva já passada,<br>
+ Que mostra baga, e pelle, e çumo nada.<span class="pn">{20}</span><br>
+ Portugal, tu tens tido alguma gente,<br>
+ Que se tem feito a si, e a ti doente.<br>
+ Muita especulação vejo eu fazer,<br>
+ Que em lugar de lucrar, bota a perder;<br>
+ Pois de ter perda certa não se izenta<br>
+ Quem para tirar dez dispende oitenta.<br>
+ <br>
+ Portugal, Portugal! não te conheço!<br>
+ Que me fazes tristeza te confesso!<br>
+ Homens ha mais nocivos do que a peste,<br>
+ E senhoras tambem de genio agreste:<br>
+ Enfadão-se com todos, e com tudo,<br>
+ E parece que o fazem por estudo!<br>
+ Não cessão de ralhar, e de moer<br>
+ As familias, por dar-lhes que soffrer:<br>
+ Trazem a casa toda em labyrintho,<br>
+ Pela condição aspera, que pinto.<br>
+ Tambem homens encontro de tal modo,<br>
+ Que assentão que he já seu o mundo todo;<br>
+ Humas caras, que estão sempre estanhadas,<br>
+ Que ou riem muito, ou são embuziadas.<br>
+ Com condições assim não ha quem possa,<br>
+ A reprehensão não vexa, nem faz mossa.<br>
+ Isto nasce dos mimos, que lhes dão<br>
+ Nas faltas da primeira educação.<br>
+ <br>
+ Vejo huns homens tambem affeminados,<br>
+ No gesto, e no fallar muito affectados,<span class="pn">{21}</span><br>
+ Todos sentimentaes, cheios de nicas,<br>
+ Que algum dia chamavão-se Maricas;<br>
+ Mas assentárão hoje bons engenhos,<br>
+ Que devião chamar-se homens gamenhos.<br>
+ A origem deste nome bem se aponta<br>
+ N'hum caso jovial, que ahi se conta.<br>
+ E são recommendaveis taes figuras<br>
+ Nos tregeitos, e vãs caricaturas;<br>
+ Té mastigão fazendo muito mômo<br>
+ O cheiroso Indiano cardamômo,<br>
+ O qual trazem na boca largas horas,<br>
+ Para terem bom bafo entre as senhoras;<br>
+ Nem perdoão ao seu mestre barbeiro<br>
+ A dedada de banha de bom cheiro.<br>
+ E já houve hum, que tendo a irmã de parto,<br>
+ E entrando casualmente no seu quarto,<br>
+ O cheiro da tal banha muito activo<br>
+ Da pobre endoudecer foi o motivo.<br>
+ Antes do Terremoto se munião<br>
+ De pastilhas de cheiro, que trazião,<br>
+ Em pivete, e em almiscar enfrascados,<br>
+ Parecião de alcorce ser formados.<br>
+ Destas verdades não se escandalizem,<br>
+ Que ainda ha velhos vivos, que isto dizem.<br>
+ Então erão faceiras, e casquilhos<br>
+ No principio da moda dos polvilhos;<br>
+ Pelos tempos vierão a peraltas,<br>
+ Mas hoje são tafues, e alguns com faltas:<span class="pn">{22}</span><br>
+ Os quaes agora tem por maravilha<br>
+ A barriga apertarem co' huma cilha,<br>
+ Enfivelada com tal arte, e geito,<br>
+ Que a barriga se encolha, e altêe o peito;<br>
+ Porque querem mostrar que podem ter<br>
+ Perfeitos <em>patriotismos</em> de mulher.<br>
+ Que errei esta palavra não se pense;<br>
+ Pois vem na biblioteca Tafulense<br>
+ Com <em>pitéo</em>, com <em>pinóia</em>, com <em>chalaça</em>,<br>
+ <em>Cucanha</em>, <em>mujangué</em>, <em>Caurím</em>, que embaça<br>
+ E para o peito ter maior altura,<br>
+ E mostrar o que querem na figura,<br>
+ Dão aos seus alfaiates a matraca<br>
+ De almofadar as bandas da casaca.<br>
+ Ora em trazerem cilha acho razão,<br>
+ Visto haver ferradura por tacão!<br>
+ São estas invenções todas de fóra,<br>
+ Nós somos de outros reinos firme escora.<br>
+ Os mais aprestes elles virão vindo,<br>
+ Pois que as outras nações ficão-se rindo,<br>
+ Mandando engodos taes a Portugal<br>
+ Por sommas de dinheiro em bom metal.<br>
+ Tomára persuadir aos que usão disto<br>
+ Que usassem o que a muitos tenho visto:<br>
+ Nas modas meio termo, e na despeza,<br>
+ E nada de emendar a natureza.<br>
+ Deixemos que hum tal sestro as Damas tomem;<br>
+ Que a perfeição do homem he ser homem,<span class="pn">{23}</span><br>
+ E não trazer pescoço almofadado,<br>
+ Tingir cabello já esbranquiçado,<br>
+ Ou pôr grande chinó da côr da amora<br>
+ Co' as bellezas mui brancas, e de fóra,<br>
+ Como vejo aos que são de meia idade<br>
+ Filhos só do amor proprio, e da vaidade:<br>
+ Com outros desacordos deste lote,<br>
+ Que de certo não falta quem os note.<br>
+ <br>
+ E que direi de velhos enfeitados,<br>
+ Que são a hum cêpo bem assemelhados?<br>
+ Assim como eu, que o digo, a quem os annos<br>
+ Feito hum espelho tem de desenganos,<br>
+ Mas se viuvo estou, e já maduro,<br>
+ Viuvo ficarei pelo seguro.<br>
+ Não obstante elles verem-se encolhidos,<br>
+ De pernas a vergarem carcomidos,<br>
+ Assim mesmo meninas vão buscar,<br>
+ Querendo-lhes fazer seu pé d'altar:<br>
+ Sem se lembrarem que huma franga nova<br>
+ Atira com hum velho para a cova.<br>
+ Se buscassem dos annos a igualdade,<br>
+ Inda lhes perdoaria a leviandade;<br>
+ Mas quererem que as pobres raparigas,<br>
+ Que por pouco escapárão das bexigas,<br>
+ Atrás de algum vintem vão á lambugem,<br>
+ E que morrão de nojo, e de rabugem!<br>
+ Não posso levar tal á paciencia!<span class="pn">{24}</span><br>
+ Amor isto não he: conveniencia.<br>
+ Que em casamentos taes bem se conhece<br>
+ Serem ellas escravas do interesse.<br>
+ Que prazer póde ter muito a seu salvo<br>
+ A que se liga a hum velho chôcho e calvo?<br>
+ He muito natural mais lhe aborreça,<br>
+ Se calvo for de quanto ha na cabeça;<br>
+ Pois velho, que namora, e que se enlaça,<br>
+ Tem a cabeça igual a huma cabaça;<br>
+ E porque a natureza lhe he avessa,<br>
+ Se tem dor de vazio he na cabeça.<br>
+ Coitado! na figura, em que se vê,<br>
+ Já podião chamar-lhe a morte em pé.<br>
+ Mas no dia do alegre casamento<br>
+ Resuscita com tal contentamento,<br>
+ Que he pena ter o velho, que faz rizo!<br>
+ Resurreição sem dia de juizo.<br>
+ <br>
+ Tambem noto que hum velho de algum dia<br>
+ Para a terra curvado he que pendia,<br>
+ Grossa bengala a corpo hia sustendo,<br>
+ E sobre as costas a marrã crescendo<br>
+ Mas parece que a mesma natureza<br>
+ Nos quer mostrar que nada tem firmeza;<br>
+ Pois que os velhos, a quem tudo desanda,<br>
+ Andão hoje tombados a huma banda.<br>
+ Na velhice o estupor se reconcentra,<br>
+ E não torna a sahir huma vez que entra.<span class="pn">{25}</span><br>
+ Por acaso algum dia se fallava<br>
+ Que em alguma pessoa estupor dava.<br>
+ Eu sim me enganarei, mas ajuizo<br>
+ Que nos vem este grande prejuizo<br>
+ Do pão, do vinho, do vinagre, e azeite,<br>
+ Quando generos taes levão enfeite.<br>
+ E se isto assim não he, porque razão<br>
+ Só em Lisboa ha tal repitição?<br>
+ E lá fóra nas Villas, e Cidades<br>
+ São estas cousas humas raridades?<br>
+ Porque ha lá menos gente? Não convence;<br>
+ Bem que he mui natural que assim se pense.<br>
+ E hoje até na florida mocidade<br>
+ Se está vendo huma tal calamidade;<br>
+ Mas os moços, álem da razão dada,<br>
+ Tem outra circunstancia mais pezada,<br>
+ Que he o irem por gosto aos sacrificios,<br>
+ Para as forças perderem pelos vicios.<br>
+ <br>
+ São a saude, e o tempo dois objectos<br>
+ Estimados dos homens circunspectos;<br>
+ E diz a mocidade que tambem<br>
+ Estas cousas em grande valor tem:<br>
+ Porém com appetites, e loucuras<br>
+ Enxadadas vão dar nas sepulturas.<br>
+ Hum perdeo a substancia, o outro a côr<br>
+ Aquelle anda tolhido de huma dor.<br>
+ E já tantas molestias lhes acodem.<span class="pn">{26}</span><br>
+ Que nem armas, nem letras seguir podem:<br>
+ Sobrevindo-lhes tal debilidade,<br>
+ Que não podem gozar de longa idade.<br>
+ Perdem filhos os pais, o Rei vassallos,<br>
+ Porque a chusma dos vicios vem cortallos.<br>
+ Nelles a mocidade he que se illude<br>
+ Para estrago do tempo, e da saude:<br>
+ Preciosidades estas, que perdidas,<br>
+ Não vemos com que possa o ser suppridas.<br>
+ <br>
+ Portugal, Portugal! não te conheço!<br>
+ Do que és, e do que foste não me esqueço!<br>
+ Dos teus usos antigos te tiraste,<br>
+ E he problema entre nós se melhoraste!<br>
+ Do que tinhas melhor já te esqueceste,<br>
+ E o que perder devias não perdeste!<br>
+ Puzeste cousas mil em confusões<br>
+ Das modas, que te vêm de outras naçõês:<br>
+ Té desprezas o solido alimento,<br>
+ E por isso te vejo tão gosmento;<br>
+ Não tens senão defluxos catarrosos,<br>
+ Indigestões, topôres perigosos,<br>
+ Com que continuamente te prantêas,<br>
+ Fruto de altos jantares, grandes cêas:<br>
+ Ha cinco, e seis cubertas, e ha pessoa,<br>
+ Que a hum só prato que seja não perdoa.<br>
+ Hum individuo assim Pai Pai segundo,<br>
+ He capaz de comer quanto ha no mundo.<span class="pn">{27}</span><br>
+ Fica esmola a pedir quem o supporta:<br>
+ Tal gente longe vá da minha porta!<br>
+ Portugal, sê na meza acautelado;<br>
+ A gula te vai pondo em triste estado:<br>
+ Já nas cazas de pasto frequentadas,<br>
+ Já nas mezas dos ricos enfeitadas,<br>
+ Mostras fastio á sôpa, vaca, arroz,<br>
+ Só queres fricassés, e fricandoz;<br>
+ O rosbife, que em sangue inda escorrendo,<br>
+ Os estômagos vai assim perdendo;<br>
+ Rabiolos, fatia á Prussiana,<br>
+ Pitéos de toda a casta de chanfana;<br>
+ Que ha cozinheiro tal, tão delicado,<br>
+ Que de folhas de parras faz guizado,<br>
+ Mujangués, varios môlhos, e frituras,<br>
+ Leite creme, pudins, e outras misturas,<br>
+ Compotas com as caldas refervidas;<br>
+ Tudo isto pouco a pouco acaba as vidas.<br>
+ Depois tens nos cafés vastos licôres,<br>
+ Que alguns até se bebem pelas côres:<br>
+ Hum porque he côr de roza muito vivo,<br>
+ Outro o ser côr de goivo faz motivo;<br>
+ O de cravo, que agita, bem que esquenta,<br>
+ Hum, que se estima de hortelã pimenta;<br>
+ O licor de canela, o marrasquino,<br>
+ Licor de ouro tambem que he caro, e fino.<br>
+ Eu inda espero ver licor de cardos,<br>
+ De alfazema, tomilho, e lirios pardos.<span class="pn">{28}</span><br>
+ Sahe hum Taful d'alli, que he todo braza;<br>
+ Se tomasse cantharides em casa,<br>
+ Não julgava ficar assim tão forte;<br>
+ Quer conservar a vida, e busca a morte.<br>
+ Se não se emenda disto, anda enganado,<br>
+ Cuida que morre cru, morrendo assado.<br>
+ <br>
+ Portugal, em mil couzas tens mudado!<br>
+ Só te vejo aos abusos afferrado!<br>
+ Por exemplo: jogar-se tanto o entrudo,<br>
+ Em que se insulta o homem mais sisudo,<br>
+ Com agua, pós, laranjas, pulhas, peças,<br>
+ Em que aberto se tem tantas cabeças!<br>
+ Louvo que jantes bem nesses tres dias,<br>
+ Mas reprovo da cêa as demazias.<br>
+ Pois comes sem discurso, ou reflexão,<br>
+ Para teres p'rigoza indigestão!<br>
+ Tens outro abuso, que he serrar a velha,<br>
+ Tolice, que não póde ter parelha;<br>
+ Para andarem por frios, e por lamas<br>
+ Os homens a fugir das suas camas,<br>
+ Fazendo levantar, vir á janella,<br>
+ Para se constipar esta, e aquella,<br>
+ Que sem juizo algum ama, e criada<br>
+ Perdem a noite nessa mascarada,<br>
+ Até que no outro dia a cozinheira<br>
+ Dá ao demo tão grande babozeira;<br>
+ Pois não podendo o somno disfarçar,<span class="pn">{29}</span><br>
+ Deixou entrar o caturro no jantar.<br>
+ E que direi tambem das boas Festas?<br>
+ Não devo criticar couzas como estas;<br>
+ Porque trazem motivo mui sagrado,<br>
+ Com que todo o Christão, bem educado,<br>
+ Deve ter alegria, e grande gloria<br>
+ Em trazer taes motivos á memoria.<br>
+ Mas quizera, encontrando-se as pessoas,<br>
+ Que abraçando-se, dessem Festas boas;<br>
+ E que os que mais pudessem nestes dias,<br>
+ Embora uzassem grandes bizarrias,<br>
+ Mandando, não Bilhetes de prezente,<br>
+ Mas sim couzas, que alegrem o olho á gente:<br>
+ Bons perús, porcos, patos, ou perdizes,<br>
+ Seis gallinhas com doze codornizes,<br>
+ Tortas, pudins, pasteis, ou pastelões,<br>
+ Finas broas, gostozos massapões.<br>
+ Eis-aqui humas Festas de prazer,<br>
+ Que são de consolar, e agradecer.<br>
+ Isto prova a amizade ser fiel,<br>
+ E val mais que tirinhas de papel,<br>
+ Ou Bilhetes de nomes em cartão,<br>
+ Que os criados ás vezes nem os dão:<br>
+ A sege mui fechada á porta chega<br>
+ A procurar aquelle, que se nega;<br>
+ E muito digno he de se notar<br>
+ O que de ambos devemos ajuizar;<br>
+ No da sege bem he que se supponha<span class="pn">{30}</span><br>
+ Que de dar Boas Festas se envergonha;<br>
+ Porque vai tão fechado, e tão occulto,<br>
+ Que parece que teme algum insulto.<br>
+ E esse, que em caza está, do amigo á espreita,<br>
+ Em não fallar-lhe faz-lhe huma desfeita.<br>
+ Por isso implicão taes formalidades<br>
+ Com as bem reguladas amizades.<br>
+ <br>
+ Dizem que quanto mais se vai vivendo,<br>
+ Mais couzas, nunca vistas, se vão vendo;<br>
+ Mas eu outro conceito he bem que forme,<br>
+ Que quanto mais se vive, mais se dorme;<br>
+ E dou esta razão, porque supponho<br>
+ Que viver, e dormir he tudo hum sonho.<br>
+ Sonho parece quanto vejo, e digo,<br>
+ Além do quanto fica só comigo.<br>
+ Porém vamos a couzas divertidas,<br>
+ E fallemos de velhas presumidas,<br>
+ Que algumas ha de tanta affectação,<br>
+ Que por invencioneiras dão penção.<br>
+ Huma velha vi eu tão melindroza,<br>
+ Que fugia do cheiro de huma roza,<br>
+ Dizendo lhe exaltava logo o flato;<br>
+ Tão estragado estava aquelle olfato!<br>
+ Succedeo de vizita ir esta lesma<br>
+ A caza de outra igual Dona Seresma<br>
+ A tempo que entrou logo outra vizita<br>
+ De huma grave Senhora, mui bonita,<span class="pn">{31}</span><br>
+ A qual tinha nas tranças espetada<br>
+ Huma perfeita roza avermelhada;<br>
+ E porque ao pé da velha se assentou,<br>
+ Logo a velha aos arrotos começou,<br>
+ Dando desta molestia por motivo<br>
+ Daquella roza o cheiro muito activo:<br>
+ Foi crescendo a afflicção a mais e mais,<br>
+ E com afrontamentos grandes ais;<br>
+ Cahio do canapé torcida toda<br>
+ Com huma convulsão destas da moda.<br>
+ Acodio-lhe a Senhora a toda a pressa,<br>
+ Que trazia a tal roza na cabeça,<br>
+ Dizendo que era sêca, e que a comprára,<br>
+ Por ser roza de musgo, linda, e rara;<br>
+ Obra feita por mão de huma Franceza,<br>
+ Que nas flores imita a Natureza.<br>
+ Quando a velha ouvio tal, envergonhada,<br>
+ Fingio tornar a si com lã queimada;<br>
+ E foi então geral a zombaria,<br>
+ Que fez da dita velha a companhia.<br>
+ Eis-aqui as molestias, que dão rizo,<br>
+ E a que se expõem com faltas de juizo<br>
+ As velhas infundidas em vaidade,<br>
+ Que querem sempre estar na flor da idade;<br>
+ Que ha velha, que no modo de trajar,<br>
+ Presume as raparigas desbancar.<br>
+ <br>
+ Eu vejo raparigas enfeitadas,<span class="pn">{32}</span><br>
+ Rethoricas, porém pouco applicadas,<br>
+ De orelha palavrinhas apanhando,<br>
+ Com as quaes aos tafues vão affectando.<br>
+ Huma carta vi eu de huma senhora,<br>
+ Muito desvanecida de Doutora,<br>
+ Cuja carta era em verso, e era de amores:<br>
+ Queixas de auzencias, zelos raladores;<br>
+ Quando só tinha lido a mocetona<br>
+ As guerras de Alecrim, e Mangerona.<br>
+ A carta não me lembra até ao fim,<br>
+ Porém o seu principio vinha assim;<br>
+ <br>
+ <em>De pungentes receios combatida,<br>
+ Lembrando-me talvez o ser trahida,<br>
+ O meu ciume trepido, fervente<br>
+ Adeja sobre mim avidamente:<br>
+ Eu desafio a magoa, e a impaciencia<br>
+ No campo dilatado de huma auzencia,<br>
+ Ululando, e exprimindo o sentimento,<br>
+ Que me despenha em grande abatimento:<br>
+ Anhelando appellar nesta fraqueza<br>
+ Para o tribunal dubio da fineza.</em><br>
+ <br>
+ Que tal foi este parto sem parteira?<br>
+ Ella chamou-lhe carta, eu chamo asneira.<br>
+ Não critico as Senhoras instruidas<br>
+ Em bons Autores, e Obras escolhidas,<br>
+ Que com principios bons de educação<span class="pn">{33}</span><br>
+ Mostrão que tem juizo, e tem lição:<br>
+ Senhoras ha discretas, que nas fallas<br>
+ Tomárão muitos homens imitallas.<br>
+ Tambem não noto aquellas coitadinhas,<br>
+ Que lidão com dedal, agulha e linhas,<br>
+ Vivem do bastidor, ou da almofada,<br>
+ Que essas tempo não tem para mais nada.<br>
+ Só murmuro daquella não sizuda,<br>
+ Que em trez dias a fórma ás modas muda,<br>
+ Que só cuida do luxo mui garrida,<br>
+ Da belleza, que tem, desvanecida;<br>
+ Não lhe importa nem ler, nem trabalhar,<br>
+ E o que sabe he somente namorar,<br>
+ De janella esperando os valdevinos,<br>
+ Feitas huns papagaios femeninos;<br>
+ Formosuras pasmadas quanto a mim,<br>
+ Bem proprias para estátuas de jardim.<br>
+ <br>
+ Portugal, Portugal! não te conheço!<br>
+ Cada vez te vou vendo mais avêço.<br>
+ Eu vejo tambem homens presumidos,<br>
+ Com desvanecimento de instruidos;<br>
+ Porém he hum saber tão fôfo, e escasso,<br>
+ Que andão a tropeçar a cada passo.<br>
+ Criticão tudo, nada se respeita,<br>
+ Sem saber onde tem a mão direita.<br>
+ Soffrer já mais se póde que a ignorancia<br>
+ O merito confunda co' a jactancia.<span class="pn">{34}</span><br>
+ A ponto se me está reprezentando<br>
+ Hum caso, que nos vem aqui frizando:<br>
+ Nosso insigne Pintor Alexandrino<br>
+ Fallou ao Preto velho Pai Justino,<br>
+ Para que lhe caiasse a propriedade<br>
+ De humas casas, que tinha na Cidade.<br>
+ Caiou-lhe o Preto a frente muito bem,<br>
+ E no fim não lhe quiz levar vintem,<br>
+ Dizendo que hum a outro companheiro<br>
+ Era desattenção levar dinheiro.<br>
+ Ora, assim como o preto, muita gente<br>
+ Sonha em ser grande cousa de repente!<br>
+ <br>
+ Assentemos que o mundo cada dia<br>
+ He de doudos extensa enfermaria;<br>
+ Porque hum ser Mathematico projecta,<br>
+ Outro insigne Pintor, outro Poeta;<br>
+ Hum a Musico vai, outro a Letrado,<br>
+ Outro na Medicina he enfronhado;<br>
+ Hum he Filósofo, outro he Arquitecto,<br>
+ Outro quer ser da Lua, e do Sol neto;<br>
+ E muitos sem principios, nem razão,<br>
+ Não sabem mostrar mais que presumpção;<br>
+ Pertendendo roubar a fama, e gloria<br>
+ A quem cançou com livros a memoria.<br>
+ He tudo enthusiasmo, e parvoice,<br>
+ Desconcertos nascidos da doudice:<br>
+ E nas varias manias, que contém,<span class="pn">{35}</span><br>
+ Assenta cada qual que assim vai bem.<br>
+ Mas se viver por gosto assim pertendem,<br>
+ Que nem já huns aos outros bem se entendem,<br>
+ Vão vivendo, que as cousas deste mundo<br>
+ Humas ficão em cima, outras no fundo;<br>
+ Porque a razão nos mostra, e nos ensina<br>
+ Que tudo toca a meta, e então declina.<br>
+ <br>
+ Portugal, Portugal! nao te conheço!<br>
+ Quanto mais penso em ti, mais esmoreço. </blockquote>
+
+<p>&nbsp;</p>
+<hr>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p><em>Explicação dos Enigmas, Adivinhações, e Charades do 1.º Folheto, ou
+primeira Parte desta Obra.</em></p>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p>O 1.º Enigma he = a letra <em>O</em> = o 2.º = <em>Dedos</em> == o 3.º =
+<em>Pares de luvas</em> = a Adivinhação = <em>Figos</em> = a 1.ª Charade =
+<em>hum Soldado</em> = a 2.ª Charade = <em>hum Caçador</em> =.</p>
+
+<p><span class="pn">{36}</span></p>
+
+<p>&nbsp;</p>
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p style="margin-left: 25%;"><em>Escolher té acertar.</em></p>
+
+<p style="margin-left: 25%;"><em>Improvizo
+do Autor.</em></p>
+
+<blockquote>
+ Tafueszinhos deste tempo,<br>
+   Se estado quereis tomar,<br>
+   Deveis com muito sentido<br>
+   <em>Escolher té acertar.<br>
+ </em><br>
+ Daquella, que rir sem tempo,<br>
+   E esperta de mais fallar,<br>
+   Fugir de se lhe dar corda,<br>
+   <em>Escolher té acertar.</em><br>
+ <br>
+ A que de lograr os homens<br>
+   Com jactancia se gabar,<br>
+   Nem mais pôr-lhe a vista em cima,<br>
+   <em>Escolher té acertar.</em><br>
+ <br>
+ Rapariga janelleira,<br>
+   He bom della não fiar,<br>
+   Namora a muitos, pois quer<br>
+   <em>Escolher té acertar.</em><br>
+ <br>
+ A que ás modas afferrada<br>
+   A moda não perdoar,<br>
+   Deixalla, mas logo ir outra<br>
+   <em>Escolher té acertar.</em><span class="pn">{37}</span><br>
+ <br>
+ A que der costura fóra,<br>
+   E meias a accrescentar,<br>
+   Deixalla ir pela malha,<br>
+   <em>Escolher té acertar.</em><br>
+ <br>
+ Daquella, que crê em bruxas,<br>
+   Que se anda sempre a assustar,<br>
+   Fazer-lhe huma cruz á porta,<br>
+   <em>Escolher té acertar.</em><br>
+ <br>
+ Não vos enleve a menina,<br>
+   Porque canta, e vai walçar;<br>
+   Sem tempo, não ha escolha,<br>
+   <em>Escolher té acertar.</em><br>
+ <br>
+ Fingi ter paixão por todas,<br>
+   Depois huma exceptuar,<br>
+   Fazei o que ellas vos fazem,<br>
+   <em>Escolher té acertar.</em><br>
+ <br>
+ Mal que a escolha se fizer,<br>
+   Sem demoras ir cazar,<br>
+   Mas tomar bem as medidas,<br>
+   <em>Escolher té acertar.</em><br>
+ <br>
+ Qualidades da senhora<br>
+   Podeis por fóra indagar,<br>
+   Indagar não dá, nem tira,<br>
+   <em>Escolher té acertar.</em><span class="pn">{38}</span><br>
+ <br>
+ O laço do Matrimonio,<br>
+   Dado sem se ponderar,<br>
+   Traz depois sempre a desordem,<br>
+   <em>Escolher té acertar.</em><br>
+ <br>
+ Todos sabem que he melhor<br>
+   Prevenir do que emendar,<br>
+   Com brio, honra, e decencia<br>
+   <em>Escolher té acertar.</em><br>
+ <br>
+ Ser amante, e não velhaco,<br>
+   Prometter, e não faltar,<br>
+   E para mais segurança<br>
+   <em>Escolher té acertar.</em><br>
+ <br>
+ Os que nada tem de seu,<br>
+   Nem tem genio de casar,<br>
+   Desenganem, porque escusão<br>
+   <em>Escolher té acertar.</em><br>
+ <br>
+ Hoje as mulheres não querem<br>
+   Os maridos sustentar,<br>
+   Antes tomão por systema<br>
+   <em>Escolher té acertar.</em><br>
+ <br>
+ Donzella, ou viuva rica<br>
+   Pobretões não vão buscar,<br>
+   Vão entre os homens chineiros.<br>
+   <em>Escolher té acertar.</em><span class="pn">{39}</span><br>
+ <br>
+ Casamentos com juizo<br>
+   Poucos vejo effectuar,<br>
+   Se Amor vai com o interesse<br>
+   <em>Escolher té acertar.</em><br>
+ <br>
+ Formosura, e qualidades<br>
+   Já ninguem vai disputar,<br>
+   Se o dinheiro he quem traz tudo,<br>
+   <em>Escolher té acertar.</em><br>
+ <br>
+ Porém siga embora o mundo<br>
+   Esse modo de pensar,<br>
+   Ide só honra, e juizo<br>
+   <em>Escolher té acertar.</em><br>
+ <br>
+ Vós deveis sem ambição,<br>
+   Se tendes com que passar,<br>
+   Nas honestas, recolhidas<br>
+   <em>Escolher té acertar.</em><br>
+ <br>
+ As ricas devem tambem<br>
+   Homens de bem amparar,<br>
+   E nos mais bem comportados<br>
+   <em>Escolher té acertar.</em><br>
+ <br>
+ Se todos isto seguissem,<br>
+   Melhor se havião de achar;<br>
+   Mas dinheiro quer dinheiro,<br>
+   <em>Escolher té acertar.</em><span class="pn">{40}</span><br>
+ <br>
+ A final será virtude<br>
+   Pensões do estado notar,<br>
+   E depois outro destino<br>
+   <em>Escolher té acertar.</em> </blockquote>
+
+<p>&nbsp;</p>
+<hr style="width: 30%;">
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p style="margin-left: 25%;"><em>Minhas
+filhas não caseis.</em></p>
+
+<p style="margin-left: 25%;"><em>Improvizo
+do Autor.</em></p>
+
+<blockquote>
+ Namoradinhas da moda,<br>
+   Vede bem o que fazeis,<br>
+   Com tafues atordoados,<br>
+   <em>Minhas Filhas não caseis.</em><br>
+ <br>
+ Se tomais paixões de amor,<br>
+   De velhas não morrereis;<br>
+   Tira amor annos de vida,<br>
+   <em>Minhas Filhas não caseis.</em><br>
+ <br>
+ Todos huns santos se inculcão,<br>
+   Namorando cinco, e seis,<br>
+   Em lhes conhecendo a balda,<br>
+   <em>Minhas Filhas não caseis.</em><span class="pn">{41}</span><br>
+ <br>
+ São huns em quanto pertendem,<br>
+   Depois são hydras crueis,<br>
+   Como a cobra, a pelle mudão,<br>
+   <em>Minhas Filhas não caseis.</em><br>
+ <br>
+ Destes frangainhos novos,<br>
+   Ó Filhas, não vos fieis;<br>
+   Andão sempre dando ás azas,<br>
+   <em>Minhas Filhas não caseis.</em><br>
+ <br>
+ Trazem-vos anneis das feiras<br>
+   De vintem, e de dez reis,<br>
+   Porque a mais chegar não podem,<br>
+   <em>Minhas Filhas não caseis.</em><br>
+ <br>
+ De educação, e de genio<br>
+   He justo vos informeis;<br>
+   Com homens desconfiados,<br>
+   <em>Minhas Filhas não caseis.</em><br>
+ <br>
+ Entre a guerra dos ciumes<br>
+   N'hum tormento vivereis;<br>
+   Meninas, coração livre,<br>
+   <em>Minhas Filhas não caseis.</em><br>
+ <br>
+ Depois da primeira offensa<br>
+   Segunda não espereis,<br>
+   Fugi sempre a lograções,<br>
+   <em>Minhas Filhas não caseis.</em><span class="pn">{42}</span><br>
+ <br>
+ Como he raro em Lotarias<br>
+   Achar a dos dezeseis,<br>
+   He raro achar bom marido,<br>
+   <em>Minhas Filhas não caseis.</em><br>
+ <br>
+ Não duvido que finezas,<br>
+   E mil excessos acheis;<br>
+   Mas são iscas para a rêde,<br>
+   <em>Minhas Filhas não caseis.</em><br>
+ <br>
+ As cartinhas amorozas,<br>
+   São finezas em papeis,<br>
+   O papel tudo consente,<br>
+   <em>Minhas Filhas não caseis.</em><br>
+ <br>
+ Por huma verdade só<br>
+   Mentiras mil soffrereis,<br>
+   Olho vivo, prevenção,<br>
+   <em>Minhas Filhas não caseis.</em><br>
+ <br>
+ Como Amor cego se pinta,<br>
+   A mesma queixa tereis,<br>
+   Se haveis cahir por cegueira,<br>
+   <em>Minhas Filhas não caseis.</em><br>
+ <br>
+ Aturar os pequerruxos,<br>
+   Do marido os aranzeis,<br>
+   São cousas, que custão muito!<br>
+   <em>Minhas Filhas não caseis.</em><span class="pn">{43}</span><br>
+ <br>
+ Vós em casa com mil sustos,<br>
+   Elles por outros quarteis;<br>
+   Vós em jejum, elles fartos,<br>
+   <em>Minhas Filhas não caseis.</em><br>
+ <br>
+ Casar, e ficar depois,<br>
+   Como muitas achareis,<br>
+   Viuvas, pobres, doentes,<br>
+   <em>Minhas Filhas não caseis.</em><br>
+ <br>
+ Os velhos são rabugentos,<br>
+   Os moços são infieis;<br>
+   Como ha pouco, onde se escolha,<br>
+   <em>Minhas Filhas não caseis.</em><br>
+ <br>
+ Por sustos, penas, cuidados<br>
+   O descanco não troqueis,<br>
+   Solteiras não sois escravas;<br>
+   <em>Minhas Filhas não caseis.</em><br>
+ <br>
+ Rir, brincar, zombar de todos<br>
+   He bem bom, se isto fazeis,<br>
+   Não vos enterreis em vida,<br>
+   <em>Minhas Filhas não caseis.</em><br>
+ <br>
+ Vivei libertas, Meninas,<br>
+   Que contentes vivereis;<br>
+   Boi solto lambe-se todo,<br>
+   <em>Minhas Filhas não caseis.</em><span class="pn">{44}</span><br>
+ <br>
+ Bem conheço, minhas Filhas,<br>
+   Que em velhas pouco valeis;<br>
+   Mas que serve acertar mal?<br>
+   <em>Minhas Filhas não caseis.</em><br>
+ <br>
+ Amor, juizo, e fortuna<br>
+   He com que acertar deveis;<br>
+   Isto he bom, mas onde ha disto?<br>
+   <em>Minhas Filhas não caseis.</em><br>
+ <br>
+ Nisto, que digo, vos mostro<br>
+   O fruto, que tirareis;<br>
+   Só por trez dias de festa,<br>
+   <em>Minhas Filhas não caseis.</em><br>
+ <br>
+ Abraçai os meus conselhos,<br>
+   Porque vos não enganeis,<br>
+   Mandai Amor á tabúa,<br>
+   <em>Minhas Filhas não caseis.</em><span class="pn">{45}</span> </blockquote>
+
+<hr style="width: 30%;">
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p style="margin-left: 25%;">APÓLOGO.</p>
+
+<p style="margin-left: 25%;"><em>A
+Gallinha, e os Pardaes.</em></p>
+
+<blockquote>
+ N'huma reserva de estrume<br>
+   Gallinha sôfrega andava,<br>
+   Espalhando com os pés<br>
+   O deposito, que achava.<br>
+ Bando de espertos Pardaes<br>
+   Muito de perto a seguião,<br>
+   Quanto ella esgaravatava<br>
+   Elles, famintos, comião:<br>
+ Neste, naquelle lugar<br>
+   Andava a triste cançada;<br>
+   Os Pardaes comião tudo,<br>
+   A pobre Gallinha nada:<br>
+ Té que sacudindo as azas,<br>
+   Virou de repente, e vio<br>
+   A manada charleadora,<br>
+   Que áquelle estrume acudio.<br>
+ Então disse: Está mui bom<br>
+   Esse modo de viver!<br>
+   Eu descobrindo, e espalhando,<br>
+   Para os mais virem comer!<br>
+ Por certo que estou lograda!<br>
+   N'outra não torno a cahir:<br>
+   Donde vir estes golosos<br>
+   Eu cuidarei de fugir.<span class="pn">{46}</span><br>
+ Hum Pardal de escuro bico<br>
+   Dos outros sahio á frente,<br>
+   Que por ser Pardal ja velho,<br>
+   Se julgava intelligente:<br>
+ E querendo despicar<br>
+   Aquella descompostura,<br>
+   Deo á Gallinha em resposta<br>
+   Esta sentença madura:<br>
+ Este lugar, em que andamos,<br>
+   Não he vedado a ninguem;<br>
+   Temos a elle o direito,<br>
+   Que qualquer Gallinha tem:<br>
+ De mais ha outro motivo;<br>
+   Quem por espalhar trabalha,<br>
+   He certo que já não quer<br>
+   As mesmas cousas, que espalha:<br>
+ Nós aproveitamos tudo<br>
+   Fiados nesta razão;<br>
+   Ninguem he tolo, que deixe<br>
+   De acceitar o que lhe dão.<br>
+ A Gallinha envergonhada<br>
+   Das satisfações, que ouvio,<br>
+   Deo huma volta em redondo,<br>
+   E nem mais o bico abrio.<br>
+ Os que achão dinheiro junto,<br>
+   Como herdeiros de seus pais,<br>
+   Fazendas, cópa de prata,<br>
+   E outros muitos cabedaes;<span class="pn">{47}</span><br>
+ Que espalhão tudo por vicios,<br>
+   Appetites, e funcções,<br>
+   Dando cabo do que tem<br>
+   Com loucas combinações,<br>
+ Talvez que mais se acautelem,<br>
+   Se disto se recordarem:<br>
+   A Gallinha espalha, espalha,<br>
+   Para os mais se aproveitarem. </blockquote>
+
+<hr style="width: 30%;">
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p style="margin-left: 25%;">CONTO EPIGRAMMATICO.</p>
+
+<blockquote>
+ Ha pelas casas das Sortes<br>
+   Tres Tabellas penduradas<br>
+   Com attractivas fortunas,<br>
+   Mas são fortunas pintadas.<br>
+ Tem por cima Premios grandes,<br>
+   Que se chamão de cabeça;<br>
+   Por baixo os mais diminutos,<br>
+   Em que a gente nada int'ressa.<br>
+ Entrou na loja um Laponio,<br>
+   Querendo Sortes comprar,<br>
+   Metteo prompto a mão na caixa<br>
+   A rir muito, e a perguntar:<br>
+ Diga-me senhor caixeiro,<br>
+   Porque saber me convem,<br>
+   Se esses Premios de cabeça<br>
+   Todos esta caixa tem?<span class="pn">{48}</span><br>
+ Respondeo hum dos que estavão<br>
+   Arrumados ao balcão:<br>
+   Descance; que os de cabeça<br>
+   Todos nessa caixa estão:<br>
+ Cabeça he que nós não temos<br>
+   Em vir sentar-nos n'hum banco<br>
+   A trocarmos o dinheiro<br>
+   Por iscas de papel branco. </blockquote>
+
+<hr style="width: 30%;">
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p style="margin-left: 25%;">CONTO</p>
+
+<p style="margin-left: 25%;"><em>Do Sabio
+por imaginação.</em></p>
+
+<blockquote>
+ Certo Rapaz de Provincia<br>
+   A Lisboa veio dar,<br>
+   O qual não sabia ler,<br>
+   Nem escrever, nem contar.<br>
+ Para ganhar o sustento<br>
+   Pôz-se a servir hum Letrado,<br>
+   Esperto, prompto, e fiel,<br>
+   Mostrando-se hum bom criado.<br>
+ De tres a tres mezes o Amo<br>
+   Por costume lhe dizia:<br>
+   Esfrega-me essas estantes,<br>
+   Limpa-me essa Livraria.<span class="pn">{49}</span><br>
+ Ajuntou alguns vintens,<br>
+   E a sua patria buscou,<br>
+   Onde se estabeleceo<br>
+   Com fazendas que comprou.<br>
+ Lá na Botica da terra<br>
+   Elle hia as noites passar<br>
+   Com o Cura, e mais pessoas,<br>
+   Que alli vinhão palestrar.<br>
+ N'huma noite huma questão<br>
+   Se moveo co'hum Estudante,<br>
+   Em que elle se foi metter<br>
+   Por atrevido e ignorante.<br>
+ Instava sem reflexão<br>
+   Dizendo: He que me faltava;<br>
+   Se por ter aberto livros<br>
+   Vossa Mercê me encovava.<br>
+ Eu tambem Livros abri,<br>
+   Lidei com discreta gente;<br>
+   Não jugue o senhor novato<br>
+   Que acha em mim algum demente.<br>
+ O estudante, que sabia<br>
+   Que o tal servíra hum Letrado,<br>
+   Querendo-o desmascarar,<br>
+   Lhe respondeo enjoado:<br>
+ Eu sei que livros abrio,<br>
+   Mas diz gente verdadeira,<br>
+   Que abria livros alheios,<br>
+   Para tirar-lhe a poeira<span class="pn">{50}</span><br>
+ Eis como alguns impostores<br>
+   De sabios querem ter fama,<br>
+   Lendo só rostos de Livros,<br>
+   Nada fruto, e tudo rama.<br>
+ Não estudão, nem se canção;<br>
+   Querem que a sabedoria<br>
+   Se pegue, bem como a febre<br>
+   Em tempo de epidemia. </blockquote>
+<hr style="width: 30%;">
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p style="margin-left: 25%;">CONTO
+EPIGRAMMATICO.</p>
+
+<blockquote>
+ Havia hum homem sagaz,<br>
+   E bastante indagador;<br>
+   Sempre das vidas alhêas<br>
+   Queria ser sabedor.<br>
+ Por conseguir o seu fim<br>
+   Valia-se de mil modos,<br>
+   Louvando, ou dizendo mal<br>
+   Sabia tudo de todos:<br>
+ Com perguntas, e rodeios<br>
+   Botava a rede em cautela:<br>
+   Quem conversava com elle<br>
+   Por força cahia nella.<br>
+ Adoeceo gravemente;<br>
+   E hum Medico foi chamado,<br>
+   Que da lingoa deste enfermo<br>
+   Vivia escandalizado:<span class="pn">{51}</span><br>
+ Receitou-lhe hum vomitorio,<br>
+   Mas com elle não lançou;<br>
+   Repetio segunda dose,<br>
+   Igualmente se frustrou;<br>
+ Até que o Medico disse:<br>
+   Pasmo do caso presente!<br>
+   Não vomitar quem tem feito<br>
+   Vomitar a tanta gente!<br>
+ E pois que o meu vomitorio<br>
+   Nada, ou pouco lhe aproveita,<br>
+   Se quer vomitar, amigo,<br>
+   Use da sua receita. </blockquote>
+<hr style="width: 30%;">
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p style="margin-left: 25%;">CONTO</p>
+
+<p style="margin-left: 25%;"><em>Do Homem,
+e o Macaco.</em></p>
+
+
+<blockquote>
+ Hum Capitão de Navios<br>
+   Trouxe do Brazil hum Mono<br>
+   De condição vingativo,<br>
+   Mas fagueiro com seu dono.<br>
+ O dono estimava-o muito,<br>
+   E o Macaco o conhecia;<br>
+   Disto dava o bruto provas<br>
+   Nas festas, que lhe fazia.<span class="pn">{52}</span><br>
+ Trepava por elle a cima,<br>
+   Catava-o de quando em quando,<br>
+   Punha-lhe a mão pela cara,<br>
+   De roda delle pulando.<br>
+ Ao animal finalmente<br>
+   So lhe faltava fallar;<br>
+   Tendo o dono ao pé de si,<br>
+   O seu forte era brincar.<br>
+ Vio o Macaco huma vez<br>
+   Seu dono matar hum gallo;<br>
+   Pilhou-o fóra de caza,<br>
+   Tentou tambem imitallo:<br>
+ Entrou pela capoeira<br>
+   Com huma faca na mão,<br>
+   Foi matando tudo a eito,<br>
+   E atirando para o chão.<br>
+ Vindo o dono para casa,<br>
+   E achando tal mortandade,<br>
+   Esconjurou o Macaco,<br>
+   Mais a sua habilidade;<br>
+ Mas passando-lhe a paixão,<br>
+   Co' hum páo o ameaçou,<br>
+   Deo-lhe huma leve pancada,<br>
+   E com dó delle ficou.<br>
+ O bruto, que não perdeo<br>
+   A pancada da lembrança,<br>
+   Mesmo á bruta não deixou<br>
+   De tomar delle vingança;<span class="pn">{53}</span><br>
+ E pilhando no outro dia<br>
+   O dono ao pé descuidado,<br>
+   Botou-lhe com dentes, e unhas<br>
+   A cara abaixo de hum lado.<br>
+ Quem dissera que por tempos<br>
+   Se mostrasse tão cruel<br>
+   Hum bruto, que parecia<br>
+   Tão submisso, e tão fiel!<br>
+ Ha duas moralidades,<br>
+   Que d'aqui se hão de tirar:<br>
+   A primeira he que nos brutos<br>
+   Ninguem se deve fiar:<br>
+ A segunda de que ha homens<br>
+   De huma apparente bondade;<br>
+   São huns, e parecem outros<br>
+   Por manha, e sagacidade. </blockquote>
+<hr style="width: 30%;">
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p style="margin-left: 25%;">APÓLOGO.</p>
+
+<p style="margin-left: 25%;"><em>A Pulga, e
+o Mosquito.</em></p>
+
+
+<blockquote>
+ N'huma noite de Verão,<br>
+   E de bastante calor,<br>
+   Encontrou-se co' hum Mosquito<br>
+   A Pulga n'hum cobertor:<span class="pn">{54}</span><br>
+ Cumprimentárão-se muito<br>
+   Co' a politica devida;<br>
+   E disse a Pulga ao Mosquito:<br>
+   Ando aqui desfalecida;<br>
+ De vossa mercê me queixo,<br>
+   Que do sustento me priva;<br>
+   Estou tisica, e esfalfada,<br>
+   Não sei como já sou viva:<br>
+ Ando por cima de leitos,<br>
+   Ando nas camas de chão;<br>
+   Vem vossa mercê tocando,<br>
+   Começa a minha afflicção;<br>
+ Se dou alguma picada,<br>
+   He sempre em sustos, e medos;<br>
+   Porque temo de cahir<br>
+   Na ratoeira dos dedos.<br>
+ N'hum individuo, que dorme,<br>
+   He onde janto, onde ceio;<br>
+   Mas não me presta o que como,<br>
+   Pelo meu justo receio:<br>
+ Se lhe chupo n'huma perna<br>
+   Sempre com cinco sentidos,<br>
+   Vem logo a sua trombeta<br>
+   Metter-se-lhe nos ouvidos.<br>
+ Acorda o que está dormindo,<br>
+   Dando a cantiga ao diabo;<br>
+   Se me sente, põe-me o dedo,<br>
+   E entre as unhas me dá cabo.<span class="pn">{55}</span><br>
+ Por tanto quero pedir-lhe<br>
+   Tenha de mim compaixão;<br>
+   Que toque á gente acordada,<br>
+   Porém á que dorme não.<br>
+ Ó filha, disse o Mosquito,<br>
+   Eu tambem soffro, e padeço;<br>
+   Pois levo ás vezes boléos,<br>
+   Que da vida me despeço.<br>
+ Dão bofetadas em si<br>
+   Os que andão comigo em guerra;<br>
+   E se me apanhão no lance,<br>
+   Atirão comigo a terra.<br>
+ Os desastres que me conta,<br>
+   Por certo me mettem dó;<br>
+   Mas he preciso tambem<br>
+   Que não queira comer só.<br>
+ Nestes termos, minha rica,<br>
+   A vontade lhe farei;<br>
+   Que engorde, e que viva farta,<br>
+   He que eu muito estimarei.<br>
+ Despedirão-se hum do outro:<br>
+   E o Mosquito atraiçoado<br>
+   Não fez nada do que disse,<br>
+   Que he traidor dissimulado.<br>
+ Perseguia a toda a gente;<br>
+   A quem dormia acordava,<br>
+   Por emulação á Pulga<br>
+   Fazia o que costumava.<span class="pn">{56}</span><br>
+ A Pulguinha muito afouta,<br>
+   Vendo hum homem a dormir,<br>
+   Ferrou-se-lhe no cachaço,<br>
+   Sem lhe lembrar o fugir.<br>
+ O Mosquito pelos olhos<br>
+   A zunir muito, e a morder,<br>
+   Acordou o homem da sesta,<br>
+   Para a Pulga surprender:<br>
+ Que, coitadinha! espirou,<br>
+   Acabando o seu flagello,<br>
+   Entalada entre o sobrado,<br>
+   E entre a sola de hum chinelo.<br>
+ Daqui colligir se deve<br>
+   Que quando a vingança cega,<br>
+   Quasi sempre hum malfeitor<br>
+   O seu semelhante entrega. </blockquote>
+<hr style="width: 30%;">
+
+<p>&nbsp;</p>
+<p style="margin-left: 25%;">APÓLOGO.</p>
+
+<p style="margin-left: 25%;"><em>O Burro, e
+a Ratazana.</em></p>
+
+
+<blockquote>
+ Estava hum Burro comendo<br>
+   Á noite a sua ração,<br>
+   E huma velha Ratazana<br>
+   Quiz ter com elle quinhão.<span class="pn">{57}</span><br>
+ Disse-lhe o Burro: Malvada,<br>
+   Vai a outro sitio comer:<br>
+   Não basta a ração ser pouca?<br>
+   Mais pequena a vens fazer?<br>
+ Respondeo-lhe a Ratazana:<br>
+   Por hoje licença dá;<br>
+   Que por estes oito dias<br>
+   Prometto de não vir cá:<br>
+ Eu sei mui bem que teu dono<br>
+   Hum grande queijo comprou;<br>
+   Espreitei onde o metteo,<br>
+   E á manhã com elle dou:<br>
+ Hei de fartar-me á vontade,<br>
+   Roendo-lho muito bem:<br>
+   Sei que a vizinha debaixo<br>
+   Bolos n'huma cópa tem:<br>
+ O criado, que te trata,<br>
+   Tem lá n'huma parteleira<br>
+   Hum grande monte de cebo<br>
+   Junto dentro de huma ceira:<br>
+ Lá pelas aguas furtadas<br>
+   Já atinei co' huns buracos<br>
+   Para saltar n'hum pombal,<br>
+   E chupar pombos dos cacos.<br>
+ Á vista das descubertas,<br>
+   Que já hoje tenho feito,<br>
+   Espero passar sem fome,<br>
+   Com subtileza, e com geito,<span class="pn">{58}</span><br>
+ Foi tasquinhando a ração<br>
+   Naquella doce esperança,<br>
+   Co'a imaginada fartura<br>
+   Sempre posta na lembrança.<br>
+ Do Burro se despedio<br>
+   Com affago, e cortezia;<br>
+   E foi de rabo estendido<br>
+   Para a cova, em que vivia.<br>
+ Porém lá pela alta noite<br>
+   Tornou depois a sahir,<br>
+   E foi-se por certo atalho<br>
+   Nas casas introduzir.<br>
+ Andou em busca do queijo,<br>
+   Porém já o não achou<br>
+   No sitio, que imaginava,<br>
+   Onde d'antes se guardou.<br>
+ Voltou-se ao primeiro andar<br>
+   Para os bolos da vizinha,<br>
+   Basculhou a copa toda,<br>
+   E nem hum só bolo tinha.<br>
+ Cançada, raivosa, e triste<br>
+   Ao quarto do moço veio;<br>
+   E porque estava acordado,<br>
+   Entrou com algum receio.<br>
+ Saltou para a parteleira<br>
+   Com o cebo no sentido;<br>
+   Mas no dia antecedente<br>
+   O tinha o moço vendido.<span class="pn">{59}</span><br>
+ A sahida deste quarto<br>
+   Empreza foi arriscada;<br>
+   Por se safar tão ligeira,<br>
+   Não mammou huma arrochada.<br>
+ Lá por outros escaninhos<br>
+   Ao telhado caminhou,<br>
+   Só para entrar no pombal,<br>
+   Onde outras vezes entrou.<br>
+ Mal que se pilhou de dentro,<br>
+   Vio huns ninheiros mais baxos,<br>
+   Ficou-lhe o olho luzindo<br>
+   Co' o sentido nos borrachos.<br>
+ O dono, que de outros ratos<br>
+   Se via mais perseguido,<br>
+   Pôz-lhe armada ratoeira<br>
+   Com petisco appetecido.<br>
+ Foi então que a Ratazana,<br>
+   Não se podendo conter,<br>
+   Cheirou-lhe a isca por fóra,<br>
+   Quiz entrar dentro, e comer.<br>
+ Deo voltas, metteo focinho;<br>
+   Mas á dentada primeira<br>
+   Ficou a pobre engasgada<br>
+   Nos ferros da ratoeira.<br>
+ Quanto esperava falhou,<br>
+   E por mais infausta sorte,<br>
+   Toda a alegria passada<br>
+   Acabou nas mãos da morte.<span class="pn">{60}</span> </blockquote>
+<hr style="width: 30%;">
+
+<p>&nbsp;</p>
+<p style="margin-left: 25%;">CONTO EPIGRAMMATICO.</p>
+
+<blockquote>
+ Hum Author compunha hum livro,<br>
+   Livros velhos folheando:<br>
+   Perguntou-lhe hum seu collega:<br>
+   Que estás ahi procurando?<br>
+ Respondeo: Como não ha<br>
+   Livro algum que tão máo seja<br>
+   Que não tenha alguma cousa<br>
+   Boa, que se note, e veja:<br>
+ De cada hum tiro hum pouco.<br>
+   Disto hum novo livro ageito<br>
+   Ficando de cousas boas<br>
+   Formado hum livro perfeito.<br>
+ Desta lição eu quisera<br>
+   Que os homens se aproveitassem,<br>
+   De cada hum imitando<br>
+   As virtudes, que lhe achassem.<br>
+ O homem, que isto fizesse,<br>
+   Hum grande brazão teria;<br>
+   Ficava sendo hum compôsto,<br>
+   Que ao Mundo exemplo daria.<span class="pn">{61}</span> </blockquote>
+<hr style="width: 30%;">
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p style="margin-left: 25%;">APOLOGO.</p>
+
+<p style="margin-left: 25%;"><em>O Saloio,
+e huma Sorte de papel.</em></p>
+
+<blockquote>
+ Vendo nas casas das Sortes<br>
+   Premio de oitenta mil reis,<br>
+   Foi hum Saloio comprar<br>
+   Oito tostões de papeis:<br>
+ E tudo desembrulhando<br>
+   Hum Premio só não achou,<br>
+   Repetio dobrando a dóze,<br>
+   Da mesma sorte ficou:<br>
+ Foi comprando mais e mais,<br>
+   Quanto comprava perdia,<br>
+   Gastou dezoito mil reis,<br>
+   E delles nem bóia via.<br>
+ Raivoso se foi á caixa,<br>
+   Dizendo: Forte castigo!<br>
+   Tirou mais seis tostões dellas,<br>
+   Que era o que tinha comsigo:<br>
+ Tambem lhe sahírão brancas,<br>
+   E o homem desesperou;<br>
+   Mas a ultima entre os dedos<br>
+   Deste modo lhe fallou:<br>
+ Saloio, quem quer que sejas,<br>
+   Toma do mundo lição,<br>
+   Todas as cousas pintadas<br>
+   Como parecem não são;<span class="pn">{62}</span><br>
+ Não te illudas com os Premios,<br>
+   Que he natural o falharem,<br>
+   E nesse engodo emmagreces,<br>
+   Para os outros engordarem:<br>
+ Se o acaso der hum Premio,<br>
+   Põe logo no pensamento,<br>
+   Que para hum só ser feliz,<br>
+   São desgraçados hum cento:<br>
+ O que tira tres moedas,<br>
+   Já veio vinte deixar,<br>
+   E se inda não as largou,<br>
+   He isca para as largar.<br>
+ O que tira tres tostões,<br>
+   Fica de nós muito amigo,<br>
+   Sem ver que deixou o porco,<br>
+   E leva a corda comsigo.<br>
+ Os prudentes conceituão<br>
+   Ser tudo isto huma Tragedia,<br>
+   Que os felizes nestas casas<br>
+   São como os Reis de comedia.<br>
+ E porque em lojas de Sortes<br>
+   Não gastes nem hum vintem,<br>
+   Huns conselhos vou a dar-te,<br>
+   Com os quaes te acharás bem.<br>
+ Nao olhes para as Tabellas,<br>
+   Nem os mais vejas jogar,<br>
+   Que se algum tem sorte em preto,<br>
+   A ambição te vai tentar;<span class="pn">{63}</span><br>
+ Olha sim, para a dinheiro,<br>
+   Que está perdido no chão<br>
+   Em sortes desembrulhadas<br>
+   Da porta até ao balcão.<br>
+ O Saloio respondeo:<br>
+   Teu desengano me embaça,<br>
+   Se se promettem fortunas<br>
+   Onde se encontra a desgraça.<br>
+ Á vista disto he razão<br>
+   Que este vicio em mim se quebre,<br>
+   Fugirei de toda a casa,<br>
+   Que vende gato por lebre.<span class="pn">{64}</span></blockquote>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p>Vindo ás mãos do Author huma Quadra bastantemente conceituosa, tentou
+glosala pelo seguinte modo:</p>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p style="margin-left: 25%;">QUADRA.</p>
+
+<blockquote>
+ <em>Dois Entes regem o mundo</em><br>
+ <em>Doce Amor, e Morte impía,</em><br>
+ <em>A Morte co' a fouce corta</em><br>
+ <em>Quanto Amor semêa, e cria.</em></blockquote>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p style="margin-left: 25%;">GLOSA.</p>
+
+
+<p style="margin-left: 25%;">1.</p>
+
+<blockquote>
+ Logo que foi construida<br>
+ Esta Maquina brilhante,<br>
+ Não falhou hum só instante<br>
+ Na conta, pezo, e medida:<br>
+ Nem podia ser falida<br>
+ Obra de hum Saber profundo;<br>
+ He seu creador segundo<br>
+ O Tempo, que não faz pausa,<br>
+ Por mando da Eterna Causa<br>
+ <em>Dois Entes regem o mundo</em><span class="pn">{65}</span> </blockquote>
+
+
+<p style="margin-left: 25%;">2.</p>
+
+<blockquote>
+ Hum he Amor, outro a Morte,<br>
+ Cada qual com fortaleza,<br>
+ Entre alegria, e tristeza,<br>
+ Mudão dos Mortaes a sorte:<br>
+ No que hum faz outro dá córte,<br>
+ Que a desordem desafia,<br>
+ Disputão de noite, e dia,<br>
+ A qual mais poder encerra,<br>
+ Andão sempre em viva guerra<br>
+ <em>Doce Amor, e Morte impía,</em> </blockquote>
+
+
+<p style="margin-left: 25%;">3.</p>
+
+<blockquote>
+ Nesta horrorosa campanha<br>
+ Não faz figura a Razão,<br>
+ Nem ha capitulação<br>
+ (O que já se não estranha)<br>
+ Tudo de terror se banha,<br>
+ He immensa a gente morta;<br>
+ E por mais que Amor a exhorta,<br>
+ Sem respeito ás creaturas,<br>
+ Searas verdes, maduras<br>
+ <em>A Morte co' a fouce corta</em><span class="pn">{66}</span> </blockquote>
+
+
+<p style="margin-left: 25%;">4.</p>
+
+<blockquote>
+ Quando a paixão se declara<br>
+ De Amor entre dois amantes,<br>
+ Porque não fiquem triunfantes,<br>
+ A Morte vê se os separa:<br>
+ Como he das vidas avara,<br>
+ Em suffocallas porfia;<br>
+ De balde Amor a vigia,<br>
+ Que a Morte, que tudo extingue,<br>
+ Trabalha porque não vingue<br>
+ <em>Quanto Amor semêa, e cria.</em><span class="pn">{67}</span></blockquote>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p>Quadra, que mandou huma Senhora ao Author (talvez sem reflectir) com muito
+empenho, para que lha glosasse; sendo assás bem difficultosa, pelo veneno do
+tempo que tem comsigo, etc.</p>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p style="margin-left: 25%;">QUADRA.</p>
+
+<blockquote>
+ <em>Não sigas, Bella, os caprichos,</em><br>
+ <em>Que os Mortaes tem fabricado;</em><br>
+ <em>Segue as Leis da Natureza,</em><br>
+ <em>Felicita hum desgraçado.</em> </blockquote>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p style="margin-left: 25%;">GLOSA.</p>
+
+
+<p style="margin-left: 25%;">1.</p>
+
+<blockquote>
+ Bella Nize, o Creador,<br>
+ Que o Mundo fez, e governa,<br>
+ Que com Providencia eterna<br>
+ He, e foi de tudo Author,<br>
+ He em quem devemos pôr<br>
+ Os nossos desejos fixos;<br>
+ De genios que estão perfixos,<br>
+ Com a maior impiedade,<br>
+ Em negar esta verdade<br>
+ <em>Não sigas, Bella, os caprichos.</em><span class="pn">{68}</span> </blockquote>
+
+
+<p style="margin-left: 25%;">2.</p>
+
+<blockquote>
+ Dar a todos a entender<br>
+ Por Fabula Ceo, e Inferno;<br>
+ Que não ha castigo eterno;<br>
+ Que nem premio póde haver;<br>
+ Que ha só nascer, e morrer<br>
+ Sem lembrança de peccado,<br>
+ Bem como bruto esfaimado,<br>
+ Eis a perversa doutrina,<br>
+ Só para nossa ruina,<br>
+ <em>Que os Mortaes tem fabricado.</em> </blockquote>
+
+
+<p style="margin-left: 25%;">3.</p>
+
+<blockquote>
+ Quem na Pia do Baptismo<br>
+ As luzes da Fé recebe,<br>
+ O bom caracter concebe<br>
+ No Gremio do Christianismo:<br>
+ Não temer penas do Abismo<br>
+ He ser de Lucifer preza<br>
+ Na Religião firmeza<br>
+ He quanto todos convem<br>
+ Inculto Gentio he quem<br>
+ <em>Segue as Leis da Natureza,</em><span class="pn">{69}</span> </blockquote>
+
+
+<p style="margin-left: 25%;">4.</p>
+
+<blockquote>
+ Ó Deos Eterno! he possivel<br>
+ Que o Christão, que tu creaste,<br>
+ Dos teus preceitos se afaste,<br>
+ Á tua voz insensivel!<br>
+ Sua pena era infallivel<br>
+ Por ter a Lei quebrantado;<br>
+ Mas o teu Poder sagrado<br>
+ Fallando-lhe ao coração,<br>
+ O salve da escravidão;<br>
+ <em>Felicita hum desgraçado.</em><span class="pn">{70}</span> </blockquote>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p style="margin-left: 25%;">CHARADE.</p>
+
+<blockquote>
+ Guarda a primeira e segunda<br>
+ Dos rigores da estação,<br>
+ E guarda a terceira as duas<br>
+ Por amor, e gratidão:<br>
+ As tres conchegão seu dono,<br>
+ Seja de inverno, ou verão. </blockquote>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p style="margin-left: 25%;">CHARADE.</p>
+
+<blockquote>
+ Não quer demora a primeira,<br>
+ A segunda he contra a fome,<br>
+ Separadas não tem bocca,<br>
+ Ambas juntas muita toca,<br>
+ Muita gente tem, que come. </blockquote>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p style="margin-left: 25%;">CHARADE.</p>
+
+<blockquote>
+ He criminosa a primeira,<br>
+ E aos crimes, que commetteo<br>
+ Logo a segunda, e terceira<br>
+ Justa sentença lhes deo;<br>
+ Porém juntando-se as trez<br>
+ Entrão em tanta harmonia,<br>
+ Que o mal, que a primeira fez,<br>
+ Torna-se em grande alegria.<span class="pn">{71}</span> </blockquote>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p style="margin-left: 25%;">CHARADE.</p>
+
+<blockquote>
+ A primeira diz aonde,<br>
+ Esta, e segunda cultiva,<br>
+ Evita a terceira o pó,<br>
+ E de precipicios priva:<br>
+ Primeira, e ultima afflige,<br>
+ Nutre segunda, e primeira:<br>
+ Ha nas quintas, e fazendas<br>
+ A segunda co' a terceira:<br>
+ O bom commodo dos homens<br>
+ Nas tres syllabas se encerra<br>
+ Em couza, que serve muito<br>
+ Na paz, e tambem na guerra.</blockquote>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p style="margin-left: 25%;">CHARADE.</p>
+
+<blockquote>
+ Da primeira, e segunda se gosta,<br>
+ Que he onde se chora, se folga, e se ri:<br>
+ Na segunda, e terceira apparece<br>
+ O aspecto da gente por bom, ou ruim;<br>
+ A segunda, e terceira dá nome<br>
+ A huma alta serra do nosso paiz;<br>
+ Mas se as três ajuntarmos, veremos<br>
+ Hum peixe saltante na praia a cahir.<span class="pn">{72}</span> </blockquote>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p style="margin-left: 25%;">ADIVINHAÇÃO.</p>
+
+<blockquote>
+ Eu visito toda a casa,<br>
+ E co' a gente desespero,<br>
+ Como com ElRei á meza<br>
+ Daquelles pratos, que quero;<br>
+ Seja a Dama a mais formosa,<br>
+ Mais pobre, ou mais abastada,<br>
+ Mesmo diante de todos<br>
+ Por mim ha de ser beijada;<br>
+ Ando sempre em viva guerra,<br>
+ Vivo entre muito inimigo;<br>
+ Mas sendo debil de forças,<br>
+ Só póde o tempo comigo. </blockquote>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p style="margin-left: 25%;">ADIVINHAÇÃO.</p>
+
+<blockquote>
+ Não tenho sete cabeças,<br>
+ Co' a que tenho me governo,<br>
+ Meu rosto não tem feitio,<br>
+ Até sou da côr do Inferno:<br>
+ Pareço no meu sustento<br>
+ Nascer no Signo de Aquario;<br>
+ E a minha condição he<br>
+ Semelhante á do usurario;<br>
+ Morro de huma ingratidão,<br>
+ Que me faz ser infeliz;<br>
+ Pois dão-me a morte por paga<br>
+ Do beneficio, que fiz.<span class="pn">{73}</span> </blockquote>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p>Significação das Charades, e Adivinhações deste Folheto.</p>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p><em>= ecraeb = amõacar = ãzoccaa = sgausgenua = alacvo = oapaj = osacm
+=</em></p>
+
+<p>&nbsp;</p>
+
+<p>A Significação destas <em>Xarades</em>, e <em>Adivinhações</em> aqui vão não
+por sua ordem, e até cada huma de per si com as letras trocadas, para maior
+confusão, e gosto de quem as adivinhar: cujos nomes escolherá para os
+appropriar, e collocar onde pertencerem, visto não haver outro Folheto, em que
+se explique, por ser este o ultimo desta Obra, que torno a advertir se deve
+encadernar com a <em>primeira Parte</em>, e com o <em>Poema do Balão aos
+Habitantes da Lua; que fica hum Livro divertido.</em></p>
+
+<p><em>Tudo se vende nas lojas: de Francisco Xavier de Carvalho defronte da rua
+de S. Francisco da Cidade; de Antonio Manoel Polycarpo da Silva junto ao
+Senado; de Antonio Xavier Moreira da Impressão Regia debaixo da Arcada; de João
+Henriques no principio da rua Augusta, de Antonio Pedro na rua do Ouro; de Luiz
+José de Carvalho aos Paulistas; e em Belém na loja da Viuva de José Tiburcio.
+Custa este Folheto 240; a primeira Parte outro tanto; e o Balão 160.</em></p>
+
+<p>&nbsp;</p>
+</div>
+
+<p>&nbsp;</p>
+<div class="fbox"><p><b>Notas de transcrição:</b></p>
+
+<p>O texto aqui transcrito, é uma cópia integral e inalterada do livro
+impresso em 1820.</p>
+
+<p>Mantivemos a grafia usada na edição impressa, tendo sido corrigidos alguns
+pequenos erros tipográficos evidentes, que não alteram a leitura do texto,
+e que por isso não considerámos necessário assinalá-los. Mantivemos
+inclusivamente as eventuais incoerências de grafia de algumas palavras, em
+particular quanto à acentuação.</p>
+</div>
+
+
+
+
+
+
+
+
+<pre>
+
+
+
+
+
+End of the Project Gutenberg EBook of Continuação do Portugal enfermo por
+vicios, e abusos de ambos os sexos, by José Daniel Rodrigues da Costa
+
+*** END OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK CONTINUACAO DO PORTUGAL ENFERMO ***
+
+***** This file should be named 31744-h.htm or 31744-h.zip *****
+This and all associated files of various formats will be found in:
+ https://www.gutenberg.org/3/1/7/4/31744/
+
+Produced by Pedro Saborano (produced from scanned images
+of public domain material from Google Book Search)
+
+
+Updated editions will replace the previous one--the old editions
+will be renamed.
+
+Creating the works from public domain print editions means that no
+one owns a United States copyright in these works, so the Foundation
+(and you!) can copy and distribute it in the United States without
+permission and without paying copyright royalties. Special rules,
+set forth in the General Terms of Use part of this license, apply to
+copying and distributing Project Gutenberg-tm electronic works to
+protect the PROJECT GUTENBERG-tm concept and trademark. Project
+Gutenberg is a registered trademark, and may not be used if you
+charge for the eBooks, unless you receive specific permission. If you
+do not charge anything for copies of this eBook, complying with the
+rules is very easy. You may use this eBook for nearly any purpose
+such as creation of derivative works, reports, performances and
+research. They may be modified and printed and given away--you may do
+practically ANYTHING with public domain eBooks. Redistribution is
+subject to the trademark license, especially commercial
+redistribution.
+
+
+
+*** START: FULL LICENSE ***
+
+THE FULL PROJECT GUTENBERG LICENSE
+PLEASE READ THIS BEFORE YOU DISTRIBUTE OR USE THIS WORK
+
+To protect the Project Gutenberg-tm mission of promoting the free
+distribution of electronic works, by using or distributing this work
+(or any other work associated in any way with the phrase "Project
+Gutenberg"), you agree to comply with all the terms of the Full Project
+Gutenberg-tm License (available with this file or online at
+https://gutenberg.org/license).
+
+
+Section 1. General Terms of Use and Redistributing Project Gutenberg-tm
+electronic works
+
+1.A. By reading or using any part of this Project Gutenberg-tm
+electronic work, you indicate that you have read, understand, agree to
+and accept all the terms of this license and intellectual property
+(trademark/copyright) agreement. If you do not agree to abide by all
+the terms of this agreement, you must cease using and return or destroy
+all copies of Project Gutenberg-tm electronic works in your possession.
+If you paid a fee for obtaining a copy of or access to a Project
+Gutenberg-tm electronic work and you do not agree to be bound by the
+terms of this agreement, you may obtain a refund from the person or
+entity to whom you paid the fee as set forth in paragraph 1.E.8.
+
+1.B. "Project Gutenberg" is a registered trademark. It may only be
+used on or associated in any way with an electronic work by people who
+agree to be bound by the terms of this agreement. There are a few
+things that you can do with most Project Gutenberg-tm electronic works
+even without complying with the full terms of this agreement. See
+paragraph 1.C below. There are a lot of things you can do with Project
+Gutenberg-tm electronic works if you follow the terms of this agreement
+and help preserve free future access to Project Gutenberg-tm electronic
+works. See paragraph 1.E below.
+
+1.C. The Project Gutenberg Literary Archive Foundation ("the Foundation"
+or PGLAF), owns a compilation copyright in the collection of Project
+Gutenberg-tm electronic works. Nearly all the individual works in the
+collection are in the public domain in the United States. If an
+individual work is in the public domain in the United States and you are
+located in the United States, we do not claim a right to prevent you from
+copying, distributing, performing, displaying or creating derivative
+works based on the work as long as all references to Project Gutenberg
+are removed. Of course, we hope that you will support the Project
+Gutenberg-tm mission of promoting free access to electronic works by
+freely sharing Project Gutenberg-tm works in compliance with the terms of
+this agreement for keeping the Project Gutenberg-tm name associated with
+the work. You can easily comply with the terms of this agreement by
+keeping this work in the same format with its attached full Project
+Gutenberg-tm License when you share it without charge with others.
+
+1.D. The copyright laws of the place where you are located also govern
+what you can do with this work. Copyright laws in most countries are in
+a constant state of change. If you are outside the United States, check
+the laws of your country in addition to the terms of this agreement
+before downloading, copying, displaying, performing, distributing or
+creating derivative works based on this work or any other Project
+Gutenberg-tm work. The Foundation makes no representations concerning
+the copyright status of any work in any country outside the United
+States.
+
+1.E. Unless you have removed all references to Project Gutenberg:
+
+1.E.1. The following sentence, with active links to, or other immediate
+access to, the full Project Gutenberg-tm License must appear prominently
+whenever any copy of a Project Gutenberg-tm work (any work on which the
+phrase "Project Gutenberg" appears, or with which the phrase "Project
+Gutenberg" is associated) is accessed, displayed, performed, viewed,
+copied or distributed:
+
+This eBook is for the use of anyone anywhere at no cost and with
+almost no restrictions whatsoever. You may copy it, give it away or
+re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included
+with this eBook or online at www.gutenberg.org
+
+1.E.2. If an individual Project Gutenberg-tm electronic work is derived
+from the public domain (does not contain a notice indicating that it is
+posted with permission of the copyright holder), the work can be copied
+and distributed to anyone in the United States without paying any fees
+or charges. If you are redistributing or providing access to a work
+with the phrase "Project Gutenberg" associated with or appearing on the
+work, you must comply either with the requirements of paragraphs 1.E.1
+through 1.E.7 or obtain permission for the use of the work and the
+Project Gutenberg-tm trademark as set forth in paragraphs 1.E.8 or
+1.E.9.
+
+1.E.3. If an individual Project Gutenberg-tm electronic work is posted
+with the permission of the copyright holder, your use and distribution
+must comply with both paragraphs 1.E.1 through 1.E.7 and any additional
+terms imposed by the copyright holder. Additional terms will be linked
+to the Project Gutenberg-tm License for all works posted with the
+permission of the copyright holder found at the beginning of this work.
+
+1.E.4. Do not unlink or detach or remove the full Project Gutenberg-tm
+License terms from this work, or any files containing a part of this
+work or any other work associated with Project Gutenberg-tm.
+
+1.E.5. Do not copy, display, perform, distribute or redistribute this
+electronic work, or any part of this electronic work, without
+prominently displaying the sentence set forth in paragraph 1.E.1 with
+active links or immediate access to the full terms of the Project
+Gutenberg-tm License.
+
+1.E.6. You may convert to and distribute this work in any binary,
+compressed, marked up, nonproprietary or proprietary form, including any
+word processing or hypertext form. However, if you provide access to or
+distribute copies of a Project Gutenberg-tm work in a format other than
+"Plain Vanilla ASCII" or other format used in the official version
+posted on the official Project Gutenberg-tm web site (www.gutenberg.org),
+you must, at no additional cost, fee or expense to the user, provide a
+copy, a means of exporting a copy, or a means of obtaining a copy upon
+request, of the work in its original "Plain Vanilla ASCII" or other
+form. Any alternate format must include the full Project Gutenberg-tm
+License as specified in paragraph 1.E.1.
+
+1.E.7. Do not charge a fee for access to, viewing, displaying,
+performing, copying or distributing any Project Gutenberg-tm works
+unless you comply with paragraph 1.E.8 or 1.E.9.
+
+1.E.8. You may charge a reasonable fee for copies of or providing
+access to or distributing Project Gutenberg-tm electronic works provided
+that
+
+- You pay a royalty fee of 20% of the gross profits you derive from
+ the use of Project Gutenberg-tm works calculated using the method
+ you already use to calculate your applicable taxes. The fee is
+ owed to the owner of the Project Gutenberg-tm trademark, but he
+ has agreed to donate royalties under this paragraph to the
+ Project Gutenberg Literary Archive Foundation. Royalty payments
+ must be paid within 60 days following each date on which you
+ prepare (or are legally required to prepare) your periodic tax
+ returns. Royalty payments should be clearly marked as such and
+ sent to the Project Gutenberg Literary Archive Foundation at the
+ address specified in Section 4, "Information about donations to
+ the Project Gutenberg Literary Archive Foundation."
+
+- You provide a full refund of any money paid by a user who notifies
+ you in writing (or by e-mail) within 30 days of receipt that s/he
+ does not agree to the terms of the full Project Gutenberg-tm
+ License. You must require such a user to return or
+ destroy all copies of the works possessed in a physical medium
+ and discontinue all use of and all access to other copies of
+ Project Gutenberg-tm works.
+
+- You provide, in accordance with paragraph 1.F.3, a full refund of any
+ money paid for a work or a replacement copy, if a defect in the
+ electronic work is discovered and reported to you within 90 days
+ of receipt of the work.
+
+- You comply with all other terms of this agreement for free
+ distribution of Project Gutenberg-tm works.
+
+1.E.9. If you wish to charge a fee or distribute a Project Gutenberg-tm
+electronic work or group of works on different terms than are set
+forth in this agreement, you must obtain permission in writing from
+both the Project Gutenberg Literary Archive Foundation and Michael
+Hart, the owner of the Project Gutenberg-tm trademark. Contact the
+Foundation as set forth in Section 3 below.
+
+1.F.
+
+1.F.1. Project Gutenberg volunteers and employees expend considerable
+effort to identify, do copyright research on, transcribe and proofread
+public domain works in creating the Project Gutenberg-tm
+collection. Despite these efforts, Project Gutenberg-tm electronic
+works, and the medium on which they may be stored, may contain
+"Defects," such as, but not limited to, incomplete, inaccurate or
+corrupt data, transcription errors, a copyright or other intellectual
+property infringement, a defective or damaged disk or other medium, a
+computer virus, or computer codes that damage or cannot be read by
+your equipment.
+
+1.F.2. LIMITED WARRANTY, DISCLAIMER OF DAMAGES - Except for the "Right
+of Replacement or Refund" described in paragraph 1.F.3, the Project
+Gutenberg Literary Archive Foundation, the owner of the Project
+Gutenberg-tm trademark, and any other party distributing a Project
+Gutenberg-tm electronic work under this agreement, disclaim all
+liability to you for damages, costs and expenses, including legal
+fees. YOU AGREE THAT YOU HAVE NO REMEDIES FOR NEGLIGENCE, STRICT
+LIABILITY, BREACH OF WARRANTY OR BREACH OF CONTRACT EXCEPT THOSE
+PROVIDED IN PARAGRAPH F3. YOU AGREE THAT THE FOUNDATION, THE
+TRADEMARK OWNER, AND ANY DISTRIBUTOR UNDER THIS AGREEMENT WILL NOT BE
+LIABLE TO YOU FOR ACTUAL, DIRECT, INDIRECT, CONSEQUENTIAL, PUNITIVE OR
+INCIDENTAL DAMAGES EVEN IF YOU GIVE NOTICE OF THE POSSIBILITY OF SUCH
+DAMAGE.
+
+1.F.3. LIMITED RIGHT OF REPLACEMENT OR REFUND - If you discover a
+defect in this electronic work within 90 days of receiving it, you can
+receive a refund of the money (if any) you paid for it by sending a
+written explanation to the person you received the work from. If you
+received the work on a physical medium, you must return the medium with
+your written explanation. The person or entity that provided you with
+the defective work may elect to provide a replacement copy in lieu of a
+refund. If you received the work electronically, the person or entity
+providing it to you may choose to give you a second opportunity to
+receive the work electronically in lieu of a refund. If the second copy
+is also defective, you may demand a refund in writing without further
+opportunities to fix the problem.
+
+1.F.4. Except for the limited right of replacement or refund set forth
+in paragraph 1.F.3, this work is provided to you 'AS-IS' WITH NO OTHER
+WARRANTIES OF ANY KIND, EXPRESS OR IMPLIED, INCLUDING BUT NOT LIMITED TO
+WARRANTIES OF MERCHANTIBILITY OR FITNESS FOR ANY PURPOSE.
+
+1.F.5. Some states do not allow disclaimers of certain implied
+warranties or the exclusion or limitation of certain types of damages.
+If any disclaimer or limitation set forth in this agreement violates the
+law of the state applicable to this agreement, the agreement shall be
+interpreted to make the maximum disclaimer or limitation permitted by
+the applicable state law. The invalidity or unenforceability of any
+provision of this agreement shall not void the remaining provisions.
+
+1.F.6. INDEMNITY - You agree to indemnify and hold the Foundation, the
+trademark owner, any agent or employee of the Foundation, anyone
+providing copies of Project Gutenberg-tm electronic works in accordance
+with this agreement, and any volunteers associated with the production,
+promotion and distribution of Project Gutenberg-tm electronic works,
+harmless from all liability, costs and expenses, including legal fees,
+that arise directly or indirectly from any of the following which you do
+or cause to occur: (a) distribution of this or any Project Gutenberg-tm
+work, (b) alteration, modification, or additions or deletions to any
+Project Gutenberg-tm work, and (c) any Defect you cause.
+
+
+Section 2. Information about the Mission of Project Gutenberg-tm
+
+Project Gutenberg-tm is synonymous with the free distribution of
+electronic works in formats readable by the widest variety of computers
+including obsolete, old, middle-aged and new computers. It exists
+because of the efforts of hundreds of volunteers and donations from
+people in all walks of life.
+
+Volunteers and financial support to provide volunteers with the
+assistance they need are critical to reaching Project Gutenberg-tm's
+goals and ensuring that the Project Gutenberg-tm collection will
+remain freely available for generations to come. In 2001, the Project
+Gutenberg Literary Archive Foundation was created to provide a secure
+and permanent future for Project Gutenberg-tm and future generations.
+To learn more about the Project Gutenberg Literary Archive Foundation
+and how your efforts and donations can help, see Sections 3 and 4
+and the Foundation web page at https://www.pglaf.org.
+
+
+Section 3. Information about the Project Gutenberg Literary Archive
+Foundation
+
+The Project Gutenberg Literary Archive Foundation is a non profit
+501(c)(3) educational corporation organized under the laws of the
+state of Mississippi and granted tax exempt status by the Internal
+Revenue Service. The Foundation's EIN or federal tax identification
+number is 64-6221541. Its 501(c)(3) letter is posted at
+https://pglaf.org/fundraising. Contributions to the Project Gutenberg
+Literary Archive Foundation are tax deductible to the full extent
+permitted by U.S. federal laws and your state's laws.
+
+The Foundation's principal office is located at 4557 Melan Dr. S.
+Fairbanks, AK, 99712., but its volunteers and employees are scattered
+throughout numerous locations. Its business office is located at
+809 North 1500 West, Salt Lake City, UT 84116, (801) 596-1887, email
+business@pglaf.org. Email contact links and up to date contact
+information can be found at the Foundation's web site and official
+page at https://pglaf.org
+
+For additional contact information:
+ Dr. Gregory B. Newby
+ Chief Executive and Director
+ gbnewby@pglaf.org
+
+
+Section 4. Information about Donations to the Project Gutenberg
+Literary Archive Foundation
+
+Project Gutenberg-tm depends upon and cannot survive without wide
+spread public support and donations to carry out its mission of
+increasing the number of public domain and licensed works that can be
+freely distributed in machine readable form accessible by the widest
+array of equipment including outdated equipment. Many small donations
+($1 to $5,000) are particularly important to maintaining tax exempt
+status with the IRS.
+
+The Foundation is committed to complying with the laws regulating
+charities and charitable donations in all 50 states of the United
+States. Compliance requirements are not uniform and it takes a
+considerable effort, much paperwork and many fees to meet and keep up
+with these requirements. We do not solicit donations in locations
+where we have not received written confirmation of compliance. To
+SEND DONATIONS or determine the status of compliance for any
+particular state visit https://pglaf.org
+
+While we cannot and do not solicit contributions from states where we
+have not met the solicitation requirements, we know of no prohibition
+against accepting unsolicited donations from donors in such states who
+approach us with offers to donate.
+
+International donations are gratefully accepted, but we cannot make
+any statements concerning tax treatment of donations received from
+outside the United States. U.S. laws alone swamp our small staff.
+
+Please check the Project Gutenberg Web pages for current donation
+methods and addresses. Donations are accepted in a number of other
+ways including including checks, online payments and credit card
+donations. To donate, please visit: https://pglaf.org/donate
+
+
+Section 5. General Information About Project Gutenberg-tm electronic
+works.
+
+Professor Michael S. Hart was the originator of the Project Gutenberg-tm
+concept of a library of electronic works that could be freely shared
+with anyone. For thirty years, he produced and distributed Project
+Gutenberg-tm eBooks with only a loose network of volunteer support.
+
+
+Project Gutenberg-tm eBooks are often created from several printed
+editions, all of which are confirmed as Public Domain in the U.S.
+unless a copyright notice is included. Thus, we do not necessarily
+keep eBooks in compliance with any particular paper edition.
+
+
+Most people start at our Web site which has the main PG search facility:
+
+ https://www.gutenberg.org
+
+This Web site includes information about Project Gutenberg-tm,
+including how to make donations to the Project Gutenberg Literary
+Archive Foundation, how to help produce our new eBooks, and how to
+subscribe to our email newsletter to hear about new eBooks.
+
+
+</pre>
+
+</body>
+</html>
diff --git a/LICENSE.txt b/LICENSE.txt
new file mode 100644
index 0000000..6312041
--- /dev/null
+++ b/LICENSE.txt
@@ -0,0 +1,11 @@
+This eBook, including all associated images, markup, improvements,
+metadata, and any other content or labor, has been confirmed to be
+in the PUBLIC DOMAIN IN THE UNITED STATES.
+
+Procedures for determining public domain status are described in
+the "Copyright How-To" at https://www.gutenberg.org.
+
+No investigation has been made concerning possible copyrights in
+jurisdictions other than the United States. Anyone seeking to utilize
+this eBook outside of the United States should confirm copyright
+status under the laws that apply to them.
diff --git a/README.md b/README.md
new file mode 100644
index 0000000..545cbfd
--- /dev/null
+++ b/README.md
@@ -0,0 +1,2 @@
+Project Gutenberg (https://www.gutenberg.org) public repository for
+eBook #31744 (https://www.gutenberg.org/ebooks/31744)